CSM/SP: Registro de Imóveis – Usucapião na via extrajudicial – Dúvida – Apelação – Falta de prova da posse própria (“com animus domini”) de antecessora – Impossibilidade de afirmar-se neste caso, na via administrativa, a sucessão na posse nos termos dos arts. 1.207 e 1.243 do Código Civil – Sentença bem lançada – Apelação a que se nega provimento


  
 

Apelação Cível nº 0001035-05.2021.8.26.0278

Espécie: APELAÇÃO
Número: 0001035-05.2021.8.26.0278
Comarca: ITAQUAQUECETUBAPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 0001035-05.2021.8.26.0278

Registro: 2023.0000976476

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0001035-05.2021.8.26.0278, da Comarca de Itaquaquecetuba, em que é apelante VICTOR HUGO FABOTTI DELGADO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ITAQUAQUECETUBA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 6 de novembro de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 0001035-05.2021.8.26.0278

APELANTE: Victor Hugo Fabotti Delgado

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Itaquaquecetuba

VOTO Nº 39.185

Registro de Imóveis – Usucapião na via extrajudicial – Dúvida – Apelação – Falta de prova da posse própria (“com animus domini”) de antecessora – Impossibilidade de afirmar-se neste caso, na via administrativa, a sucessão na posse nos termos dos arts. 1.207 e 1.243 do Código Civil – Sentença bem lançada – Apelação a que se nega provimento

Cuida-se de apelação interposta por Victor Hugo Fabotti Delgado contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Itaquaquecetuba, Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoa Jurídica e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de Itaquaquecetuba, que julgou procedente a dúvida e impediu o prosseguimento de processo extrajudicial de usucapião.

Segundo a r. sentença (fls. 274/276), o requerente Victor Hugo Fabotti Delgado não conseguiu provar o exercício de posse pelo tempo suficiente para a usucapião extraordinária, pois os documentos que trouxe não deixam claro a que título e de que forma a pessoa jurídica antecessora ocupava o imóvel.

Na apelação (fls. 280/285) está dito que o imóvel foi inicialmente ocupado em 10.10.2001 por Recimax Comércio de Metais, em área maior, e sua posse foi sucessivamente transmitida mediante contratos escritos (de Recimax para Carlos Peres Delgado e Marcelo Silva, em 02.06.2009; de Carlos e Marcelo para apenas Carlos, em 03.07.2017), até que, em 22.01.2018, o apelante, por contrato de cessão gratuita, celebrado com seu pai Carlos Peres Delgado, adquiriu a posse na área menor usucapienda, com exclusividade; contudo, o cartório afirmou que não é possível determinar se a pessoa jurídica Recimax exercia ou não posse própria (“com animus domini”), o que não está correto; a prova da posse própria (“com animus domini”) verifica-se independentemente de prova escrita ou contrato, mas tira-se das circunstâncias do caso, as quais, de modo efetivo, indicam que o poder fático da empresa realmente existiu, mediante contrato social registrado na Junta Comercial, notas fiscais de entrada e saída de mercadorias, cópias de mandados de intimação e de citação no endereço etc.; é incoerente a afirmação de que Carlos e Marcelo tinham posse própria, mas a sua antecessora a sociedade Recimax não a havia, valendo notar que não existem notícias de demandas judiciais contra essa pessoa jurídica, acerca de sua posse; pede, assim, o apelante, que se reforme a r. sentença e lhe seja reconhecida a usucapião almejada.

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento da apelação (fls. 542/544).

É o relatório.

Como diz o Cód. Civil, art. 1.207, 2ª parte, “ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais” (successio possessionis) dentre esses efeitos, a contagem de prazo para a usucapião (Cód. Civil, art. 1.243).

Para que seja possível admitir-se essa sucessão na posse, é preciso que os poderes fáticos exercidos pelos interessados sejam contínuos e tenham a mesma natureza (= sejam sempre posse ad usucapionem).

A constatação dessa homogeneidade dos poderes fáticos, entretanto, não pode ser feita retroativamente, como se o poder fático hoje exercido demonstrasse de modo cabal, de trás para frente, que os possuidores antecedentes também mantinham posse própria (“com animus domini”), especialmente na via extrajudicial, onde as limitações instrutórias e a ausência de coisa julgada tornam ainda mais necessária a firme cautela na apreciação dos requisitos para a usucapião.

Na hipótese dos autos, os documentos que supostamente indicam a presença da pessoa jurídica Recimax no local (fls. 19/20 e 48/74) não dão prova contundente da forma pela qual essa sociedade iniciou e conservou o poder fático sobre o imóvel: o só fato de a empresa estar lá não indica, com efeito, que ela tenha exercido a posse como se dona fosse, e sem segurança sobre isso (= sem certeza sobre a posse própria de Recimax) não há como cogitar da soma desse tempo anterior com os períodos subsequentes, para a consumação do prazo de usucapião extraordinária. Nesse contexto, andaram bem o Oficial de Registro de Imóveis (fls. 05/06, em especial) e a r. sentença (fls. 274/276), quando afirmaram a ausência do requisito temporal para a declaração da prescrição aquisitiva na via extrajudicial como também fez notar o Ministério Público (fls. 542/544).

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 01.02.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.