Processo 0004110-96.2024.8.26.0100
Pedido de Providências – Reclamação do extrajudicial (formulada por usuários do serviço) – Helena Dellape Jardim Passarini – Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a reclamação formulada por Helena Dellape Jardim Passarini. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: HELENA DELLAPE JARDIM PASSARINI (OAB 310977/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo nº: 0004110-96.2024.8.26.0100
Classe – Assunto Pedido de Providências – Reclamação do extrajudicial (formulada por usuários do serviço)
Requerente: Helena Dellape Jardim Passarini
Requerido: 1º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital
Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta
Vistos.
Trata-se de pedido de providências instaurado a partir de reclamação formulada por Helena Dellape Jardim Passarini em face do 1º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital, insurgindo-se contra a negativa de protesto de contrato de prestação de serviços advocatícios e seu aditamento.
A requerente alega que apresentou a protesto um título executivo extrajudicial consubstanciado em “contrato e aditamento de prestação de serviço de honorários advocatícios”, contudo, o Tabelião o teria recusado, sem fundamentação legal. Relata que encaminhou correspondência ao Tabelião, por meio de carta postal registrada, para notificá-lo de que a negativa de protesto do título executivo extrajudicial em questão caracteriza procedimento ilegal, “abuso de poder de autoridade”, ameaça “de direitos, desrespeito à legislação e desvio de função pública”; e que os documentos foram desconsiderados para beneficiar a devedora, “por parcialidade (…), de acordo com comportamento sem fundamentação legal e prova das agressões legais na gravação de áudio”. (fls. 01/03).
O Tabelião manifestou-se, aduzindo que as alegações da requerente são desprovidas de pertinência e que os dispositivos legais e constitucionais citados na reclamação, com exceção do art. 784, III, do CPC, não possuem nenhuma pertinência ao caso concreto, estando, inclusive, um deles já revogado, qual seja, o art. 7º, §2º, da Lei n. 8906/1994; que, nunca é demais lembrar que os títulos e documentos de dívida encaminhados para protesto devem ser objeto de exame e qualificação de seus termos, eis que nenhum protesto pode ser lavrado sem que efetivamente seja constatada a liquidez, certeza e exigibilidade do crédito; que, de fato, apontado um título ou documento de dívida, é dever do Tabelião aferir, em sede de qualificação, a sua protestabilidade, não podendo, portanto, após a protocolização, de forma automática, dar seguimento ao procedimento de protesto; que o Tabelião age com imparcialidade e, por expressa previsão legal, possui liberdade para a qualificação do título ou documento de dívida que lhe é apresentado para protesto, sendo inclusive responsável pelo ato; que não há sentido algum em amoldar o múnus do Tabelião de Protesto às acusações totalmente infundadas e inverídicas desfiadas pela requerente, todas fruto de inequívoco e exacerbado sentimento de inconformismo pela recusa do Tabelião em prosseguir com o procedimento de protesto com base nos documentos apresentados; que, no caso, o protesto não foi definitivamente rejeitado, mas adiado e condicionado à apresentação de prova ineludível da presença dos requisitos da certa, liquidez e exigibilidade do contrato de prestação de serviços advocatícios.
O Tabelião esclareceu que em 17 de novembro de 2023, a requerente apresentou para protesto, em duplicidade, contrato de prestação de serviços advocatícios e seu aditamento, assinados, respectivamente, em 21 de janeiro de 2020, e 22 de maio de 2021, tendo como devedora Genilda de Oliveira Santana; que o contrato indicava que a advogada atuaria em dez tipos de procedimentos judiciais ou extrajudiciais e vinculavam o pagamento dos honorários advocatícios a “50% sobre cada recebimento” decorrente de tais intervenções, além de valor correspondente a seis meses de pensão a ser percebida pela cliente; que o aditamento, de seu turno, acresceu outros quatro serviços jurídicos, informando novo e confuso pagamento que considerava cinco mensalidades de benefício, que deveriam ser somadas a outras cinco em aberto, das quais metade seria devida à advogada somente no que concernia ao pagamento de pensão, enquanto o restante seria descontado na proporção de 50%; que o contrato, como dito, fora apresentado em duplicidade, e seguidos de demonstrativos de débito diferentes, o primeiro no valor de R$ 327.039,26, o segundo no valor de R$ 8.000,00; que o primeiro demonstrativo ressalvava tratar-se de valor correspondente a 50% de haveres a receber da SPPREV, dos direitos de companheiro falecido, com vencimento para 31 de julho de 2023, e o segundo, consignava tratar-se de “valor de benefício a pagar de pensão em aberto para desconto em conta salário”, com vencimento para 06 de outubro de 2023; que os documentos de dívida foram distribuídos e protocolados em data de 21/11/2023, sob ns. 0973 e 0974; que no exercício de regular exame de qualificação, o Tabelião não vislumbrou presentes os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, nos termos do item 22, Cap. XV, das NSCGJ; que não se encontravam presentes evidencias inequívocas a demonstrar que os valores levados a protesto correspondem de fato ao quanto fora contratado; que, ao contrário do alegado pela requerente, os atos de protesto não foram definitivamente rejeitados, mas adiados e condicionados à apresentação de prova ineludível de que os valores indicados para protesto significam de fato o valor dos honorários contratados, sequer havendo prova dos vencimentos das dívidas, os quais também devem ser demonstrados; que são inverídicas e inexistentes as acusações de preconceito, misoginia, humilhação e insinuações de parcialidade, as quais refuta com muita veemência; que depois da devolução dos contratos, a reclamante desejou conversar com o Tabelião, sendo na ocasião recebida com cordialidade e educação, mas, infelizmente, a requerente adotou outra postura, foi agressiva, não aceitando e não se conformando com a devolução dos documentos e afirmara aos brados que iria gravar a conversa, com o que o Tabelião concordou de imediato e, neste ponto, o delegatário pede ao Juízo proclamação para que a correspondente mídia seja juntada aos autos pela requerente; pronto, os documentos devolvidos segundo avaliação objetiva de suas condições e não em razão da pessoa da apresentante, a qual, aliás, fora educada e pacientemente atendida pessoalmente pelo Tabelião e pelo preposto Roberto Gomes de Souza (fls. 08/15). Vieram documentos (fls. 16/50).
Novas manifestações vieram aos autos da parte reclamante (fls. 53/54, 65 e 77/78) e do Tabelião (fls. 68/ e 87/88).
Apesar de expressamente instada, em mais de uma ocasião, a requerente deixou de apresentar nos autos a gravação de áudio propalada na reclamação, conforme certidão de decurso de prazo de fls. 93.
O Ministério Público ofertou parecer, opinando pelo arquivamento do feito (fls. 104/105).
É o relatório.
FUNDAMENTO e DECIDO.
Considerando os elementos presentes nos autos, entendo possível julgamento.
No mérito, diante das informações fornecidas e dos documentos que as acompanham, não se verifica falha funcional a ser apurada tampouco providência a ser adotada.
Inicialmente, verifica-se que o contrato de prestação de serviços advocatícios firmado em 21 de janeiro de 2020, e respectivo aditamento, datado de 22 de maio de 2021 (fls. 19/22), foram apresentados a protesto.
No contrato de prestação de serviços advocatícios, consta a indicação de que a advogada foi contratada para atuar em dez tipos de procedimentos judiciais ou extrajudiciais e, quanto ao valor dos honorários advocatícios devidos pela cliente, vinculando o pagamento dos honorários a “50% sobre cada recebimento” decorrente de tais intervenções, bem como o pagamento equivalente a seis meses de pensão a ser percebida pela cliente (fls. 19).
No aditamento do contrato de prestação de serviços advocatícios, por sua vez, consta o acréscimo de outros quatro serviços jurídicos e, quanto ao valor devido a título de honorários, que “o montante do acréscimo deste aditamento corresponde a 5 mensalidades do benefício, que acrescido às 5 mensalidades ainda em aberto, somem 10 meses a pagar (…) sendo metade para a parte e metade para a advogada dos valores recebidos, somente referente ao pagamento da pensão. Os demais serão descontados integralmente, na sua proporcionalidade estabelecida de 50%” (fls. 21).
Consta, ainda, que a requerente apresentou demonstrativos de débito diferentes, o primeiro no valor de R$ 327.039,26, com a ressalvava tratar-se de valor correspondente a 50% de haveres a receber da SPPREV, dos direitos de companheiro falecido, com vencimento para 31 de julho de 2023; e o segundo no valor de R$ 8.000,00, com a ressalva de tratar-se de “valor de benefício a pagar de pensão em aberto para desconto em conta salário”, com vencimento para 06 de outubro de 202 (fls. 23; 40).
Em vista disso, o Tabelião, no exercício de regular exame de qualificação, não positivou a presença dos requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade necessários ao protesto e emitiu nota devolutiva, com indicação das seguintes exigências: “1-
Apresentar comprovação que o valor indicado para protesto corresponde a 50% do valor recebido pela Sra Helena Dellape Jardim Passarini. 2- Apresentar comprovação identificando o vencimento informado.” (fls. 71/72).
De fato, não há certeza, liquidez e exigibilidade nos títulos apresentados, uma vez que, para se aferir eventual valor devido, é necessário analisar um conjunto de documentos, bem como eventos ocorridos.
No entanto, no caso concreto, a avaliação dos fatos extra títulos, a partir do exame dos documentos juntados pela requerente quando do protocolo dos títulos, não permitem concluir que os valores levados a protesto correspondem de fato ao quanto fora contratado.
Vê-se que são muitas as variáveis a serem ponderadas, as quais demandam contraditório e exame de provas, a afastar a exigibilidade imediata dos contratos nos moldes pretendidos.
Não se ignora a possibilidade de contratos bilaterais serem recepcionados como títulos executivos extrajudiciais.
Contudo, há que se observar o disposto no Capítulo XV, das NSCGJ:
16. Na qualificação dos títulos e outros documentos de dívida apresentados a protesto, cumpre ao Tabelião de Protesto de Títulos examiná-los em seus caracteres formais.”
“17. Verificada a existência de vícios formais ou inobservância do estatuído na legislação em vigor ou na normatização administrativa do Conselho Nacional de Justiça ou da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, os títulos e outros documentos de dívida serão devolvidos ao apresentante com anotação da irregularidade, ficando obstado o registro do protesto.” (…)
“20. Podem ser protestados os títulos de crédito, bem como os documentos de dívida qualificados como títulos executivos, judiciais ou extrajudiciais. (…)
“22. Além dos considerados títulos executivos, também são protestáveis outros documentos de dívida dotados de certeza, liquidez e exigibilidade, atributos a serem valorados pelo Tabelião, com particular atenção, no momento da qualificação notarial.”
Portanto, embora, em tese, seja possível protesto de instrumento particular, é dever do Tabelião aferir se estão presentes os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, o que não se positivou, na espécie.
Neste sentido, convergem os precedentes administrativos da E. Corregedoria Geral da Justiça, destacando-se:
“TABELIÃO DE PROTESTO – Recebimento de título para protesto que não constitui título executivo extrajudicial – Sinalagma configurador da avença bilateral com obrigações diversas para ambas as partes – Necessidade, não obstante se tratar de documento assinado por duas testemunhas, e da existência de cláusula na qual as partes reconhecem se tratar de título executivo, de análise cuidadosa para valoração dos atributos de certeza, liquidez e exigibilidade, no momento em que o título é apresentado para protesto, conforme previsto no Capítulo XV, itens 16, 17, 20 e 22 das NSCGJ – Reexame da decisão de absolvição e arquivamento, nos termos do subitem 23.1., do Capítulo XXI, das NSCGJ e do art. 28, XXVII, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça, com condenação do Tabelião de Protesto de Letras e Títulos à pena de multa.” (Processo n. 146.716/2015; Parecer 411/15-E, aprovado em 14.10.15 pelo Des. Hamilton Elliot Akel, então Corregedor Geral da Justiça)
Importante ressaltar que o exame necessário ao protesto restringe-se ao âmbito da análise formal do título. Assim, do mesmo modo que não cabe ao Tabelião o exame intrínseco, também não cabe a ele a definição de exigibilidade mediante análise de fatos e provas, nos termos do artigo 9º, caput e parágrafo único, da Lei n. 9.492/1997 (destaque nosso):
“Art. 9º Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade.
Parágrafo único. Qualquer irregularidade formal observada pelo Tabelião obstará o registro do protesto.”
A recusa, portanto, foi acertada.
No tocante às sérias alegações e insinuações propaladas pela reclamante em desfavor do Tabelião, importante salientar que, no curso do processamento do feito, ela foi expressamente instada pelo Juízo, em mais de uma ocasião, a apresentar nos autos a gravação de áudio aludida na reclamação. Todavia, quedou-se inerte (certidão de fls. 93).
Por outro lado, tais alegações foram veementemente refutadas e negadas pelo Tabelião, que apresentou a gravação com as imagens do atendimento prestado à requerente.
Pelas imagens desta gravação, é possível constatar que a reclamante foi bem atendida pelo Tabelião, de forma muito cortês e educada: o atendimento durou cerca de vinte e três minutos, sendo possível visualizar o Tabelião, calmamente, explicando os detalhes da recusa à usuária.
Em suma, as alegações da reclamante, despidas de qualquer indício de prova, mostram-se totalmente infundadas e destoam completamente do bom histórico funcional do delegatário.
Diante desse painel, à vista das informações fornecidas e dos documentos juntados, não verifico qualquer falha funcional ou irregularidade a ser apurada, tampouco providência a ser adotada.
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a reclamação formulada por Helena Dellape Jardim Passarini.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 27 de maio de 2024.
Renata Pinto Lima Zanetta
Juíza de Direito (DJe de 28.05.2024 – SP).
Fonte: DJE/SP
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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