Número do processo: 1010335-08.2022.8.26.0223
Ano do processo: 2022
Número do parecer: 139
Ano do parecer: 2024
Parecer
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 1010335-08.2022.8.26.0223
(139/2024-E)
Recurso administrativo – Registro de imóveis – negativa de averbação de cancelamento de cláusulas restritivas gravadas em caráter vitalício – Necessidade de suprimento judicial da vontade do instituidor falecido – Parecer pelo não provimento do recurso, com manutenção do óbice.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
Trata-se de recurso de apelação interposto por Silvana Antônio de Souza Couto contra a r. sentença de fls. 43/44, que julgou “improcedente” pedido de providências instaurado pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Guarujá/SP em virtude da negativa de averbação de cancelamento de cláusulas restritivas de incomunicabilidade e impenhorabilidade na matrícula n. 50.105 daquela serventia (fls. 12/15; prenotação n. 447.944 – fl. 11).
A decisão esclareceu que as cláusulas foram instituídas de forma vitalícia pelo falecido doador, de modo que somente se extinguirão com a morte da donatária; que cabe unicamente à parte interessada postular pelo levantamento das cláusulas restritivas em procedimento de jurisdição voluntária, nos termos do art. 1.848, §2º, do Código Civil, no qual poderá demonstrar a necessidade de desconstituí-las para o melhor aproveitamento do bem enquanto estiver viva; que a averbação de cancelamento das cláusulas restritivas somente poderá ocorrer com apoio em decisão judicial neste sentido (fls. 43/44).
A parte recorrente alega, em síntese, que a sentença deixou de observar as principais intenções do doador por ocasião da formalização da escritura, bem como as especificidades da matrícula; que o falecido doador, seu pai, por meio de escritura pública, doou a fração ideal de 50% (cinquenta por cento) do imóvel da matrícula n. 50.105 em seu favor quando já era proprietária da outra metade. O doador optou, ainda, por instituir usufruto vitalício em favor dele (R.9/M.50.105 – fl. 15), bem como estabelecer cláusulas restritivas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, também vitalícias (Av. 10/M. 50.105 – fl. 15); que a intenção do doador era, portanto, proteger a posse, do que se pode concluir que as cláusulas restritivas permaneceriam válidas enquanto estivesse vivo. Em outros termos, a pretensão era de impedir a disposição da nua propriedade durante o usufruto ou de que houvesse comunicação de propriedade pelo casamento e penhora; que a expressão “vitalício” estaria se referindo ao período em que o doador estivesse vivo; que a escritura de doação prevê expressamente o direito à plena propriedade quando do falecimento do doador; que o doador não gravou o bem com cláusula de inalienabilidade, mais restritiva, não sendo plausível manter as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, notadamente porque possui o direito de vendê-lo, conforme jurisprudência do STJ que colaciona; que o Oficial averbou o cancelamento do usufruto, mas não das cláusulas restritivas (fls. 50/65).
Inicialmente distribuído ao C. Conselho Superior da Magistratura (fls. 66 e 76), o Exmo. Corregedor Geral da Justiça à época determinou o processamento da apelação como recurso administrativo, encaminhando os autos a esta Corregedoria Geral da Justiça e determinando a regularização da representação processual da parte recorrente (fls. 77/78), o que foi providenciado às fls. 85/87.
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 102/105).
É o relatório.
Por primeiro, vale observar que, como se pretende cancelamento de cláusulas restritivas que recaem sobre imóvel, o que se dá por meio de averbação, trata-se efetivamente de recurso administrativo (fls. 77/78).
Vale observar, ainda que, embora o pedido de providências tenha sido julgado improcedente, o comando judicial foi pela manutenção do óbice.
No mérito, é caso de não provimento do recurso. Vejamos os motivos.
A matrícula indica que parte ideal do imóvel foi doada para Silvana Antônio de Souza Couto, ora recorrente, por Homero de Oliveira Couto, o qual impôs cláusulas restritivas sobre a nua propriedade: “cláusulas vitalícias de INCOMUNICABILIDADE e de IMPENHORABILIDADE, extensivas aos frutos e rendimentos produzidos” (Av. 10/M. 50.105 – fl. 15).
A recusa ao requerimento decorreu da necessidade de prévia autorização judicial, na medida em que o falecimento do doador apenas possibilita extinção do usufruto (fl.11).
A parte recorrente, por sua vez, sustenta o cabimento de seu pedido por meio da interpretação da vontade do doador (impugnação de fls. 27/37 e razões recursais de fls. 50/65).
O óbice oposto pelo Oficial subsiste na medida em que o cancelamento de cláusulas restritivas que implique investigação da vontade do instituidor compete a órgão com função jurisdicional [1], não podendo se dar nos estritos limites da via administrativa (Proc. CG n.1.109/2005, 20/02/2006, Relator: Des. Álvaro Luiz Valery Mirra; Proc. CG n. 120/84 – Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, 1984/1985, RT, ementa nº 60).
Nossa competência, em outros termos, está restrita à análise de causa automática de extinção do vínculo, tal como na hipótese de usufruto em decorrência da morte de seu instituidor, o que foi observado pelo Oficial no caso concreto (fl. 11).
Diante do exposto, o parecer que respeitosamente submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de que seja negado provimento ao recurso administrativo, com manutenção da r. sentença recorrida.
Sub censura.
São Paulo, 01 de março de 2024.
Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Juíza Assessora da Corregedoria
DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer apresentado pela MM. Juíza Assessora da Corregedoria e por seus fundamentos, ora adotados, nego provimento ao recurso administrativo, com manutenção da r. sentença recorrida. Int. São Paulo, 04 de março de 2024. (a) FRANCISCO LOUREIRO, Corregedor Geral da Justiça. ADV: PABLO CARVALHO MORENO, OAB/SP 162.948.
Fonte: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo | DJE/SP – 06.03.2024
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.