TJ/SP – Escritura pública de compra e venda que abrangeu cinco imóveis – Indicação dos valores venais de cada um dos imóveis e do preço total da venda – Pedido de retificação da escritura pública, por ata retificativa, para constar que o valor da venda de cada um dos imóveis correspondeu ao seu valor venal – Inexistência de erro material que comporte a modificação de elemento da compra e venda, consistente no preço atribuído a cada um dos imóveis, sem a participação dos vendedores – Recurso não provido.

Número do processo: 1005014-46.2018.8.26.0024

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 75

Ano do parecer: 2020

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1005014-46.2018.8.26.0024

(75/2020-E)

Escritura pública de compra e venda que abrangeu cinco imóveis – Indicação dos valores venais de cada um dos imóveis e do preço total da venda – Pedido de retificação da escritura pública, por ata retificativa, para constar que o valor da venda de cada um dos imóveis correspondeu ao seu valor venal – Inexistência de erro material que comporte a modificação de elemento da compra e venda, consistente no preço atribuído a cada um dos imóveis, sem a participação dos vendedores – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto pela Igreja Evangélica Assembleia de Deus contra decisão que manteve a recusa do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Município de Murutinga do Sul, Comarca de Andradina, em lavrar ata retificativa para a alteração da escritura pública de compra e venda dos imóveis que são objeto das matrículas nºs 14.868, 19.379, 12.136, 19.378 e 12.137, todos do Registro de Imóveis de Andradina, em razão da inexistência de erro material, constatável por documento, que autorize a modificação do negócio jurídico sem que os vendedores participem do novo ato notarial.

A recorrente alegou, em suma, que necessita da retificação da escritura pública de compra e venda a fim de possibilitar o seu registro. Asseverou que a compra e venda teve como objeto cinco imóveis cujos valores venais foram indicados na escritura pública. Aduziu que esses valores somam R$ 8.428,82. Esclareceu que o preço total da compra venda dos imóveis foi de R$ 8.430,00 e que não foi especificado na escritura o preço atribuído a cada um dos imóveis porque deveria corresponder ao seu respectivo valor venal. Disse que a diferença entre a soma dos valores venais e o preço da venda dos imóveis, de R$ 1,18, decorreu de mero arredondamento. Contudo, para registro da compra e venda foi exigida a retificação da escritura pública que deverá conter o preço da venda de cada um dos imóveis, o que pode ser feito pelo tabelião de notas mediante ata retificatória, sem a participação dos vendedores (fls. 63/71).

A douta Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso, ressalvando que os vendedores movem ação para anular a compra e venda, conforme constou na r. decisão recorrida (fls. 82/86).

Opino.

Conforme precedentes desta Corregedoria Geral da Justiça, a retificação de atos notariais pela via administrativa, sem a participação de todas as partes do negócio jurídico, somente é possível para a correção de erro material evidente, verificável desde logo. Neste sentido o r. parecer da MM. Juíza Auxiliar da Corregedoria, atual Desembargadora Maria Adelaide de Campos França, no Proc. 98/90, a seguir transcrito:

“A emenda de atos notariais mediante intervenção do Poder Público é admitida, tão somente, quando as circunstâncias indicam ser o erro material evidente, independente de qualquer conjectura e verificável a olho nu. Tal admissão da correção de mero equívoco material pela via administrativa encontra seu fundamento no poder de autoridade da Administração Pública sobre seus próprios atos” (Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo – 1990, Coord. Des. Onei Raphael Pinheiro Oricchio, Ed. RT, págs. 210/211).

Os itens 54 e 54.1 do Capítulo XVI das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, de igual modo, autorizam a retificação da escritura pública por meio de ata de retificação destinada a suprir inexatidões materiais e irregularidades constatáveis por documentos, desde que não acarretem a modificação da vontade das partes ou a substância do negócio jurídico:

“54. Os erros, as inexatidões materiais e as irregularidades, constatáveis documentalmente e desde que não modificada a declaração de vontade das partes nem a substância do negócio jurídico realizado, podem ser corrigidos de ofício ou a requerimento das partes, ou de seus procuradores, mediante ata retificativa lavrada no livro de notas e subscrita apenas pelo tabelião ou por seu substituto legal, a respeito da qual se fará remissão no ato retificado.

54.1. São considerados erros, inexatidões materiais e irregularidades, exclusivamente:

a) omissões e erros cometidos na transposição de dados constantes dos documentos exibidos para lavratura do ato notarial, desde que arquivados na serventia, em papel, microfilme ou documento eletrônico;

b) erros de cálculo matemático;

c) omissões e erros referentes à descrição e à caracterização de bens individuados no ato notarial;

d) omissões e erros relativos aos dados de qualificação pessoal das partes e das demais pessoas que compareceram ao ato notarial, se provados por documentos oficiais”.

Assim porque não é possível ao tabelião, ou ao juiz, em procedimento administrativo, alterar a manifestação de vontade das partes consubstanciada na escritura pública.

Neste caso concreto, a recorrente busca retificar escritura pública de compra e venda, lavrada pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Município de Murutinga do Sul em 20 de março de 2007, nas págs. 005 a 008 do Livro nº 0404, para que conste que o preço atribuído para a compra e venda de cada um dos cinco imóveis correspondeu ao seu respectivo valor venal.

Contudo, a certidão de fls. 16/19 demonstra que as partes da escritura pública atribuíram para a compra e venda dos cinco imóveis o preço total de R$ 8.430,00, sem especificar o valor correspondente à venda de cada um dos bens.

Apesar da pequena divergência entre a soma dos valores venais dos imóveis e o preço total da compra e venda, a retificação pretendida diz respeito a elemento essencial do negócio jurídico, sem que esteja comprovada documentalmente a existência de erro evidente, detectável desde logo.

Ademais, a atribuição de valor individual para a venda de cada um dos imóveis poderá acarretar obrigações correlatas, como as consistentes em retificar declaração de imposto de renda e recolher imposto, razão pela qual não pode ser feita sem a participação dos vendedores.

Por fim, segundo indicado na decisão recorrida, os vendedores movem ação em que pretendem a declaração da nulidade da escritura pública (Processo nº 1003142-59.2019.8.26.0024), o que também impede a modificação da escritura por ata de retificação, a ser lavrada sem a sua participação, para indicar o preço individual para a venda de cada imóvel.

Diante disso, neste caso concreto não estão presentes os requisitos para a alteração da escritura pública de compra e venda mediante ata de retificação, a ser lavrada sem que dela participem os vendedores dos imóveis.

Ante o exposto, o parecer que submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 21 de fevereiro de 2020.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, e por seus fundamentos que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Intimem-se. São Paulo, 21 de fevereiro de 2020. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: SILVIO BARBOSA FERRARI, OAB/SP: 373.138.

Diário da Justiça Eletrônico de 16.03.2020

Decisão reproduzida na página 033 do Classificador II – 2020

Fonte: INR Publicações

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TJ/SC – Pensão à viúva: Coabitação não é requisito para união estável

Para o colegiado, a relação duradoura e estável e a constituição de família, com filhos e netos, foram determinantes para a resolução da demanda.

O TJ/SC, baseado na premissa de que a coabitação não configura requisito essencial para comprovar união estável, manteve a obrigação do Iprev – Instituto de Previdência do Estado em bancar pensão por morte de servidor público em favor de sua companheira.

A decisão partiu da 1ª câmara de Direito Público, em apelação interposta pelo ente previdenciário estadual e relatada pelo desembargador Luiz Fernando Boller. A viúva, doravante, passará a receber a pensão, além de resgatar os valores atrasados desde a data do óbito do segurado.

O Iprev, em seu recurso, alegou que os requisitos legais para conceder a pensão por morte à viúva não estavam preenchidos. Isto porque, na data de morte do segurado, eles não moravam juntos. O relator, contudo, destacou a importância de a Justiça acompanhar as evoluções registradas na sociedade.

“Atenta ao dinamismo social e ao caráter plural das organizações familiares, a jurisprudência das Cortes Superiores e deste Tribunal sedimentou a compreensão de que, embora relevante, a coabitação não é requisito essencial para a constituição de uma entidade familiar, conforme reiterados precedentes.”

Em sua defesa, a viúva e testemunhas afirmaram que o casal viveu junto por mais de 30 anos, com dois filhos frutos desse relacionamento. Eles não coabitavam a mesma residência porque ela passou a estar em outra cidade, ajudando a criar os netos. Por seis meses, a mulher morava com a filha em Nápoles, na Itália, e outros seis meses com o marido, no bairro dos Ratones, norte de Florianópolis.

Para Boller, a relação duradoura e estável e a constituição de família, com filhos e netos, foram determinantes para a resolução da demanda. Por isso, o colegiado entendeu que a coabitação não é requisito indispensável para identificar a união estável ou o estado matrimonial, mesmo que seja pouco usual na prática cotidiana. A decisão foi unânime.

Processo: 0307908-93.2018.8.24.0023

Fonte: Migalhas

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STJ – Espólio de usufrutuária vitalícia tem legitimidade para propor ação de rescisão de arrendamento rural

Durante a vigência do contrato de arrendamento rural, a morte da arrendadora usufrutuária – causa de extinção do usufruto, nos termos do artigo 1.410, inciso I, do Código Civil –, sem que haja a restituição ou reivindicação de posse pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos sucessores da pessoa falecida. Essa condição, porém, não constitui impedimento para o exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento rural pelo espólio em relação ao terceiro arrendatário, pois as relações jurídicas do usufruto e do arrendamento são diferentes e autônomas.

O entendimento foi estabelecido pelo Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que reconheceu a legitimidade do espólio para propor ação de despejo cumulada com cobrança e rescisão contratual, buscando a extinção de contrato de arrendamento rural, a reintegração da posse do imóvel e o pagamento de dívidas em aberto.

O contrato foi celebrado pela falecida arrendadora (que tinha usufruto vitalício do imóvel) e o arrendatário (também falecido) – que, posteriormente subarrendou a propriedade.

Os pedidos foram julgados procedentes em primeira instância; em segundo grau, o TJSP apenas ajustou os critérios da condenação mantendo a legitimidade do espólio para ajuizar a ação.

Dívidas posteriores à morte

Em recurso especial, o recorrente alegou que o espólio não teria legitimidade ativa, pois a posse da autora da herança sobre o imóvel objeto do arrendamento seria oriunda de usufruto, o qual se extinguiu com a sua morte.

Sustentou, também, que o falecimento da usufrutuária ocorreu em 2004 e as alegadas dívidas em aberto do arrendamento rural seriam do período ente 2009 e 2014, quando já havia sido extinto o direito real de usufruto que legitimava a posse da arrendadora.

Usufruto como direito real

O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do recurso, explicou que o usufruto consiste em uma espécie de direito real (artigo 1.225, inciso IV, do Código Civil) que pode recair sobre um ou mais bens, móveis ou imóveis, conferindo, temporariamente, a alguém – denominado usufrutuário –, o direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.

Tratando-se de bem imóvel, o relator apontou que o registro em cartório é pressuposto necessário do direito real de usufruto – tanto no caso de sua constituição quanto na hipótese de sua desconstituição –, a partir do qual passará a produzir os efeitos legais, especialmente em relação a terceiros.

Por outro lado, o ministro Bellizze destacou que, no caso de morte da usufrutuária, surge causa extintiva do usufruto (artigo 1.410, inciso I, do CC/2002), o qual, diante do seu caráter personalíssimo, não se transmite aos herdeiros, de forma que é descabido no ordenamento jurídico brasileiro o caráter sucessivo desse direito real.

Arrendamento não se integra ao usufruto

Entretanto, Bellizze afirmou que, por causa do efeito constitutivo do registro no cartório imobiliário, o falecimento do usufrutuário não opera efeitos automaticamente, de maneira que, mesmo que seja descabida a sucessão do usufruto, as implicações do instituto permanecerão enquanto não for cancelado o registro e retomado o pleno domínio do bem pelo proprietário.

Além disso, o ministro apontou que a cessão do exercício do usufruto ao terceiro arrendatário, mediante contrato de arrendamento, não possui o poder de integrá-lo à relação jurídica do usufruto em si, principalmente pela vedação expressa de alienação desse direito real (artigo 1.393 do CC/2002).

No caso dos autos, o ministro lembrou, ainda, que a averbação do cancelamento do usufruto na matrícula do imóvel foi realizada em 2016, ou seja, após ao período de cobrança levantado pelo espólio e do ajuizamento da ação, em 2015 – situação que mantém o interesse do espólio na ação.

De possuidor direito a indireto

Em seu voto, Bellizze reforçou que, efetivado o usufruto, ocorre o desdobramento da posse, passando o proprietário à condição apenas de possuidor indireto, e o usufrutuário à posição de possuidor direto. Já no caso de cessão do exercício do usufruto a terceiro, mediante contrato de arrendamento, há o desdobramento sucessivo da posse, tornando-se possuidores indiretos o proprietário e o usufrutuário/arrendador, e direto o arrendatário.

“Sobrevindo a morte do usufrutuário (que é causa de extinção desse direito real), a posse, enquanto não devolvida ou reivindicada pelo proprietário, transmite-se aos sucessores daquele, mas com o caráter de injusta, dada a sua precariedade, excepcionando a regra do artigo 1.206 do CC. Com isso, o possuidor não perde tal condição em decorrência da mácula que eventualmente recaia sobre sua posse”, disse o ministro.

Ao manter o acórdão do TJSP, o relator ainda ressaltou a natureza jurídica do espólio como uma universalidade de direito que, nos termos do artigo 91 do Código Civil, é caracterizado como o complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico, motivo pelo qual a relação jurídica de direito pessoal decorrente do contrato de arrendamento integra o espólio da arrendadora / usufrutuária.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 1758946

Fonte: STJ

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