Artigo: As principais diferenças entre representação, mandato e procuração – Por Luís Flávio Fidelis Gonçalves


* Luís Flávio Fidelis Gonçalves

Ordinariamente, as pessoas realizam negócios pessoalmente, através de sua própria manifestação volitiva. Porém, há situações em que, por determinação legal ou por conveniência do agente, o interessado é representado por outra pessoa para a prática do ato.

Sem a pretensão de esgotar o tema, o presente estudo visa delimitar o alcance jurídico dos institutos da representação, do mandato e da procuração, auxiliando o operador quando da lavratura de documentos jurídicos.

No que tange à representação, sempre haverá quando uma pessoa manifesta vontade em nome de outrem na prática de um determinado ato jurídico.

A representação pode ser legal, quando decorrer do poder familiar e ocorre em relação aos pais sobre os filhos menores. Pode ser judicial, se decorrer de um processo judicial, como ocorre com os tutores, curadores, síndicos e administradores de falência. Finalmente, a representação pode ser convencional, quando decorrer de um negócio jurídico específico denominado mandato.

Ressalta-se que há outros negócios jurídicos que denotam também o exercício de representação, como ocorre com a comissão, preposição, gestão e agência.

Desta análise preliminar, nota-se que representação é gênero cujo mandato é a espécie. A representação decorre da lei, enquanto que o mandato sempre decorrerá da vontade das partes.

Etimologicamente, a palavra mandato possui dois sentidos. O primeiro advém do latim “mandatum” ou “mandare” no sentido de “confiar a ou encarregar”. Já no Direito romano, significava “manus dare” ou “dar as mãos”, configurando expressão de confiança e amizade.

O conceito de mandato se encontra no art. 653 do CC que estabelece que se opera mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses.

No tocante à natureza jurídica, o mandato é um contrato bilateral quando for oneroso, ou seja, quando o mandatário for remunerado, existindo sinalágma. Poderá, porém, ser unilateral quando for gratuito, pois haverá prestação apenas por parte do mandatário.

Ainda, trata-se de um contrato consensual, aperfeiçoando-se com a mera manifestação de vontade. Também se trata de um contrato informal, vez que sequer precisa ser instrumentalizado, conforme dispõe o art. 656 do CC. Trata-se, outrossim, de um contrato preparatório, que visa outra relação jurídica e também é personalíssimo, calcado na confiança.

A principal característica do mandato é que implica sempre em representatividade. Porém, há doutrina que sustenta haver mandato sem representatividade quando o mandante confia ao mandatário a realização de um ato em nome do próprio mandatário, mas no seu interesse e por sua conta. Neste caso, o mandatário age em nome próprio e não de mandante, adquirindo os direitos e assumindo as obrigações decorrentes do negócio que celebra. Trata-se de noção do contrato celebrado por interposta pessoa, pois na verdade o mandatário age em seu nome, mas sob ordens, orientações, por conta e interesse do mandante.

Analisados os aspectos principais de representação e de mandato, passa-se a tratar da procuração.

A doutrina conceitua procuração como o instrumento jurídico unilateral, por meio do qual uma pessoa física ou jurídica outorga poderes de representação para outrem. Importante ressaltar que a procuração não é a forma do mandato, mas sim a conseqüência.

Não se deve confundir procuração com mandato. Enquanto este é um contrato, aquela é uma manifestação unilateral que, enquanto não for aceita consubstancia mera oferta de contratar.

Ademais, a procuração pode apenas corporificar um contrato prévio de mandato, sendo seu instrumento. Isto porque no mandato pode haver cláusulas que não interessam a terceiros que irão contratar com o representado, como é o caso da remuneração paga ao mandatário.

Ressalta-se que é possível procuração sem mandato, pois se trata de promessa de contrato, vez que só haverá mandato se o outorgado na procuração aceitar. Em razão disso, afere-se a natureza jurídica da procuração, que é de ato jurídico unilateral. Mais uma vez não se confunde com mandato, que é contrato bilateral.

A outorga da procuração pode ser anterior, concomitante ou posterior ao contrato de mandato. Ela servirá para instrumentalizar o mandato para terceiro. Se a procuração for anterior ao mandato, o contrato só se considera formado com a aceitação do outorgado. Enquanto não aceita, a procuração é mera promessa de contratar. Haverá procuração pelo mandato, mas ela também pode instrumentalizar o núncio, que é o encarregado de levar uma proposta pelo proponente ao oblato, ou a preposição, que é a representação de uma empresa.

Se o procurador pratica um ato se valendo da procuração, entende-se por firmado o contrato de mandato, pois este aceita sua forma tácita para a configuração. Porém, se o outorgado da procuração não praticar qualquer ato ou recusar expressamente, tem-se por não firmado o mandato, sendo a procuração um instrumento existente, válido, porém, ineficaz.

Importante diferenciar ainda mandato em causa própria e procuração em causa própria. No mandato em causa própria há verdadeira alienação, vez que comparecem mandante e mandatário, possuindo o contrato ingresso no registro de imóveis dado o seu caráter translativo. Porém, a procuração em causa própria é mera declaração unilateral de vontade e por isso necessita de um novo ato notarial para transferir a propriedade.

Portanto, nota-se que representação, mandato e procuração são institutos jurídicos diversos, devendo o notário ou qualquer outro operador de direito se atentar para que confira o nome correto ao instrumento realizado. Isto porque, a aplicação da terminologia adequada, além de cumprir o princípio da tecnicidade, ajuda a delimitar o alcance do ato firmado, sendo mais um elemento garantidor da segurança jurídica.

Fonte: Notariado | 13/05/2015.

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Artigo: RESTRIÇÕES DO IMÓVEL E/OU DAS PESSOAS E O REGISTRO DE IMÓVEIS: ASPECTOS PRÁTICOS – Por Luís Ramon Alvares


*Luís Ramon Alvares[1]

As restrições que alcançam o imóvel e/ou nas pessoas, físicas ou jurídicas, têm importante repercussão no Registro Imobiliário, merecendo especial atenção de tabeliães e registradores imobiliários. No Livro “Manual do Registro de Imóveis: Aspectos Práticos da Qualificação Registral (Editora Crono, 2015, Autor Luís Ramon Alvares)”, consta a seguinte abordagem do tema:

[…]

4.5 RESTRIÇÕES DO IMÓVEL E/OU DAS PESSOAS

É importante saber se não há impedimento para alienação ou oneração do imóvel. É preciso observar se o imóvel pode ser perfeitamente alienado ou onerado, e se o(s) proprietário(s) pode(m) dispor e/ou onerar o bem que lhe(s) pertence. Averbação de indisponibilidade, p. ex., em regra, impede alienações e onerações do imóvel. Atenção especial também é requerida quando há hipotecas do SFH ou constituídas por Cédulas de Crédito Industrial, Comercial, À Exportação ou Rural.

  1. Verificar se há averbação de indisponibilidade na matrícula, o que, em regra, impede a alienação e a oneração do imóvel.
  2. a) Contrato celebrado em data anterior à averbação de indisponibilidade não pode ser registrado. Se há indisponibilidade, em regra, não pode ser praticado qualquer ato sem autorização judicial (ou, eventualmente, do Banco Central, se a indisponibilidade decorrer de intervenção ou liquidação extrajudicial de instituições financeiras ou da ANS, se a indisponibilidade decorrer de liquidação extrajudicial de operadores de planos de assistência à saúde).
  3. b) Deve-se verificar na legislação respectiva se a indisponibilidade impede outros atos de registro ou averbação na matrícula. Vide item “Indisponibilidade de bens”, na subseção 5.2.8 – Mandados de Penhora, arresto, sequestro, declaração de ineficácia e indisponibilidade de bens.
  4. c) Quando a indisponibilidade for oriunda de ação de responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa, há parecer da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo permitindo a averbação de construção (Parecer n. 316/2008E – Processo CG n. 2008/47616).Como a averbação de construção não é ato de alienação, poderá ser acolhida em outras situações em que houver indisponibilidades de bens, sempre após apreciação do caso concreto pelo oficial.
  5. Verificar se a indisponibilidade de bens na matrícula é oriunda de penhora fiscal (bens penhorados em execuções fiscais da União, INSS, Fazenda Nacional, suas autarquias e fundações públicas estão indisponíveis, nos termos do art. 53 da Lei n. 8.212/91[2]) ou da Central de Indisponibilidades, haja vista que, nos termos do artigo 16, caput, do Provimento n. 39/2014 do CNJ, que criou a Central Nacional de Indisponibilidade de Bens- CNIB (http://www.indisponibilidade.org.br), as indisponibilidades averbadas nos termos deste Provimento e as decorrentes do § 1º, do art.53, da Lei n. 8.212/91 não impedem:1-) a inscrição de constrições judiciais (como também já constava no artigo 22 do Provimento n. 13/2012 da CGJ/SP); 2-) o registro da alienação judicial do imóvel desde que (restrição imposta pelo provimento do CNJ[3]): a-) a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade, ou do juízo da distribuição do inquérito civil público ou do juízo da posterior ação desse decorrente; OU b-) consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução.Parece não ser razoável distinguir a indisponibilidade averbada “nos termos deste Provimento” e as indisponibilidades anteriores. S.m.j., o art. 16 do Provimento n. 39/2014 do CNJ deve aplicar-se a quaisquer indisponibilidades. É importante que a alienação, oneração ou constrição seja judicial, nela subentendia, exclusivamente, a expropriação judicial do bem. As cartas de adjudicação compulsória e os formais de partilha não têm o ingresso autorizado pelo CNJ ou pelas NSCGJ/SP se houver indisponibilidade.
  6. Os registros de venda ou constituição de ônus em imóveis vinculados à cédula de crédito industrial, comercial, à exportação e rural dependem de prévia anuência do credor, por escrito[4].
  7. Imóveis vinculados à cédula industrial, comercial ou à exportação não serão penhorados ou sequestrado por outras dívidas do emitente ou do terceiro que presta a garantia real[5].
  8. Imóvel objeto de hipoteca constituída por cédula de crédito rural não será penhorado, arrestado ou sequestrado por outras dívidas do emitente ou do terceiro hipotecante[6].
  9. Os bens vinculados à Cédula de Produto Rural (CPR) não serão penhorados ou sequestrados por outras dívidas do emitente ou do terceiro prestador da garantia real (art. 18 da Lei n. 8.929/94).
  10. Nos termos do art. 1º do Decreto-lei n. 8.618/46, os imóveis financiados pelos Institutos e Caixas de Aposentadoria se Pensões, de acordo com plano destinado aos seus segurados ou associados, não poderão ser alienados por estes ou por seus herdeiros sem autorização expressa da instituição financiadora.
  11. A formalização de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão relativas a imóvel financiado no Sistema Financeiro da Habitação (SFH), dar-se-á em ato concomitante à transferência do financiamento respectivo, com a interveniência obrigatória da instituição financiadora (parágrafo único do art. 1º da Lei n. 8.004/90). Não pode registrar só a venda ou transmissão do imóvel sem transferência do financiamento e da hipoteca.Imóvel hipotecado no SFH só pode ser transferido por ato de disposição do proprietário mediante anuência do credor hipotecário. Nos termos daApelação cível (CSM/SP) n. 20.8970/9 – Cubatão, “não se tratando de venda, promessa de venda,cessão ou promessa de cessão de imóvel gravado com hipoteca em favor de instituição financeira integrante do Sistema Financeiro da Habitação, inaplicável o art.1º e par. único da Lei federal n. 8.004, de 14.3.90, que modificou a norma contida no art.292 da Lei de Registros Públicos. No caso, cuida-se de partilha em separação judicial, hipótese não contemplada no referido dispositivo de lei”

[…]

Vale lembrar que:

“97. Os registradores de imóveis deverão, antes da prática de qualquer ato de alienação ou oneração, proceder à consulta à base de dados da Central de Indisponibilidade de Bens (item 404 do Cap. XX das NSCGJ/SP). Recomenda-se atenção quanto à verificação de indisponibilidades em nome de cedentes de direitos em inventário e partilha e escrituras de cumprimento de compromisso de venda e compra, especialmente daqueles que não são proprietários tabulares e não irão figurar na tábua registral (ex.:cedente de direitos hereditários, cedente de compromisso de venda e compra não registrado)”- conteúdo constante da Atualização 4.2015 do Manual do RI- Versão Eletrônica[7].

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[1] Luís Ramon Alvares é Substituto do 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de São José dos Campos/SP, idealizador e organizador do Portal do RI- Registro de Imóveis (www.PORTALdoRI.com.br), autor do Manual do Registro de Imóveis, e editor e colunista do Boletim Eletrônico, diário e gratuito, do Portal do RI.

[2] Lei n. 8.212/91:

Art. 53. Na execução judicial da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, será facultado ao exequente indicar bens à penhora, a qual será efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor.

  • 1° Os bens penhorados nos termos deste artigo ficam desde logo indisponíveis.

[3]Art. 22 do Provimento 13/2012 da CGJ/SPc/c item 405 do Cap. XX das NSCGJ/SP: “as indisponibilidades averbadas nos termos deste Provimento e as decorrentes do § 1º, do art. 53, da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a alienação, oneração e constrições judiciais do imóvel.”.

Art. 16 do Provimento n. 39/2014 do CNJ: “As indisponibilidades averbadas nos termos deste Provimento e as decorrentes do § 1º, do art.53, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a inscrição de constrições judiciais, assim como não impedem o registro da alienação judicial do imóvel desde que a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade, ou a que distribuído o inquérito civil público e a posterior ação desse decorrente, ou que consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução.”

[4]Decreto-lei n.413/69– “Art. 51. A venda dos bens vinculados à cédula de crédito industrial depende de prévia anuência do credor, por escrito.”

Lein.6.840/80 – “Art. 5º Aplicam-se à cédula de crédito comercial e à nota de crédito comercial as normas do Decreto-lei n. 413/69 […].”

Lein.6.313/75 – “Art. 3º Serão aplicáveis à cédula de crédito à exportação […] os dispositivos do Decreto-lei n. 413 de 9 de janeiro de 1969 […].”

Decreto-lein.167/67– “Art. 59. A venda de bens apenhados ou hipotecados pela cédula de crédito rural depende de prévia anuência do credor, por escrito.”.

[5] Decreto-lei n. 413/69 – “Art. 57. Os bens vinculados à cédula industrial não serão penhorados ou sequestrados por outras dívidas do emitente ou do terceiro que presta a garantia real […].”.

[6] Decreto-lei n. 167/67 – “Art. 69. Os bens objeto de penhor ou de hipoteca constituídos pela cédula de crédito rural não serão penhorados, arrestados ou sequestrados por outras dívidas do emitente ou do terceiro empenhador ou hipotecante […].”.

[7]Manual do Registro de Imóveis: https://www.portaldori.com.br/manual-do-ri/

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Como citar este artigo: ALVARES, Luís Ramon. RESTRIÇÕES DO IMÓVEL E/OU DAS PESSOAS E O REGISTRO DE IMÓVEIS: ASPECTOS PRÁTICOS. Boletim Eletrônico do Portal do RI nº. 089/2015, de 15/05/2015. Disponível em https://www.portaldori.com.br/2015/05/15/restricoes-do-imovel-eou-das-pessoas-e-o-registro-de-imoveis-aspectos-praticos/

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