TST: TST mantém nulidade de cláusula que exigia CID em atestados médicos


Por maioria, o colegiado entendeu que a exigência viola a intimidade do empregado

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho manteve a nulidade de cláusula coletiva que previa a obrigatoriedade da informação sobre a Classificação Internacional de Doenças (CID) como requisito para a validade do atestado médico e para o abono de faltas para empregados. Por maioria, os ministros entenderam que a cláusula negociada viola garantias constitucionais.

A decisão foi tomada no julgamento do recurso ordinário interposto à decisão em que o Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA-AP) havia acolhido pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT) de anulação da cláusula do acordo firmado entre o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Alimentação no Estado do Pará e do Amapá e a Mercúrio Alimentos S/A, de Xinguara (PA).

Ética e privacidade

Na ação anulatória, o MPT sustentava que o conteúdo do atestado emitido por médico legalmente habilitado tem presunção de veracidade para a comprovação a que se destina e só pode ser recusado em caso de discordância fundamentada por médico ou perito. Ainda de acordo com a argumentação, o médico somente deve informar o CID por solicitação do paciente. Assim, a exigência da informação transgride os princípios de proteção ao trabalhador, viola as normas de ética médica e o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem.

Sigilo médico

Ao acolher a ação anulatória, o TRT entendeu que a cláusula coletiva contrariava duas resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM): a Resolução 1.658/2002, que trata da presunção de veracidade do atestado e da necessidade de anuência do paciente para a informação do CID, e a Resolução 1.819/2007, que veda ao médico o preenchimento dos campos referentes ao CID nas guias de consulta e solicitação de exames das operadoras de planos de saúde. Segundo o TRT, “o sigilo na relação médico-paciente é um direito inalienável do paciente, cabendo ao médico a sua proteção e guarda”.

No julgamento do recurso ordinário interposto pelo sindicato, a relatora, ministra Kátia Magalhães Arruda, reconheceu a importância de o empregador ter conhecimento do estado de saúde do empregado, mas ressaltou que a exigência do CID como condição para a validade dos atestados em norma coletiva fere direitos fundamentais. Segundo ela, a imposição constitucional de reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho “não concede liberdade negocial absoluta para os sujeitos coletivos, que devem sempre respeitar certos parâmetros protetivos das relações de trabalho e do próprio trabalhador”.

Direito

A ministra lembrou ainda que a ausência justificada ao trabalho por motivo de doença é um direito do empregado, nos termos do artigo 6º, parágrafo 1º, alínea “f”, da Lei 605/1949. “A exigência do diagnóstico codificado nos atestados médicos, estabelecida por norma coletiva, obriga o trabalhador a divulgar informações acerca de seu estado de saúde sempre que exercer o seu direito de justificar a ausência no trabalho nessas circunstâncias”, observou.

Para a relatora, o conflito não é entre a norma coletiva e as resoluções do CFM, mas entre a norma coletiva e os preceitos constitucionais que protegem a intimidade e a privacidade dos trabalhadores.

Histórico

A relatora destacou em seu voto que a SDC entendia que a exigência do CID para justificar faltas e atrasos, por si só, violava o direito fundamental à intimidade e à privacidade. Entretanto, em 2015, no julgamento do RO-480-32.2014.5.12.0000, pelo voto prevalente da Presidência, o colegiado decidiu de forma diversa. Naquela ocasião, em que a ministra ficou vencida, a SDC havia entendido que o empregador deve ter conhecimento da doença que acomete o empregado para saber se ela inviabiliza o tipo de atividade desempenhada por ele.

No novo exame da matéria, a relatora reiterou seu entendimento e foi seguida pela maioria. Ficaram vencidos os ministros Ives Gandra Filho e Caputo Bastos e a ministra Dora Maria da Costa.

(RR/CF)

Processo: RO-213-66.2017.5.08.0000

Fonte: TST

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.




STJ: Anormalidade institucional na Venezuela justifica dispensa de exigências para obtenção de documento


Situações de anormalidade institucional em país estrangeiro, que permitam presumir dificuldade ou inviabilidade de obter documentos ou informações necessárias para o prosseguimento de uma ação no Brasil, justificam flexibilizar a regra segundo a qual é dever da parte atender às exigências de órgãos públicos para a obtenção de documentos.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso para possibilitar que a Receita Federal, em caráter excepcional, emita o CPF de uma brasileira que morou por 40 anos na Venezuela e lá faleceu.

Conforme a decisão, o juízo de primeira instância deverá solicitar das autoridades venezuelanas todos os documentos pela via da cooperação jurídica internacional. Na ausência de resposta no prazo de 120 dias, o juízo deverá expedir ofício à Receita Federal determinando a emissão do CPF, tendo como base a autenticação dos documentos estrangeiros feita pelo advogado do inventário.

O recurso chegou ao STJ ante a impossibilidade de os familiares obterem a autenticação dos documentos necessários para a emissão do CPF em nome da falecida. A ausência dos documentos impediu o andamento da ação de inventário, e a dispensa da exigência foi negada em primeira e segunda instâncias.

Segundo o processo, a brasileira foi casada com cidadão venezuelano, é herdeira de imóvel no Brasil e não possuía CPF, documento indispensável para a expedição de certidões negativas de débito exigidas para a tramitação do inventário.

Anormalidade

A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, disse que, em se tratando de situação de “excepcional e induvidosa anormalidade”, é preciso haver a necessária sensibilidade e flexibilidade na interpretação das regras jurídicas, “a fim de que o processo não seja um fim em si mesmo, mas que efetivamente sirva ao seu propósito: a realização do direito material”.

A ministra ressaltou que, em uma situação de regular funcionamento das instituições, é evidente que os recorrentes deveriam ser responsáveis pela obtenção dos documentos necessários para o inventário. Entretanto, Nancy Andrighi afirmou que é necessário contextualizar a situação vivida.

“É preciso estabelecer, como premissa, o fato de que a Venezuela se encontra em uma situação de anormalidade institucional, fato que é público, notório e indiscutível, o que torna absolutamente verossímil a versão apresentada pelos recorrentes, no sentido de ser impossível a obtenção da declaração de autenticidade dos documentos indispensáveis ao prosseguimento da ação de inventário do imóvel situado no Brasil.”

Situação paradoxal

Impedir uma interpretação histórico-evolutiva das normas, de acordo com a relatora, produziria uma situação paradoxal no caso, já que os documentos declarados autênticos pelo advogado serviriam para resolver questões de fato e de direito na ação do inventário, mas não seriam suficientes para a simples emissão do CPF da autora da herança.

“É preciso reconhecer, pois, que há uma nítida migração, cada vez mais acentuada e rápida, no sentido de se abandonar a mentalidade cartorial e os arraigados anacronismos, com o contínuo – e aparentemente irrefreável – movimento de desapego da forma em prol da materialização do conteúdo”, comentou Nancy Andrighi ao relatar o clamor social pela desburocratização de procedimentos e pelo afastamento de exigências desnecessárias que podem “até mesmo inviabilizar o regular e tempestivo exercício de direitos, de liberdades e de garantias”.

Leia o acórdão.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1782025

Fonte: STJ

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.