IBDFAM: Superior Tribunal de Justiça nega troca de curatela por tomada de decisão apoiada.


Um homem que pretendia trocar a curatela pela tomada de decisão apoiada, a TDA, teve recurso negado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ por não comprovar que houve melhora da condição de saúde do interditado.

O caso teve origem em ação ajuizada pelo curatelado, representado pelo filho. O requerimento foi negado em primeiro grau e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, pois a prova pericial produzida no processo demonstrava que as razões da curatela ainda persistiam.

De acordo com informações do STJ, o homem sofreu um acidente vascular cerebral em 2015 e, por conta dos desdobramentos disso, foi interditado no ano seguinte, sob curatela quanto à prática de atos negociais e patrimoniais.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, destacou que, para a revogação da interdição e curatela, é necessário que as circunstâncias que justificaram essas medidas tenham desaparecido ou diminuído.

Ela explicou que o encerramento da curatela pode levar ao reconhecimento da capacidade da pessoa para realizar atos da vida civil ou, se houver melhora significativa, à adoção de uma medida menos restritiva. Contudo, no caso em questão, o pedido foi feito formalmente pelo filho do interditado, que não conseguiu contratar um advogado devido às limitações impostas pela curatela.

A ministra ressaltou que não é possível saber se o interditado realmente deseja ter apoiadores e se seu filho é a pessoa mais indicada para essa função. Ela afirmou que não se pode implementar a tomada de decisão apoiada de forma compulsória sem considerar os interesses do beneficiado.

Além disso, foi observado que, apesar da condição de saúde do interditado permitir a possibilidade de TDA, a sentença e o acórdão do TJSP indicaram que não houve evolução no quadro clínico dele, que apresenta limitações não apenas motoras, mas também mentais.

Direito à autonomia

A tomada de decisão apoiada foi introduzida no Brasil pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, que segue as diretrizes da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD, segundo a qual os Estados devem substituir modelos que restringem a capacidade jurídica das pessoas com deficiência, como a interdição e a curatela, por alternativas que respeitem sua autonomia e direito à autodeterminação.

“A tomada de decisão apoiada não é propriamente uma alternativa à curatela, pois esta, segundo o art. 12 da CDPD, sequer deveria subsistir nos ordenamentos jurídicos dos Estados signatários. De toda sorte, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, a curatela, além de ter sofrido limitação em seu alcance objetivo, passou a ser medida excepcional, uma espécie de ultima ratio que só pode ser aplicada se os mecanismos de apoio mostrarem-se insuficientes para o caso concreto. E, mesmo diante da aplicação da curatela, devem ser preservadas a vontade e as preferências do curatelado”, explica o promotor de Justiça Fernando Gaburri, presidente da Comissão de Promotores de Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

Segundo ele, o modelo biopsicossocial da deficiência, adotado pelo Estatuto, não se restringe à análise médica da condição da pessoa, mas também considera barreiras sociais que limitam sua participação na sociedade. Para o especialista, esse modelo reforça a ideia de que a curatela deve ser uma medida excepcional e proporcional, aplicada apenas quando realmente for necessária.

“Se a curatela é medida excepcional, o ônus da prova deveria correr contra a permanência do estado de curatela, e não contra o curatelado. Partindo do pressuposto de que a decisão do STJ baseou-se na falta de provas da evolução clínica do curatelado, parece ter havido uma equivocada distribuição do ônus da prova, quando ao curatelado caberia apenas comprovar que pode exprimir vontade, conforme o disposto nos arts. 4º, III e 1.767, I, do Código Civil”, afirma.

Gaburri destaca que a CDPD adota o critério do respeito à vontade e preferências das pessoas com deficiência. Por outro lado, o promotor acredita que, ao exigir prova da evolução clínica do paciente, a decisão parece ter adotado o critério do melhor interesse.

“A tomada de decisão apoiada é um mecanismo formal de apoio que preserva a capacidade da pessoa com deficiência e a coloca como protagonista na tomada de decisões, sejam de natureza patrimonial ou negocial, sejam de natureza existencial. Enquanto que na tomada de decisão apoiada o apoiador é um coadjuvante, na curatela, o curador substitui pela sua, a vontade do curatelado”, analisa.

Formas de manifestação de vontade

O especialista pontua que, além da embriaguez, do vício em substâncias e da prodigalidade, a incapacidade relativa de uma pessoa maior de idade pode ser decretada se ela não conseguir expressar sua vontade. No entanto, ele ressalta que existem diversas formas de manifestação de vontade que vão além da fala e da escrita.

“O Estatuto da Pessoa com Deficiência reconhece essa diversidade ao prever, durante o processo de curatela, o uso de tecnologias assistivas e intérpretes, assim como a participação de uma equipe multidisciplinar. Esses recursos ajudam a garantir que a pessoa sob curatela possa se comunicar e expressar suas intenções de maneira efetiva. Assim, o Estatuto busca promover a autonomia e a inclusão das pessoas com deficiência, assegurando que suas vozes sejam ouvidas e respeitadas no processo de tomada de decisões que envolvem suas vidas”, aponta.

Ele destaca que a legislação atual prevê que a deficiência, por si só, não interfere na capacidade jurídica da pessoa, além de prever uma gama de apoios, informais e formais, para facilitar a expressão da vontade da pessoa com deficiência.

“Recentemente participei, como fiscal do ordenamento jurídico, de uma audiência em que o curatelando não falava, mas conseguia responder a todas as perguntas da magistrada. Como sou pessoa com deficiência visual e não poderia ver os gestos dele, no momento de perguntar, nomeei a magistrada como minha intérprete juramentada e ela me descrevia todos os gestos com os quais o curatelando respondia às minhas perguntas. Não caberia a mim limitar a linguagem falada como a única forma válida de expressão da vontade, ainda que fosse a maneira mais confortável e segura para emitir parecer ao final da instrução”, conta Fernando Gaburri.

Em sua manifestação, ele conta que emitiu parecer pela improcedência do pedido de decretação de curatela, uma vez que a pessoa podia exprimir a sua vontade, embora por meios diversos dos habituais.

“Se o sistema de Justiça considerasse aquela pessoa incapaz só porque sua maneira de viver é diferente da utilizada pela maioria das pessoas, estaria criando mais uma barreira social e estaria sendo preconceituoso, para dizer o mínimo. É necessário conceber o Judiciário como um martelo que quebra barreiras e não como um canteiro de obras que as constrói”, pontua.

Transformação cultural

O especialista defende a necessidade de transformação da formação cultural de acordo com a legislação brasileira, “uma das melhores e mais modernas do mundo”.

“Por que indeferir a conversão da curatela em tomada de decisão apoiada com base apenas em critério médico se o que define a pessoa com deficiência é uma equação um pouco mais complexa que parte da somatória de um impedimento de longo prazo com as barreiras sociais, cujo resultado é o prejuízo no exercício de direitos em situação de igualdade com as demais pessoas?”, questiona.

Para ele, a formação acadêmica e a aprovação em exames são importantes, mas não são suficientes para garantir que os profissionais do Direito sejam verdadeiramente preparados para atuar de maneira eficaz e ética. Gaburri argumenta que o conhecimento técnico é fundamental, mas é igualmente essencial que os profissionais desenvolvam habilidades como empatia, tolerância e respeito à diversidade.

“A prática do direito não se resume apenas à aplicação da lei; envolve compreender as necessidades e realidades das pessoas com quem se trabalha. Profissionais que carecem de empatia podem ter dificuldades em oferecer um serviço jurídico que realmente atenda às demandas da sociedade”, avalia.

Fonte: Instituto Brasileiro de Direito de Família com informações do STJ.

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TRT 2ª Região: Profissional impedida de retornar ao trabalho após alta previdenciária deve ser indenizada.


Sentença proferida na 11ª Vara do Trabalho da Zona Sul-SP condenou empresa de alimentos e bebidas a pagar indenização de R$ 20 mil por danos morais a promotora de vendas que não foi readaptada em novas atividades após o fim do auxílio-doença. Para o magistrado, o fato é considerado impedimento de retorno ao serviço, cabendo a responsabilização da empregadora. A condenação determinou também o pagamento de pensão em parcela única e todos os salários do período da alta previdenciária até a efetiva reintegração ao trabalho.

Em 14/6/2005, a profissional caiu de um banquinho ao abastecer prateleira, lesionando o joelho esquerdo e sofrendo redução de 20% na capacidade laborativa, conforme laudo pericial, que também atestou incapacidade permanente para a função de reposição. Na ocasião, ela passou por duas cirurgias e recebeu auxílio-doença, de 30/9/2005 até 30/11/2023, quando recebeu alta previdenciária.

Apesar de considerada apta pelo médico da Nestlé e para exercer a ocupação de auxiliar administrativo ou qualquer atividade para a qual se julgasse capacitada pelo Programa de Reabilitação do INSS, a mulher foi colocada em situação semelhante ao “limbo previdenciário”, sem salário e sem trabalho. A ré argumentou que a reabilitação pelo INSS não a obrigava a readaptá-la, alegando a “inexistência de vaga compatível com as limitações da trabalhadora na empresa”.

De acordo com o juiz Gustavo Kiyoshi Fujinohara, em relação ao acidente, a ré criou risco ao não disponibilizar equipamento adequado para a profissional alcançar as gôndolas mais altas, agindo com negligência. Lembrou na sentença que, conforme o artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 63 da Lei nº 8.213/91, a alta previdenciária implica a retomada da vigência contratual, tendo o empregado o dever de prestar serviços e o empregador, o de pagar salários.

Ainda, explicou que o fato de o INSS indicar uma função ou qualquer outra para a qual mulher se entendesse capacitada não exime a reclamada do dever de readaptação. Por fim, considerou “gravosa” a conduta da Nestlé, que ficou inerte mesmo estando ativo o contrato entre as partes, indicando “barreira atitudinal” da ré na inclusão de pessoa reabilitada em igualdade de condições com os demais obreiros.

“[…]Inclusão requer a adaptação das condições de trabalho às necessidades individuais da pessoa que se apresenta. Exigir higidez física e mental das pessoas que trabalham configura mais do que a reprodução de preconceitos, configura a discriminação das pessoas reabilitadas da previdência social”, concluiu.

Cabe recurso.

(Processo nº 1000988-86.2024.5.02.0711)

Fonte: Justiça do Trabalho – TRT 2ª Região (SP).

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