Registro de imóveis – Pedido de Providências – Alegado desdobro de lote – Requerimento para abertura de matrículas – Lançamento fiscal que não dispensa a autorização municipal para o desdobro – Inexistência de procedimento administrativo perante a municipalidade para o desdobro de lote – Recurso não provido.


  
 

Número do processo: 1083056-70.2021.8.26.0100

Ano do processo: 2021

Número do parecer: 312

Ano do parecer: 2022

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1083056-70.2021.8.26.0100

(312/2022-E)

Registro de imóveis – Pedido de Providências – Alegado desdobro de lote – Requerimento para abertura de matrículas – Lançamento fiscal que não dispensa a autorização municipal para o desdobro – Inexistência de procedimento administrativo perante a municipalidade para o desdobro de lote – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso, impropriamente denominado de apelação, interposto por Ana Carolina de Morais Bauer e Eloisa Brasil de Moraes contra a r. decisão da MM. Juíza Corregedora Permanente do 15º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo que, em pedido de providências, manteve a recusa de abertura de matrículas em razão de suposto desdobro de lote (fls. 287/291).

Alegam as recorrentes, em síntese, que houve sim aprovação municipal para o desdobro de lote, consoante a legislação em vigor à época (1940/1945), revelando-se mais do que suficientes os documentos apresentados para que se proceda à abertura das matrículas na circunscrição que se tornou competente (15º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo). Ademais, o ato de desdobro já foi praticado pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo quando averbadas à margem da transcrição nº 15.962 a demolição e a construção das 03 edificações que receberam os números 200/204, 208/212 e 214/216. E as divergências apontadas quanto às áreas lançadas no cadastro municipal, já individualizadas (contribuintes fiscais nºs 019.050.0015-4, 019.050.0014-6 e 019.050.0013-8), não se aperfeiçoam como óbice à abertura das matrículas, passíveis de correção a posteriori. Por isso, postulam o afastamento das exigências registrárias, para seguir com a “regularização registral dos três prédios” (fls. 302/314).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 327/330).

É o relatório.

Opino.

De início, saliente-se que se cuida (como já foi ressaltado às fls. 318) de pedido de providências e de recurso inominado, uma vez que a inscrição colimada é averbação (artigos 198, 203, II, e 296, da Lei nº 6.015, 31 de dezembro de 1973). De qualquer forma, o erro de nominação não prejudica em nada o processamento do recurso, pois foi respeitado o prazo legal para interposição, de resto idêntico para essa espécie e para a apelação (artigo 202 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, artigo 1003, § 5º, do Código de Processo Civil, e artigo 246 do Código Judiciário de São Paulo).

Pretendem as recorrentes a abertura de matrículas para três áreas distintas, que, atualmente, já possuem lançamento fiscal individualizado, cadastros como contribuintes fiscais de nºs 019.050.0015-4, 019.050.0014- 6 e 019.050.0013-8, sob a assertiva de que foi realizado o desdobro de lote perante a Municipalidade de São Paulo.

De acordo com a última nota de devolução, objeto deste pedido de providências, os óbices registrários à rogação feita são os seguintes:

“Para a efetivação do desdobro ora solicitado, a planta apresentada que define os contornos de cada lote e respectiva edificação, deve apresentar indícios de aprovação pela Municipalidade, bem como deve ser apresentado o alvará de sua aprovação, visto que da planta apresentada não define tal situação. Ainda que assim não fosse, até em razão das divergências das áreas superficiais do terreno de cada porção desdobrada nos IPTU’S, em relação às áreas correspondentes, devem ser objeto de retificação pela Prefeitura, no propósito que estas áreas sejam correspondentes/coincidentes.” (fls. 18/19 e 268/271)

E, de fato, os documentos apresentados não dão conta de que houve aprovação urbanística municipal para o desdobro da área transcrita sob nº 15.962, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo, apenas para a construção, já averbada à margem da referida transcrição imobiliária (fls. 24/27).

A autorização para desdobro não decorre da autorização para construção e a simples averbação de mais de uma construção no ofício imobiliário não implica em automática divisão do terreno.

Neste sentido:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA – FORMAL DE PARTILHA – DESDOBRO DE LOTES – AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO MUNICIPAL – DOCUMENTOS ESSENCIAIS QUE NÃO ACOMPANHARAM O REQUERIMENTO – REGULARIZAÇÃO DE EDIFICAÇÃO QUE NÃO SE CONFUNDE COM REGULARIZAÇÃO DE DESDOBRO DA GLEBA – RECUSA DO REGISTRO MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO”. (CSMSP Apelação Cível nº 0025337-31.2013.8.26.0100, Relator Desembargador Hamilton Elliot Akel, j. 03/06/2014)

Tampouco o lançamento fiscal individualizado equivale à aprovação urbanística do desdobro ou supre a sua falta.

Sob este prisma, vale destacar trecho do voto da lavra do então Corregedor Geral da Justiça, Milton Evaristo dos Santos, nos autos da apelação nº 8.807-0/1:

“Da mesma forma, se o ato registrário pretendido importa em parcelamento da unidade imobiliária conhecida do assentamento predial, é indispensável a comprovação de que a esse parcelamento anuiu o Poder Público Municipal.

(…)

A singela existência de lançamento fiscal para determinado imóvel, bastante a demonstrar sua tributação como unidade, não implica haja sido o parcelamento aprovado pela Prefeitura para fins urbanísticos. A partir do julgamento da Apelação Cível n.° 4.369-0, de Santos, em 6.8.85 (Rel. o Des. Nogueira Garcez), o Colendo Conselho Superior da Magistratura do Estado adotou a distinção em pauta, passando-se a exigir aprovação urbanística para os desmembramentos, desvalioso o simples lançamento tributário autônomo”.

O procedimento administrativo municipal referido se deu em época muito longínqua (1940/1945), décadas antes da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, e da Lei Municipal nº 7.805, de 01 de novembro de 1972, sujeitando-se às normas de regência vigentes a tal tempo, que culminou tão somente com a autorização para a construção, nos exatos termos do requerimento formulado (fls. 222/266).

E assim foi averbado à margem da transcrição nº 15.962, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo:

“1) Pela petição de 23 de maio de 1.969, Carmo Haddad, que assina Abdelkarim Haddad, autorizou a necessária averbação para o fim de ficar constando a construção de três prédios com uma loja e residência cada um, que recebeu os nºs 200 (residência), 204 (loja), 208 (residência), 212 (loja), 214 (residência) e 216 (loja), todos da Rua Anhanguera, conforme prova auto de vistoria nº 21.145-A, da Prefeitura, datado de 25/07/1945.” (fls. 24/25)

Não se dessume, como já afirmado, de dito procedimento administrativo municipal, qualquer aprovação para o desdobro de lote, observado, consoante nota devolutiva, que “a planta apresentada que define os contornos de cada lote e respectiva edificação, deve apresentar indícios de aprovação pela Municipalidade, bem como deve ser apresentado o alvará de sua aprovação, visto que da planta apresentada não define tal situação.” (fls. 87).

Além disso, o desdobro, ainda que autorizado pela Prefeitura Municipal, tem de atender ao princípio da especialidade objetiva, para o que são imprescindíveis a planta e o memorial descritivo.

Impende consignar que a perfeita identificação do imóvel é requisito da abertura de matrícula (especialidade objetiva) em consonância com o disposto no artigo 176, §1º, II, 3, b, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973:

“Art. 176 – O Livro nº 2 – Registro Geral – será destinado à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.

§1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:

(…)

II – são requisitos da matrícula:

(…)

3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:

(…)

b) – se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver”.

Logo, imprescindível a emissão do alvará de desdobro de lote, além da planta aprovada pela Prefeitura do Município de São Paulo e o memorial descritivo, para proceder à abertura das matrículas imobiliárias, com o que se poderão esclarecer, inclusive, eventuais divergências das áreas constantes nos lançamentos fiscais.

Ante o exposto, o parecer que apresento ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação seja recebida como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, e a ele seja negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 06 de setembro de 2022.

Caren Cristina Fernandes de Oliveira

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora desta Corregedoria Geral da Justiça e, por seus fundamentos, ora adotados, recebo a apelação como recurso administrativo, na forma do artigo 246, do Código Judiciário do Estado de São Paulo, ao qual nego provimento. São Paulo, 08 de setembro de 2022. (a) FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA, Corregedor Geral da Justiça. ADV: DENISE VIANA NONAKA ALIENDE RIBEIRO, OAB/SP 84.482.

Diário da Justiça Eletrônico de 14.09.2022

Decisão reproduzida na página 108 do Classificador II – 2022