1VRP/SP: Registro de Imóveis. Com o registro da convenção do condomínio na matrícula matriz, a inclusão da denominação do edifício representa mera complementação de informações, com averbação na matrícula de todas as unidades autônomas vinculadas a ele. Não estará havendo alteração no ato de instituição e especificação do condomínio. Há necessidade de reconhecimento de firma dos condôminos na lista de presença ou na convenção apresentada a registro.


  
 

Processo 1084389-86.2023.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1084389-86.2023.8.26.0100

Processo 1084389-86.2023.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Condomínio Edifício Motta – – Fatima Therezinha Motta – Diante do exposto, JULGO PREJUDICADA a dúvida, observando que apenas o óbice relativo ao reconhecimento das firmas subsiste. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: ALEX ARAUJO TERRAS GONÇALVES (OAB 242150/SP)

Íntegra da decisão: l

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1084389-86.2023.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Requerente: Condomínio Edifício Motta e outro

Requerido: Primeiro Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de ação de obrigação de fazer movida por Condomínio Edifício Motta em face do Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital diante da negativa de registro de instrumento particular de convenção e regimento interno do condomínio objeto da transcrição n. 47.255 daquela serventia.

A parte sustenta que o condomínio foi instituído em 1958, mas não houve atribuição de nome, já que não elaborada convenção; que, em 19/12/2022, a fim de regularizar a situação do condomínio, realizou-se assembleia para votação da convenção e do regimento interno, na qual compareceram representantes de sete das nove unidades, ou seja, mais de 2/3 das frações ideais que o compõem; que, na referida assembleia, deliberou-se que o condomínio passaria a se chamar “Condomínio Edifício Motta”; que, apesar de o Oficial sustentar que a instituição de nome depende da aprovação da unanimidade dos condôminos, não há previsão nesse sentido nos artigos 1.332, 1.333 e 1.334 do Código Civil nem no artigo 9º da Lei n. 4.591/1964.

Documentos vieram às fls. 07/82.

A decisão de fls. 83/84 recebeu o feito como dúvida e, diante do decurso da validade da última prenotação (fl. 37), determinou a reapresentação do requerimento à serventia extrajudicial. Também houve determinação de regularização da representação processual da parte suscitante.

Com o atendimento (fls. 88/90), o Oficial prestou informações às fls. 92/94, confirmando a reapresentação do título sob prenotação n. 435.425 e esclarecendo que, por ocasião da instituição e da especificação do condomínio, averbadas na transcrição n. 47.255, não constou a denominação do edifício; que, apesar de não haver disposição expressa na legislação no sentido de que deve ser atribuído um nome ao edifício, o artigo 1º, § 1º, da Lei n. 4.591/1964, o faz de forma oblíqua, ao impor que “cada unidade será assinalada por designação especial, numérica ou alfabética, para efeitos de identificação e discriminação”; que a nomeação incluída posteriormente na convenção caracteriza alteração da instituição e especificação do condomínio e, considerando que a denominação de um edifício diz respeito à sua especialidade subjetiva ou caracterização, há necessidade de aprovação unânime de todos os titulares especialmente convocados para tal fim, com averbação na matrícula matriz do edifício, bem como nas matrículas filiadas das unidades de uso exclusivo, o que implica alteração do direito real do titular; que a expressão “minuta” deve ser excluída do regimento interno; que há necessidade de assinatura e reconhecimento das respectivas firmas de todos os signatários da convenção e do regimento interno do condomínio. Juntou documentos às fls. 95/143.

O Ministério Público opinou pela procedência parcial (fls. 146/148).

É o relatório.

Fundamento e decido.

De início, vale destacar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

De fato, no sistema registral, vigora o princípio da legalidade estrita, pelo qual somente se admite o ingresso de título que atenda aos ditames legais.

Em outras palavras, o Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.

É o que se extrai do item 117 do Cap. XX das Normas de Serviço:

“Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

No caso concreto, constata-se, ainda, que não há insurgência da parte suscitante contra todas as exigências que foram sempre formuladas cumulativamente pelo Oficial (reconhecimento de firma e exclusão do termo “minuta” do regimento interno fls. 37 e 95), de modo que a dúvida inversa resta prejudicada.

Ainda assim, como estamos na via administrativa, visando evitar novo questionamento futuro, passo à análise dos óbices, o que é possível segundo entendimento do E. Conselho Superior da Magistratura (destaque nosso):

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Recusa de ingresso de título. Resignação parcial. Dúvida prejudicada. Recurso não conhecido. Análise das exigências a fim de orientar futura prenotação. Correta descrição dos imóveis envolvidos em operações de desdobro e fusão. Princípio da especialidade objetiva. Manutenção das exigências. Exibição de certidões negativas de débitos federais, previdenciários e tributários municipais. Inteligência do item 119.1. do Cap. XX das NSCGJ. Precedentes deste Conselho. Afastamento das exigências. Exibição de certidões de ações reais, pessoais reipersecutórias e de ônus reais. Exigência que encontra amparo na letra “c” do item 59 do Capítulo XIV das NSCGJ e na Lei nº 7.433/1985. Manutenção das exigências” (Apelação n.1000786-69.2017.8.26.0539 Relator Des. Pereira Calças).

No mérito, a dúvida seria procedente em parte. Vejamos os motivos.

Primeiramente, é relevante compreender a distinção entre a instituição, a especificação e a convenção do condomínio.

A instituição dá origem jurídica às unidades autônomas que anteriormente integravam um único imóvel. É a manifestação de vontade do proprietário que construiu o edifício de criar um condomínio, submetendo seu imóvel ao regime da propriedade edilícia, com restrições e direitos para cada unidade autônoma, de modo a vincular os futuros titulares.

A especificação, que é indissociável da instituição (artigo 237-A, § 3º, da LRP), é a individualização de cada unidade autônoma, com delimitação das áreas comuns e das áreas privativas.

A instituição e a especificação servem, portanto, para descrever, caracterizar e individualizar as partes comuns e exclusivas, na forma prevista pelo Código Civil:

“Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial:

I – a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;

II – a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;

III – o fim a que as unidades se destinam”.

A Lei n. 4.591/64, por sua vez, assim dispôs sobre a instituição e a especificação das unidades (destaque nosso):

“Art. 7º O condomínio por unidades autônomas instituir-se-á por ato entre vivos ou por testamento, com inscrição obrigatória no Registro de Imóvel, dêle constando; a individualização de cada unidade, sua identificação e discriminação, bem como a fração ideal sôbre o terreno e partes comuns, atribuída a cada unidade, dispensando-se a descrição interna da unidade”.

Já a convenção regula o funcionamento do condomínio, definindo as atribuições e a forma de eleição dos seus órgãos administrativos, quóruns para votação e regras de arrecadação, além de normas mais detalhadas de convivência coletiva, as quais também podem ser consolidadas em um regimento interno.

No caso concreto, verifica-se que, quando da instituição e da especificação do condomínio, com averbação na transcrição n. 47.255 do 1º RI da Capital, não se fez constar a denominação do edifício (Av.01, de 21/01/1958 fls. 42/43).

As matrículas das unidades autônomas somente descrevem os imóveis como apartamentos do “EDIFÍCIO” situado na rua Glicério, n. 791, no 2º Subdistrito Liberdade, sem menção a nome (fls. 13, 44/48, 49/51, 52/54, 55/57, 58/62, 63/66, 67/69, 70/72, 73/74, 75/79 e 80/82).

Considerando que a instituição e a especificação foram averbadas sem registro da convenção do condomínio, o qual só se tornou obrigatório com o advento da Lei n. 4.591/64, os condôminos realizaram assembleia para votação da convenção e do regimento interno, na qual compareceram representantes de sete das nove unidades, sendo seis de propriedade da síndica, Fátima Therezinha Motta (19/12/2022 fls. 08/09).

Embora não tenha havido deliberação específica sobre a denominação, consta na convenção aprovada que o condomínio passou a se chamar “Edifício Motta” (fls. 10/11 e 12/26), o que cumpre o requisito legal.

De fato, o artigo 1.333 do Código Civil e o artigo 9º da Lei n. 4.591/1964 estabelecem que a elaboração de convenção depende da aprovação de titulares que representem, no mínimo, 2/3 das frações ideais que compõem o condomínio:

“Art. 1.333. A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção”.

“Art. 9º Os proprietários, promitentes compradores, cessionários ou promitentes cessionários dos direitos pertinentes à aquisição de unidades autônomas, em edificações a serem construídas, em construção ou já construídas, elaborarão, por escrito, a Convenção de condomínio, e deverão, também, por contrato ou por deliberação em assembleia, aprovar o Regimento Interno da edificação ou conjunto de edificações.

(…)

§ 2º Considera-se aprovada, e obrigatória para os proprietários de unidades, promitentes compradores, cessionários e promitentes cessionários, atuais e futuros, como para qualquer ocupante, a Convenção que reúna as assinaturas de titulares de direitos que representem, no mínimo, 2/3 das frações ideais que compõem o condomínio”.

Não se desconhece, por outro lado, que, para alteração da instituição, fazse necessária a aprovação pela unanimidade dos condôminos, nos termos do item 82, Cap. XX, das NSCGJ:

“82. A alteração da especificação exige a anuência da totalidade dos condôminos”.

Na interpretação deste juízo, porém, não está havendo alteração no ato de instituição e especificação do condomínio.

Ou seja, não se estão alterando a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; o fim a que as unidades se destinam. Está-se tão somente esclarecendo o nome do condomínio, o que foi regularizado por meio de realização de assembleia para aprovação de sua convenção, que até então inexistia.

Com o registro da convenção do condomínio na matrícula matriz, haverá, portanto, mera complementação de informações (denominação do edifício), com averbação na matrícula de todas as unidades autônomas vinculadas a ele.

Quanto à segunda exigência da nota de devolução de fl. 95, observa-se que é dispensável o reconhecimento de firma das procurações e da lista de presença, notadamente quando não há impugnação na própria assembleia, como no caso.

Neste sentido a orientação da E. Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo no julgamento do Recurso Administrativo n. 1003515-12.2020.8.26.0071:

“Registro de Imóveis – Averbação de alteração de convenção de condomínio – Procedimento administrativo – Recurso – Desnecessidade de reconhecimento das firmas nas procurações passadas por condôminos, para fins de assembleia de condomínio edilício – Inexistência de impugnação ou de exigência disso na convenção vigente ou na lei – Inteligência da Lei n. 6.015/1973, art. 221, II – Parecer pelo provimento do recurso, para que se proceda ao averbamento da alteração da convenção de condomínio, como rogado” (CGJ Processo n. 1003515-12.2020.8.26.0071 – Corregedor Geral da Justiça Des. Ricardo Mair Anafe j. 24.11.2020).

O título formal levado a registro, porém, é a convenção, para a qual há exigência de reconhecimento das firmas de seus subscritores (artigo 221, inciso II, da Lei de Registros Públicos).

Note-se que a Lei de Registros Públicos não faz distinção entre os escritos particulares registráveis. Em outros termos, tenham eles ou não natureza contratual, devem conter o reconhecimento das firmas de seus signatários, ou seja, de todos aqueles que os assinaram.

Neste ponto, portanto, a qualificação negativa subsiste.

Vale observar que, na forma da lei, o reconhecimento das firmas das partes e testemunhas que assinam o escrito particular não pode ser substituído por outras declarações.

O que se admite é que o reconhecimento seja feito somente na lista de presença da assembleia na qual a convenção foi aprovada, de modo que desnecessário, por redundante, o reconhecimento das assinaturas nos dois documentos:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Alteração de convenção condominial – Averbação – Exigibilidade de reconhecimento das firmas dos condôminos presentes à assembleia – Art. 221, II, da LRP e Item 121, Capítulo XX, das NSCGJ – Verificação da observância dos quóruns de instalação da assembleia e aprovação da alteração da convenção que serve como orientação ao síndico, a evitar novos percalços – Desnecessária a apresentação cumulativa da ata da assembleia, com firmas reconhecidas, de solicitação formal de alteração da convenção, assinada por todos os condôminos que participaram da assembleia, com firmas reconhecidas, e teor integral da convenção, já com as alterações aprovadas, também com firmas reconhecidas – Inexigibilidade da apresentação de documentos em duas vias – Recurso desprovido” (CGJSP PROCESSO de autos n. 1100603-36.2015.8.26.0100, RELATOR: Manoel de Queiroz Pereira Calças, data de julgamento: 07/07/2016; DATA DJ: 12/08/2016).

O parecer então aprovado deixa bastante claro que (destaque nosso):

” (…) Para a averbação almejada, basta que se apresente, uma única vez, documentação comprobatória de que os quóruns de instalação da assembleia e de aprovação da alteração tenham sido observados, com identificação de quais sejam os condôminos presentes e qual o resultado final do escrutínio. Por óbvio, será necessário que conste da ata, igualmente, o preciso teor da alteração, com indicação das cláusulas modificadas e da nova redação de cada dispositivo. E, repise-se, é necessário, de fato, que as firmas dos condôminos presentes à assembleia sejam reconhecidas, como explicado há pouco. Não obstante, de todo dispensável que, simultaneamente à ata com o teor aludido, acompanhada da lista de presença em que os votantes venham devidamente identificados, com reconhecimento das respectivas firmas, o condomínio apresente pedido formal de alteração da convenção, novamente com assinatura dos condôminos, com firmas reconhecidas, e, mais, a integralidade da nova convenção, já com as alterações providenciadas, com reconhecimento de firmas pela terceira vez”.

Dessa forma, haverá necessidade de reconhecimento de firma dos condôminos na lista de presença ou na convenção apresentada a registro (fls. 26 e 36).

Por fim, embora conste o termo “minuta” no regimento interno (fls. 27/36), a sua aprovação por pelo menos dois terços dos condôminos presentes afasta qualquer dúvida de que se trata de documento definitivo, elaborado em conjunto com a convenção do condomínio, que pode, portanto, ter acesso, com menção expressa a tal aprovação.

Diante do exposto, JULGO PREJUDICADA a dúvida, observando que apenas o óbice relativo ao reconhecimento das firmas subsiste.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 31 de julho de 2023.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 02.08.2023 – SP)

Fonte: Diário da Justiça Eletrônico.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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