Apelação cível – Ação de retificação de assento de registro civil – Sentença de improcedência – Inconformismo do autor – Pretensão de correção de grafia em patronímico de origem japonesa – Presente justo motivo a autorizar a medida pretendida: a par de personalíssimo o direito ao nome, não se pode negar ao autor o direito à retificação pretendida, eis que os registros públicos, em favor ao princípio da veracidade, devem refletir fielmente os dados reais – Comprovada a ausência de prejuízo a terceiros – Havendo patente erro de grafia no patronímico do autor, de seu genitor e de seu avô, não há necessidade de que todos os ascendentes componham o polo ativo da ação de retificação (precedentes) – Recurso provido.


  
 

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1016102-76.2019.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que é apelante PEDRO MASSAHARU TAKATU (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado JUÍZO DA COMARCA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores EDSON LUIZ DE QUEIROZ (Presidente sem voto), GALDINO TOLEDO JÚNIOR E JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO.

São Paulo, 4 de fevereiro de 2020.

PIVA RODRIGUES

Relator

Assinatura Eletrônica

APELAÇÃO Nº 1016102-76.2019.8.26.0564

APELANTE: Pedro Massaharu Takatu

APELADO: Juízo da Comarca

COMARCA: São Bernardo do Campo 1ª Vara Cível

VOTO: 35839

Apelação cível. Ação de retificação de assento de registro civil. Sentença de improcedência. Inconformismo do autor. Pretensão de correção de grafia em patronímico de origem japonesa. Presente justo motivo a autorizar a medida pretendida: a par de personalíssimo o direito ao nome, não se pode negar ao autor o direito à retificação pretendida, eis que os registros públicos, em favor ao princípio da veracidade, devem refletir fielmente os dados reais. Comprovada a ausência de prejuízo a terceiros. Havendo patente erro de grafia no patronímico do autor, de seu genitor e de seu avô, não há necessidade de que todos os ascendentes componham o polo ativo da ação de retificação (precedentes). Recurso provido.

Trata-se de ação de retificação de assento de registro civil ajuizada por Pedro Massaharu Takatu, em que pleiteia a retificação de seu patronímico, a fim de que passe a constar no assento de nascimento “Takatsu”, e não “Takatu”.

A sentença de fls. 50/52, proferida pelo E. Juiz Gustavo Kaedei em 15 de julho de 2019, cujo relatório adoto, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que a retificação somente em seu nome violaria os princípios da uniformidade e da continuidade dos registros públicos, sendo necessário retificar o patronímico no assento do genitor e do progenitor.

Irresignado, apela o autor (fls. 58/70). Pugna pela correção apenas e tão somente de seu nome Pedro Massaharu Takatu, para Pedro Massaharu Takatsu. Alternativamente, protesta pela reforma da sentença, para determinar a retificação dos sobrenomes de seu avô e de seu pai, sem que integrem o polo ativo da ação. Alega que seu sobrenome está grafado de forma errônea, pois, quando da entrada de seu avô em território brasileiro foi suprimida a letra “s” do sobrenome, de forma que a maneira correta da escrita de seu sobrenome seria “Takatsu”. Alega ser inviável a prévia retificação do sobrenome de seu genitor e progenitor, pois a imprescindível obtenção da anuência de todos os herdeiros será diligência de extrema dificuldade para ser cumprida, tendo em vista a distante comunicação entre os mesmos e o apelante e seu genitor. Alega que os princípios da uniformidade e continuidade registrais não devem se sobrepor aos princípios da dignidade da pessoa humana.

Parecer do Ministério Público reiterando sua manifestação anterior (fls. 47/48), em que concorda com o deferimento do pedido autoral (fls. 74).

Recurso distribuído a esta Relatoria em 12.08.2019.

Manifestação da Procuradoria Geral de Justiça opinando pelo não provimento do recurso (fls. 80/84).

É o relatório.

Respeitado o entendimento exarado pelo Ministério Público, nesta instância, o recurso comporta provimento.

Verifica-se que o apelante foi registrado como Pedro Massaharu Takatu, conforme se atesta na Certidão de Nascimento juntada à fl. 22. Alega que a grafia de seu patronímico de origem japonesa esta errada, pois suprimida a letra “s”. Requer, assim, a retificação de seu assento de nascimento, a fim de que e dele passe constar a grafia correta: “Takatsu”.

Como é cediço, a regra da imutabilidade dos apelidos de família, ainda que de grande importância para a manutenção da segurança jurídica, não deve ser encarada de forma absoluta, tanto é assim que os artigos 57 e 58 da própria Lei nº 6.015/73 preveem hipóteses em que se admite a modificação ou alteração do prenome. Confira-se:

Art. 57. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.

Art. 58. Qualquer alteração posterior de nome só por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do Juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa.

Parágrafo único. Poderá também ser averbado, nos mesmos termos o nome abreviado, usado como firma comercial registrada ou em qualquer atividade profissional.

Indicando sua motivação para alteração no assento civil, a parte autora afirma na inicial que: “é fonte de verdadeiro incômodo ao recorrente saber que a grafia do patronímico de seus antecedentes vem sendo escrita de maneira errônea (…) acaso pretenda obter a cidadania japonesa, naquelas terras o apelante será registrado como “Takatsu”. Com efeito, até mesmo a expedição de passaporte seria uma grande problemática para o recorrente.” (fls.62/63)

Decorre de tais argumentos justo motivo a autorizar a medida pretendida, eis que a par de personalíssimo o direito ao nome, não se pode negar ao autor o direito à retificação pretendida, eis que os registros públicos, em favor ao princípio da veracidade, devem refletir fielmente os dados reais.

Embora os nomes do avô e do pai do apelante estejam grafados da mesma forma, bem comprovou o ora apelante tratar-se efetivamente de equívoco cartorário quando da transliteração.

A lastrear suas razões, o ora apelante coligiu aos autos, certidão genealógica oriental traduzida por tradutor juramentado, em que se comprova o erro gráfico constante do patronímico “Takatu” (Fl. 27)

Ressalte-se que o apelante trouxe aos autos certidões de distribuição, certidões negativas de protestos extrajudiciais e de negativação, das quais não se extrai qualquer restrição (fls. 29/41). Não há que se falar, assim, em prejuízo a terceiros.

Ressalte-se que, havendo patente erro de grafia no patronímico do autor, de seu genitor e de seu avô, não há necessidade de que todos os ascendentes componham o polo ativo da ação de retificação.

Neste sentido:

Retificação de registro civil – Certidão de nascimento, casamento e óbito – Necessidade de uniformização da grafia em todos documentos para obtenção de cidadania italiana – Ação Improcedente – Decisão reformada – Recurso provido para este fim

(TJSP; Apelação Com Revisão 9090949-78.2004.8.26.0000; Relator (a): Beretta da Silveira; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Foro de Presidente Prudente – 4ª. Vara Cível; Data do Julgamento: N/A; Data de Registro: 11/08/2005)

“Retificação de assento de nascimento do avô do autor, com o específico propósito de obtenção de cidadania italiana. Retificação do nome do avô, com alteração do sobrenome Destro, e do nome da genitora do avô, de Pazzota Ergia para Emília Pazotto Arzir. Possibilidade. Precedentes. Evidente erro de grafia quanto aos prenomes e sobrenomes do avô do autor e da genitora. Inexistência de óbice legal. Ação procedente. Recurso provido.”

(TJ-SP Apelação nº 0003120-69.2014.8.26.0581, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 14/06/2016, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/06/2016).

REGISTRO CIVIL Ação de retificação – Alteração de sobrenome dos ascendentes Objetivo específico de obtenção de cidadania italiana – Desentranhamento de documento juntado extemporaneamente Prova do erro de grafia em sobrenome de origem italiana Não comprovação de prejuízo a terceiros Ausência de ofensa à segurança jurídica Sentença reformada Recurso provido.

(TJSP; Apelação Cível 0002779-48.2015.8.26.0083; Relator (a): Mônica de Carvalho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Aguaí – Vara Única; Data do Julgamento: 20/01/2014; Data de Registro: 17/09/2019)

DIREITO CIVIL. REGISTRO PÚBLICO. NOME CIVIL. RETIFICAÇÃO DO PATRONÍMICO. ERRO DE GRAFIA. PRETENSÃO DE OBTENÇÃO DE DUPLA CIDADANIA. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DA PRESENÇA EM JUÍZO DE TODOS OS INTEGRANTES DA FAMÍLIA.

1. A regra da inalterabilidade relativa do nome civil preconiza que o nome (prenome e sobrenome), estabelecido por ocasião do nascimento, reveste-se de definitividade, admitindo-se sua modificação, excepcionalmente, nas hipóteses expressamente previstas em lei ou reconhecidas como excepcionais por decisão judicial (art. 57, Lei 6.015/75), exigindo-se, para tanto, justo motivo e ausência de prejuízo a terceiros.

2. No caso em apreço, o justo motivo revela-se presente na necessidade de suprimento de incorreções na grafia do patronímico para a obtenção da cidadania italiana, sendo certo que o direito à dupla cidadania pelo jus sanguinis tem sede constitucional (art. 12, § 4º, II, “a”, da Constituição da República).

3. A ausência de prejuízo a terceiro advém do provimento do pedido dos recorridos – tanto pelo magistrado singular quanto pelo tribunal estadual -, sem que fosse feita menção à existência de qualquer restrição. Reexame vedado pela Súmula 7 do STJ.

4. Desnecessária a inclusão de todos os componentes do tronco familiar no polo ativo da ação, uma vez que, sendo, via de regra, um procedimento de jurisdição voluntária, no qual não há lide nem partes, mas tão somente interessados, incabível falar-se em litisconsórcio necessário, máxime no polo ativo, em que sabidamente o litisconsórcio sempre se dá na forma facultativa.

5. Recurso especial não provido.

(REsp 1138103/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 06/09/2011, DJe 29/09/2011).

Por tais fundamentos, dá-se provimento ao recurso, a colhendo-se o pleito subsidiário para que autorizar a retificação do patronímico “Takatsu” no assentos de registro civil do autor, de seu avô (Ei Takatu) e de seu pai (Vanderson Takashi Takatu).

Por fim, na hipótese de apresentação de embargos de declaração contra o presente acórdão, ficam as partes intimadas a se manifestar, no próprio recurso, a respeito de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do artigo 1º da Resolução nº 549/2011 do Órgão Especial deste Egrégio Tribunal, entendendo-se o silêncio como concordância.

PIVA RODRIGUES

Relator – – /

Fonte: INR Publicações

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