Registro de Imóveis – Pedido de providências – Pretensão de averbação de cancelamento de cláusulas restritivas incluídas por força de escritura pública de doação – Impossibilidade – Necessidade de prévia alteração do contrato de doação – Pedido de providências rejeitado – Recurso não provido.


Número do processo: 1126499-47.2016.8.26.0100

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 299

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1126499-47.2016.8.26.0100

(299/2017-E)

Registro de Imóveis – Pedido de providências – Pretensão de averbação de cancelamento de cláusulas restritivas incluídas por força de escritura pública de doação – Impossibilidade – Necessidade de prévia alteração do contrato de doação – Pedido de providências rejeitado – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso inominado interposto por Marcos Sayeg em face de sentença que rejeitou pedido de providências por ele formulado, a teor de que o cancelamento das cláusulas restritivas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade depende de prévia modificação dos termos do contrato de doação que deu origem à inserção dos referidos gravames.

Alega, em síntese, que o instrumento particular firmado por doador e donatário, seria suficiente para cancelamento das cláusulas restritivas impostas por escritura pública de doação, aplicando-se o disposto no art. 250, II, da Lei de Registros Públicos. Sustenta que não se cuida de hipótese de distrato, uma vez que é vontade das partes que a doação permaneça incólume, devendo ser cancelados os efeitos das cláusulas restritivas mediante cancelamento da averbação. Com o cancelamento, não haveria qualquer afronta à segurança jurídica, uma vez que os gravames estariam excluídos do fólio real, não sendo aptos a gerar qualquer efeito.

Parecer da Procuradoria de Justiça, pelo não provimento do recurso.

É o relatório. Opino.

Respeitado o douto entendimento esposado pelo recorrente, razão assiste ao Oficial Registrador.

A doação que beneficiou o recorrente é pura, uma vez que não trouxe em seu bojo encargos que beneficiassem terceiros, ou os doadores, ou a coletividade (CCart. 553).

De qualquer forma, a cláusula por meio da qual se impuseram as restrições à livre disposição do bem doado é parte integrante do contrato de doação e somente a alteração desse contrato poderia implicar exclusão desses gravames e ter por consequência o cancelamento da averbação a eles correspondente.

Ensina Francisco Eduardo Loureiro (in Lei de Registros Públicos Comentada, Ed. Forense, 2014, p. 1.321) que “A Lei (art. 472, do CC), consagra o princípio da atração das formas, dispondo tenha o distrato a mesma forma exigida para o contrato”.

Ora, o cancelamento das cláusulas restritivas que foram estabelecidas no contrato de doação somente poderia se dar mediante modificação do próprio contrato de doação. Tendo sido ele celebrado por escritura pública, é essa a forma a ser adotada para a revisão dos termos do contrato.

A averbação das cláusulas restritivas decorreu do conteúdo do contrato de doação. Portanto, o cancelamento dessa inserção no fólio real somente pode se dar por via da modificação da fonte desses gravames.

Não prospera a alegação de que o simples pedido administrativo de cancelamento bastaria, a exemplo do que ocorre quando se postula o cancelamento de hipoteca, cláusula resolutiva ou usufruto. Isso porque, nessas hipóteses, o interessado formula pedido, instruindo-o com prova de que a causa dessas averbações cessou, seja pela quitação (hipoteca), seja pelo óbito do usufrutuário (usufruto). No caso específico da cláusula resolutiva, como ensina Francisco Loureiro (op. cit., p. 1320), nem sempre a averbação a ela correspondente pode ser cancelada administrativamente:

“Há causas, ainda, que podem ou não comportar pedido de cancelamento direto ao Oficial do Registro de Imóveis. Tome-se por exemplo o implemento de condição resolutiva, a depender da natureza da condição, se comprovável por documento hábil, ou a exigir a investigação de fato externo ou complementar”.

No tocante às cláusulas restritivas integrantes de contrato de doação, a causa de sua averbação somente cessará mediante modificação das cláusulas desse contrato.

Em suma, o parecer que, respeitosamente, submeto a Vossa Excelência, é no sentido de se negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 09 de agosto de 2017.

Tatiana Magosso

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo integralmente o parecer da MM. Juíza Assessora desta Corregedoria Geral da Justiça, negando provimento ao recurso. São Paulo, 11 de agosto de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: MARCOS SAYEG, OAB/SP 298.876 (em causa própria).

Diário da Justiça Eletrônico de 22.09.2017

Decisão reproduzida na página 257 do Classificador II – 2017

Fonte: INR Publicações.

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Ação ordinária – Reparação de danos morais e materiais – Tabelião de notas – Ilegitimidade passiva da Fazenda do Estado de São Paulo reconhecida – A responsabilidade da Fazenda Pública é subsidiária, atuando apenas diante da insolvência da pessoa física, agente do serviço notarial, uma vez que o poder público age como delegante – Recurso provido.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0941568-88.2012.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado VERA LUCIA CATTIS.

ACORDAM, em 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COIMBRA SCHMIDT (Presidente) e MOACIR PERES.

São Paulo, 25 de junho de 2018.

LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Voto nº 15313

Apelação Cível nº 0941568-88.2012.8.26.0506 Comarca de Ribeirão Preto

Apelante: Fazenda Pública do Estado de São Paulo

Apelado: Vera Lucia Cattis

AÇÃO ORDINÁRIA – Reparação de danos morais e materiais – Tabelião de Notas – Ilegitimidade passiva da Fazenda do Estado de São Paulo reconhecida – A responsabilidade da Fazenda Pública é subsidiária, atuando apenas diante da insolvência da pessoa física, agente do serviço notarial, uma vez que o poder público age como delegante – Recurso provido.

Vistos, etc.

Cuida-se de ação de reparação de danos morais e materiais ajuizada por Vera Lúcia Cattis em face de Antonio Carlos Menossi e da Fazenda do Estado de São Paulo, na qual busca a condenação dos requeridos ao pagamento de R$ 729,29, a título de reparação dos danos materiais decorrentes de ato ilícito praticado pelo primeiro requerido. Relata que contratou os serviços dele, à época Tabelião Interino do 3º Cartório de Notas, para lavratura de Escritura Pública de Compra e Venda de Imóvel e registro do documento no 1º Cartório de Registro de Imóveis, pagando por isto. Entretanto, o serviço contratado deixou de ser realizado sob a justificativa de falta de recebimento do valor correspondente, pelo que a autora, vendo-se obrigada a pagar novamente para obter o registro, teve de pedir empréstimos a parentes e amigos. Constatou-se, depois quando o interino repassou o cargo de tabelião para a sucessora que o segundo requerido havia desviado o valor que lhe fora pago mediante recibo. Pede, assim, reparação dos danos morais em razão de ter sido submetida a situações de extremo desconforto e constrangimento por conta do empréstimo contraído.

A ação foi julgada procedente, afastando o magistrado a preliminar de ilegitimidade passiva da Fazenda do Estado, oportunidade na qual, comprovado o fato de que a autora pagou por serviço que não foi realizado, condenou os réus, solidariamente, ao pagamento do valor de R$ 729,29 a título de ressarcimento, e R$ 5.000 a título de reparação dos danos morais sofridos pela autora, tudo no montante de R$5.729,29, valor a ser corrigido monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, desde a data da sentença, incidentes juros de mora, a contar da data do fato, nos termos da Lei Federal nº 11.960/09. Os honorários advocatícios foram fixados em 10% do valor da causa.

Em sede de apelação, a Fazenda do Estado de São Paulo suscita novamente a preliminar de ilegitimidade passiva, ao argumento de que a responsabilidade civil por danos decorrentes de atos de serventia extrajudicial é pessoal, dos notários e oficiais de registro, nos termos da regra do artigo 22 da Lei 8.935/94, argumentando ainda no sentido de que tabelião e oficial de registro sequer podem ser considerados servidores públicos, pois exercem suas atividades, por delegação, em caráter privado, por sua conta e risco. Alega, também, a ausência de demonstração do abalo moral que a autora diz ter experimentado. Requer, por fim, a aplicação da Lei Federal nº 11.960/09.

Foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

Colhe a preliminar de ilegitimidade passiva, suscitada pela Fazenda do Estado de São Paulo.

Injustificável se mostra, no caso em exame, o exercício da pretensão em face da Fazenda Pública do Estado de São Paulo. Aliás, nem mesmo de litisconsórcio necessário se trata, porquanto a responsabilidade da Fazenda Pública é sempre subsidiária, uma vez que age como delegante. A propósito, colhe o escólio de Caio Mario da Silva Pereira:

“A matéria terá de assumir novas conotações, tendo em vista que o art. 236 da CF/88 estabeleceu que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público. (…) A Constituição Federal de 1988 considerou os serviços notariais e de registro exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. A lei regulará as respectivas atividades e disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos serventuários, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário (art. 236). Assim havendo estabelecido, não afastou a responsabilidade do Estado pelas faltas e abusos que cometam os servidores, uma vez que as atividades são exercidas por delegação do Poder Público.” (Responsabilidade Civil, 3ª ed., Forense, RJ, 1992, p. 167 a 172)

A nosso ver, a responsabilidade subsidiária da Fazenda do Estado somente estará configurada no caso da insolvência daquele que exerce o serviço notarial, esgotados seus recursos econômicos, o que bem se compreende, pois, afinal de contas, os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, o que não quer dizer, como registra Rui Stoco, que têm caráter privado (Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial, 2ª ed., editora RT, 1995, p. 342). Assim, esgotadas as forças da pessoa física, Tabelião de Notas, responderá o Estado, mas subsidiariamente apenas.

A competência das Câmaras de Direito Público estabelecese, em tese, tanto ratione materiae quanto ratione personae. E quer se analise a matéria objeto da ação sob o primeiro ou sob o segundo aspecto, forçoso é concluir que a competência em questão seria de uma das Câmaras de Direito Privado, uma vez que não está em discussão aqui matéria de direito público (TJSP, Câmara Especial, Conflito de Competência nº º 0004487-86.2018.8.26.0000, Rel. Des. Renato Genzani Filho, v.u., j. 09/04/2018, e TJSP, 4ª Câmara de Direito Público, Apelação Cível 0017741-04.2010.8.26.0099, Rel. Des. Paulo Barcellos Gatti, v.u., j. 10/04/2017). Ocorre que somente a Fazenda do Estado apelou, tratando-se apenas de afastá-la da relação jurídico-processual, e nada mais.

Nestes termos, dou provimento ao recurso, julgando extinto o feito, sem resolução do mérito, em relação à Fazenda do Estado de São Paulo, nos termos do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil. Em consequência, inverto os ônus da sucumbência, ao tempo em que fixo os honorários advocatícios em R$ 1.500,00, na forma do artigo 85, §8º, do Código de Processo Civil, mas observada a regra do artigo 98, §3º.

Para fins de acesso aos Egrégios Tribunais Superiores, ficam expressamente pré-questionados todos os artigos legais e constitucionais mencionados pelos litigantes.

LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA

Relator

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 0941568-88.2012.8.26.0506 – Ribeirão Preto – 7ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Luiz Sergio Fernandes de Souza – DJ 02.07.2018

Fonte: INR Publicações.

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