Apelação – Ação ordinária – Tributário – Imunidade tributária – ITCMD – Entidade assistencial sem fins lucrativos – Pretensão ao reconhecimento de imunidade tributária referente a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel art. 150, inciso VI, “b”, da Constituição Federal c.c. art. 14 do Código Tributário Nacional – A imunidade conferida às entidades sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais – Precedentes do STF e do STJ – Sentença de procedência mantida – Reexame necessário e recurso improvidos


ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado INSTITUTO ROGACIONISTA SANTO ANIBAL.

ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao apelo e ao reexame necessário. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ENCINAS MANFRÉ (Presidente) e CAMARGO PEREIRA.

São Paulo, 30 de abril de 2019.

MAURÍCIO FIORITO

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053

Apelante: Estado de São Paulo

Apelado: Instituto Rogacionista Santo Anibal

Comarca: São Paulo

Voto nº 15545

APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA – TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – ITCMD – ENTIDADE ASSISTENCIAL SEM FINS LUCRATIVOS – Pretensão ao reconhecimento de imunidade tributária referente a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel art. 150, inciso VI, “b”, da Constituição Federal c.c. art. 14 do Código Tributário Nacional – A imunidade conferida às entidades sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais – Precedentes do STF e do STJ – Sentença de procedência mantida – Reexame necessário e recurso improvidos.

Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação do Estado de São Paulo em face de sentença que, em ação ordinária[1] movida pelo Instituto Rogacionista Santo Anibal, objetivando o reconhecimento de imunidade tributária em relação ao ITCMD incidente sobre imóvel deixado em testamento, julgou procedente o pedido para “o fim de reconhecer a inexistência de relação jurídicotributária entre as partes no que concerne a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel”, e condenar o apelante ao pagamento das custas, despesas e verba honorária de 10% do valor da causa (fls. 140/146).

Pugna o apelante pela reforma do julgado, sustentando, em síntese, que a imunidade tributária é ato vinculado da Administração Pública, concedido se atendidos os requisitos da lei, nos termos dos artigos 146, II, e 150, VI, “c” (fls. 150/163).

O recurso foi respondido (fls. 167/173).

O recurso foi distribuído em 14/05/2018 ao des. Kleber Leyser de Aquino e, em virtude de sua promoção, os autos foram redistribuídos e vieram conclusos a este magistrado em 25/02/2019, de acordo com o despacho proferido pela Presidência de Direito Público deste TJSP publicado em 13/02/2019.

É O RELATÓRIO.

FUNDAMENTO.

A sentença não comporta reparos.

Trata-se de ação ordinária ajuizada pelo Instituto Rogacionista Santo Anibal objetivando o reconhecimento de imunidade tributária de ITCMD sobre imóvel deixado em testamento por Maria Tereza Roque (fls. 42/45).

O artigo 150, inc. VI, alínea “c”, da Constituição Federal estabelece a imunidade da instituição de impostos sobre:

c – patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sociais dos trabalhadores, das instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.

A regulamentação da norma constitucional é feita pelo Código Tributário Nacional, no concernente à limitação da competência tributária, nos seguintes termos:

Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – instituir ou majorar tributos sem que a lei o estabeleça, ressalvado, quanto à majoração, o disposto nos artigos 21, 26 e 65;

II – cobrar imposto sobre o patrimônio e a renda com base em lei posterior à data inicial do exercício financeiro a que corresponda;

III – estabelecer limitações ao tráfego, no território nacional, de pessoas ou mercadorias, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais;

IV – cobrar imposto sobre:

a) o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros;

b) templos de qualquer culto;

c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;

d) papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros.

§ 1º O disposto no inciso IV não exclui a atribuição, por lei, às entidades nele referidas, da condição de responsáveis pelos tributos que lhes caiba reter na fonte, e não as dispensa da prática de atos, previstos em lei, assecuratórios do cumprimento de obrigações tributárias por terceiros.

§ 2º O disposto na alínea a do inciso IV aplica-se, exclusivamente, aos serviços próprios das pessoas jurídicas de direito público a que se refere este artigo, e inerentes aos seus objetivos.

Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:

I não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;

II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.

§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou-se no sentido ‘de que o art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal assegura a imunidade tributária quanto ao patrimônio e renda de entidades de assistência social que não tenham fins lucrativos.’ (ARE 1115724 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 26-06-2018 PUBLIC 27-06-2018).

Ainda: “A imunidade conferida às entidades de educação sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais.” (ARE 933174 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 31/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-122 DIVULG 13-06-2016 PUBLIC 14-06-2016).

Na mesma linha, sedimentou o STJ o entendimento no sentido de que a “A incidência da norma imunizante constante no art. 150, VI c da CF/88 e 9o., IV c do CTN, além dos requisitos do art. 14 do CTN, deve levar em consideração a interpretação teleológica do dispositivo normativo, de modo a alcançar a diretriz hermenêutica que, de maneira firme e exata, salvaguarde, efetive e densifique o princípio, o valor ou a liberdade albergada pelo dispositivo. (…) A imunidade tributária conferida às instituições de assistência social sem fins lucrativos leva em consideração seu propósito elementar de servir à coletividade, colaborando com o Poder Público no exercício de funções precipuamente estatais e suprindo, dessa forma, as deficiências prestacionais.” (AgRg no AREsp 187.172/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 27/02/2014).

A respeito, assevera Leandro Paulsen que “as imunidades genéricas aplicam-se a quaisquer impostos relativos às entidades imunes enquanto organizadas e voltadas ao exercício de suas atividades típicas. Todo rol dos impostos previstos nos arts. 153, 155 e 156 está abrangido, conforme a jurisprudência do STF.” (Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e da Jurisprudência, 16ª Edição, Editora Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2014, p. 243).

Resta claro, portanto, que a imunidade tributária incide sobre o patrimônio, a renda ou serviços das entidades fixadas na norma constitucional, atendidos os requisitos legais, notadamente quanto à vinculação daqueles às suas atividades essenciais.

Pois bem.

De acordo com a documentação trazida aos autos, a entidade é associação civil de caráter assistencial e educacional, sem fins econômicos e lucrativos, e obteve, no âmbito federal, a renovação da certificação de entidade beneficente de assistência social, com validade entre 17 de abril de 2.010 e 16 de abril de 2.015 (fl. 49).

Consta, ainda, de seu estatuto social e de suas demonstrações contáveis dos exercícios de 2015 e 2016, a destinação integral de suas rendas na execução de suas finalidades, sem distribuição de lucros ou vantagens a seus dirigentes (fls. 13; 28; 67/91).

Portanto, a impetrante faz jus à imunidade tributária prevista constitucionalmente, nos termos do art. 150, inc. VI, c, §4º, da CF.

No mais, o fato de o certificado federal de entidade beneficente de assistência social estar expirado – validade de 17/04/2010 a 16/04/2015 à época do requerimento administrativo de imunidade (18/11/2015), não obsta o reconhecimento da imunidade tributária no caso em questão, tendo em vista que a transmissão da herança, segundo o artigo 1784 do Código Civil, ocorre no momento da morte do de cujus (fls. 46/49).

Assim, a aferição dos requisitos legais para o reconhecimento da imunidade deve ser feita na data do falecimento (19/02/2013), momento em que a certificação federal estava vigente, a demonstrar o cumprimento dos requisitos legais.

A respeito, como bem ressaltado na sentença, “considerando que o fato gerador da hipótese tributária tratada nos presentes autos corresponde justamente à transmissão de bem imóvel por meio de sucessão testamentária, revela-se evidente que a aferição dos requisitos necessários ao reconhecimento de eventual imunidade igualmente deve remeter a este mesmo e exato momento” (fl. 144).

Com isso, conclui-se que a entidade comprovou o preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 150, VI, c, da CF/88 e 9º, IV, c, e 14, do CTN, impondo-se o reconhecimento de sua imunidade tributária nos autos do processo de inventário da de cujus Maria Tereza Roque.

Feitas essas considerações, sendo inafastável a imunidade tributária, merece ser mantida integralmente a r. sentença, por seus próprios fundamentos.

DECIDO.

Ante o exposto, e pelo meu voto, nego provimento ao reexame necessário e ao recurso voluntário.

MAURICIO FIORITO

Relator

Notas:

[1] Valor da causa em 04/10/2017: R$ 10.000,00. – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053 – São Paulo – 3ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Maurício Fiorito

Fonte: DJe/SP de 06.05.2019

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STJ: Para Terceira Turma, é possível penhora de bem de família dado em garantia fiduciária


Não é permitido que o devedor ofereça como garantia um imóvel caracterizado como bem de família para depois alegar ao juízo que essa garantia não encontra respaldo legal, solicitando sua exclusão e invocando a impossibilidade de alienação.

A partir desse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de devedores que, após o oferecimento da própria residência como garantia fiduciária, alegaram em juízo que o bem não poderia ser admitido como garantia em virtude da proteção legal ao bem familiar.

Os proprietários do imóvel contrataram um financiamento com a Caixa Econômica Federal (CEF) e colocaram o bem como garantia. Posteriormente, buscaram a declaração de nulidade da alienação incidente sobre o imóvel, por se tratar de bem de família, pedindo que fosse reconhecida sua impenhorabilidade.

A sentença julgou o pedido dos devedores procedente, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) deu provimento à apelação da CEF por considerar que o princípio da boa-fé contratual impede a prática de atividades abusivas que venham a causar prejuízo às partes.

No recurso especial, os donos do imóvel alegaram que a exceção à regra de impenhorabilidade só tem aplicação nas hipóteses de hipoteca, e não na alienação fiduciária.

Ética e boa-fé

Segundo a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, a questão da proteção indiscriminada do bem de família ganha novas luzes “quando confrontada com condutas que vão de encontro à própria ética e à boa-fé, que devem permear todas as relações negociais”.

Ela destacou que a Lei 8.009/1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família, estabelece que o imóvel assim caracterizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, “mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário”.

De acordo com a ministra, a vontade do proprietário é soberana ao colocar o próprio bem de família como garantia.

“Não se pode concluir que o bem de família legal seja inalienável e, por conseguinte, que não possa ser alienado fiduciariamente por seu proprietário, se assim for de sua vontade, nos termos do artigo 22 da Lei 9.514/1997.”

Nancy Andrighi lembrou que ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza, sendo inviável ofertar o bem em garantia para depois informar que tal garantia não encontra respaldo legal. A conduta, segundo a relatora, também não é aceitável devido à vedação ao comportamento contraditório, princípio do direito civil.

De acordo com a relatora, esse entendimento leva à conclusão de que, embora o bem de família seja impenhorável mesmo quando indicado à penhora pelo próprio devedor, a penhora não há de ser anulada “em caso de má-fé calcada em comportamentos contraditórios deste”.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1560562

Fonte: STJ

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