Ação ordinária – ITCMD – Reconhecimento do direito à isenção que se impõe, pois o valor da fração ideal transmitida não ultrapassa 5.000 UFESP’s – Inteligência da regra do artigo 6º, I, “a”, da Lei Estadual nº 10.705/00 – Repetição do indébito – Sobre o valor recolhido indevidamente, objeto da restituição, incidirão correção monetária, de acordo com o IPCA-E, conforme se decidiu no julgamento do RE 870.947, ocorrido em 20/9/17, e juros de mora, a partir do trânsito em julgado, de 1% ao mês – Recurso fazendário parcialmente provido.


  
 

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1015402-61.2016.8.26.0320, da Comarca de Limeira, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado JOZIAS FERREIRA BARBOSA (JUSTIÇA GRATUITA).

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores COIMBRA SCHMIDT (Presidente) e MOACIR PERES.

São Paulo, 8 de fevereiro de 2019.

Luiz Sergio Fernandes de Souza

Relator

Assinatura Eletrônica

Apelação nº 1015402-61.2016.8.26.0320

Apelante: Estado de São Paulo

Apelado: Jozias Ferreira Barbosa

Interessado: Secretario da Fazenda dos Estados de São Paulo

Comarca: Limeira

Voto nº 16.872

AÇÃO ORDINÁRIA – ITCMD – Reconhecimento do direito à isenção que se impõe, pois o valor da fração ideal transmitida não ultrapassa 5.000 UFESP’s – Inteligência da regra do artigo 6º, I, “a”, da Lei Estadual nº 10.705/00 – Repetição do indébito – Sobre o valor recolhido indevidamente, objeto da restituição, incidirão correção monetária, de acordo com o IPCA-E, conforme se decidiu no julgamento do RE 870.947, ocorrido em 20/9/17, e juros de mora, a partir do trânsito em julgado, de 1% ao mês – Recurso fazendário parcialmente provido.

Vistos, etc.

Cuida-se de ação ordinária, com pedido de repetição do indébito, movida por Jozias Ferreira Barbosa contra a Fazenda do Estado de São Paulo, na qual o autor busca ver reconhecido o direito à isenção do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD incidente sobre parte ideal do imóvel descrito na inicial, como previsto na regra do artigo 6º, I, a, da Lei Estadual nº 10.705/00. Requer ainda a restituição do valor recolhido indevidamente.

O juízo de primeiro grau julgou a ação procedente, oportunidade em que, reconhecendo o direito do autor à isenção do ITCMD, condenou a requerida a restituir o valor indevidamente recolhido (R$ 4.341,16), a ser corrigido pelo IPCA-E, desde o desembolso, incidindo a Taxa SELIC, a título de juros de mora, a partir da citação. A requerida foi condenada, ainda, ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o valor atualizado da causa, nos termos da norma do artigo 85, §§ 2º e 3º, I, do Código de Processo Civil.

Em apelação, a Fazenda do Estado busca a reforma da r. sentença, na defesa da legalidade da exação, alegando ainda que não ficou comprovado nos autos o preenchimento dos requisitos legais para a isenção ora perseguida. Pede, subsidiariamente, a aplicação da tabela prática deste E. Tribunal, no concernente à correção monetária do valor da condenação, até o trânsito em julgado da r. sentença, incidindo, a partir de então, apenas a Taxa SELIC, que já compreende a atualização e juros de mora.

Vieram contrarrazões.

É o relatório.

Alega o autor que, em decorrência do falecimento da mulher, com quem era casado sob o regime de comunhão universal de bens, recebeu a parte ideal de um imóvel (50%), em agosto de 2010 (fls. 33, 39 e 40). Afirma que, na qualidade de inventariante, deixou de recolher o ITCMD sobre a mencionada fração, uma vez que o valor corresponderia a menos de 5.000 UFESP’s, nos termos da regra do artigo 6º, I, a, da Lei Estadual nº 10.705/00, com a redação que lhe foi dada pela Lei Estadual nº 10.992/01:

Fica isenta do imposto:

I – a transmissão “causa mortis”:

a) de imóvel de residência, urbano ou rural, cujo valor não ultrapassar 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo – UFESPs e os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel;

No caso, à época do fato gerador, o autor já figurava como proprietário de 50% do imóvel, parcela correspondente à meação (fls. 39 e 40). Com o falecimento da consorte (fls. 33), foi-lhe transmitido os 50% restantes, parcela sobre a qual deve incidir o tributo, não se concebendo pudesse o valor total do bem compor a base de cálculo, como quer a Fazenda do Estado. Em outras palavras, a base de cálculo do ITCMD é apenas a fração do imóvel transmitida ao cônjuge supérstite, e não o valor integral do bem, haja vista que, por direito, metade do bem já pertencia ao autor. Assim, ausente transmissão e ausente fato gerador, portanto, a exação, na forma pretendida pela Administração Tributária, não se justifica.

Tal entendimento, aliás, está alinhado ao quanto vem decidindo esta E. 7ª Câmara de Direito Público, como se retira do julgamento de caso análogo:

Apelação. ITCMD. Imóvel urbano. (…) Direito à isenção. Possibilidade. Valor da fração ideal transmitida que não ultrapassa 2.500 UFESP. Único imóvel transmitido. Inteligência art. 6º, I, alínea “b”, da Lei nº 10.705/00. Sentença de procedência mantida. Recurso desprovido (Apelação nº 1003787-93.2017.8.26.0270, Rel Des. Fernão Borba Franco, v.u., j. 24/09/2018).

No caso em exame, é incontroverso que o valor total do bem correspondia, à época do fato gerador, a R$ 50.329,30 (fls. 192). Com o falecimento da esposa, foi transmitido ao autor, Jozias Ferreira Barbosa, 50%, ou seja, R$ 25.164,65, valor este inferior as 5000 UFESP’s previstos na regra do artigo 6º, I, a, da Lei Estadual nº 10.705/00, com a redação que lhe foi dada pela Lei Estadual nº 10.992/01.

E nem se venha argumentar com a norma do artigo 111, II, do Código Tributário Nacional, dizendo que se está procedendo a uma interpretação extensiva. Primeiramente, registre-se que não existe interpretação literal da lei, como demonstra a moderna Teoria Geral do Direito, na base da Filosofia da Linguagem, havendo de se acrescentar que até mesmo para concluir que uma disposição legal é clara, o intérprete há de submetê-la a um exame crítico. Por isto, ultrapassado há muito o brocardo in claris cessat interpretatio (a propósito, é rica a bibliografia, podendo-se citar, dentre outras obras, o livro de Luiz Alberto Warat, Mitos e teorias na interpretação da lei, Porto Alegre, Ed. Síntese, 1979). De mais a mais, toda a questão gira em torno, a rigor, da inexistência mesma do fato gerador no que concerne à parte do imóvel que já cabia ao autor da presente ação, tudo como assinalado parágrafos atrás.

E assim sendo, não interfere a regra do artigo 97, VI, do Código Tributário Nacional, concernente à exigência de lei para hipótese de exclusão do crédito tributário. Ainda que assim não fosse, a previsão legal ver-se-ia atendida com a edição da Lei Estadual nº 10.705/00.

Diga-se, ainda, que a Fazenda do Estado inova ao argumentar, nas razões de apelação, com a ausência de comprovação de que se está diante de único imóvel de propriedade do autor, requisito necessário para a isenção aqui discutida, inovação esta que não se admite, considerados os limites objetivos do recurso.

Demonstrado que a inclusão, na base de cálculo do ITCMD, da parcela do imóvel já pertencente ao autor é indevida, impõe-se a restituição do valor comprovadamente recolhido (fls. 230), nos termos da regra dos artigos 161, §1º, 165, I, e 167, parágrafo único, todos do Código Tributário Nacional.

Nesta esteira, sobre o valor recolhido indevidamente, objeto da restituição, incidirão correção monetária, de acordo com o IPCA-E, conforme se decidiu no julgamento do RE 870.947, ocorrido em 20/9/17, e juros de mora, a partir do trânsito em julgado, de 1% ao mês.

Não se desconhece o julgamento levado a termo no RE 1.495.146/MG, segundo o qual se deve aplicar, a título de correção monetária, o índice utilizado pela Administração Tributária, no caso, a Taxa SELIC. Sucede que aquela Taxa inclui juros de mora, de sorte que, ao adotá-la, estar-se-ia descumprindo a norma do artigo 167, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, que manda aplicar juros somente após o trânsito em julgado. Quanto ao período posterior ao trânsito em julgado, configurado estaria o bis in idem.

Dai porque, atentando-se às considerações gerais que inauguram o referido julgamento, no que concerne aos índices de correção monetária, e tendo em conta que o IPCA-E é capaz de “captar o fenômeno inflacionário” (para reproduzir a expressão textual do respectivo acórdão), tem-se por bem adotar aquele índice no lugar da Taxa SELIC.

Como a sucumbência do particular foi mínima, no concernente à correção monetária e aos juros de mora, cuida-se de manter a distribuição dos ônus dela decorrentes.

Nestes termos, dou parcial provimento ao recurso fazendário.

Para fins de acesso aos Egrégios Tribunais Superiores, ficam expressamente pré-questionados todos os artigos legais e constitucionais mencionados pelos litigantes.

LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA

Relator

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1015402-61.2016.8.26.0320 – Limeira – 7ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Luiz Sergio Fernandes de Souza 

Fonte: INR Publicações – DJe/SP | 12/02/2019.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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