Procedimento Administrativo – Responsabilidade do Tabelião – O Titular da Serventia responde por ato de seus prepostos – Fraude perpetrada por funcionário do Cartório ou do Tabelionato não afasta a responsabilidade do Oficial – Possibilidade de ocorrência de falta funcional que comporta investigação mais aprofundada – Recurso provido, para determinar abertura de procedimento administrativo.

Número do processo: 1112899-56.2016.8.26.0100

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 302

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1112899-56.2016.8.26.0100

Procedimento Administrativo – Responsabilidade do Tabelião – O Titular da Serventia responde por ato de seus prepostos – Fraude perpetrada por funcionário do Cartório ou do Tabelionato não afasta a responsabilidade do Oficial – Possibilidade de ocorrência de falta funcional que comporta investigação mais aprofundada – Recurso provido, para determinar abertura de procedimento administrativo.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso administrativo tirado em face de r. sentença que entendeu por não instaurar procedimento disciplinar em face de Tabelião de Notas, por entender inviável a responsabilização do Sr. Oficial por ato doloso de seus prepostos.

Recorreu o Ministério Público, defendendo a responsabilidade de Titular de Serventia por ato de seus funcionários. Sustentou haver severos indícios de ilícitos administrativos. Requereu a determinação de instauração de procedimento administrativo.

É o relatório.

Preambularmente, cumpre observar que a orientação trilhada por esta Egrégia Corregedoria Geral da Justiça tem sido a da possibilidade de responsabilização do Sr. Oficial, por ato de seus prepostos. Frise-se que não se está a tratar de responsabilidade objetiva do Tabelião. Cuida-se, em verdade, de responsabilidade subjetiva, escorada na omissão do dever de fiscalização dos funcionários contratados.

Consoante os magistérios do Desembargador Luís Paulo Aliende Ribeiro, outrora Assessor desta Egrégia Corregedoria Geral da Justiça:

“A responsabilidade imputada ao Tabelião não é objetiva, derivada da conduta de seus prepostos, mas pessoal, por ausência de fiscalização e omissão quanto à regularidade do serviço prestado.

Ademais, possibilidade de designação de serventuários para a prática de atos notariais de fiscalização, controle e direção do Titular da Delegação, obviamente, não retira o dever de atuação daquele.

Desse modo, é possível a conclusão da pessoalidade do Titular da Delegação Estatal quanto ao exercício da direção e fiscalização dos serviços notariais de natureza pública.” (Regulamentação da Função Pública Notarial e Registral, SP: Saraiva, 2009, p.183)

Não discrepa o pacífico entendimento desta E. CGJ, consoante se extrai do seguinte parecer da lavra dos MM. Juízes Assessores Ana Luiza Villa Nova, Gabriel Pires de Campos Sormani, Swarai Cervone de Oliveira e Gustavo Henrique Bretas Marzagão, avalizado pelo ínclito Corregedor Des. Elliot Akel, em que a responsabilidade do Sr. Oficial por atos de seus funcionários foi explicitamente acolhida:

“Não há como atribuir culpa a tais condutas reiteradas ao longo do tempo, as quais configuram dolo, nem tampouco socorre o Oficial a alegação de desconhecimento da situação e da falta de condições de acompanhar a dinâmica administrativa do cartório, diante dos avanços impostos pelos sistemas dos computadores, com os quais não estava acostumado.

O fato de não ter sido encontrado erro técnico nos atos praticados pelo Oficial não apaga nem compensa as graves faltas praticadas.

Não é demais repetir que o registrador e notário são delegados do Estado, e, nesta condição, atuam como se fossem o próprio Estado a serviço dos particulares, com a finalidade de tutelar e proteger os interesses destes com relevância e reflexos para a sociedade e para o próprio Estado. Estão, pois, sujeitos aos princípios da administração e que são os da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, e devem operar, também, em obediência aos princípios de direito privado.

(…)

Os deveres do administrador público são os de eficiência, de probidade e de prestar contas, e, nos dizeres de Hely Lopes Meirelles, na clássica obra ‘Direito Administrativo Brasileiro’, o dever de eficiência corresponde ao ‘dever de boa administração’, em menção à obra de Carvalho Simas, ‘Manual Elementar de Direito Administrativo’, Rio, 1974, págs.98 e 237, segundo o qual, todo e qualquer serviço prestado, quer pelo delegado, quer pelo preposto, em decorrência da delegação, faz parte do serviço público delegado, pois, ‘A eficiência funcional é, pois, considerada em sentido amplo, abrangendo não só a produtividade do exercente do cargo ou função, como a perfeição do trabalho e a sua adequação técnica aos fins visados pela Administração, para o quê se avaliam os resultados, confrontando-se os desempenhos, e aperfeiçoa-se o pessoal através da seleção e treinamento. Assim, a verificação da eficiência atinge os aspectos quantitativo e qualitativo do serviço, para aquilatar de seu rendimento efetivo, do seu custo operacional, e da sua real utilidade para os administrados e para a Administração. “(p.186, 16ª ed., RT)” (CGJSP – PROCESSO 31.314/2015, j. 27/3/15)

Pertinente, ainda, ilustrado parecer do MM. Juiz Assessor desta E. CGJ Luciano Gonçalves Paes Leme, acolhido pelo então Colendo Corregedor, Des. José Renato Nalini:

À autonomia e independência de que o tabelião goza no exercício de suas atribuições corresponde, necessariamente, a sua responsabilidade exclusiva pelo gerenciamento administrativo da serventia extrajudicial (cf. artigo 21 da Lei n.° 8.935/1994): foi quem recebeu a delegação para exercer a atividade estatal, insuscetível de subdelegação, e, por sua conta e risco, no plano da responsabilidade administrativa inclusive, confiou ao preposto as tratativas negociais com os clientes e a lavratura de atos notariais; por isso, sem importância os vínculos de confiança entre o preposto e o procurador dos adquirentes.

De fato, a organização dos serviços notariais, as funções, poderes atribuídos aos prepostos e as autorizações dadas aos escreventes para realização de atos não podem, de maneira nenhuma, fomentar a desculpabilização; tornar o tabelião imune à responsabilidade administrativo-disciplinar.

Descabe ignorar as peculiaridades dos serviços notariais e registrais: os tabeliães e os registradores, malgrado em caráter privado, desempenham atividade estatal, função pública, prestam serviço público e, na estrutura funcional cartorária, são os únicos que se sujeitam ao poder censório-disciplinar do Estado, do qual livres os prepostos.

Portanto, impõe desencorajar expedientes que inibam, esvaziem o poder censório-disciplinar, que abram um terreno de irresponsabilidade administrativa, que inviabilizem, impeçam mediante transferência de responsabilidade para os prepostos, a atuação saneadora e pedagógica do Estado, importem perda de credibilidade de instituições notariais e de registro.” (CGJSP – PROCESSO 157.625/2013, DJ 10/12/13)

Este, também, o entendimento do E. STJ:

“DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CARTÓRIO. TITULAR. SANÇÃO DISCIPLINAR. ATIVIDADE. PREPOSTO. SUBORDINADO. COBRANÇA. EXCESSIVA. EMOLUMENTOS. FALTA. DEVER. FISCALIZAÇÃO. PAGAMENTO. TRIBUTOS. MULTA. PREJUÍZO. USUÁRIO.

1. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.

2. A inteligência do art. 22 da Lei 8.935/1994 estabelece que o titular da serventia extrajudicial somente responde objetivamente pelos atos de seus prepostos quando forem eles próprios, isto é, quando tiverem tais atos relação com a atividade cartorária.

3. O recorrente não foi sancionado com pena de multa, contudo, pela prática executada por seu subalterno, mas por infringência a seus próprios deveres funcionais – falta de fiscalização do recolhimento de tributos e cobrança indevida ou excessiva de emolumentos – na forma dos arts. 30, incisos V e XI, 31, incisos III e V, e 33, inciso II, todos da Lei 8.935/1994.

4. Confirma ainda a lisura do processo administrativo disciplinar ter havido a oportunização ao processado do direito ao contraditório e ampla defesa.” (RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 38.985 – SP (2012/0180805-3), Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJ 18/2/14)

Assim é que o só fato de a ilicitude atestada na prática notarial em epígrafe ter sido perpetrada por meio de fraude de antigo funcionário da serventia, já demitido, não basta, per si, para obstar a investigação acerca de eventual responsabilidade do Sr. Oficial. Nem se olvide que a demissão do preposto pelo recorrido somente ocorreu onze meses depois das falhas apontadas, e depois de o recorrente haver opinado pela instauração do procedimento administrativo.

Frise-se que não se está afirmando tenha havido falta funcional. Todavia, à vista dos elementos coligidos, não se a pode descartar de plano. Investigação mais aprofundada mostra-se adequada à hipótese.

Com efeito, há sólidos indicativos de que o local de assinatura da procuração tenha sido diverso daquele mencionado no documento, bem como de que ficha-padrão tenha sido retirada da serventia, desacompanhada de preposto, o que, em tese, poderia configurar violação, quando menos, dos itens 5.1, 52.2, 178.1 e 180 do Capítulo XIV das NSCGJ.

Ante o exposto, o parecer que submeto a Vossa Excelência propõe, respeitosamente, que se dê provimento ao recurso, para determinar instauração de procedimento disciplinar, pelo MM. Corregedor Permanente, com vistas à apuração de responsabilidade do Sr. Tabelião pelos fatos retromencionados.

Sub censura.

São Paulo, 10 de agosto de 2017.

Iberê de Castro Dias

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, dou provimento ao recurso administrativo, para determinar instauração de procedimento disciplinar, pelo MM. Corregedor Permanente, com vistas à apuração de responsabilidade do Sr. Tabelião pelos fatos retromencionados. Publique-se. São Paulo, 11 de agosto de 2017 – (a) – MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS – Corregedor Geral da Justiça.

Fonte: INR Publicações

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Instrumento particular de integralização de capital social – Sociedade de advogados – Sociedade simples registrada no Conselho Seccional da OAB, em cuja base territorial está sediada – Regra de exceção trazida pelo art. 64 da Lei nº 8.934/94, que não se aplica ao caso concreto – Necessidade de apresentação de escritura pública, nos termos do art. 108 do Código Civil – Recurso não provido.

Vistos.

Sanseverino Advogados Associados interpôs recurso de apelação contra a r. sentença [1] proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, mantendo a recusa do registro de instrumento particular de alteração de contrato social, por intermédio do qual o sócio, Carlos Alberto Maluf Sanseverino, transfere a propriedade do imóvel de sua propriedade, matriculado sob nº 87.664 perante aquela serventia predial, para integralizar o capital da referida sociedade.

Alega a apelante, em síntese, que não se aplica o disposto no art. 108 do Código Civil ao caso concreto, pois a regra do art. 109 do mesmo Código não incide na hipótese por expressa determinação legal. Sustenta que a constituição e registro da sociedade de advogados tem o mesmo regramento legal aplicável às sociedades simples, ainda que limitadas. Acrescenta que os atos constitutivos e posteriores alterações contratuais das sociedades de advogados, inclusive a integralização de capital por conferência de bens, são registrados na forma dos arts. 45, caput, do Código Civil, e art. 15, § 1º, da Lei 8.906/94, sendo que o art. 167, inciso I, nº 32, da Lei de Registros Públicos não faz distinção entre sociedade simples e empresária. Ainda, diz que o art. 221, inciso II, da referia lei autoriza o registro dos atos constitutivos das sociedades de advogados e posteriores alterações contratuais, nos termos do Código Civil [2].

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso [3].

É o relatório.

Trata-se de pedido de registro de instrumento particular de alteração de contrato social, por meio do qual o sócio buscou transmitir a titularidade do imóvel matriculado sob nº 87.644 junto ao 10º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, para fins de integralização do capital.

Na nota devolutiva expedida [4] em 19.06.2017, o registrador formulou três exigências, que podem ser assim resumidas: 1) imprescindibilidade da lavratura de escritura pública para transmissão de domínio do imóvel, pois a sociedade de advogados é registrada na Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo e não possui estrutura de sociedade empresária; 2) necessidade de apresentação da via original do título; 3) necessidade de apresentação da certidão de casamento atualizada de Carlos Alberto Maluf Sanseverino, cópia autenticada de seus documentos pessoais e declaração de profissão subscrita pelo cônjuge, com firma reconhecida.

Cumpridos os itens “2” e “3” acima, o título foi reapresentado, acompanhado do requerimento de suscitação de dúvida em relação ao item “1”, por entender a interessada que o próprio Estatuto da Advocacia e da OAB impõem à sociedade de advogados a forma de sociedade simples, vedando atividades empresariais. Sustenta que, tal como decidido anteriormente nos autos da Apelação Cível nº 1036892-23.2016.8.26.0100, que estendeu às sociedades simples a exceção trazida pelo art. 64 da Lei nº 8.934/94, também na hipótese da sociedade de advogados é dispensável a lavratura de escritura pública para integralização do capital social mediante a conferência de bens na forma requerida.

Prevê o art. 108 do Código Civil:

“Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.”

Ou seja, para os negócios jurídicos que envolvam direitos reais relativos a imóveis de valor superior a trinta salários mínimos, a escritura pública é essencial, salvo disposição de lei em contrário.

O art. 64 da Lei n.º 8.934/94 é um dos dispositivos que abre exceção à regra da escritura pública, assim prevendo:

“Art. 64. A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social.”

A questão é saber se uma sociedade de advogados pode se beneficiar dessa hipótese de exceção para fins de dispensa da lavratura de escritura pública para transferência de direitos reais sobre imóveis.

Não se desconhece a existência de precedente deste C. Conselho Superior da Magistratura, no sentido de que é possível a obtenção pela sociedade simples, que adota o modelo da sociedade limitada, da transferência da propriedade de imóvel utilizado para a formação ou aumento de capital social mediante a apresentação a registro de certidão expedida pelo Registro Civil das Pessoas Jurídicas [5].

Assim ficou decidido, pois o art. 983 do Código Civil possibilita a constituição de sociedades simples com a adoção da estrutura de um dos tipos de sociedade empresária. Então, a contrario sensu, admitiu-se que fossem aplicadas a essa sociedade simples, que atua como sociedade limitada, as normas relativas ao modelo de sociedade empresária adotado.

Ocorre que, no caso concreto, a hipótese é diversa. Trata-se, em verdade, de sociedade de advogados, que ostenta natureza jurídica de sociedade simples e não exerce atividade empresária.

A propósito, cumpre lembrar que o Código Civil diferencia a sociedade simples da sociedade empresária a partir de seu objeto e das pessoas que as constituem. Assim, para que a sociedade seja empresária, é indispensável o caráter mercantil de sua atividade econômica organizada, bem como o registro da pessoa jurídica perante a Junta Comercial. As sociedades simples, em contrapartida, não exercem atividades consideradas próprias de empresário sujeito a registro e tem por objeto a prestação de serviços de natureza intelectual, científica, literária ou artística.

De seu turno, a Lei 8.906/94, no Capítulo IV, com a redação dada pela Lei nº 13.247/16, assim dispõe:

“Art. 15. Os advogados podem reunir-se em sociedade simples de prestação de serviços de advocacia ou constituir sociedade unipessoal de advocacia, na forma disciplinada nesta Lei e no regulamento geral.

§ 1º A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia adquirem personalidade jurídica com o registro aprovado dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede.

(…)

Art. 16. Não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar.”

Confrontando-se, pois, o disposto no Código Civil de 2002 e o teor do Estatuto da OAB, conclui-se que as sociedades de advogados possuem natureza de sociedade simples, na medida em que lhes é vedado, dentre outros, o exercício de atividades de caráter mercantil, além do registro nas juntas comerciais, requisitos estes que são essenciais para a caracterização de uma sociedade empresária.

É sabido, no mais, que o exame do título pelo registrador é restrito aos aspectos formais e extrínsecos, à luz dos princípios que norteiam os registros públicos, dentre eles, o da legalidade. Consoante lições de Afrânio de Carvalho, o Oficial tem o dever de proceder o exame da legalidade do título e apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e sua formalização instrumental (in “Registro de Imóveis”, editora Forense, 4ª ed.). O exame da legalidade consiste na aceitação para registro somente do título que estiver de acordo com a lei.

Nesse cenário, não há de se falar em aplicação analógica no âmbito administrativo. A regra de exceção contida na parte inicial do art. 108 do Código Civil permite dispensa da forma pública no caso da integralização de patrimônio de sociedade empresarial para transferência da propriedade de bens imóveis, em razão do disposto no art. 64 da Lei n. 8.934/94, cuja dicção é clara ao se referir a “sociedades mercantis” e “juntas comerciais”.

E como toda regra de exceção, deve ser interpretada restritivamente, sendo descabida a interpretação extensiva defendida pela apelante.

Por conseguinte, inviável a transferência de bens imóveis do sócio por instrumento particular arquivado no Conselho Seccional da OAB, em cuja base territorial está sediada a sociedade de advogados, para fins de integralização do capital social, incidindo na espécie a regra geral da forma pública.

Diante do exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Fls. 99/102.

[2] Fls. 108/119.

[3] Fls. 137/139.

[4] Fls. 37/38.

[5] REGISTRO DE IMÓVEIS – Conferência de bens – Bens transferidos por um dos sócios para sociedade simples limitada – Óbice ao registro pela não formalização da transferência dos imóveis por escritura – Sentença de procedência da dúvida – Reforma da decisão – Sociedade simples limitada que é regida pelas normas aplicáveis às sociedades empresárias limitadas (art. 983 do CC) – Certidão de alteração de sociedade simples limitada, passada pelo Registro Civil da Pessoa Jurídica, que constitui documento hábil para a transferência de bens imóveis – Inteligência dos artigos 983 do CC e 64 da Lei n.º 8.934/94 – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida. (TJSP; Apelação 1031098-21.2016.8.26.0100; Relator (a): Pereira Calças; Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 02/02/2017; Data de Registro: 17/02/2017)

Fonte: INR Publicações

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1ª VRP/SP: Registro de Imóveis. Comunhão Parcial de Bens. Imóvel exclusivo de um dos cônjuges.

Processo 1125824-16.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1125824-16.2018.8.26.0100

Processo 1125824-16.2018.8.26.0100 – Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Priscila Heleno Monoz – Vistos. Tendo em vista que o objeto do presente feito é a averbação do divórcio da requerente junto à matrícula nº 195.043, torno sem efeito o primeiro parágrafo da decisão de fls.22/23 e recebo presente procedimento como pedido de providências. Anote-se. Trata-se de pedido de providências formulado por Priscila Heleno Monoz, em face do Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, pleiteando a averbação de seu casamento e posterior divórcio junto à matrícula nº 195.043. O ato registrário foi negado sob o fundamento de que houve a comunicabilidade do imóvel em razão do casamento da requerente com Marcos Roberto Palucci Borges, razão pela qual há a necessidade da apresentação da carta de sentença devidamente formalizada ou escritura de partilha de bens do casal. Insurge-se a requerente do óbice imposto, sob o argumento de que referido imóvel foi adquirido no estado civil de solteira, aos 21.09.2009 (R.04). Pelo mesmo instrumento público, o bem foi dado em alienação fiduciária à Caixa Econômica Federal para garantia do financiamento no valor de R$ 90.251,00, pagável em 300 prestações mensais e sucessivas no importe de R$ 752,09 (R.05). Informa que, após a aquisição do imóvel, em 23.01.2010, contraiu matrimonio com Marcos, sob o regime da comunhão parcial de bens, e em 03.12.2013 separou-se, mediante acordo de divórcio consensual, cujos autos tramitaram perante o MMº Juízo da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional do Jabaquara, ocasião em qua os interessados reconheceram que o patrimônio de cada um era composto por bens próprios adquiridos antes do casamento, logo incabível a exigência formulada pelo registrador. Juntou documentos às fls.10/21. O oficial manifestou-se às fls.30/31, corroborando os argumentos da exigência acima mencionados. Apresentou documentos às fls.32/47. O Ministério Público opinou pela procedência do pedido (fls.51/54). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Pleiteia a requerente a averbação de seu casamento e posterior divórcio na matrícula nº 195.043, ou seja, não há qualquer comunicação envolvendo a transmissão do bem. Neste contexto, a Lei 6.015/73, em seus arts. 212 e 213, I, g, permite a retificação do registro de imóveis sempre que se fizer necessária inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas. De acordo com a certidão de casamento juntada à fl.14, consta a averbação do divórcio da requerente, por sentença proferida pelo MMº Juízo da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional III – Jabaquara, transitada em julgada em 13.01.2014, logo em consonância como principio da segurança juridica que norteia os atos registrários, entendo ser incabível a exigência da apresentação de carta de sentença para a realização da averbação. Analisando a questão por outro angulo, observo que a requerente adquiriu o imóvel em 21.09.2009, no estado civil de solteira (registro nº 04 – fl.12). Na data mencionada, deu imóvel em alienação fiduciária à Caixa Econômica Federal para garantia do financiamento no valor de R$ 90.251,00, pagável em 300 prestações mensais e sucessivas no valor de R$ 752,09, vencendo a primeira em 12.09.2019. A alienação fiduciária de bem imóvel em garantia, nos termos do art. 22 da Lei nº 9.514/97, é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel. Ao devedor é conferida a posse direta sobre a coisa. Daí que uma vez extinta a condição resolutiva, há o retorno dos envolvidos ao “status quo ante”, de maneira retroativa. No presente caso, não há como afirmar que o fato do posterior casamento após a assinatura do instrumento de alienação fiduciária, resulte na comunicação do imóvel ao cônjuge, uma vez que a escritura de compra e venda, bem como a constituição do gravame deuse comente em nome de Priscila na qualidade de solteira. Ademais, não há qualquer prova de ter havido esforço comum para o pagamento das prestações restantes, sendo que tal prova somente é cabível nas vias ordinárias com a presença do contraditório e ampla defesa. Ademais, o próprio cônjuge, na qualidade de principal interessado com a comunicabilidade, concordou que a cônjuge virago continuará na titularidade dos bens próprios, dentre os quais, o imóvel objeto do presente feito (fl.17), indicando a ausência de qualquer conflito de interesses. Ressalto ainda que a obrigação em relação ao pagamento deu-se exclusivamente em nome da requerente, consequentemente, não há possibilidade da comunicação das obrigações adquiridas antes do casamento, nos termos do artigo 1659, I e II do CC: “Art. 1659. Excluem-se da comunhão: I os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os subrogados em seu lugar; II os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em subrogação dos bens particulares” E ainda neste sentido: “DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO – PARTILHA DE IMÓVEL – BEM ADQUIRIDO ANTES DO CASAMENTO POR FINANCIAMENTO BANCÁRIO – PRESTAÇÕES PAGAS NA CONSTÂNCIA DA SOCIEDADE CONJUGAL – DIREITO DE PARTILHA QUANTO AOS VALORES PAGOS – AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO MONETÁRIA NÃO COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. 1) – SE O IMÓVEL ADQUIRIDO ANTES DO CASAMENTO FOI FINANCIADO MEDIANTE O PAGAMENTO DE PRESTAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO QUE SE PROLONGARAM DURANTE A CONSTÂNCIA DO CASAMENTO, TEM A RECORRIDA O DIREITO À METADE DOS VALORES PAGOS NA VIGÊNCIA DA SOCIEDADE CONJUGAL.2) – NÃO TENDO O RECORRENTE COMPROVADO QUE A RECORRIDA NÃO EXERCIA QUALQUER ATIVIDADE REMUNERADA DURANTE O CASAMENTO PARA CONTRIBUIR COM O PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES, NÃO HÁ COMO SE AFASTAR A PRESUNÇÃO DE QUE TAL PAGAMENTO FOI FEITO COM O ESFORÇO COMUM.3) – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO” (Apelação nº 20120910076898 DF 0007508-81.2012.8.07.0009, 5ª Turma Cível, Publicação no DJE: 01/08/2013, pag. 137, julgamento: 29 de julho de 2013, Relator: Luciano Moreira Vasconcellos) “AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. INSURGÊNCIA DA AUTORA. INCONFORMISMO COM A PARTILHA DE BENS. SENTENÇA QUE EXCLUIU DA PARTILHA UM TERRENO URBANO BEM COMO OS VALORES PAGOS PELA RÉ MEDIANTE SUB-ROGAÇÃO DE BENS QUE HAVIA ADQUIRIDO ANTES DA UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE PROVAS NO SENTIDO DE QUE O TERRENO URBANO TERIA SIDO ADQUIRIDO PELA RÉ APÓS A UNIÃO ESTÁVEL. DOCUMENTOS COMPROVANDO QUE A RÉ EFETUOU SAQUE DE SEU FGTS PARA FINANCIAMENTO DOS MATERIAIS A SEREM UTILIZADOS NA CONSTRUÇÃO DO IMÓVEL. INCOMUNICABILIDADE DE BENS POR FORÇA DO ARTIGO 1659, INCISO I DO CÓDIGO CIVIL. AUTORA QUE NÃO COMPROVOU QUE O VALOR REFERENTE A VENDA DO LOTE Nº 179 NÃO FOI UTILIZADO NA CONSTRUÇÃO DO IMÓVEL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO”. “Em obediência ao regime da comunhão parcial de bens, aplicável para o caso de união estável, o bem adquirido exclusivamente por um dos conviventes antes do início da união estável não é objeto de partilha com a dissolução da união, bem como exclui-se da comunhão os valores pagos mediante sub-rogação de bem pertencente exclusivamente a um dos consortes, nos termos do art.1659, I do CC/2002” (Processo nº AC 20120354319 SC 2012.035431-9, 3ª Câmara de Direito Civil Julgado, Apelante: S. E., Advogados: Fernando da Veiga (25087/SC) e outro, Apelada: B. C. da S., Advogados: Luiz Eduardo Cleto Righetto (18453/SC) e outro, Julgamento: 27 de agosto de 2012, Relator: Saul Steil). Logo tem-se que deve ser afastada a exigência do registrador, haja vista que por qualquer angulo que se analise a questão, a propriedade do imóvel permanecerá exclusivamente em nome da requerente. Diante do exposto, julgo procedente o pedido de providências formulado por Priscila Heleno Monoz, em face do Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, e consequentemente determino a averbação do casamento e do divórcio da interessada. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: ALESSANDRA PERIN FARIAS (OAB 284762/SP)

Fonte: DJe/SP | 12/02/2019.

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