Testamento vital e seu perfil normativo (parte 1) – Por Otavio Luiz Rodrigues Junior

A ampliação dos limites de expectativa de vida na sociedade ocidental implicou variegadas consequências antropológicas, sociológicas, religiosas, jurídicas e morais. Conceber a indissolubidade do vínculo matrimonial para pessoas com expectativa de vida de 40 anos, como se dava no início do século XX, é algo bem diverso quando a existência humana pode-se prolongar até aos 80 anos. A relação com a morte também foi dramaticamente alterada. Parte integrante do cotidiano, com sucessivas ocorrências na família, na vizinhança ou no bairro, o sepultamento dos mortos era uma cerimônia plena de elementos litúrgicos, simbólicos ou formais, que, com sua refinada elaboração, se projetava até aos aspectos arquitetônicos. A morada dos mortos seguia a lógica da habitação dos vivos.

O prolongamento da vida não se deu apenas em face da melhoria das condições sanitárias, alimentares e educacionais. A vida também se prolonga por eficientes e caríssimos tratamentos médico-hospitalares. E é nesse ponto que se radica o estudo do chamado “testamento vital”, também conhecido por expressões como testamento biológico, instruções prévias ou diretivas antecipadas de vontade,[1] a respeito do qual já se encontra alguma literatura jurídica.[2] O advogado Ernesto Lippmann, especialista na matéria e que tem proferido diversas palestras a esse respeito para um público não jurídico, de modo objetivo, explica que o “testamento vital”, diferentemente do “testamento civil”, “visa ser eficaz em vida, indicando como você deseja ser tratado — do ponto de vista médico — se estiver em uma situação de doença grave e inconsciente”, na medida em que se constitui em uma “declaração escrita da vontade de um paciente quanto aos tratamentos aos quais ele não deseja ser submetido caso esteja impossibilitado de se manifestar”.[3]

Em termos doutrinários, o “testamento vital” é uma expressão bastante equívoca, a despeito de sua inegável popularização. Trata-se de uma declaração de vontade emitida por uma pessoa natural, em pleno gozo de suas capacidades, cujo conteúdo é uma autorização ou uma restrição total ou parcial à submissão do declarante a certos procedimentos médico-terapêuticos, na hipótese de não mais ser possível emitir esse comando, em face da perda de autodeterminação, seja por lesões cerebrais, seja por ele se encontrar em estado terminal. Há quem o considere uma espécie de testamento[4] e quem nele reconheça uma “figura que, em realidade, não se insere no campo do Direito das Sucessões, nem pode ser tomada como um verdadeiro testamento, ao menos em sua acepção tradicional”, o que implica localizar seu estudo no campo do Biodireito e não do Direito das Sucessões.[5]

A declaração de vontade, sob o nome vulgar de “testamento vital”, pode ter por objeto disposições sobre: a) a realização ou não de procedimentos médico-terapêuticos; b) a delimitação de quais procedimentos poder-se-iam realizar; c) a pré-exclusão de certos procedimentos; d) o estabelecimento de um lapso para a continuidade dos tratamentos, após o qual, permanecendo o estado vegetativo, se teria a recusa prévia a sua continuidade.

Não se discutirá, ao menos por agora, a relação entre o testamento vital e os limites ao exercício pleno da autodeterminação sobre tratamentos ou procedimentos médicos futuros. Essas questões ficarão para outro momento. Por agora, veja-se qual o marco infralegal existente sobre o tema, o que nos remete, de modo específico, ao texto da Resolução 1.995/2012, do Conselho Federal de Medicina, publicada na Primeira Seção do Diário Oficial da União, de 31 de agosto de 2012, que “dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes”.

A resolução, em seu artigo1o, define que o objeto das “diretivas antecipadas de vontade” (DAVs) corresponde ao “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade”. A resolução exonera o médico do dever de cumprir o conteúdo das DAVs quando estas se revelarem desconformes ao Código de Ética Médica (parágrafo 2o do artigo 2o). No entanto, as DAVs “prevalecerão sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares” (parágrafo 3o do artigo 2o).

É possível que essas DAVs sejam comunicadas diretamente ao médico pelo paciente, o que, a despeito da Resolução do CFM não o afirmar de modo expresso, pressupõe a hipótese de: a) revogação de DAVs anteriormente elaboradas; b) a necessidade de comprovação dessas novas disposições (parágrafo 4o do artigo 2o).

Se as DAV’s (a) não forem conhecidas ou se (b) não houver representante designado pelo paciente para expressá-las ou (c) familiares do paciente que assim o façam, bem como se (d) não houver consenso entre os familiares, “o médico recorrerá ao Comitê de Bioética da instituição, caso exista, ou, na falta deste, à Comissão de Ética Médica do hospital ou ao Conselho Regional e Federal de Medicina para fundamentar sua decisão sobre conflitos éticos, quando entender esta medida necessária e conveniente” (parágrafo 5o do artigo 2o).

A resolução do Conselho Federal de Medicina antecipou-se a um debate jurídico que talvez merecesse ser realizado no plano legislativo, embora seja compreensível a necessidade de se estabelecer algum balizamento deontológico para uma prática que começa a ser identificada em diversos hospitais brasileiros. Em linhas bem gerais, a resolução atribui ao médico um papel altamente complexo e difícil de interpretar a vontade do paciente e de confrontá-la com os limites de seu código de ética profissional.

A discussão prévia sobre a adequação ao ordenamento jurídico é um tema que será trabalhado em outra coluna, quando examinado o problema à luz do Direito Comparado. No entanto, é importante salientar a diferenciação entre as DAVs e a eutanásia, como muito bem expôs Jorge de Figueiredo Dias,[6] ao categorizar as “ajudas à morte” em três níveis: 1)“a ajuda à morte ativa direta, compreendendo aqueles casos em que, por meio de um comportamento ativo (v.g., a administração de uma injeção letal), se produz a morte ou se apressa, em maior ou menor medida, a ocorrência da morte”; 2) “a ajuda à morte ativa indireta, abrangendo os casos em que não é de excluir, ou é mesmo razoavelmente seguro, que a medicação atenuante das dores ou indutora do estado de inconsciência (v.g., a administração de doses crescentes de morfina) possa ter como consequência não intencionada ou mesmo indesejada o apressar do momento da ocorrência da morte”; 3) “a chamada ajuda à morte passiva, compreendendo os casos em que uma omissão ou uma interrupção do tratamento determina um encurtamento do tempo de vida por forma tal que este deve considerar-se objetivamente imputável àquela, v.g., a renúncia a uma intervenção cirúrgica ou a um tratamento intensivo que teriam a virtualidade de prolongar a vida do paciente”.

Segundo o autor, catedrático jubilado da Universidade de Coimbra, a terceira hipótese, a ajuda à morte passiva, é “a de mais difícil e questionável decisão jurídico-penal nos casos de espécie”, na medida em que “é constituída por aqueles casos de renúncia a medidas de prolongamento da vida sempre que o paciente se não encontra em condições de exprimir a sua vontade”. Assim, “estando em causa doentes inconscientes ou em estado análogo, relativamente aos quais o processo da morte se iniciou já (…), o médico tem o direito — e porventura o dever — de interromper medidas absolutamente inúteis do ponto de vista do ‘tratamento’ e de uma salvação humanamente impossível, sem verdadeiramente ter de curar de qual seria a vontade hipotética do paciente se ele a pudesse exprimir”.

No entanto, ainda com base no texto de Jorge de Figueiredo Dias, “mais complexos são os casos em que o enfermo incapaz de exprimir a sua vontade não pode considerar-se um moribundo, antes pode viver ainda meses ou mesmo anos, mas perdeu de forma irrecuperável a consciência (casos de ajuda à morte em sentido amplo). Fala-se a este propósito de ‘estados vegetativos permanentes’, de ‘coma vígil irreversível’, de “síndroma apálico”, quando — se apreendo exatamente a realidade médica correspondente — o córtex cerebral (o pallium) entrou definitivamente em colapso, conservando-se apesar de tudo a função do tronco cerebral. Que, em casos desta natureza, se não pode defender sem mais a cessação do dever e da posição de garante do médico ou da pessoa titulada, parece seguro e comummente aceite. Desenham-se todavia a propósito duas orientações opostas”.

A primeira dessas opiniões é no sentido de que se devem manter os cuidados médicos até aos limites das possibilidades técnicas. A interrupção do tratamento de pessoas não moribundas, “mesmo quando pudesse considerar-se que nesse sentido correria a vontade presumida do paciente, significaria sempre um homicídio a pedido, como tal punível.”

A segunda opinião orienta-se pela admissibilidade da interrupção do tratamento médico, sob o fundamento de que não seria razoável supor que o paciente desejasse continuar a sofrer.

Como forma de se evitar essas discussões, o autor português entende que se deva atribuir “um relevantíssimo e crescente valor os outrora chamados ‘testamentos de paciente’, ‘testamentos de vida’, ‘vitais’ ou ‘biológicos’; hoje preferentemente cognominados ‘diretivas antecipadas de vontade no âmbito da prestação de cuidados de saúde’ e para os quais inclusivamente se recomenda, com larga aceitação, a criação de um registo nacional”. Segundo Jorge de Figueiredo Dias, são inconsistentes as refutações de parte da dogmática ao valor jurídico das DAVs, que as equiparam a expressões do consentimento presumido para fins de atuarem causa de justificação. E tal se dá porque as DAVs, “sobretudo se periodicamente reiteradas”, apresentar-se-iam como “o mais forte indício da vontade presumida do declarante e só podem ser desobedecidas se forem conhecidas razões que definitivamente as contrariem. Nem sequer se pode pensar em argumentar, em rigor, com os “interesses” do paciente porque, como justamente assinala Roxin, ‘o apálico privado para sempre da consciência e das sensações não pode, desde que entrou nesse estado, ter mais quaisquer interesses: estes pressupõem a possibilidade da decisão pessoal’”.

A defesa das DAVs, nos termos do quanto formulado por Jorge de Figueiredo Dias, é possível, mas não se deve esquecer a permanente (re)discussão de seu fundamento jurídico, do que se cuidará mais amiúde em outra coluna, e, ainda, dos problemas relativos à sua formalização. Dito de outro modo, a relevância de uma DAV, que tem por objeto a manutenção do mais valioso de todos os “bens” humanos (à falta de qualificativo melhor), exige que se questione o nível de rigor formal desse documento e a necessidade de sua reiteração dentro de prazos razoáveis. Se para um negócio jurídico como a venda e compra de um automóvel, exige-se considerável formalismo, o que se dizer de uma declaração de vontade que consubstancia um comando de consequências profundas para a vida de quem a emite? Somente por esse aspecto do problema é que se deve realmente pensar em uma normatização de dignidade legislativa para se enfrentar questões tão sérias como a relativa ao vulgarmente chamado “testamento vital”.

Na próxima coluna, o Direito Comparado retoma algumas questões aqui enunciadas.

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[1] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: Direito das sucessões. Atualizado por Carlos Roberto Barbosa Moreira. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. v. 6. p. 184.

[2] Citando-se apenas artigos publicados em periódicos nacionais: DADALTO, Luciana. Reflexos jurídicos da Resolução CFM 1.995/12. Revista bioética, v. 21, n. 1, p. 106, 2013; ALVES, Cristiane Avancini. Diretivas antecipadas de vontade e testamento vital : considerações sobre linguagem e fim de vida. Revista jurídica, Porto Alegre, v. 61, n. 427, p. 89-110, maio 2013; BOMTEMPO, Tiago Vieira. A aplicabilidade do testamento vital no Brasil. Revista Síntese : direito de família, v. 15, n. 77, p. 95-120, abr./maio 2013; CABRAL, Vívian Boechat. O testamento vital e a efetividade da vontade do titular do bem jurídico vida. Revista brasileira de direito das famílias e sucessões, v. 14, n. 28, p. 22-47, jun./jul. 2012; MIRANDA, Verônica Rodrigues de. O testamento vital. Revista Síntese : direito de família, v. 14, n. 74, p. 53-71, out./nov. 2012.

[3] LIPPMANN, Ernesto. Testamento vital : o direito à dignidade. São Paulo: Matrix, 2013. p. 17.

[4] “O testamento, considerado um negócio jurídico personalíssimo e ato de última vontade de uma pessoa, é instituto não restrito a valores ou bens patrimoniais, mas extensivo a situações existenciais. E justamente na eventualidade de inexistência do exercício da manifestação da vontade é que se revela eficaz o ato que decidiu sobre esse momento, o qual se conhece como testamento vital, ou living will, servindo, sobretudo, para oficializar a escolha do médico que apressou os últimos momentos de existência unicamente vegetativa” (RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p .219).

[5] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit. p. 183.

[6] DIAS, Jorge de Figueiredo. A "ajuda médica à morte": uma consideração jurídico-penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais. v. 100, p. 15, jan. 2013.

Autor: Otavio Luiz Rodrigues Junior é advogado da União, professor doutor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Direito Civil (USP), com estágios pós-doutorais na Universidade de Lisboa e no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo).

Fonte: CNB | 16/08/2013.

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Testamento Vital

Por Miguel Reale Júnior

Em recente semi­nário na Faculda­de de Direito de Lisboa se abor­dou o tema do es­tranhamente de­nominado "testamento vital", relativo às disposições anteci­padas de vontade pelas quais se veda a sujeição a tratamentos obstinados ou inúteis quando em estado de saúde terminal. O conhecido jurista português José Oliveira Ascensão iniciou sua palestra lembrando como é difícil nos colocarmos diante das consequências de eventual derrame cerebral ou desastre automobilístico que nos deixe em estado vegetativo.

Com efeito, mais facilmente estabelecemos disposições testamentárias patrimoniais, que­rendo abraçar a vida depois da morte, para comandar o desti­no e a fruição de nossos bens, estendendo nosso poder de de­cisão para após a entrada no rei­no dos mortos. Mais difícil, po­rém, é enfrentarmos a possível realidade de desgraça em vida que nos leve a um estado de in­consciência. Para Sartre, a vida seria uma desconversa diante da morte inexorável. Viver a pensar a morte levaria a abdicar do gosto pela vida, razão por que fazemos de conta que não ocorrerá. Mas, mais do que a morte, afastamos com maior vi­gor de nossa mente a probabili­dade da desgraça de doença ter­minal que nos prostrará incons­cientes. Imaginar essa hipóte­se, todavia, passa a ser preciso, pois a arte médica consegue prolongar artificialmente a vi­da sem consciência, impondo-se a necessidade de antecipar­mos decisões para fazer prevale­cer nossa vontade quando inca­pacitados para expressá-la, no­meadamente no sentido de não querer uma vida vegetativa.

Como já mencionei em arti­go anterior, surgiu em abril de 2010 o novo Código de Ética Médica, que no artigo 41, parágrafo único, diz: "Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuida­dos paliativos disponíveis sem em­preender ações diagnosticas ou te­rapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal", deixan­do de adotar medidas terapêuti­cas inúteis, especialmente se contrariam a vontade e a auto­nomia do doente.

A questão agora é relativa às disposições antecipadas de tra­tamento, visando a suprir precavidamente a hipótese de o declarante se tornar incapacita­do, cabendo saber quais as con­dições para reconhecimento da validade e eficácia de tais ma­nifestações de vontade.

Em Portugal foi editada no ano passado a Lei n.° 25, regu­lando detalhadamente a maté­ria, enquanto no Brasil apenas veio a lume em 2012 a Resolu­ção n.° 1.995 do Conselho Fede­ral de Medicina (CFM). Pela re­solução, em face da relevância da autonomia do paciente no contexto da relação médico-paciente, reconhece-se válido o conjunto de desejos, prévia e ex­pressamente manifestados pe­lo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que es­tiver incapacitado de se expres­sar, livre e autonomamente.

Avancini, Fernandes e Goldim, em artigo na Revista do Hos­pital de Clínicas de Porto Alegre (2012, n.° 32, págs, 358-362), bem destacam que a prevalên­cia da vontade do paciente não significa uma destituição da au­toridade do médico, mas sim "O reconhecimento de compartilha­mento, de corresponsabilidade no mútuo reconhecimento de uma co-presença ética na relação médico-paciente Estatui também a resolução que nas decisões sobre cuida­dos e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de se comunicar o médico levará em consideração as diretivas in­formadas pelo representante designado para tal fim pelo doente. Essas diretivas anteci­padas, diz a resolução, prevale­cerão em face de qualquer ou­tro parecer não médico, inclusi­ve sobre os desejos dos familia­res, devendo ser elas registra­das pelo médico no prontuário. Essa determinação torna o médico o certificador único da vontade expressa, não sendo exigida nenhuma outra forma de comprovação do desejo do paciente, exceto essa anotação no prontuário, que constitui de­licada assunção de responsabi­lidade pelo médico.

A disciplina da resolução quanto ao conteúdo e à forma da diretriz antecipada de vonta­de é limitada e não poderia mes­mo deixar de ser genérica, reco­nhecendo apenas a validade da manifestação feita pelo pacien­te ou por seu procurador ao mé­dico que a certifica no prontuá­rio. A previsão normativa reves­te-se, portanto, de insuficiên­cia e de risco para o médico.

Pode-se tomar, então, como fonte a lei portuguesa, para regu­lar quem é capaz de dar a decla­ração – por exemplo, apenas a pessoa maior de idade, não in­terdita, reconhecidamente ca­paz de dar seu consentimento de forma livre e consciente. Cumpre também definir o obje­to possível de tais declarações, exemplificadamente, a determi­nação de não ser submetido a tratamento de suporte artificial das funções vitais ou a procedi­mento fútil, inútil ou desproporcionado no seu quadro clínico.

Quanto à forma, cabe saber se a declaração há de ser feita por instrumento público, se se­ria suficiente documento parti­cular com testemunhas, se bas­ta a explicitação da vontade por meio de redes sociais ou em e-mails para amigos. E como se resolve a hipótese de confronto entre o disposto pelo paciente e o dito pelo procurador quanto à adoção, por exemplo, da utiliza­ção de medicamento em fase de experimentação? É outra ques­tão a ser disciplinada.

Por fim, cumpre limitar no tempo a eficácia da declaração, pois uma manifestação feita aos 18 anos não poderia prevalecer aos 30, fixando-se prazo de ca­ducidade de cinco anos ou mais.

Para permanecer dono do próprio corpo mesmo incons­ciente, sem riscos de conflitos éticos no exercício da medicina ou perante o Ministério Públi­co, é de todo conveniente que a matéria seja objeto de lei, e não apenas de resolução do CFM, elaborando-se anteprojeto em discussão com médicos, juris­tas e especialistas em bioética.

Fonte: O Estado de S. Paulo. Publicação em 04/05/2013.