1VRP/SP: Registro de Imóveis. Averbação de “Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência. Ainda que a requerente figure como única proprietária do prédio tombado integrante do condomínio, que correspondente à “Unidade Bloco A – Melhoramentos”, ela já não mais detém o domínio da totalidade do terreno que serviu como base para o cálculo do potencial construtivo passível de transferência, sendo que a responsabilidade pela preservação do imóvel tombado passou a ser dos atuais proprietários das unidades autônomas integrantes do condomínio, na proporção das suas respectivas frações ideais do terreno.


  
 

Processo 1024871-34.2024.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Companhia Melhoramentos de São Paulo – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para manter os óbices registrários. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: LUIS RODRIGO MARGARIDO PIRES DE ALMEIDA (OAB 258520/SP), LUIS RODRIGO MARGARIDO PIRES DE ALMEIDA (OAB 258520/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo nº: 1024871-34.2024.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 10º Oficial de Registro de Imóveis da capital

Suscitado: Companhia Melhoramentos de São Paulo e outro

Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Companhia Melhoramentos de São Paulo e Exto Live Empreendimentos Imobiliários Ltda., diante de negativa em proceder à averbação de “Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência – SMDU/DEUSO 0142/16”, envolvendo o imóvel da matrícula n. 76.155 daquela serventia.

O Oficial informa que o título recebeu qualificação negativa pelos seguintes motivos: o potencial construtivo passível de transferência de 5.711,15m² foi originado da totalidade do terreno sobre o qual o Condomínio “Vila Romana Nobre” foi implantado (R17/76.155, de 27.04.2021) e, portanto, vincula-se a totalidade de suas 139 unidades autônomas, matriculadas sob nºs. 159.116 a 159.254, e, além disso, tendo havido o registro da instituição e especificação do condomínio, a incorporadora e a proprietária da unidade “Bloco A – Melhoramentos” não têm legitimidade para requerer a pretendida averbação.

O Oficial esclarece que, pelo teor da referida declaração, consta que “o imóvel sito à Rua Tito, 479, nesta Capital, com área total de terreno de 11.422,30 m² de acordo com a referida matrícula, de propriedade de Companhia Melhoramentos de São Paulo, tombado pelo Conpresp através da Resolução nº 05/2009, dispõe de 5.711,15m² de potencial construtivo passível de transferência, originado sem a doação do terreno cedente …”; que, com o registro da incorporação, o imóvel ficou afetado pelo empreendimento, deixando de existir como um todo, criando assim o que é designado pela lei como “condomínio de frações ideais”, ou seja, deixou de existir “um único imóvel como um todos, passando a ser formado por diversas unidades autônomas, às quais correspondem frações ideais no terreno; que, no caso concreto, ainda que na ocasião do tombamento a interessada Companhia Melhoramentos de São Paulo fosse titular de domínio da totalidade do imóvel (terreno com a área de 11.422,30 m² e prédio com 16.290,00 m²), posteriormente, a mesma vendeu uma fração ideal de 76,5559% do imóvel, reservando para si a fração ideal de 23,4441%, deixando de ter disponibilidade sobre a totalidade do terreno.

O Oficial aduz que, ainda que a requerente figure como única proprietária do prédio tombado integrante do condomínio, que correspondente à “Unidade Bloco A – Melhoramentos”, ela não mais detém o domínio da totalidade do terreno que serviu como base para o cálculo do potencial construtivo passível de transferência, sendo que a responsabilidade pela preservação do imóvel tombado passou a ser dos atuais proprietários das unidades autônomas integrantes do condomínio, na proporção das suas respectivas frações ideais do terreno, haja vista que o cálculo do potencial construtivo corresponde ao resultado da multiplicação da área do terreno pelo Coeficiente de Aproveitamento (CA) aprovado pela legislação, de acordo com a zona da cidade onde está localizado o imóvel; que, ao transmitir a fração ideal do terreno de 76,5559% do terreno, ainda que mantida a construção já existente, para que sobre a totalidade do terreno fosse construído o condomínio, pode-se concluir que foram transmitidos também eventuais direitos à percepção dos benefícios oriundos da transmissão do potencial construtivo; que a averbação requerida somente pode ser acolhida se requerida expressamente pelo condomínio, representado pelo síndico, após aprovação em assembleia geral extraordinária convocada para tal fim.

Documentos vieram às fls. 04/188.

Em manifestação dirigida ao Oficial, e em impugnação, a parte interessada alega que a Companhia Melhoramentos de São Paulo, à época em que era proprietária da totalidade do imóvel descrito e caracterizado na matrícula n. 76.155 do 10º Registro de Imóveis da Capital, sofreu Tombamento Definitivo do referido imóvel, decorrente da Resolução 05/CONPRESP/2009, de 16 de setembro de 2009, e promoveu a correspondente averbação do tombamento na matrícula, em 13 de dezembro de 2017 (Av. n 19 e n. 22); que houve expedição de “Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência SMDU/DEUSO n. 0142/16”, em 11 de junho de 2016, e, no âmbito do Processo Administrativo Municipal n. 6025.2020/0020566-6, exigiu-se a apresentação da matrícula imobiliária contendo averbação da Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência.

Sustenta que a transferência de potencial construtivo caracteriza um instrumento previsto na legislação municipal há quase quatro décadas, iniciando-se com a Lei Municipal n. 9.725/84; que, nos termos da legislação, fica autorizada a transferência do potencial construtivo de imóveis urbanos, privados ou públicos, para fins de viabilizar, principalmente, a obtenção de recursos financeiros pelo proprietário visando à preservação do bem de interesse histórico, paisagístico, ambiental, social ou cultural; que a transferência é materializada por Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência, que atesta a quantidade de metros quadrados passíveis de transferência, dependendo, a efetivação da transferência, da posterior Certidão de Potencial Construtivo; que, ultimada a tramitação do pedido junto aos órgãos municipais, outorgada a Escritura de Cessão e Transferência de Potencial Construtivo, averbada na matrícula imobiliária, com posterior publicação no Diário Oficial do Município, será expedida Certidão de Transferência de Potencial Construtivo pela SMDU para utilização pela cessionária no imóvel receptor; que, diversamente do informado pelo Oficial, a responsabilidade pela preservação do imóvel tombado não passou a ser dos atuais proprietários das unidades autônomas integrantes do condomínio, mas continua sendo exclusivamente da Companhia Melhoramentos de São Paulo, única proprietária da Unidade Bloco A, que é justamente o prédio histórico tombado; que obteve junto à PMSP a declaração de existência de 5.711,15m² de potencial construtivo passível de transferência, originado sem doação de terreno para Municipalidade; que o proprietário de unidade autônoma do Bloco B jamais poderia ser cotitular do potencial construtivo do imóvel tombado, se apropriando desse resultado financeiro decorrente da venda do potencial construtivo, como forma de geração de caixa, por exemplo, sem qualquer destinação ou aplicação específica com a finalidade de manutenção do imóvel tombado; que a Municipalidade, mesmo ciente da incorporação e do condomínio instituído, não questionou a titularidade do potencial construtivo; que o requerimento de averbação deve ser firmado somente pelas pessoas jurídicas das coproprietárias, ora interessadas, e não pelo condomínio e/ou tampouco pelos titulares das 139 unidades autônomas; requer o afastamento do óbice para averbação do título na matrícula mãe n. 76.155 ou, alternativamente, na matrícula filha n. 159.116, específica da Unidade Bloco A (fls. 141/150 e 189/204). Juntou documentos (fls. 205/207).

O Ministério Público opinou pela manutenção do óbice (fls. 210/212).

É o relatório.

FUNDAMENTO e DECIDO.

De proêmio, cumpre destacar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

No Sistema Registral, vigora o princípio da legalidade estrita: o Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.

Nesse sentido, dispõe o item 117 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (NSCGJ): “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

No mérito, o pedido é procedente.

A parte requerente busca a averbação da “Declaração de Potencial Construtivo Passível de Transferência – SMDU/DEUSO 0142/16”, na matrícula n. 76.155 do 10º Registro de Imóveis da Capital.

Pelo teor da referida declaração emitida pela Prefeitura do Município de São Paulo, em 13 de junho de 2.016, consta que “o imóvel sito à Rua Tito, 479, nesta Capital, com área total de terreno de 11.422,30 m² de acordo com a referida matrícula, de propriedade de Companhia Melhoramentos de São Paulo, tombado pelo Conpresp através da Resolução nº 05/2009, dispõe de 5.711,15m² de potencial construtivo passível de transferência, originado sem a doação do terreno cedente …” (fls. 185).

De acordo com a certidão da matrícula n. 76.155 do 10º Registro de Imóveis da Capital (fls. 07/140), verifica-se que, em 19 de maio de 2.017, a proprietária Companhia Melhoramentos de São Paulo vendeu uma parte ideal correspondente a 76,5559% do imóvel a Exto Live Empreendimentos Imobiliários Ltda (R.16, fls. 12), reservando para si a fração ideal de 23,4441%; em 23 de novembro de 2017, houve averbação do tombamento definitivo da totalidade do imóvel da matrícula (AV.19, fls. 13); em 08 de setembro de 2.017, procedeu-se ao registro da incorporação imobiliária do empreendimento denominado Condomínio Vila Romana Nobre, formado por dois blocos: Bloco A – Melhoramentos e Bloco B – Clock Vila Romana (R.21, fls. 14); em 27 de abril de 2021, foi registrada a instituição e especificação de condomínio, sob a denominação Condomínio Vila Romana Nobre, tendo sido abertas na mesma data as matrículas nºs. nºs. 159.116 a 159.254, referentes a todas as unidades autônomas (R.171, fls. 80/80), seguida de averbação da convenção de condomínio (AV.172, fls. 81).

Na espécie, com o registro da instituição e especificação de condomínio na matrícula n. 76.155, houve a alteração do regime jurídico da propriedade, configurando uma nova realidade jurídica, dando origem formal ao condomínio edilício e, consequentemente, às unidades autônomas com frações ideais nas áreas comuns do condomínio (matrículas nºs. 159.116 a 159.254).

Com efeito, a especificação e instituição de condomínio estão disciplinadas no artigo 1.332 do Código Civil e dizem respeito a: I discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; II a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; III o fim a qual as unidades se destinam.

Uma vez regularmente instituído o condomínio edilício, o mesmo será representado pelo síndico, com a respectiva legitimidade, nos termos do artigo 1.348 do Código Civil.

No tocante à legitimidade para requerer averbação, dispõem os artigos 13 e 217 da Lei de Registros Públicos:

“Art. 13. Salvo as anotações e as averbações obrigatórias, os atos do registro serão praticados:

I – por ordem judicial;

II – a requerimento verbal ou escrito dos interessados;

III – a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar.

Art. 217. O registro e a averbação poderão ser provocados por qualquer pessoa, incumbindo-lhe as despesas respectivas”.

O item 120, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, por simetria, prevê:

“As averbações serão feitas a requerimento dos interessados, com firma reconhecida, instruído com documento comprobatório fornecido pela autoridade competente, dispensado o reconhecimento de firma no requerimento quando for assinado perante o Registrador ou seu preposto”.

No caso concreto, como dito, tendo havido o registro da instituição e especificação de condomínio na matrícula n. 76.155, sob a denominação Condomínio Vila Romana Nobre, esse passa a ser legitimado para requerer averbação na aludida matrícula, devidamente representado pelo síndico, após aprovação em assembleia geral extraordinária convocada para tal fim.

Importante mencionar que as normas a serem respeitadas quando da qualificação registral são aquelas vigentes no momento de apresentação do título a registro, em atenção ao princípio tempus regis actum.

Vale dizer, ainda que a requerente figure como única proprietária do prédio tombado integrante do condomínio, que correspondente à “Unidade Bloco A – Melhoramentos”, ela já não mais detém o domínio da totalidade do terreno que serviu como base para o cálculo do potencial construtivo passível de transferência, sendo que a responsabilidade pela preservação do imóvel tombado passou a ser dos atuais proprietários das unidades autônomas integrantes do condomínio, na proporção das suas respectivas frações ideais do terreno.

Isso porque, o potencial construtivo corresponde ao resultado da multiplicação da área do terreno pelo Coeficiente de Aproveitamento (CA) aprovado pela legislação, de acordo com a zona da cidade onde está localizado o imóvel.

Embora tenha sido determinada a preservação do Edifício e área de proteção ao seu redor, o Potencial Construtivo Passível de Transferência foi calculado sobre a área total do terreno, agora ocupado em sua maior proporção pelo Condomínio Vila Romana Nobre, vinculando-se às 139 unidades autônomas.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para manter os óbices registrários.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 01 de abril de 2024.

Renata Pinto Lima Zanetta

Juíza de Direito (DJe de 02.04.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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