ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2142119-86.2019.8.26.0000, da Comarca de São José do Rio Preto, em que são agravantes OSVALDO RAMIM (ESPÓLIO), MARCELINA SANT ANNA RAMIN (ESPÓLIO) e LUCIANE D AGOSTO FREITAS LARRANHAGA (INVENTARIANTE), são agravados MARCELO HENRIQUE DOS SANTOS RAMIN (HERDEIRO) e RAQUEL APARECIDA DIAS RAMIN (HERDEIRO).
ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores EDSON LUIZ DE QUEIROZ (Presidente) E JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO.
São Paulo, 1º de março de 2021.
GALDINO TOLEDO JÚNIOR
Relator
Assinatura Eletrônica
Agravo de Instrumento nº 2142119-86.2019.8.26.0000
Comarca: São José do Rio Preto
Agravantes: Osvaldo Ramim e outros
Agravados: Marcelo Henrique dos Santos Ramin e outra
Voto nº 30.103
INVENTÁRIO – Decisão que determinou a retificação do plano de partilha para incluir o cônjuge sobrevivente como herdeiro – Admissibilidade – Falecida sem descendentes nem ascendentes – De cujus que lavrou testamento beneficiando a agravante, sua sobrinha, com a totalidade dos bens – Irrelevância – Lei vigente ao tempo da abertura da sucessão – Metade do patrimônio da falecida deve ser transmitido ao cônjuge sobrevivente – Herdeiro necessário – Herança que não se confunde com a meação – Inteligência dos artigos 1.787 e 1.829, ambos do Código Civil – Ordem de recolhimento da taxa judiciária com base no valor total dos bens integrantes do montemor, incluída a meação do cônjuge sobrevivente – Irresignação – Acolhimento – Meação do cônjuge sobrevivente que não integra, para quaisquer efeitos, o montemor – Parcela que não está abrangida pelo serviço público a justificar a incidência do tributo – Agravo provido em parte.
1. Cuida-se de agravo de instrumento tirado de decisão que, em autos de inventário, acolheu a impugnação ofertada “para que seja retificado o plano de partilha, de maneira que o cônjuge supérstite seja contemplado com a sua meação, bem como à herança de metade dos bens devidos pelo passamento da de cujus Marcelina Sant’Anna Ramin (imóvel rural matrícula nº 22.881; imóvel urbano matrícula nº 37.262; saldo de conta corrente – R$ 16.365,77; saldo do OUROCAP R$ 1.730,39 e 1/26 do imóvel urbano matrícula nº 22.477)”, bem como corrigiu o valor da causa, determinando o recolhimento da taxa judiciária sobre a totalidade dos bens, afastando a exclusão da meação para tal fim.
Sustenta a inventariante Luciane, em síntese, que é sobrinha de Marcelina Sant’Anna Ramin, que faleceu no dia 14 de abril de 2018 deixando Testamento/Disposição de última vontade sendo o mesmo objeto de Ação de Registro de Testamento, com posterior processo de Arrolamento, Ação de Registro de Testamento, o recolhimento do ITCMD, tudo em perfeita consonância e acordo com o viúvo meeiro Oswado Ramin. Acrescenta que o casal Oswaldo Ramin e Marcelina Sant’anna Ramin era casado sob o regime da comunhão universal de bens e não teve filhos, sendo que era afilhada de ambos cuidou a autora da herança até a sua morte; e logo após permaneceu cuidando do viúvo Sr. Oswaldo Ramin como se seu avô fosse levando-o a médicos até o dia de sua morte, que ocorreu em 27/02/2019, sendo que durante o velório surgiram duas pessoas que se apresentaram como filhos do de cujus e posteriormente interviram no Inventário contestando o Testamento e reclamando a parte da legítima. Defende que o testamento foi feito em 1991, em total consonância com o Código Civil vigente à época, de modo que, diante do regime de bens do casamento, o viúvo não é herdeiro da falecida, mas apenas meeiro (conforme artigo 1.829, I, Código Civil e Enunciado 270 Conselho da Justiça Federal e jurisprudência do STJ), não devendo de forma alguma ser modificado o plano de partilha inicial e incluído o cônjuge como herdeiro, o que daria direito à herança aos dois filhos deste, tidos fora do casamento e que nunca participaram da vida do pai. Pede o provimento do reclamo para que o viúvo Osvaldo seja considerado meeiro e não herdeiro da falecida, e que as custas recaiam sobre a percentagem a ser inventariada e não sobre a totalidade dos imóveis, ou que, caso na eventualidade o viúvo seja considerado herdeiro, que seus herdeiros que fizeram a habilitação no processo sejam os responsáveis por recolher o saldo devedor.
Recurso processado, sem pedido liminar (fls. 28/30). Dispensadas informações. Contraminuta às fls. 43/48 e 54/59, as primeiras pelo parcial provimento do agravo.
2. Comporta parcial acolhida a irresignação, apenas no que toca à base de incidência para o recolhimento da taxa judiciária.
Colhe-se dos autos que a tia da agravante, Marcelina Sant´anna Ramin, faleceu no dia 14/04/2018 (fl. 09) e era casada com Osvaldo Ramin, sob o regime da comunhão universal de bens, em 17/07/1969 (fl. 14).
Marcelina não tinha filhos e lavrou testamento, lavrado no dia 31/10/1991, deixando todos os seus bens para a agravante, sua sobrinha Luciane D´Agosto Freitas (fls. 19/20).
Osvaldo Ramin faleceu durante o processamento do inventário, no dia 27/02/2019 (fl. 89), discordando seu espólio do plano de partilha apresentado, uma vez que Osvaldo deve ser incluído como herdeiro, sendo que ele possui dois filhos unilaterais (fls. 78/88).
No tocante à retificação do plano de partilha, com efeito, deve ser mantida a decisão agravada, uma vez que, nos termos do artigo 1.787, do Código Civil: “Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela”.
Nesse passo, ainda que o testamento tenha sido confeccionado em 1991, deve ser observada a lei que vigorava quando da abertura da sucessão, que, no caso dos autos ocorreu em 14/04/2018, determinando o artigo 1.829 da lei substantiva que inexistentes descendentes e ascendentes, é o cônjuge o herdeiro.
Destarte, in casu , a parte disponível cabe à beneficiária no testamento da falecida (sua sobrinha, ora agravante) e a outra porção deve ser transmitida ao cônjuge sobrevivente, uma vez que, nos termos do artigo 1.845, do diploma legal citado: ”São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge” , devendo ser mantida a decisão agravada, com a retificação do plano de partilha.
Outrossim, num ponto merece reparo a decisão.
No tocante ao recolhimento das custas processuais, anote-se que os bens que compõem a meação do cônjuge sobrevivente lhe pertencem em razão do regime de bens adotado no casamento, não em razão do direito sucessório. Destarte, embora a partilha implique, também, em individualização da meação, o faz como consequência da identificação dos bens que compõem a herança, não integrando, contudo, para quaisquer efeitos, o monte mor objeto do inventário.
Em outros termos, a meação do cônjuge supérstite não constitui patrimônio partível entre os herdeiros, não se justificando a sua inclusão no inventário, que tem por escopo a partilha dos bens transmitidos aos sucessores por ocasião da morte da autora da herança.
A respeito, esclarecem Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira, “Uma coisa é a meação, que decorre do regime de bens e pré-existe ao óbito do outro cônjuge, devendo ser apurada sempre que dissolvida a sociedade conjugal. Diversamente, herança é a parte do patrimônio que pertencia ao cônjuge falecido, transmitindo-se aos seus sucessores legítimos ou testamentários ” (in Inventários e Partilhas, Direito das Sucessões, 19ª edição, págs. 94/95).
Nem mesmo para fins de recolhimento de imposto causa mortis ou taxa judiciária a meação deve ser considerada, conforme entendimento que vem sendo reiteradamente adotado por este Tribunal de Justiça “… a meação do cônjuge sobrevivente, que de modo e em sentido algum pode reputar-se parte da herança, nada tem, a rigor, com o inventário ou arrolamento, de cuja causa não participa como patrimônio considerável, senão para o só efeito de, em atividade jurisdicional de todo em todo secundária, permitir a identificação da porção disponível, quando seja o caso, e do monte partível, este sim, alvo de divisão entre os herdeiros”. O acórdão lembra que “já não é pouco que se paga, como taxa judiciária, com base só nas coisas que eram do defunto”, para concluir, em síntese: “A taxa judiciária, nos inventários e arrolamentos, não é calculada sobre o montemor, quando neste se compreenda meação do cônjuge supérstite, a qual, não constituindo patrimônio do defunto, não entra no conceito de herança ” (AI nº 158.108-4/6-00-SP, da 2ª Câmara de Direito Privado, relatado pelo então Desembargador Cezar Peluso).
Vale anotar, ainda, que a taxa judiciária e custas judiciais constituem, conforme entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, tributos devidos em razão “da prestação de serviço público específico e divisível e que têm como base de cálculo o valor da atividade estatal referida diretamente ao contribuinte “ (ADI 1772 MC, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, j. 15/04/1998).
Por mais essa razão, nos processos de inventário ou arrolamento, a taxa judiciária deve ser calculada sobre o montemor partível, não incluindo neste montante o valor relativo à meação do cônjuge supérstite, pois tal parcela não constitui patrimônio do de cujus e não está abrangida pelo serviço público prestado.
Nesse sentido: “Agravo de Instrumento. Inventário. Valor da causa. Taxa judiciária. Decisão que atribuiu à causa o valor correspondente aos bens a serem partilhados entre os herdeiros, bem como sobre a meação do cônjuge supérstite, determinando o recolhimento da diferença das custas processuais. Inconformismo. Cabimento. Base de cálculo da taxa judiciária. Exclusão da meação do cônjuge supérstite, não abrangida pela prestação de serviço público. Decisão reformada. Agravo provido ” (TJSP, 8ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 2214913-76.2017.8.26.0000, Relator Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho, j. 06.04.2018).
Sendo assim, a par da previsão trazida no artigo 4º, III, §7º, da Lei Estadual nº 11.608/2003, correto o posicionamento da agravante, sendo de rigor a exclusão da meação do cônjuge sobrevivente para fins de recolhimento da taxa judiciária.
3. Ante o exposto, para o fim acima, meu voto dá parcial provimento ao recurso.
Galdino Toledo Júnior
Relator – – /
Dados do processo:
TJSP – Agravo de Instrumento nº 2142119-86.2019.8.26.0000 – São José do Rio Preto – 9ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Galdino Toledo Júnior – DJ 02.03.2021
Fonte: INR Publicações
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias
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