RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. RETIRADA DO SOBRENOME MARITAL. IMPOSSIBILIDADE


10 de Abril de 2019 13:00:00

Apelação Cível n. 0300219-25.2018.8.24.0014

Relator: Des. Paulo Ricardo Bruschi

   APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. RETIRADA DO SOBRENOME MARITAL. IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA EXCEPCIONAL. AUSÊNCIA DE JUSTO MOTIVO. MERO DESINTERESSE NO USO. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO, ERRO DE GRAFIA OU INCÔMODOS SOCIAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300219-25.2018.8.24.0014, da comarca de Campos Novos (2ª Vara Cível) em que é Apelante Liliane Esmerio Raitz Batista.

           A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Gerson Cherem II, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. José Agenor de Aragão.

           Florianópolis, 28 de março de 2019.

Desembargador Paulo Ricardo Bruschi

RELATOR

           RELATÓRIO

           Liliane Esmerio Raitz Batista, devidamente qualificada nos autos e inconformada com a decisão proferida, interpôs Recurso de Apelação, objetivando a reforma da respeitável sentença prolatada pelo MM. Juiz da 2ª Vara Cível, da comarca de Campos Novos, na “Ação de Retificação de Registro Civil” n. 0300219-25.2018.8.24.0014, a qual julgou improcedente o pedido formulado na exordial e, por consequência, condenou-a ao pagamento das custas processuais, suspensa a exigibilidade em razão do benefício da justiça gratuita.

           Na inicial (fls. 01/07), a autora postulou a retificação do seu registro civil no assento de casamento lavrado sob o n. 106575 01 55 2006 2 00007 082 0000851 39.

           Justificou o pedido fundamentando-o no argumento de que contraiu matrimônio com Rômulo Batista na data de 27/05/2006, sendo que por um equívoco da serventia extrajudicial constou como se desejasse utilizar o sobrenome do cônjuge, o que, no entanto, não coincidiria com a realidade, eis que almejava permanecer com o patronímico de solteira.

           Destacou, ainda, ter percebido a incorreção já no ato do casamento, negando-se a assinar o livro registral, todavia em seguida o fazendo, embora até a presente data não tenha modificado seus documentos pessoais, à exceção do título de eleitor, razão pela qual, acrescentando não possuir nenhum título protestado ou responder a qualquer processo criminal, afastando-se, pois, eventual má-fé, pugnou pelo acolhimento da pretensão.

           Postulou, igualmente, a benesse da gratuidade judiciária e juntou documentos (fls. 09/23).

           A decisão de fl. 27 deferiu o benefício.

           O representante do Ministério Público manifestou-se pela improcedência do pleito (fls. 30/31).

           Julgando o feito (fls. 32/34), o douto Magistrado a quo prestou a jurisdição, decidindo pela improcedência do pedido, nos termos do relatado supra.

           Ponderou o insigne prolator que, “vigorando a regra da imutabilidade do nome civil, não demonstrando a requerente razões convincentes para retificação do registro, e não havendo qualquer demonstração de prejuízo em sua atividade social, familiar e pessoal, o pleito de exclusão do sobrenome do marido é motivo de indeferimento do pedido” (fl. 33).

           Irresignada com a prestação jurisdicional efetuada, a demandante tempestivamente apresentou recurso a este Colegiado. Em sua apelação (fls. 38/44), lastrou o pedido de reforma da sentença no argumento de que, embora tenha constado no seu assento de casamento que passaria a utilizar o nome de casada, continuou usando apenas o nome de solteira, o que, por conseguinte, evidenciaria que a intenção sempre foi essa, não havendo, pois, nenhum empecilho ao seu pedido, até porque ausente proibição legal.

           Desse modo, restando comprovado que não pretende fraudar o marido ou terceiros, mas tão somente “usar o nome de solteira, porque é conhecida na sociedade e no trabalho com este nome, entendendo que seu desejo deve ser preservado, pois seu estado psicológico desde o casamento está sendo afetado” (fl. 43), bradou pela procedência da pretensão.

           Ato contínuo, ascenderam os autos a esta Corte.

           A digna Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do eminente Procurador Guido Feuser (fls. 57/59), manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

           Recebo os autos conclusos.

           Este o relatório.

           VOTO

           Objetiva a autora, em sede de apelação, a reforma da sentença que julgou improcedente o pedido de retificação do seu registro civil, nos termos delineados no preâmbulo do relatório.

           Como supedâneo à pretensão recursal, a insurgente sustentou que jamais teve a intenção de utilizar o sobrenome do marido, externando, desde o casamento, o desejo de permanecer com o nome de solteira, de modo que, inexistindo proibição legal para tanto, pugnou pelo acolhimento do seu pedido.

           Não obstante, em que pesem as razões manejadas, necessária vênia, decidiu com acerto o douto Sentenciante, não havendo se falar, assim, na reforma do decisum.

           Isso porque, ausente no caso em tela a demonstração de que a autora se enquadraria em uma das hipóteses legais em que é permitida a alteração do registro civil.

           A propósito, urge se consigne que, consoante preconiza o art. 16 do Código Civil, “toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome”.

           O §1º do art. 1.565 da Lei n. 10.406/02, a seu turno, estabelece que “qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro”.

           Discorrendo a respeito, Maria Helena Diniz pontua que:

    “[…] Qualquer dos nubentes poderá, se quiser, adotar o sobrenome do outro, bem como, se o desejar, conquanto casado, conservar seu nome de solteiro (CC, art. 1.565, §1º). Todavia, não lhe é permitido, ao casar-se tomar o patronímico de seu consorte, abandonando o próprio, uma vez que somente está autorizado legalmente a acrescentar, optativamente, ao seu o nome de família do outro. Um dos cônjuges não poderá impor ao outro a adoção de seu sobrenome; há liberdade de opção, ficando a critério do interessado acrescentar ou não o sobrenome do outro cônjuge ao seu. Se preferir continuar só com os apelidos de sua família, esse fato em nada afetará os direitos e deveres conjugais. Essa adoção de nome deve ser compreendida como expressão da comunhão de vida (CC, art. 1.511) ou da transfusão das almas dos cônjuges […]”(Código Civil anotado – 15. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1.096).

           Partindo de tais premissas legais e doutrinárias, denota-se que a legislação civil afeta ao tema condicionou a uma vontade própria dos nubentes a possibilidade de inclusão do patronímico do outro, não havendo, portanto, obrigatoriedade para que assim o fizessem, silenciando a norma, todavia, com relação à situação inversa, ou seja, quanto ao caso de uma das partes não querer mais fazer uso do sobrenome do cônjuge.

           Assim, em casos tais, aplica-se o estatuído nos arts. 56 e 57 da Lei n. 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), assim vazados, in verbis:

    Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.

    Art. 57.  A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei (grifou-se).

           Tecendo comentário a respeito, Walter Ceneviva esmiúça que:

    […] O CC/02 permite que um dos nubentes, querendo, mas sem reciprocidade, acrescente ao seu o sobrenome do outro. Está revogada a alternativa que a LRP admitiu apenas para a mulher. Na forma do art. 56 a mudança será acolhida no assento matrimonial para qualquer dos nubentes.

    O art. 57 autoriza o interessado a alterar o prenome, mas a mudança será admitida:

    A) excepcionalmente;

    B) com os motivos que a justificam denunciados ao juiz competente, com clareza e extensão;

    C) ouvido o Ministério Público, que se manifestará sobre o enquadramento do pedido, no art. 57. Este se refere apenas ao nome, não envolvendo o prenome. Todavia, aceitos acréscimos, tem-se em sentido amplo modificação até do prenome. Este é o entendimento cabível para ajuste à linguagem do CC/02 (art. 16).

    A lei limitou a mutabilidade de modo não absoluto. Pode ocorrer por vontade do interessado (por exemplo, a adoção, por um dos cônjuges, no ato do casamento, de sobrenome do outro) ou por sentença, isto é, por ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa. A modificação por provocação do interessado não se confunde com a mudança legal, pela adoção ou pela renúncia do cônjuge separado judicialmente aos sobrenomes do outro.

    Nada impede que se abra exceção ao art. 57 da LRP, quando a pessoa interessada sempre foi conhecida pelo nome que deseja adotar. Nesse sentido, mais liberal, tem-se orientado a jurisprudência, desde que cabalmente satisfeita a prova quanto ao nome pelo qual o interessado é conhecido no seu meio social e que, por isso, quer acrescentar ao prenome registrado. Nessa hipótese, a mudança pura e simples do prenome é inviável, permitido, entretanto, o acréscimo do nome pelo qual o chamam os que o conhecem […] (Lei dos Registros Públicos comentada – 18 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva: 2008, ps. 144/146).

           In casu, ao que se dessome do processado, Liliane Esmerio Raitz Batista, por livre e espontânea vontade, aderiu ao nome do seu cônjuge Rômulo Batista na ocasião em que celebraram matrimônio, mais especificamente na data de 27/06/2006 (fl. 09).

           E, convém registrar, embora permitida a retirada do patronímico do cônjuge no caso de extinção da sociedade conjugal (vide arts. 1.571, §2º, e 1.578, §2º, ambos do Código Civil), ou em situação excepcional, nos termos dispostos no art. 57 da Lei de Registros Públicos, constata-se não ser esta a hipótese dos autos, na medida em que a postulante lastrou seu pedido, apenas, na intenção de permanecer usando o nome de solteira.

           Como visto, não houve qualquer menção ao fato de o seu sobrenome expô-la ao ridículo ou vexame, causando-lhe constrangimento (art. 55, parágrafo único, da Lei n. 6.015/73), tampouco indicativo de que conteria algum erro gráfico (art. 100, I, da referida norma), situações que, via de regra, fundamentam pedidos similares.

           Demais disso, ressalta-se, não houve qualquer indício de eventual prejuízo à requerente no seu convívio social, acrescentando-se que embora a apelante tenha sustentado que é pela antiga identificação que seria conhecida na sociedade e no trabalho (fl. 43), não há nenhuma prova específica nesse sentido, senão os documentos pessoais que, por desídia sua, apenas, deixou de atualizar para o nome de casada.

           Conclui-se, inclusive, que se houvesse efetivo prejuízo às suas relações pessoais e profissionais, a demandante não teria aguardado aproximadamente 12 (doze) anos após o enlace matrimonial para ingressar em juízo pleiteando a retificação, de modo que, com isso, induziu ao entendimento de que mantém uma vida social regular, sem qualquer intercorrência relevante a ponto de motivar a modificação do registro civil mencionado.

           Aliás, outra não foi a manifestação do representante do Parquet no Primeiro Grau, reafirmada, frise-se, nesta Segunda Instância. Veja-se (fl. 30):

    […] Deflui-se dos autos que a requerente, por livre e espontânea vontade, optou por adotar o nome do seu cônjuge. Não pode agora, imbuída de mero capricho e mera conveniência, querer suprimir o patronímico de seu esposo. Aliás, a requerente estava ciente de que no seu nome constaria o patronímico do seu marido, tanto que alegou interesse em deixar de assinar o matrimônio por essa razão. Contudo, a partir do instante que o matrimônio foi efetivado, ela, automaticamente, anuiu a inclusão do sobrenome referido.

           Neste compasso, necessária vênia, mostra-se inviável o acolhimento da pretensão formulada, mantendo-se hígida a decisão que julgou improcedente a retificação registral.

           A propósito, essa Corte de Justiça já decidiu em casos análogos:

    1) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL.SUPRESSÃO DO SOBRENOME DA ESPOSA NA VIGÊNCIA DO VÍNCULO CONJUGAL. ALEGAÇÃO DE ARREPENDIMENTO. FALTA DE JUSTO MOTIVO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE A ALTERAÇÃO NÃO CAUSARÁ PREJUÍZO A TERCEIROS. RECURSO DESPROVIDO.

    No caso em tela, o Apelante, mesmo na vigência de seu casamento, pretende retornar ao seu nome de solteiro após, aproximadamente, 9 anos de alteração, sob os fundamentos de se arrepender do acréscimo feito, vez que, em razão disto, perdeu sua identidade familiar e vem sofrendo desconfortos.

    Todavia, o arrependimento e o transtorno decorrente da alteração do nome, mormente após transcorrido cerca de nove anos desde o casamento e a o consequente acréscimo do sobrenome de sua cônjuge, não constitui motivo relevante para a autorização da medida […] (Apelação Cível n. 0300132-42.2016.8.24.0175, de Meleiro, Relator: Des. Joel Dias Figueira Júnior, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 24/01/2019).

    2) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. ALTERAÇÃO DO REGISTRO DE CASAMENTO. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM.  PRETENSA EXCLUSÃO DO SOBRENOME MARITAL. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, ERRO MATERIAL OU SITUAÇÃO VEXATÓRIA DECORRENTE DO ASSENTAMENTO. MERO DESCONTENTAMENTO IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO. PRINCÍPIO DA IMUTABILIDADE. EXCEPCIONALIDADE NÃO VERIFICADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

    […] Compulsando-se os documentos colacionados, aos autos apura-se que, embora possua documentos ainda com o nome de solteira (fls. 10-16), tal como haja a expressa concordância de seu marido (fl. 17), a inclusão do sobrenome marital “Mistro” no registro civil da apelante deu-se em 23-10-1997 (fl. 8) – há aproximados 18 (dezoito) anos.

    Não obstante a inclusão do sobrenome do cônjuge seja uma faculdade dada aos cônjuges, bem como a jurisprudência pátria venha admitindo em determinados casos a relativização do princípio do imutabilidade do nome, no caso sub judice, a alteração do assentamento da apelada reputa-se totalmente descabida.

    Isso pois, a retificação do registro civil não pode ser utilizada para simples adequação do nome, haja vista que possui aplicação limitada aos casos de omissão, erro material ou de inclusão do assentado em manifesta situação vexatória, o que não ocorre na hipótese vertente (TJSC, AC n. 0321894-56.2014.8.24.0023, Rel. Des. Fernando Carioni, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 27-6-2017) […] (Apelação Cível n. 0302031-14.2015.8.24.0045, de Palhoça, Relator: Des. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 16/10/2018).

    3) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. PLEITO DE ALTERAÇÃO DO PRENOME DO AUTOR DE ERIVAM THALÍS PARA ERIVAM TCHARLIS. DEMANDA JULGADA IMPROCEDENTE. RECURSO DO REQUERENTE. 1.APELANTE QUE NÃO EVIDENCIA SER CONHECIDO NO MEIO SOCIAL PELO NOME QUE PRETENDE VER EM SEU ASSENTO CIVIL, AINDA, AUSÊNCIA DE PROVA DE OCORRÊNCIA DE EQUÍVOCO NO SEU REGISTRO CIVIL OU DE SIGNIFICATIVOS INCÔMODOS À SUA INDIVIDUALIDADE. GRAFIA DO NOME PRETENDIDO, ADEMAIS, QUE TAMBÉM SE AFIGURA EQUIVOCADA. IMPOSSIBILIDADE DA MUDANÇA PRETENDIDA. 2. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

    “A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabilidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro de grafia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública. Assim, o pedido de retificação de registro civil que não se funda em qualquer dessas hipóteses, não pode ser deferido.” (TJSC, Apelação Cível n. 2009.003897-2, de Caçador, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 17-03-2009) (Apelação Cível n. 2015.067663-0 de Fraiburgo, Relator: Des. Raulino Jacó Brüning, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 19/05/2016).

           Por fim, deixa-se de fixar os honorários advocatícios recursais (art. 85, §§ 1º e 11, do CPC/2015), porquanto o apelo foi interposto contra sentença que não arbitrou verba honorária, em razão da ausência de triangularização processual.

           Ante o exposto, vota-se no sentido de se conhecer do recurso, e negar-lhe provimento, mantendo-se hígida a sentença de Primeiro Grau.

           É como voto.

Fonte: Arpen/SC

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CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida inversa julgada procedente – Escritura pública de compra e venda – Título com prenotação cancelada pelo decurso do prazo de validade, sem que o suscitante o tenha reapresentado para novo protocolo – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido


Apelação n° 1005690-76.2018.8.26.0320

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1005690-76.2018.8.26.0320
Comarca: LIMEIRA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1005690-76.2018.8.26.0320

Registro: 2019.0000197952

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1005690-76.2018.8.26.0320, da Comarca de Limeira, em que são apelantes GERALDO MILANI e ANTONIA FASSIS MILANI, é apelado 2º CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE LIMEIRA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Julgaram a dúvida prejudicada e não conheceram do recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 14 de março de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1005690-76.2018.8.26.0320

Apelantes: Geraldo Milani e Antonia Fassis Milani

Apelado: 2º Cartório de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Limeira

VOTO Nº 37.701

Registro de imóveis – Dúvida inversa julgada procedente – Escritura pública de compra e venda – Título com prenotação cancelada pelo decurso do prazo de validade, sem que o suscitante o tenha reapresentado para novo protocolo – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido.

Trata-se de apelação interposta por Geraldo Milani e Antonia Fassis Milani contra r. sentença que julgou procedente a dúvida inversamente suscitada e manteve a recusa do Sr. 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Limeira em promover o registro de escritura pública de compra e venda do Lote 03 da Quadra “19” do Parque das Nações, objeto da matrícula nº 10.966, em razão da existência de anterior registro de contrato de compromisso de compra e venda celebrado com pessoas que não cederam seus direitos de compromissários em favor dos compradores do imóvel.

Os apelantes alegaram, em suma, que compromissaram comprar o imóvel por contrato particular de 17 de dezembro de 1979 e que receberam a escritura pública de compra e venda em 02 de abril de 1990, ao passo que o contrato de compromisso de compra e venda celebrado pelos proprietários do imóvel com Odécio Miranda Gonçalves e sua mulher foi registrado em 22 de abril de 1981. Asseveraram que as empresas loteadoras encerraram suas atividades há muitos anos. Informaram que não conhecem Odécio e sua mulher, o que impede a celebração do distrato do compromisso de compra e venda, ou a obtenção da cessão dos direitos desses compromissários compradores. Ademais, esse contrato de compromisso de compra e venda perdeu o valor e não impede o registro da escritura pública. Requereram a improcedência da dúvida (fls. 48/51).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 64/66).

É o relatório.

Os apelantes pretendem o registro de escritura de compra e venda do imóvel consistente no Lote 03 da Quadra 19 do Parque das Nações, objeto da matrícula nº 10.966 do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Limeira (fls. 12/16).

Ocorre que a escritura pública foi protocolada em 23 de março de 2018 (fls. 18), mais de trinta dias antes da suscitação da dúvida inversa que foi promovida em 08 de junho de 2018 (fls.19).

E não consta dos autos a notícia da reapresentação do original do título ao registro imobiliário, para novo protocolo, o que não foi suprido quando da manifestação dos recorrentes acerca do exposto pelo Sr. Oficial quanto às exigências formuladas (fls. 22/25 e 33/35), ou por ocasião da interposição do presente recurso.

Contudo, em sua manifestação o Sr. 2º Oficial de Registro de Imóveis de Limeira alertou sobre a necessidade de reapresentação do título para nova prenotação (fls. 23), o que fez em conformidade com o subitem 41.1 e do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça que dispõe:

41.1. Ocorrendo suscitação diretamente pelo interessado (Dúvida Inversa), assim que o Oficial a receber do Juízo para informações, deverá prenotar o título e observar o disposto nas letras “b” e “c” do item 41.

Nota: Suscitada por meio eletrônico, o Juízo dará ciência dos termos e da data da suscitação ao oficial de registro e aguardará a apresentação dos motivos da recusa do registro. O suscitante encaminhará ao registrador a via original do título em cinco dias contados da data do protocolo da dúvida, sob pena de arquivamento. Ao receber o título, o registrador o prenotará, dará recibo ao apresentante e, no prazo de 15 dias, informará ao Juízo se lhe foi apresentada a via original do título dentro do prazo e as razões da recusa.

Se o interessado no registro não tiver advogado constituído, poderá apresentar a petição em meio físico no distribuidor do Fórum, onde será protocolada, digitalizada, e destruída após a formação do processo eletrônico. Os documentos que instruem a petição, o título recusado pelo registrador inclusive, serão apresentados em cópia, não cabendo ao distribuidor esse exame. Distribuída a dúvida, o suscitante encaminhará a via original do título ao registro de imóveis nos termos do parágrafo acima. As petições intermediárias em meio físico serão apresentadas diretamente no Ofício Judicial competente, que a digitalizará e a inserirá no processo eletrônico (grifei)

De outro lado, também nos termos do arts. 203 e 221 da Lei n° 6.015/73 mostra-se indispensável a apresentação da via original do título, e nova prenotação quando já vencida a anterior. Nesse sentido:

“Penhor rural. Penhor agrícola. Cédula rural pignoratícia. Prazo – prorrogação trienal. Dúvida prejudicada título original cópia reprográfica” (Ap. Civ. 1.076-6/5, j. Em 5/5/2009 Rel. Des. Ruy Camilo).

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida inversa – Origem judicial do título que não o isenta de qualificação Ausência, todavia, de título original – Matéria prejudicial – Recurso não conhecido” (Ap. Civ. 1.188-6/6, j. Em 6/10/2009, Rel. Des. Reis Kuntz).

Essa compreensão é pacífica nas decisões administrativas em matéria registral imobiliária, pois “A cópia constitui mero documento e não instrumento formal previsto como idôneo a ter acesso ao registro e tendo em vista uma reavaliação qualificativa do título, vedado o saneamento intercorrente das deficiências da documentação apresentada (…)” (Apelação Cível n° 33.624-0/4, Rel. Des. Márcio Bonilha, j . 12/9/1996).

O D. Desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, Corregedor Geral da Justiça à época, no julgamento da Apelação Cível n° 0011169-71.2015.8.26.0482, j . 16/2/2017, reafirmou essa compreensão:

Preambularmente, cumpre observar que o apelante não acostou, quando da suscitação da dúvida, o original do documento cujo registro se pretende. A providência é de rigor para que, em caso de eventual improcedência, lavre-se o ato notarial. O documento trazido à baila, cópia de contrato particular de doação, não está no rol do art. 221 da Lei 6.015/73. A ausência do título original configura óbice intransponível ao registro e, pois, ao conhecimento da dúvida.

Para o mesmo Norte aponta a sedimentada jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior da Magistratura, consoante Apelação Cível 9000001-98.2015.8.26.0099, julgada em 21/06/2016, por mim relatada, com citação de diversos outros julgados em idêntico sentido:

“Não obstante, o entendimento pacificado no Conselho Superior, há muito, é de que a ausência do instrumento original levado a registro prejudica o exame da questão, por representar um obstáculo intransponível ao registro (Apelação Cível n. 17-6/0 [3] e Apelação Cível n. 7.120-0/9). Nesse sentido, o acórdão proferido na apelação 1076-6/5, de 05 de maio de 2009, Rel. Des. RUY CAMILO: ‘A ausência de requisitos essenciais constituise em matéria prejudicial ao conhecimento do recurso interposto. Com efeito, nenhum título original se encontra acostado aos autos, uma vez que a presente dúvida foi suscitada a partir de mera cópia reprográfica da cédula rural pignoratícia que foi reapresentada pelo banco suscitado, estando inviabilizada assim a sua análise direta por este Conselho Superior da Magistratura'”.

Neste raciocínio, acerca de hipóteses semelhantes sobre a posição firmada, é representativo o V. Acórdão proferido na Apelação Cível n° 43.728-0/7, da Comarca de Batatais, relatado pelo eminente Des. SÉRGIO AUGUSTO NIGRO CONCEIÇÃO:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida inversamente suscitada – Falta do título original e de prenotação – Inadmissibilidade – Prejudicialidade – Recurso não conhecido”.

O texto do julgado faz referência a outro precedente, o qual é categórico: “Pacífica a jurisprudência deste Colendo Conselho Superior da Magistratura no sentido da necessidade de apresentação do título original, como decidido na apelação cível n.° 30.728-0/7, da Comarca de Ribeirão Preto, Relator o Desembargador Márcio Martins Bonilha, nos seguintes termos:

‘Ora, sem a apresentação do título original, não se admite a discussão do quanto mais se venha a deduzir nos autos, porque o registro, em hipótese alguma, poderá ser autorizado, nos termos do artigo 203, II, da Lei 6.015/73. Não é demasiado observar que no tocante à exigência de autenticidade, o requisito da exibição imediata do original diz respeito ao direito obtido com a prenotação do título, direito que não enseja prazo reflexo de saneamento extrajudicial de deficiências da documentação apresentada”‘ (Apelação Cível 9000001-98.2015.8.26.0099, julgada em 21/6/2016, por mim relatada).

“Saliente-se ser tranquilo o entendimento deste Egrégio Colendo Conselho Superior da Magistratura no sentido de que o título deve ser apresentado em seu original e não por cópias. A cópia constitui mero documento e não instrumento formal previsto como idôneo a ter acesso ao registro e tendo em vista uma reavaliação qualificativa do título, vedado o saneamento intercorrente das deficiências da documentação apresentada, sendo imprescindível a exibição de qualquer dos títulos relacionados no mencionado artigo, que tem caráter restritivo, no original.” (Apelação Cível: 17-6/0, j . 11/9/2003, Relator Des. LUIZ TÂMBARA).

Ou seja, imprescindível a apresentação do título original, ao Oficial de Registro de Imóveis, pois eventual procedência do recurso resultaria no pretendido registro, decidindo-se acerca da qualificação registral. Inviável, igualmente, a apresentação posterior do título original, em razão da necessidade de sua qualificação registral em todas as etapas.

Sobre o tema, decidiu este C. Conselho Superior da Magistratura nos embargos de declaração n° 0006849-88.2015.8.26.0510/50000, j . 28/3/2018, em apelação que relatei:

A apelação não foi conhecida em razão de não ter sido apresentada a via original dos títulos cujos registros eram pretendidos.

A juntada dos originais em sede de embargos de não modifica essa situação, pois já realizada a qualificação registrai e analisado o procedimento de dúvida registrai.

Assim, permanece o não conhecimento da dúvida, o que impediria o exame do cabimento do registro.

Esse entendimento tem como fundamento o fato de que todos os títulos ingressaram no protocolo conforme a rigorosa ordem cronológica de apresentação e adquirem preferência para o registro também conforme a ordem de prenotação.

A inexistência de protocolo válido impede que a escritura de compra e venda adquira prioridade para o registro.

E não é possível decidir a dúvida sem protocolo válido porque o que se qualifica é o título efetivamente apresentado para registro e com prioridade sobre eventuais outros representativos de direitos reais contraditórios.

Em razão disso, na forma como suscitada a dúvida adquire natureza meramente consultiva, para o que não se presta.

Nesse cenário, ante a falta de apresentação do título original ao Oficial de Registro de Imóveis, com novo protocolo em razão do decurso do prazo de validade do anteriormente realizado, o presente recurso não comporta conhecimento.

E de acordo com precedentes atuais deste Col. Conselho Superior da Magistratura, ante o não conhecimento do recurso descabe prosseguir com o exame das questões de fundo por ausência de poder vinculativo dessa providência (nesse sentido: Apelação nº 1015740-40.2016.8.26.0577, Apelação nº 1000295-86.2017.8.26.0531 e Apelação nº 1001619-57.2016.8.26.0431).

Ante o exposto, pelo meu voto julgo a dúvida prejudicada e não conheço do recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

Fonte: DJe/SP de 09/04/2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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