CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD ou sua isenção – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias ou prova do reconhecimento administrativo da isenção – Óbice mantido – Recurso desprovido.


  
 

Apelação Cível nº 1001733-55.2018.8.26.0615

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1001733-55.2018.8.26.0615

Comarca: TANABI

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1001733-55.2018.8.26.0615

Registro: 2021.0000973508

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001733-55.2018.8.26.0615, da Comarca de Tanabi, em que são apelantes NIVAN BATISTA DA SILVA e CASTORINA DE SOUZA SILVA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE TANABI.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 22 de novembro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001733-55.2018.8.26.0615

Apelantes: Nivan Batista da Silva e Castorina de Souza Silva

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Tanabi

VOTO Nº 31.641– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD ou sua isenção – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias ou prova do reconhecimento administrativo da isenção – Óbice mantido – Recurso desprovido.

1. Trata-se de apelação interposta por NIVAN BATISTA DA SILVA e CASTORINA DE SOUZA SILVA em face da r. sentença de fl. 134/136, que manteve a recusa levantada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Tanabi, negando registro de escritura pública de permuta de bens em razão da não apresentação de prova de quitação do ITCMD relativo à diferença de valores entre os imóveis permutados.

Em suas razões, os recorrentes sustentaram, em suma, que a permuta sem exigência de torna, com imóveis de valores díspares, deu-se em razão da conveniência e oportunidade dos permutantes; eventual renúncia deveria ser expressa, não havendo qualquer previsão legal de que ela constitua fato gerador de ITCMD; os valores venais expressam grandezas que foram consideradas para cálculo de ITBI e emolumentos e não se confundem com o ITCMD.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fl. 172/177).

É o relatório.

2. O recurso não merece provimento.

Versa a questão sobre a possibilidade de se efetuar o registro de escritura pública de permuta de bens imóveis com valores diversos e sem torna, sem que haja prova de recolhimento do ITCMD.

Da nota devolutiva de fl. 32 constou o seguinte óbice:

“Considerando que na permuta houve uma significativa renúncia de valores entre os imóveis, no montante de R$ 193.454,31, fato que configura como uma doação, motivo pelo qual se exige o recolhimento do ITCMD, de conformidade com a decisão do processo de DÚVIDA nº 1095880-08.2014.8.26.0100, de 13 de novembro de 2014, da 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo.”

Com efeito, a escritura pública de permuta lavrada em 04 de julho de 2018, no livro nº 162, fl. 388/396, perante o Tabelião de Notas da Comarca de Monte Azul Paulista/SP tem como partes Luiz Rodrigues e Olga Augusta Fávero, titulares dos imóveis matriculados no Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Tanabi, São Paulo, com área total de 134.45.52 hectares: 1) matrícula nº 8.725, com 62.92.00 hectares (com valor atribuído de R$ 90.531,92); 2) matrícula nº 10.790, com 21.78.00 hectares (com valor atribuído de R$ 31.337,97); 3) matrícula nº 13.223, com 18.29.52 hectares (com valor atribuído de R$ 26.316,42) ; 4) matrícula nº 10.986, com 14.52.00 hectares (parte ideal de 83.38% da propriedade rural com valor atribuído de R$ 17.409,99); 5) matrícula nº 8.160, com área de 9.68.00 hectares (com valor atribuído de R$ 13.927,99); 6) matrícula nº 12.170, com 7.26.00 hectares (com valor atribuído de R$ 10.445,99).

De outro lado constam como partes os recorrentes, Castorina de Souza Silva e Nivan Batista da Silva, titulares dos seguintes imóveis todos localizados no Município de Turmalina, Comarca de Estrela D’Oeste/SP, com área total de 84.09.50 hectares: 1) matrícula nº 5.632, com 62.31.50 hectares (com valor atribuído de R$ 308.424,59; 2) matrícula nº 7.420, com 7.26.00 hectares (com valor atribuído de R$ 25.000,00); 3) matrícula nº 7.421, com 7.26.00 hectares (com valor atribuído de R$ 25.000,00); 4) matrícula nº 7.422, com 7.26.00 hectares (com valor atribuído de R$ 25.000,00).

Em referido ato notarial foram atribuídos aos imóveis rurais de propriedade dos primeiros permutantes o valor global de R$ 189.970,28 e aos imóveis de propriedade dos segundos permutantes, situados na Comarca de Estrela D’ Oeste, o valor total de R$ 383.424,59, havendo, assim, diferença de R$ 193.454,31.

Além disso, os seis imóveis rurais de Luiz Rodrigues e Olga Augusta Fávero, que foram permutados com os recorrentes, têm, somados, valores venais de R$ 2.501.143,12 (Declaração do Imposto Territorial Rural ITR), e valor venal total, atribuído pela Prefeitura de Tanabi, para fins de ITBI, de R$ 1.200.742,26 (fl. 70).

Já os quatro imóveis rurais dos apelantes, Nivan Batista e Castorina Silva, que foram permutados com Luiz Rodrigues e Olga Augusta Fávero, têm, somados, valores venais de R$ 1.170.538,90 (Declaração do Imposto Territorial Rural ITR), e valor venal total, atribuído pela Prefeitura de Turmalina, para fins de ITBI, de R$ 1.345.520,00 (fl. 71).

Assim, sob qualquer prisma que se analise, certo é que há diferença de valores entre os bens permutados, considerando-se o valor excedente como doação. Daí a pertinência da exigência para recolhimento do ITCMD ou a comprovação do reconhecimento de sua isenção pela autoridade tributária.

Não se ignora que, se tratando de ITCMD, este C. Conselho Superior da Magistratura tem seguido a linha de que, em regra, não cabe ao Oficial Registrador aferir a regularidade do valor apurado a título do referido imposto:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA – FORMAL DE PARTILHA – Registro negado, ao argumento de recolhimento a menor de ITCMD – Impossibilidade – Não pode o Sr. Oficial obstar registro por entender que o valor recolhido a título de tributo é inferior ao devido – Dúvida improcedente – Recurso provido.” (Apelação n.º 1066691-48.2015.8.26.0100, Rel. Des. PEREIRA CALÇAS).

Contudo, a hipótese não envolve a regular apuração de valor recolhido, mas sim de efetivo não recolhimento.

Com efeito, o art. 289 da Lei nº 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do art. 134, VI, do Código Tributário Nacional-CTN, não se olvidando, também, de seu dever de analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando-se simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízos ao Fisco.

No caso, o negócio jurídico entabulado, permuta de bens imóveis de valores distintos sem haver torna ou reposição em dinheiro, gera acréscimo patrimonial de forma não onerosa àquele que recebe o bem de maior valor, a caracterizar doação, nos termos da legislação civil vigente.

“Art.538, CC: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Outro não é o entendimento jurisprudencial a respeito:

“DECADÊNCIA – ITCMD – Não ocorrência Inteligência do art. 173, inc. I do CTN – Créditos tributários constituídos antes de decorrido o prazo decadencial Preliminar prejudicial de mérito afastada. APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO ITCMD – Alegação de que se firmou contrato de permuta sem torna a título oneroso, de forma a não incidir o imposto estadual – Inadmissibilidade – Autuação baseada nas informações prestadas na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física onde foram informadas as transferências de valores a título de doação Admissibilidade – Doação, todavia, que ocorreu em valor menor ao apurado pela fiscalização – Doação relativa a diferença de valores (venais) entre os imóveis permutados – ITCMD que deve recair sobre esta diferença – Minoração do valor autuado que se impõe – Multa confiscatória Não observada – Conversão do depósito em renda em favor da Fazenda – Possibilidade após o trânsito em julgado R. sentença parcialmente reformada – Recursos da autora e da ré parcialmente providos.” (Apelação Cível: 1003390-40.2016.8.26.0053, SILVIA MEIRELLES RELATORA).

Nestes termos, assiste razão ao I. Registrador ao exigir a apresentação de guia recolhida do ITCMD sobre a diferença do valor existente entre os imóveis, à luz do que dispõem os arts. 1º, II, 6º, II, a, 13 e 16, I, a, todos do Decreto Estadual nº 46.655/2002:

“Artigo 1.º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

II – por doação.

Artigo 6.º – Fica isenta do imposto

II – a transmissão por doação:

a – cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs;

Artigo 13 – O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação, devendo ser atualizado monetariamente, a partir do dia seguinte, segundo a variação da Unidade Fiscal do Estado de São Paulo – UFESP, até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto.

Artigo 16 – O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei 10.705/00, art.13):

I – em se tratando de:

a – urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU”.

Ademais, eventual isenção está condicionada à apresentação pelo interessado de prova do reconhecimento administrativo da isenção, conforme art. 6º, §3º, do referido Decreto Estadual nº 46.655/2002:

“§3º. Na hipótese prevista na alínea “a” do inciso II, os tabeliães e serventuários responsáveis pela lavratura de atos que importem em doação de bens ficam obrigados a exigir do donatário declaração relativa a doações isentas recebidas do mesmo doador, conforme disposições estabelecidas pela Secretaria da Fazenda.”

Não cabe, pois, ao registrador determinar se é caso de isenção ou não, do tributo, competindo ao órgão tributante emitir documento neste sentido para viabilizar o registro.

Tampouco colhe o argumento dos recorrentes no sentido de ser prerrogativa dos proprietários a atribuição de valores aos imóveis objeto da permuta.

Neste sentido decidiu este E. Conselho Superior da Magistratura em caso semelhante:

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna. Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação. Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD. Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias. Óbice mantido. Recurso desprovido.” (CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 1007778- 97.2020.8.26.0100, RELATOR: Ricardo Mair Anafe, DATA DE JULGAMENTO: 05/06/2020 DATA DJ: 19/06/2020).

Nesse cenário, não há como se concluir pela superação do óbice apontado pelo registrador.

3. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.