Artigo: Sentença estrangeira de divórcio consensual não mais necessita ser homologada pelo STJ após novo CPC – Por Letícia Franco Maculan Assumpção e Isabela Franco Maculan Assumpção


*Letícia Franco Maculan Assumpção e Isabela Franco Maculan Assumpção

INTRODUÇÃO

O Novo Código de Processo Civil trouxe uma série de inovações no sentido de reduzir a burocracia e agilizar, por meio dos serviços extrajudiciais, demandas que, anteriormente, exigiam a atuação do judiciário.

Assim, o artigo art.  961, § 5º do referido código dispensa a necessidade de homologação de sentença estrangeira nos casos de divórcio consensual, a partir da sua entrada em vigor, inclusive nos processos pendentes. Desse modo, como se explicará a seguir, torna-se mais simples o processo de averbação do divórcio ocorrido no exterior daquelas pessoas que tenham se casado no Brasil ou mesmo em outro país, mas tenham trasladado o casamento para o Brasil.

A INOVAÇÃO TRAZIDA PELO NOVO CPC

Uma das inovações do Novo CPC – Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 foi a dispensa de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ da sentença estrangeira de divórcio consensual.

Foi importante a alteração, posto que, atualmente, está cada vez mais comum que pessoas se casem no Brasil e depois se mudem para o exterior, ou mesmo se casem no exterior, mas trasladem o casamento para o Brasil, por meio de registro no Livro “E” do Cartório do 1º Subdistrito do município de residência no Brasil, e depois venham a se divorciar perante a autoridade estrangeira.

As distâncias se tornam a cada dia menores, o mundo, de repente, ficou pequeno. Assim, deve ser facilitada a regularização do estado civil de tais pessoas, principalmente no que tange ao divórcio consensual, em que não há lide.

Como bem explica Alessandra Helene Fortes Lobo (LOBO, 2016):

No Brasil, para que uma sentença proferida no exterior tenha eficácia, é preciso o pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça mediante procedimento denominado “homologação”, cuja finalidade é o “[…] reconhecimento da eficácia jurídica da sentença estrangeira perante a ordem jurídica brasileira.” (Rechsteiner, 2012, p. 349 ).

Tal exigência está prevista no art. 15 do Decreto-Lei 4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, anteriormente denominada Lei de Introdução ao Código Civil) e no artigo 105, I, “i” da Constituição.

Importante lembrar que, desde a Emenda Constitucional- EC nº 45/04,a competência para a homologação de sentenças estrangeiras é do STJ – Superior Tribunal de Justiça. Anteriormente à referida EC 45, a competência era do Supremo Tribunal Federal – STF.

Ainda conforme Alessandra Helene Fortes Lobo (LOBO, 2016):

Atualmente, estão sujeitas à homologação todos os tipos de sentenças proferidas no exterior (RECHSTEINER, 2012, p. 349). Dessa forma, mesmo as sentenças estrangeiras meramente declaratórias do estado civil das pessoas, caso do divórcio, precisam ser primeiramente submetidas ao procedimento de reconhecimento perante o STJ.

A exigência de que todas as decisões estrangeiras precisam ser homologadas foi introduzida pelo artigo 483 do CPC . Até então, o artigo 15 da LINDB, em seu parágrafo único, excluía a necessidade de homologação das decisões declaratórias, que podiam ser levadas diretamente a registro.

Todavia, essa orientação do parágrafo único do aludido artigo 15 foi modificada pelo STF, que declarou a revogação tácita desse dispositivo legal pelo artigo 483 do CPC (ARAUJO, 2008, p. 464 ). De fato, Nádia de Araujo esclarece que, mesmo com a previsão do parágrafo único do artigo 15 da LINDB, “[…] com a modificação do CPC, a regra se aplica a todas as decisões estrangeiras, em face de seu caráter imperativo.” (ARAUJO, 2008, p. 310-311).

Note-se que com a entrada em vigor da Lei 12.036/09, que alterou a LINDB para adequá-la à Constituição, o citado parágrafo único do artigo 15 foi expressamente revogado.De tal forma, permanece vigente a regra de que todo tipo de decisão estrangeira precisa ser homologado.

Estavam sujeitas à homologação até mesmo decisões estrangeiras referentes a divórcios por mútuo consentimento, o que foi alterado pelo Novo CPC, Lei 13.105/15. Agora a sentença estrangeira que declarar o divórcio consensual não mais precisará mais ser submetida à homologação, conforme previsto  no art.  961, § 5º:

Art. 961.  A decisão estrangeira somente terá eficácia no Brasil após a homologação de sentença estrangeira ou a concessão do exequatur às cartas rogatórias, salvo disposição em sentido contrário de lei ou tratado.

§ 1o É passível de homologação a decisão judicial definitiva, bem como a decisão não judicial que, pela lei brasileira, teria natureza jurisdicional.

§ 2o A decisão estrangeira poderá ser homologada parcialmente.

§ 3o A autoridade judiciária brasileira poderá deferir pedidos de urgência e realizar atos de execução provisória no processo de homologação de decisão estrangeira.

§ 4o Haverá homologação de decisão estrangeira para fins de execução fiscal quando prevista em tratado ou em promessa de reciprocidade apresentada à autoridade brasileira.

§ 5o A sentença estrangeira de divórcio consensual produz efeitos no Brasil, independentemente de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça.

§ 6o Na hipótese do § 5o, competirá a qualquer juiz examinar a validade da decisão, em caráter principal ou incidental, quando essa questão for suscitada em processo de sua competência. (sem grifos no original)

Assim, está dispensada a homologação pelo STJ da sentença estrangeira de divórcio consensual. Mesmo para os processos já em curso aplica-se a alteração, posto que  o art.  1.046 do novo CPC estipula que suas disposições serão imediatamente aplicadas aos processos pendentes. Assim, as ações de homologação de sentença estrangeira de divórcio consensual que estiverem sob análise do STJ serão extintas em razão da perda superveniente de seu objeto.

Deve ser ressaltado que, para as sentenças estrangeiras de divórcio litigioso ou em que houve revelia de uma das partes, continua sendo obrigatória a homologação pelo STJ.

Por fim, é possível que o divórcio seja feito diretamente nos Consulados Brasileiros, conforme prevê a Lei 12.874/2013. O divórcio nos consulados, como também já ocorre nos Tabelionatos de Notas do Brasil, é feito por meio de escritura pública, mas somente pode ser realizado se houver consenso entre as partes e não houver filhos incapazes ou nascituros.

No caso de divórcio realizado em Consulado Brasileiro também não há homologação no Brasil, posto que o Consulado é território brasileiro. No entanto, se a parte quiser que o divórcio realizado no Consulado Brasileiro tenha validade também no país estrangeiro, na hipótese de o casamento ter sido registrado também naquele país, é preciso verificar a necessidade de homologação conforme a legislação do país respectivo. É o que ocorre, por exemplo, na Espanha .

CONCLUSÃO

Logo, com base em todo o disposto, entende-se que a averbação do divórcio não-litigioso ocorrido no exterior foi simplificada, reduzindo o desgaste dos trâmites até então obrigatórios e tornando o processo mais ágil e menos burocrático.

Assim sendo, em casos de divórcio consensual fora do Brasil, não há mais necessidade de homologação da sentença estrangeira pelo STJ, podendo a questão ser resolvida diretamente com o cartório no qual foi realizado o casamento.

Portanto, é de clara percepção a adequação pelo legislador às dinâmicas do mundo globalizado, que permite não apenas a troca de informações, mas também o trânsito de pessoas, que podem viver em diversos países ao longo da vida e, assim, criar e desfazer vínculos jurídicos em outros lugares que não seu país pátrio.

REFERÊNCIAS:

[1]RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacional privado: teoria e prática. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, mencionado por LOBO, 2016.

[2] Aqui a doutrinadora trata do ANTIGO CPC.

[3] ARAUJO, Nádia de. Direito internacional privado: teoria e prática brasileira. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, mencionada por LOBO, 2016.

[4] Consulado-Geral do Brasil em Madri, 2016.

LOBO, Alessandra Helene Fortes. Disponível em: <ww.conjur.com.br/2015-set-06/alessandra-lobo-nao-homologacao-divorcio-nao-configura-bigamia>. Acesso em: 11 abr. 2016.

CONSULADO-GERAL DO BRASIL EM MADRI. Disponível em: <http://cgmadri.itamaraty.gov.br/pt-br/divorcio_consensual_no_consulado-geral.xml>. Acesso em: 11 abr. 2016.

*Letícia Franco Maculan Assumpção é graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1991), pós-graduada e mestre em Direito Público. Foi Procuradora do Município de Belo Horizonte e Procuradora da Fazenda Nacional. Aprovada em concurso, desde 1º de agosto de 2007 é Oficial do Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito de Barreiro, em Belo Horizonte, MG. É autora de diversos artigos na área de Direito Tributário, Direito Administrativo, Direito Civil, bem como Direito Registral e Notarial, publicados em revistas jurídicas, e do livro Função Notarial e de Registro. É Diretora do CNB/MG, Presidente do Colégio Registral de Minas Gerais, Coordenadora da Pós-Graduação em Direito Notarial e Registral no CEDIN e representante do Brasil na União Internacional do Notariado Latino.

*Isabela Franco Maculan Assumpção é estudante de Direito na Universidade Federal de Minas Gerais e Oficial Substituta no Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito do Barreiro, em Belo Horizonte, MG.

Fonte: Recivil – MG | 14/04/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.




Artigo: ISSQN e Emolumentos, modo de usar – Por Marco Antonio de Oliveira Camargo


ISSQN e emolumentos notariais, uma questão realmentente difícil.

Este artigo, que representa opinião pessoal do tabelião, efetivamente  pouco conhecedor do direito tributário, mas dotado de alguma dose de bom senso. Ele foi redigido com a máxima imparcialidade possível e ora é disponibilizado para reflexão e crítica sobre a correta aplicação de leis e regulamento de temas muito sensíveis aos usuários dos serviços, aos notários, registradores e também para a municipalidades na qual se presta o serviço público delegado. A depender de interpretações diversas, quem haverá de sofrer as consequências, será o bolso do contribuinte / usuário dos cartórios.

Já de início o autor pretende deixar expressa sua opinião: está errado considerar o valor devido para a municipalidade  como se fosse parte integrante dos emolumentos, ou seja, calcular-se um pretenso valor devido a titulo de ISSQN à partir do valor total dos emolumentos devidos ao tabelião ou registrador, mais o valor do próprio imposto municipal e, em somatória, atingir o custo efetivo total do serviço a ser prestado. Esta interpretação resultaria em lei municipal considerar-se competente para alterar o preço de emolumentos definidos por lei de competência estadual. A cobrança de um imposto municipal considerando como se valor devido pelo imposto integrasse sua própria base de cálculo, implicaria necessariamente em alteração de emolumentos fixados por lei estadual.

A incidência da alíquota fixada pelo município para a prestação dos serviços notariais e registrais em sua área de competência territorial, não pode integrar a própria base de cálculo pelo preço final do serviço prestado. Esta situação resultaria, na prática, em que o município estaria arrolando para si poderes para alterar o valor dos emolumentos já devidamente fixados por Lei Estadual.

Ressalve-se que, pela melhor técnica de linguagem, é preciso convir que a denominação emolumentos (conforme expressão do caput do artigo 19 da Lei Estadual Paulista nº11.331/2002)  representa o custo total dos serviços notariais e de registro a ser suportado pelo usuário dos cartórios paulistas, sendo que, deste valor apenas 62,5% são receita dos notários e registradores,  diferentemente desta regra aplicável a todos os demais atos, com relação aos atos privativos do Serviço de Registro Civil  das Pessoas Naturais, o percentual é diferente e importa em 88.3333%.

De toda sorte o Imposto Municipal pela prestação dos serviços notariais e registrais (assim como ocorre com o imposto de renda, de competência federal), tem como base apenas as receitas atribuídas aos notários e registradores ficando, evidentemente, excluída de sua base de cálculo os valores que pertencem ao Estado, Carteira de Previdência das Serventias – IPESP,  compensação dos atos gratuitos praticados pelo registro civil das pessoas naturais, aos Fundos Especiais de Despesa do Tribunal de Justiça e do Ministério Público do Estado de São Paulo (cf. art. 19, inc. I, alíneas “b”, “c”, “d”, “e” e “f” da supra referida lei estadual).

A alteração legislativa, surgida em nosso universo jurídico em dezembro de 2014, com início de vigência efetiva em 13 de março de 2015, consistente no acréscimo de um parágrafo único ao referido artigo 19 da Lei Estadual 11.331/2002, tem dado margem à uma interpretação flagrantemente equivocada por alguns municípios do Estado.

O texto do referido parágrafo  é exatamente este:

“Artigo 19 – (…) Parágrafo único – São considerados emolumentos e compõe o custo total dos serviços notarias e de registro, além das parcelas previstas neste artigo, a parcela dos valores tributários incidentes, instituídos pela lei do município da sede da serventia, por força de Lei Complementar Federal ou Estadual.” (NR)

Evidente que a compreensão deste dispositivo, assim como ocorre com todos os demais dispositivos normativos, depende de uma análise conjunta, diretamente com o que consta no caput do artigo, nos demais dispositivos da lei na qual ele  está inserido; nos instrumentos normativos vigor e, em última análise, com o que está determinado na Constituição Federal.

Um breve comentário sobre o referido dispositivo teria obrigatoriamente de considerar o fato de que, após o início da vigência da regra criada com o parágrafo único daquele artigo 19, efetivamente passou a existir uma diferença entre o que se definia como “emolumentos” e o que passou a representar o “custo total dos serviços” a ser suportado pelos usuários do serviço.

Esta inovação, à primeira vista causa alguma estranheza, na medida em, de fato, ocorreu de um parágrafo inserido em um artigo de lei já existente modificar a inteligência do enunciado em seu caput, o que, em tese, mostra-se como ofensivo à melhor técnica de redação legal.

Mas esta impressão não se sustenta diante do conjunto representado pela Lei Estadual nº 11331 que tem sua inteligência e escopo exatamente na regulação, a nível estadual, dos valores que serão cobrados dos contribuintes (usuários) pela prestação dos serviços notariais e registrais.

A Lei, já em seus primeiros artigos dispõe de forma clara e concisa que os emolumentos, por ela regulamentos,  representam o custo total a ser suportado pelos que se utilizarem dos serviços ou da prática de atos notariais e de registro.

A generalização da denominação “emolumentos” está em outros dispositivos da lei e este parágrafo, acrescentado ao artigo 19, em nada contraria ou modifica a inteligência dela.

Emolumentos, portanto, segundo a inteligência legal, será o custo total dos serviços.

Ele representava e ainda representa o valor total que deve ser cobrado do usuário/contribuinte e que conforme a lei determina, necessariamente deve ser distribuído entre os destinatários indicados naquele artigo nº 19, na forma discriminada nas alíneas constantes dos incisos I e II.

Diante de eventual inexistência de Lei Municipal que viesse a sujeitar os notários e registradores locais ao recolhimento de qualquer valor a título de Imposto Sobre Serviços – ISS, a referida Lei Estadual nº 11331/2002, esgotaria a matéria. O valor cobrado do usuário que seria arrecadado e repassado aos destinatários ali indicados, seria exatamente aquele indicado pela lei.

Entretanto, se existir lei municipal que venha a prever a incidência de valores tributários com base na prestação dos serviços notarias e registrais  (alíquota de ISSQN), tal valor de imposto municipal deverá ser cobrado do usuário e não poderá, pode evidente, incidir sobre as parcelas dos emolumentos que não pertencem ao notário ou registrador.

O imposto sobre serviços jamais poderá ter como base de incidência as parcelas dos emolumentos que são receitas do Estado, em decorrência do processamento da arrecadação e da respectiva fiscalizada (confira-se a alínea “b” do inciso I do art. 19 da lei em comento).

A mesma regra vale para as outras parcelas (dos emolumentos) que tem como destinatários  a Carteira de Previdência, a compensação dos atos gratuitos do registro civil, o Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça e do Ministério Público.

Nos municípios onde exista a incidência de ISS sobre os emolumentos devidos pela pratica de atos notariais e de registro, ela somente poderá atingir o percentual dos emolumentos que efetivamente  representem a receita dos notários e registradores.

Ora, se de todo e qualquer valor cobrado dos contribuintes dos emolumentos tem sua destinação perfeitamente delimitada pela lei que regula tal cobrança, a definição da base do cálculo do ISS municipal é muito simplificada.

Não existe verdadeiramente qualquer necessidade de se emitir Nota Fiscal de Serviço e mostra-se totalmente desnecessária qualquer discussão acerca dos valores que serão devidos aos cofres municipais a título de ISS. Bastaria ao município solicitar à Fazenda Estadual  ou ao Tribunal de Justiça do Estado as informações sobre o valor efetivamente arrecadado pelos notários e registradores e, com a realização de simples operação matemática, ter conhecimento do valor total da receita a ser tributada pela prestação do serviço.

Mas esta situação é uma utopia, algo muito distante da realidade – a vida do contribuinte, historicamente, nunca foi fácil – o fato é que a municipalidade se sente no direito de exigir a expedição de Nota Fiscal de Serviço e, não raro questiona a base da arrecadação do tributo.

Atualmente discute-se sobre a base de incidência do ISSQN devido à municipalidade de Campinas. Alega-se que representante da Fazenda Municipal, em uma interpretação totalmente equivocada, concebeu como se os valores destinados ao próprio município viessem a fazer parte da fração dos emolumentos tributáveis pelo ISS.

O argumento  apresentado fundamenta-se na regra geral constante da Lei Municipal que dispõe: O montante do imposto integra sua própria base de cálculo, constituindo-se eventuais destaques mera indicação para fins de controle (art. 26 da Lei Municipal de Campinas nº 12.392/2005)

Mas é absurda esta tese defendida. Muito diferentemente do preço do serviço a receita dos notários e registradores é parte integrante de um valor fixado em Lei Estadual e tem o seu nome próprio (emolumento) e características singulares.

Ressalve-se que as recentes alterações sofridas no artigo 19 da Lei dos Emolumentos, que resultaram em novo arranjo na distribuição dos emolumentos, em nada modifica a parcela do total que representa a receita dos notários e registradores

A Lei Estadual nº 15.855 de 02 julho de 2015, limitou-se a diminuir o percentual dos emolumentos que seriam destinados à Carteira de Previdência das Serventias Não Oficializadas da Justiça do Estado, aumentar o  percentual destinado ao Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça e criar um novo destinatário de uma fração dos emolumentos, destinatário este que é Fundo Especial de Despesa do Ministério  Público do Estado de São Paulo.

A somatória entretanto resultou em  equilíbrio. As alteração não resultaram em redução no percentual que tradicionalmente corresponde à receita dos notários e registradores (62,5% do total do emolumentos)  e, por consequência não existiu nenhuma alteração no percentual a ser tributado pelo ISS municipal.

A nova lei retirou valores que seriam destinados à Carteira de Previdência das Serventias (que não seriam tributados pelo ISS) e destinou a outros parceiros na distribuição do valor dos emolumentos, valor este que igualmente não poderão ser objeto de tributação por ISS.

A LEGISLAÇÃO MUNICIPAL DE CAMPINAS

Em Campinas a cobrança de ISSQN pela prestação dos serviços notarias e de registro está prevista na Lei Municipal nº 12.392 DE 20 DE OUTUBRO DE 2005.

(acesso possível ao texto integral em: https://bibliotecajuridica.campinas.sp.gov.br/index/visualizaratualizada/id/85556)

Do texto legal  constam os seguintes dispositivos:

CAPÍTULO VI – DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL / Seção I – Da Base de Cálculo

Art. 22.  A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.
…..

§ 7º A base de cálculo dos serviços de registros públicos, cartorários e notariaisprevistos no subitem 21.01 da lista anexa, inclusive para os créditos ainda não definitivamente constituídos, compreende: (acrescido pela Lei nº 14.562, de 28/12/2012)

I – a receita dos notários e registradores, integrante dos emolumentos, conforme disposição da Lei Estadual n. 11.331/02, que trata dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, ou de outra lei que venha a substituí-la;(acrescido pela Lei nº 14.562, de 28/12/2012)

II – os valores recebidos pela compensação de atos gratuitos ou pela complementação de receita mínima da serventia, no mês do seu recebimento, conforme disposição da Lei Estadual n. 11.331/02 ou de outra lei que venha a substituí-la.(acrescido pela Lei nº 14.562, de 28/12/2012) 

……

Art. 26 O montante do imposto integra sua própria base de cálculo, constituindo-se eventuais destaques mera indicação para fins de controle.  (grifei)

No município de Campinas é o  Decreto municipal nº 15.356 de 26 de dezembro 2005, que regulamenta o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN. Este regulamento, com a nova redação que lhe foi dada pelo Decreto nº 18.546/2014, cujo inteiro teor igualmente pode ser obtido no referido site da Prefeitura Municipal, acima referido, assim dispõe:

CAPÍTULO VI – DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL /  Seção I – Da Base de Cálculo 

Art. 22.  A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.…..

§ 7º A base de cálculo dos serviços de registros públicos, cartorários e notariais previstos no subitem 21.01 da lista anexa, inclusive para os créditos ainda não definitivamente constituídos, compreende: (acrescido pelo Decreto nº 18.516, de 17/10/2014)

Ia receita dos notários e registradores, integrante dos emolumentos, conforme disposição da Lei Estadual nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002, que trata dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, ou de outra lei que venha a substituí-la;

II – os valores recebidos pela compensação de atos gratuitos ou pela complementação de receita mínima da serventia, no mês do seu recebimento, conforme disposição da Lei Estadual nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002 ou de outra lei que venha a substituí-la.  (sem grifo no original)

Interpretar este dispositivo da forma como defende a fiscalização municipal, que considera como se o valor devido a título de ISSQN integrasse a própria base de cálculo dos emolumentos, ou seja, que a alíquota de 5% imposto deveria incidir sobre o valor dos emolumentos e também do próprio ISSQN, é uma interpretação pouco inteligente (para não dizer absurda) do disposto na lei estadual que regulamenta tal espécie de cobrança.

Sendo repetitivo: Emolumentos, conforme disposto na Lei Estadual  nº11.331/2002, representa o custo total, o preço final que os usuários dos serviços notariais e de registro deverão suportar pela prestação do serviço público delegado a particular.

O artigo 19 do dispositivo define claramente a distribuição final deste preço cobrado do cidadão. O parágrafo único deste artigo, inteligentemente prevendo a possibilidade de existir lei municipal que venha a tributar este serviço publico delegado,   torna expresso o comando de que não deve ser descontado do percentual total devido ao titular da delegação pública o valor eventualmente devido à municipalidade.

Vale dizer: a lei estadual paulista, com uma visão pedagógica acerca de responsabilidade tributária do contribuinte, deixa claro ao usuário, que o eventual aumento do custo do serviço público delegado em determinados municípios decorre da aplicação de um imposto de competência municipal.

Em alguns municípios, portanto, os serviços notariais e de registro custarão mais caro do que em outros e a diferença eventualmente existente representa unicamente o acréscimo de um valor que será repassado ao município, a título de ISSQN.

É justo e coerente que os usuários tenham ciência deste fato.

Igualmente justo que o percentual dos emolumentos que são destinados aos notários e registradores sejam preservados em sua integralidade, mesmo quando o poder público municipal venha a decidir por tributar o serviço público delegado pelo imposto de prestação de serviços.

Não é supérfluo ressalvar que na ordem constitucional vigente, que preza a livre iniciativa, diferentemente de quaisquer outras formas de prestação de serviço, o  Serviço Público Delegado (cartório) não possui a mesma liberdade facultada aos demais prestadores de serviço. Não é possível ao titular da delegação mudar-se para outro município e assim mitigar os efeitos econômicos de eventual excesso fiscal / arrecadatório  do município onde está instalado.

A situação peculiar do município de Campinas e de qualquer outro que eventualmente pretenda defender que a tributação do ISSQN integre o preço total do serviço (em uma forma de cobrançã de tributo conhecida popularmente como  “cobrança por dentro”) dever ser entendida em conformidade com a inteligência do disposto da lei estadual que regula a cobrança e o pagamento de emolumentos devidos pelo serviço notarial e registral no Estado de São Paulo.

Conforme já referido acima, o cálculo correto para o município que tributa o serviço pela alíquota de 5%, deverá se feito desta forma: o preço base está definido na tabela anexa à lei, deste total, 62,5%  são receitas dos notários e registradores, apenas sobre esta parte dos emolumento incidirá a alíquota definida pelo município como valor devido a título do ISSQN.

Em Campinas, a alíquota vigente, de  5% do valor da receita dos notários ou registradores, efetivamente deverá ser equivalente a um percentual total equivalente a 3,125% do preço fixado nas tabelas integrantes da referida Lei Estadual (serão 5% de  62,5%).

Apurado o valor devido a titulo de ISSQN, tal valor deverá ser somado ao total expresso naquela tabela estadual e devidamente cobrado do usuário e repassado ao município.

Na cidade de Campinas, portanto, serão cobrados dos usuários do serviço público de notas e de registro, além do custo total fixado na Lei Estadual acima referida, um acréscimo de 3,125%  que deverá ser repassado ao poder público municipal a título ISSQN.

Em arremate, é interessante mencionar que a cobrança dos emolumentos tem  seu fundamento no parágrafo 2º do artigo 236 da Constituição Federal. Que, em atendimento ao citado dispositivo constitucional, foi editada em 29 de dezembro de 2000 a Lei 10.169, seu regulamento, que definiu as regras gerais para os Estados e o Distrito Federal  fixarem o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados  pelos respectivos serviços notarias e de registro. Nesta Lei Federal, em seu artigo 3º, inciso III, consta a expressa vedação de cobrança de quaisquer outras quantias não expressamente previstas na tabelas de emolumentos.

O valor devido ao município a título de ISSQN, bem ou mal, foi considerado como constitucional e tal discussão não tem mais lugar em nosso ordenamento jurídico, entretanto, da constitucionalidade da cobrança municipal de imposto pela prestação do serviço público delegado aos notários e registradores, não se infere legitimidade para que o município venha a modificar, o valor do custo final da prestação do serviço ao arrepio dos valores fixados pela Lei Estadual competente.

Não se pode negar que existe forte corrente de doutrinadores, com especialização na área de tributos, que ao defender incondicionalmente a possibilidade do valor ISS integrar a sua própria base de cálculo,  não consegue compreender o absurdo da aplicação desta regra para o caso específico dos emolumentos cobrados no Estado de São Paulo e nos demais estados do país onde o valor dos emolumentos está definido por Lei de competência estadual e que legitimamente, não pode ser alterada por legislação municipal.

Considere-se o raciocínio tão simples, evidente e, em sua inteligência, já mencionado acima:

O valor dos emolumentos está fixado em Lei Estadual que, entretanto, prevê a possibilidade de que tal valor, mantida integralmente as parcelas destinadas ao Estado e a terceiros,  possa ser acrescido de valores devido ao município a título de ISS.

Na medida em que o serviço prestado pelas delegações já tem seu valor fixado em lei e este valor, inalterável ao arbítrio de quaisquer interessados (leia-se Oficial ou Tabelião, Tribunal de Justiça, Ministério Público, Fazenda Municipal e outros mais),  deverá se sujeitar a uma alíquota definida por lei municipal e que a aplicação desta exação não deve representar diminuição da receita de nenhuma das parcelas daquele valor, mostra-se impossível a aplicação pura e simples daquele princípio tributário conhecido pela denominação “imposto por dentro”.

Ora, se a base de cálculo já está definida por lei estadual, como poderia uma lei municipal, sem alterar a própria base de cálculo,  considerar que o imposto a ela devido deve ser somado ao valor total  e integrar a própria base de cálculo sem, ao final, resultar em alteração dela.

É impossível esta operação matemática.

Tal impossibilidade somente poderia ser solucionada com alguma dose de criatividade, como por exemplo se considerando como se os emolumento totais fossem equivalente ao valor fixado na lei estadual acrescido do percentual de 5,25%. Do resultado alcançado seria então realizada a operação final que resultaria em um imposto sobre serviços equivalente a 5% do valor cobrado pela prestação do serviço.

Com tal operação matemática o resultado final seria exatamente o pretendido por quem defende a possibilidade do imposto  sobre a prestação de serviços ser cobrado por dentrosem, ao final, resultar em alteração do valor que seria inicialmente objeto da tributação.

No entender deste autor tal criatividade não seria correta pois estaria onerando o usuário final do serviço com um preço final  total acima do que deveria ser aplicado à prestação dos serviços notariais e registrais no Estado de São Paulo.

Para a situação específica dos cartórios paulistas a solução justa é correta passa por uma simples interpretação tributária (quiçá um Decreto Municipal) que venha a considerar que,no caso específico dos emolumentos, cujo valor está regularmente fixado por lei de competência estadual, a alíquota de incidência do ISS não integra a própria base de cálculo, pois o preço total do serviço já está definido em lei e, por uma impossibilidade jurídica e matemática, sem a criação de um conflito de normas,  não seria possível que a alíquota  fixada pela Lei Municipal venha a ser aplicada como se integrante da própria base de calculo.

Fonte: Notariado | 08/04/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.