Regime de Bens – Separação legal – Único regime de bens vigente no Líbano, onde a recorrente se casou com seu falecido marido – Pretensão de averbação de que bem imóvel adquirido no Brasil, na constância do casamento, é particular – Impossibilidade – Incidência da Súmula nº 377, do STF – Presunção de esforço comum, com a consequente comunicação dos aquestos – Princípio do não enriquecimento ilícito – Possibilidade de se superar tal presunção apenas pela via jurisdicional – Pedido de Providências improcedente – Recurso não provido


Número do processo: 1112223-11.2016.8.26.0100

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 124

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1112223-11.2016.8.26.0100

(124/2017-E)

Regime de Bens – Separação legal – Único regime de bens vigente no Líbano, onde a recorrente se casou com seu falecido marido – Pretensão de averbação de que bem imóvel adquirido no Brasil, na constância do casamento, é particular – Impossibilidade – Incidência da Súmula nº 377, do STF – Presunção de esforço comum, com a consequente comunicação dos aquestos – Princípio do não enriquecimento ilícito – Possibilidade de se superar tal presunção apenas pela via jurisdicional – Pedido de Providências improcedente – Recurso não provido.

Inconformada com a sentença que julgou improcedente pedido de providências, recorre ELIANE SABAGH CHARTOUNI em face da Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital.

Alega, em síntese, que adquiriu, em 31 de agosto de 2011, imóvel matriculado sob número 21.704 e que seu marido veio a falecer em 13 de março de 2013. Pretende obter averbação de que o imóvel se cuida de bem particular, a teor de que foi casada sob regime de separação de bens, por ser o único regime vigente no Líbano, onde se casou com seu falecido marido. Sustenta que o regime da separação de bens é o vigente, consoante disposto no art. 7º, parágrafo 4º, da LINDB e que a Súmula 377. do STF, está superada desde que entrou em vigor o Código Civil de 2002, que não reproduziu o art. 239 do Código de 1916.

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Opino

A recorrente ELIANE SABBAGH demonstrou que o único regime de bens em vigor no Líbano, onde se casou no ano de 1963 com ANTOINE ABI-NADER CHARTOUNI, é o da separação total de bens, consoante declaração do Consulado Geral do Líbano em São Paulo (fls. 9).

Entretanto, tal fato não obsta que se reconheça a comunicabilidade dos bens adquiridos na constância do casamento, consoante entendimento sumulado do E. Supremo Tribunal Federal (Súmula 377). A interpretação da súmula em questão é a de que se visa obstar o enriquecimento sem causa e que os bens adquiridos com esforço comum comunicam-se, ainda que se cuide de casamento sob regime de separação obrigatória de bens.

O imóvel em análise foi adquirido em 2011, ou seja, 48 anos após a celebração do casamento de ELIANE e ANTOINE e apenas dois anos antes do óbito do varão, sendo bastante razoável presumir-se que essa aquisição decorreu do esforço comum do casal.

Nesse sentido, RSTJ 39/413, STJ-RT 691/194, STJ-RF 320/84 e RT 846/256.

Em julgado do E. STJ, da relatoria do em. Min. Aldir Passarinho Jr., tratou-se precisamente da hipótese aqui analisada:

“Apesar de o casamento haver sido contraído pelo regime da separação de bens no exterior, os bens adquiridos na constância da vida comum, quase à totalidade transcorrida no Brasil, devem se comunicar, desde que resultantes do esforço comum. Exclusão, portanto, do patrimônio existente em nome da viúva, obtido pelo labor individual, doação ou herança, incorporando-se os demais ao espólio do cônjuge varão, para partilha e meação, a serem apurados em ação própria” (STJ, REsp n. 123.633, j. 17/03/2009)

O precedente administrativo mencionado pela recorrente cuidou de situação bastante distinta, em que um casal de italianos optou pelo regime da separação de bens, embora vigorasse em seu país o regime legal da comunhão de bens. Consignou-se no douto parecer da lavra da então Juíza Assessora, Dra. Ana Luiza Villa Nova, aprovado pelo então Em. Corregedor Geral de Justiça, Dr. Hamilton Elliot Akel, que o regime da separação de bens resultou de “regular e legal opção dos contraentes, e se trata de negócio jurídico cuja lei brasileira reconhece o valor”. Ademais, consignou-se que a aquisição do imóvel pela virago ocorrera apenas quatro meses após a celebração do casamento, “com clara indicação de não ter sido a aquisição fruto do esforço comum do casal” (Processo CG Nº 2013/168591).

Portanto, o precedente em questão se distancia do caso vertente, na medida em que, ali, reconheceu-se a incomunicabilidade dos bens adquiridos na constância do casamento por ter sido essa uma opção legítima e consciente do casal e não uma circunstância imposta por Lei.

Ao que consta da certidão de transcrição de casamento (fls. 08), o casal radicou-se no Brasil ao menos a partir de fevereiro de 1975, não sendo crível que o imóvel adquirido apenas no ano de 2011, após tantas décadas de casados e de residência neste País, tenha sido adquirido sem qualquer esforço comum do varão.

Não se sustenta a alegação de que tal interpretação violaria o disposto no art. art. 7º, parágrafo 4º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Pelo contrário, com ele se compatibiliza, uma vez que se mantém vigente o regime legal de bens do primeiro domicílio do casal.

Em precedente do C. Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível n. 498-6/3), consignou-se a pertinência de se considerar a interpretação da Súmula 377, do STF na qualificação registral, reconhecendo-se a comunicação dos aquestos em caso de regime de separação legal de bens, inclusive para estrangeiros:

Com efeito, a tendência do Conselho Superior da Magistratura é no sentido de que a matéria pertinente à interpretação da disposição da Súmula n° 377 do Supremo Tribunal Federal deve ser considerada na esfera administrativa da qualificação registrária (e daí na requalificação que se opera no âmbito da dúvida), para reconhecer a presunção de comunicação de bem adquirido, a título oneroso, na constância do casamento, em situação de regime de separação legal (sem pacto antenupcial instituidor da separação pura, total e absoluta, ou prova de que seja produto de sub-rogação de bens anteriores ao enlace), admitindo-se a quebra dessa presunção apenas por decisão proferida pelo juízo competente, no exercício da função jurisdicional: Apelação Cível n° 9.954-0, Comarca de Araraquara, j. 29.05.1989, rel. Des. Álvaro Martiniano de Azevedo; Apelação Cível n° 11.156-0/7, Comarca de Campinas, j. 21.05.1990, rel. Des. Onei Raphael; Apelação Cível n° 029448-0/6, Comarca da Capital, j. 31.05.1996, rel. Des. Márcio Martins Bonilha; Apelação Cível n 083.199.0/4-00, Comarca de Bauru, j. 27.12.2001, rel. Des. Luís de Macedo; Apelação Cível n° 094.159.0/8-00, Comarca da Capital, j. 20.09.2002, rel. Des. Luiz Tâmbara; Apelação Cível n° 000.376.6/7-00, Capital, j. 06.10.2005, rel. Des. José Mário Antônio Cardinale.

(…)

Não se diga que, por se cuidar de casamento ocorrido em Praga (Tchecoslováquia), sob o regime da separação de bens segundo a lei estrangeira, haveria violação ao artigo 7º, §4°, da Lei de Introdução ao Código Civil, ou, ainda, que o caso escaparia à incidência do artigo 259 do Código Civil de 1916 e ao anunciado da Súmula n° 377 do Supremo Tribunal Federal. (grifo nosso)

Ao contrário, conforme ficou bem esclarecido no julgamento da Apelação Cível n° 000.376.6/7-00, Capital, j. 06.10.2005, rel. Des. José Mário Antônio Cardinale, em caso similar ao presente (casamento realizado no exterior, sob o regime legal da separação de bens segundo a lei estrangeira) – quer em atenção aos precedentes históricos que resultaram na Súmula n° 377 do STF (atrelados às situações de estrangeiros, especialmente italianos, consoante doutrina de Silvio Rodrigues, in O Direito na Década de 80, Estudos Jurídicos em Homenagem a Hely Lopes Meirelles), quer em atenção a precedente do Egrégio Supremo Tribunal Federal (RE 78.811-GB, relator Min. Antônio Neder, in RTJ 74/96) –, ‘a tese adotada por esse Conselho no sentido de se adotar na esfera administrativa a Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal como regra, deve também se estender aos casos de estrangeiros casados no exterior sob o regime da separação de bens’.

O fato de o imóvel não ter sido adquirido na vigência do Código Civil de 1916, que dispunha expressamente, em seu art. 259, sobre a comunicação dos aquestos, também não obsta a aplicação da Súmula 377, do STF, uma vez que, como dito, esse entendimento está em consonância com o princípio da vedação do enriquecimento sem causa. Tal princípio, sempre amparado pela Constituição Federal, por ser decorrência lógica de seus princípios e garantias, foi alçado ao patamar de norma jurídica em nosso ordenamento com o advento do Código Civil vigente (art. 884).

Portanto, correta a recusa da Oficial de Registro, podendo, entretanto, ser superada a presunção de comunicação dos aquestos pela via jurisdicional.

Pelas razões expostas, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência, é no sentido de se negar provimento ao recurso, mantendo-se a negativa de averbação de que o imóvel adquirido pela recorrente seria de sua exclusiva propriedade.

Sub censura.

São Paulo, 29 de março de 2017.

Tatiana Magosso

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo, pelas razões expostas, o parecer da MM. Juíza Assessora, para o fim de negar provimento ao recurso. Publique-se. São Paulo, 30 de março de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: HELIO LOBO JUNIOR, OAB/SP 25.120, NARCISO ORLANDI NETO, OAB/SP 191.338 e ANA PAULA MUSCARI LOBO, OAB/SP 182.368.

Diário da Justiça Eletrônico de 25.05.2017

Decisão reproduzida na página 143 do Classificador II – 2017

Fonte: INR Publicações

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Recurso de Apelação – Ação de procedimento comum – Direito administrativo – Ex-preposto de serventia extrajudicial – Pretensão ao reconhecimento e recebimento dos benefícios da licença-prêmio e adicional por tempo de serviço (quinquênio) – Impossibilidade – 1. Inicialmente: a) matéria preliminar, arguida nas razões recursais, relacionada à denunciação à lide, rejeitada; b) a questão preliminar, relacionada à ilegitimidade passiva, confunde-se com o mérito da lide e será apreciada juntamente com a matéria de fundo – 2. No mérito, é induvidoso que o titular da Serventia Extrajudicial não pode ser responsabilizado por eventual passivo de natureza trabalhista, formado pelo antecessor – 3. A atividade notarial e registral, delegada ao particular, pelo Poder Público, nos termos do artigo 236 da CF, é derivada do Estado e, consequentemente, originária – 4. Não há obrigação legal impondo, ao titular, a preservação dos contratos de trabalho celebrados pelo antigo delegatário – 5. Inexistência de qualquer relação jurídica entre as partes litigantes – 6. Ação de procedimento comum, julgada procedente, em Primeiro Grau – 7. Sentença, reformada – 8. Ação, julgada improcedente, invertido o resultado inicial da lide e fixados os ônus decorrentes da sucumbência – 9. Recurso de apelação, apresentado pela parte ré, provido


Recurso de Apelação – Ação de procedimento comum – Direito administrativo – Ex-preposto de serventia extrajudicial – Pretensão ao reconhecimento e recebimento dos benefícios da licença-prêmio e adicional por tempo de serviço (quinquênio) – Impossibilidade – 1. Inicialmente: a) matéria preliminar, arguida nas razões recursais, relacionada à denunciação à lide, rejeitada; b) a questão preliminar, relacionada à ilegitimidade passiva, confunde-se com o mérito da lide e será apreciada juntamente com a matéria de fundo – 2. No mérito, é induvidoso que o titular da Serventia Extrajudicial não pode ser responsabilizado por eventual passivo de natureza trabalhista, formado pelo antecessor – 3. A atividade notarial e registral, delegada ao particular, pelo Poder Público, nos termos do artigo 236 da CF, é derivada do Estado e, consequentemente, originária – 4. Não há obrigação legal impondo, ao titular, a preservação dos contratos de trabalho celebrados pelo antigo delegatário – 5. Inexistência de qualquer relação jurídica entre as partes litigantes – 6. Ação de procedimento comum, julgada procedente, em Primeiro Grau – 7. Sentença, reformada – 8. Ação, julgada improcedente, invertido o resultado inicial da lide e fixados os ônus decorrentes da sucumbência – 9. Recurso de apelação, apresentado pela parte ré, provido. (Nota da Redação INR: ementa oficial)

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação Cível nº 1000974-20.2017.8.26.0553, da Comarca de Santo Anastácio, em que é apelante LUCAS MARTINS DE OLIVEIRA, DELEGADO DO REGISTRO DE IMOVEIS, TITULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURIDICA E TABELIÃO, é apelado WILTON MENDONÇA LÁRIOS.

ACORDAM, em 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U. Sustentou oralmente a dra. EURIDICE BARJUD CANUTO DE ALBUQUERQUE DINIZ.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores MARIA LAURA TAVARES (Presidente sem voto), NOGUEIRA DIEFENTHALER E MARCELO BERTHE.

São Paulo, 18 de março de 2019.

FRANCISCO BIANCO

RELATOR

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº 23579

APELAÇÃO Nº 1000974-20.2017.8.26.0553

COMARCA: Santo Anastácio

APELANTE: Lucas Martins de Oliveira

APELADO: Wilton Mendonça Lários

MM. JUIZ DE DIREITO: Dr. Adriano Camargo Patussi

RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM – DIREITO ADMINISTRATIVO – EX-PREPOSTO DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL – PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO E RECEBIMENTO DOS BENEFÍCIOS DA LICENÇA-PRÊMIO E ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO (QUINQUÊNIO) – IMPOSSIBILIDADE. 1. Inicialmente: a) matéria preliminar, arguida nas razões recursais, relacionada à denunciação à lide, rejeitada; b) a questão preliminar, relacionada à ilegitimidade passiva, confunde-se com o mérito da lide e será apreciada juntamente com a matéria de fundo. 2. No mérito, é induvidoso que o titular da Serventia Extrajudicial não pode ser responsabilizado por eventual passivo de natureza trabalhista, formado pelo antecessor. 3. A atividade notarial e registral, delegada ao particular, pelo Poder Público, nos termos do artigo 236 da CF, é derivada do Estado e, consequentemente, originária. 4. Não há obrigação legal impondo, ao titular, a preservação dos contratos de trabalho celebrados pelo antigo delegatário. 5. Inexistência de qualquer relação jurídica entre as partes litigantes. 6. Ação de procedimento comum, julgada procedente, em Primeiro Grau. 7. Sentença, reformada. 8. Ação, julgada improcedente, invertido o resultado inicial da lide e fixados os ônus decorrentes da sucumbência. 9. Recurso de apelação, apresentado pela parte ré, provido.

Trata-se de recurso de apelação, interposto contra a r. sentença de fls. 103/116, integrada por meio da r. decisão de fls. 125/126, que julgou procedente ação de procedimento comum, para o seguinte: a) reconhecer o direito ao benefício da Licença-Prêmio; a.1) determinar o conversão em pecúnia dos respectivos períodos aquisitivos; b) reconhecer o direito ao Adicional por Tempo de Serviço (Quinquênio); b.1) determinar o pagamento das respectivas diferenças pecuniárias e remuneratórias. Em razão da sucumbência, a parte vencida foi condenada, ainda, ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados no valor de R$1.000,00.

A parte ré, nas razões recursais, sustentou, em resumo, a inversão do resultado inicial da lide.

O recurso de apelação, tempestivo e preparado, foi recebido nos regulares efeitos e respondido.

Por fim, a parte ré manifestou contrariamente ao julgamento do recurso de apelação por meio do sistema virtual (fls. 177).

É o relatório.

O recurso de apelação, apresentado pela parte ré, merece provimento, respeitado, contudo, o entendimento em sentido contrário manifestado pelo Digno Juízo de Primeiro Grau.

Trata-se de ação de procedimento comum, ajuizada por ex-preposto de Serventia Extrajudicial, objetivando o seguinte: a) reconhecimento do direito ao benefício da Licença-Prêmio; a.1) conversão em pecúnia dos respectivos períodos aquisitivos; b) reconhecimento do direito ao Adicional por Tempo de Serviço (Quinquênio); b.1) recebimento das respectivas diferenças pecuniárias e remuneratórias.

Inicialmente, a matéria preliminar, arguida nas razões recursais, relacionada à denunciação à lide, deve ser afastada.

Com efeito. A denunciação à lide, na hipótese dos autos, acarretaria delonga para a solução do processo e tumulto processual, ante o óbito do Oficial Registrador que antecedeu a parte ré. De qualquer forma, na hipótese de eventual derrota na lide, poderá exercer o direito de regresso, por meio de ação autônoma (artigo 125, § 1º, do CPC/15).

Na sequência, a questão relacionada à ilegitimidade passiva, confunde-se com o mérito da lide e será apreciada juntamente com a matéria de fundo.

Superada a matéria preliminar e prejudicial, enfrentasse o mérito da lide.

Pois bem. No mérito, é induvidoso que o titular da Serventia Extrajudicial não pode ser responsabilizado por eventual passivo de natureza trabalhista ou funcional, formado pelo antecessor. Afinal, a atividade notarial e registral, delegada pelo Poder Público ao particular, nos termos do artigo 236 da CF, é derivada do Estado e, consequentemente, originária.

Aliás, é impossível concluir de forma diversa, porquanto a delegação não é outorgada pelo antigo notário ou registrador, ou eventuais sucessores. Ao contrário, é outorgada, repitase, pelo próprio Poder Público.

Assim, tem-se que compete ao titular decidir, além de outros assuntos administrativos, a respeito da contratação dos respectivos prepostos e funcionários. Isso porque, a delegação do referido serviço público, notarial e registral, apresenta características de outorga originária e personalíssima.

Ademais, não há obrigação legal impondo, ao titular, a preservação e a manutenção dos contratos de trabalho celebrados pelo antigo delegatário do serviço público.

Além disso, inexistiu qualquer vínculo ou relação jurídica, inclusive, de natureza contratual ou trabalhista, entre as partes litigantes.

Daí porque, a responsabilidade, civil e trabalhista, deve ser discutida nas vias próprias e direcionada aos antigos delegados, ou, eventualmente, os respectivos sucessores.

Mas, não é só. A realidade dos autos indica, na eventual hipótese de entendimento diverso, que a parte autora não teria direito aos benefícios reclamados na petição inicial.

Os referidos direitos foram postulados, com fundamento no Provimento nº 14/91, da E. Corregedoria Geral da Justiça, deste E. Tribunal de Justiça, revogado por ocasião da vigência da Lei Federal nº 8.935/94.

Desta forma, é impossível o reconhecimento de tais direitos, em favor da parte autora, pois, a referida normatização administrativa vigorou por menos de 5 anos, sem previsão expressa de aplicação retroativa.

Outrossim, confira-se, a propósito da matéria ora debatida, a jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça, a seguir:

APELAÇÃO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. AUXILIAR/ ESCREVENTE EM REGIME ESPECIAL. PEDIDO DE CONVERSÃO EM PECÚNIA DE 360 DIAS RELATIVOS A BLOCOS DE LICENÇAS-PRÊMIO NÃO GOZADOS. Serventuário admitido antes da CF/88 e não optante pelo regime celetista quando da vigência da Lei nº 8.935/1994, que busca receber indenização do atual titular da delegação. Inadmissibilidade. Delegação do serviço notarial ou registral originária e personalíssima, mediante concurso público, sem qualquer vínculo com o anterior responsável. Inexistência do dever de assumir as obrigações trabalhistas do antigo titular. Doutrina firme no sentido da ausência de sucessão da responsabilidade fiscal e trabalhista pelo novo titular de serventia extrajudicial. Precedentes. RECURSO NÃO PROVIDO.”

(Apelação nº 1047340-71.2016.8.26.0224; Rel. o Des. Alves Braga Junior; E. 2ª Câmara de Direito Público; Julgado em 9.10.18; destaques acrescidos)

SERVENTIA EXTRAJUDICIAL – Aposentadoria – Pagamento de verbas indenizatórias decorrentes da rescisão irregular de contrato de trabalho, nos termos da Portaria CG nº 11/73, quinquênios, licença-prêmio e danos morais – Promulgação da Lei nº 8.935/94 que, nos termos de parecer da Corregedoria Geral elaborado no Processo CG nº 2428/2001, revogou os regramentos administrativos anterioresInaplicabilidade ao caso dos autos dos Provimentos CG nº 14/91 e da Portaria CG nº 11/73 – Verbas rescisórias indevidas – Direito ao pagamento dos valores correspondentes ao 4º e 5º adicionais temporais quinquenais, respeitada a prescrição das parcelas. – Licença-prêmio limitada ao período posterior à Constituição Federal de 1988 – Recurso do réu parcialmente provido e recurso da autora não provido.”

(Apelação nº 1006204-27.2014.8.26.0269; Rel. o Des. Aliende Ribeiro; E. 1ª Câmara de Direito Público; Julgado em 5.7.16; destaques acrescidos)

FUNCIONÁRIO DE CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL LICENÇA PRÊMIO E QUINQUÊNIOS. Competência da Justiça Estadual. Precedentes. Autor que se aposentou dois anos antes de o réu assumir a delegação. Vínculo de trabalho rompido. Solução de continuidade verificada. Inexistência de dever de assumir as obrigações trabalhistas do antigo titular. Delegação do serviço que se dá de forma originária. Preliminares afastadas. Improcedência da ação Recurso provido.”

(Apelação nº 1006461-55.2013.8.26.0053; Rel. o Des. Moacir Peres; E. 7ª Câmara de Direito Público; Julgado em 25.8.14; destaques acrescidos)

APELAÇÃO – SERVENTIA EXTRAJUDICIAL – ESCREVENTES E AUXILIARES EM REGIME ESPECIAL – VERBAS RESCISÓRIAS E INDENIZAÇÃO – Serventuário admitido na serventia antes da CF/88 e não optante pelo regime celetista – Art. 48, § 2º, da Lei nº 8.935/1994 – Não recepção pela atual titular da delegação – Ausência de vínculo laboral com a nova titular – Sentença de improcedência. CERCEAMENTO DE DEFESA – Inocorrência – Provas suficientes para a solução da lide. PRESCRIÇÃO – Inocorrência – Não transcurso de três anos entre a dispensa e o ajuizamento – Aplicação do art. 206, § 3º, do CC, por não se tratar de demanda contra a Fazenda Pública. VERBAS RESCISÓRIAS – Descabimento – Serventuário sujeito ao regime especial ou híbrido – Estabilidade inexistente – Possibilidade de dispensa ou não recepção imotivada – Delegação do serviço notarial ou registral é feita de forma originária e personalíssima, mediante concurso público, sem qualquer vínculo com o anterior responsável – Inexistência de vínculo laboral com o novo titular – Solução de continuidade verificada – Inexistência de dever de assumir as obrigações trabalhistas do antigo titular Serventuário que, aliás, assumiu interinamente a delegação, de forma precária, nos dois anos anteriores à investidura da nova titular Inteligência dos arts. 37 e 236 da CF e 19 do ADCT. INDENIZAÇÃO – Descabimento – Provimento nº 14/91 que, além de superada pela posterior edição da Lei Federal nº 8.935/94 e outras normas internas do Tribunal editadas sobre a matéria, extrapolou o âmbito de atuação da Corregedoria Geral de Justiça, a quem não compete fixar indenização por rompimento de vinculo entre serventuário e serventia extrajudicial – Inteligência do Parecer da Corregedoria no Processo nº 2012/41723, de 02/07/2012 – Precedentes. DANOS MORAIS – Inocorrência – HONORÁRIOS – Majoração para 10% do valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC. Sentença de improcedência reforma, em pequena parte, tão somente para majorar a verba honorária – Recurso de apelação do autor improvido e recurso adesivo do patrono da ré provido.”

(Apelação nº 0010048-11.2014.8.26.0266; Rel. o Des. Maurício Fiorito; E. 3º Câmara de Direito Público; Julgado em 14.6.16; v.u.; destaques acrescidos)

Portanto, a improcedência da ação de procedimento comum é de absoluto rigor, invertido o resultado inicial da lide.

Finalmente, em razão da sucumbência, arcará a parte autora com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados, por equidade, no valor de R$1.500,00, atento ao disposto no artigo 85, § 8º, do CPC/15, sem que isso implique, note-se, na inobservância dos parâmetros contidos nas alíneas do § 2º do mesmo dispositivo legal. Frise-se que o referido montante remunera com dignidade, razoabilidade e moderação o trabalho do profissional que participou da lide.

Ante o exposto, SE PROVIMENTO ao recurso de apelação, apresentado pela parte ré, para os fins acima especificados.

FRANCISCO BIANCO

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1000974-20.2017.8.26.0553 – Santo Anastácio – 5ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Francisco Bianco

Fonte: DJe/SP 01/04/2019

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