Registro de Imóveis – Pedido de cancelamento de loteamento regularizado pela municipalidade e devidamente inscrito – Artigo 23 da Lei n° 6.766/79 – Impugnação do município


Número do processo: 1123048-48.2015.8.26.0100

Ano do processo: 2015

Número do parecer: 226

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1123048-48.2015.8.26.0100

(226/2017-E)

Registro de Imóveis – Pedido de cancelamento de loteamento regularizado pela municipalidade e devidamente inscrito – Artigo 23 da Lei n° 6.766/79 – Impugnação do município – Pedido de cancelamento formulado por quem não é loteador, tampouco era proprietário da área na época em que o loteamento foi regularizado – Requerente que simplesmente adquiriu os lotes, sem qualquer direito às áreas que se tornaram públicas após o registro do loteamento – Parecer pelo provimento do recurso, impedindo-se o cancelamento pleiteado.

Trata-se de apelação interposta pelo Município de São Paulo contra a sentença de fls. 309/313, que determinou o cancelamento de parcelamento do solo inscrito na matrícula n° 100.360 do 11° Registro de Imóveis da Capital.

Sustenta o apelante, em síntese, que Camper Empreendimentos Ltda., por não ser loteadora, mas mera adquirente dos lotes após o parcelamento, não tem legitimidade para requerer o cancelamento; e que as áreas destinadas ao domínio público, desde a regularização do loteamento, pertencem ao município, de modo que não podem retornar ao domínio particular. Pede, por fim, a reforma da decisão de primeiro grau, com o indeferimento do pedido de cancelamento do loteamento (fls. 332/336).

Camper Empreendimentos Ltda. apresentou contrarrazões (fls. 343/352).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 355/357).

É o relatório.

Opino.

Em se tratando de expediente em que o apresentante busca ato de averbação (cancelamento de loteamento – artigo 248 da Lei nº 6.015/73), e não de registro em sentido estrito, a apelação interposta deve ser recebida, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo[1], como recurso administrativo.

No mérito, pretende a apelada, Camper Empreendimentos Ltda., o cancelamento do loteamento regularizado pela Municipalidade de São Paulo e inscrito na matrícula n° 100.360 do 11° Registro de Imóveis da Capital (cf. Av.2 – fls. 164/165).

O Oficial de Registro de Imóveis, de início, entendeu que o cancelamento era inviável, forte no argumento de que os logradouros que passaram ao domínio público (praça, passagem particular e faixa sanitária – cf. Av.2 da matrícula n° 100.360 – fls. 165) não poderiam retornar ao patrimônio particular. Posteriormente, ao receber a informação de que nem os lotes nem as áreas públicas haviam sido implantados, o registrador reviu seu posicionamento e opinou favoravelmente ao cancelamento.

A sentença prolatada pela MM. Juíza da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital determinou o cancelamento do loteamento (fls. 309/313).

Agora, a Municipalidade de São Paulo, que desde o início discordou do cancelamento pleiteado, pede a reforma da sentença (fls. 332/336).

Preceitua o artigo 23 da Lei nº 6.766/79:

Art. 23. O registro do loteamento só poderá ser cancelado:

I – por decisão judicial;

II – a requerimento do loteador, com anuência da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, enquanto nenhum lote houver sido objeto de contrato;

III – a requerimento conjunto do loteador e de todos os adquirentes de lotes, com anuência da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, e do Estado.

§ 1º – A Prefeitura e o Estado só poderão se opor ao cancelamento se disto resultar inconveniente comprovado para o desenvolvimento urbano ou se já se tiver realizado qualquer melhoramento na área loteada ou adjacências.

Pela análise da matrícula n° 100.360, nota-se que referido imóvel, que era de propriedade de Feliciano Freire Mata e de Francisca Alfonso de Freire, foi compromissado, no ano de 1981, a Eugênio Abrass Saad, Maurice Saad, Neide Caram Saad, George Saad, Suely Zattar Saad e Nicolas Saad (cf. R.l – fls. 164). No ano de 1982, a Municipalidade de São Paulo regularizou o loteamento que agora se pretende cancelar, passando a integrar o domínio público, na forma do artigo 22 da Lei nº 6.766/79, uma passagem particular, com 460m² , uma praça, com 144m², e uma faixa sanitária, com 102m² (cf. Av. 2 – fls. 164/165). Em 1982, Eugênio Abrass Saad, Maurice Saad, Neide Caram Saad, George Saad, Suely Zattar Saad e Nicolas Saad compraram o imóvel anteriormente compromissado (cf. R.5 e Av.6 – fls. 165). Em decorrência da regularização do loteamento, noticiou-se na matrícula mãe o desmembramento dos lotes (cf. Av.7 a Av.22 – fls. 165/167) e sobreveio a abertura de matrículas correspondentes (matrículas n° 135.782 a 135.797 – fls. 170/201).

Ainda no ano de 1982, os imóveis matriculados sob n° 135.782 a 135.797, em virtude de permuta, passaram a ser de propriedade de Abib Azem Administração e Participações Ltda. (cf. R.1 das matrículas n° 135.782 a 135.797). Em seguida, no ano de 1983, Camper Empreendimentos Ltda., ora recorrida, adquiriu todos os lotes objetos das matrículas 135.782 a 135.797 (cf. R.2 das matrículas n° 135.782 a 135.797).

Assim, no caso em tela, Camper Empreendimentos Ltda. não é loteadora e tampouco era proprietária da área na época em que o loteamento foi regularizado.

Isso, por si só, já inibe o requerimento de cancelamento do loteamento, uma vez que as hipóteses previstas nos inciso II e III do artigo 23 da Lei n° 6.766/79 – únicas cogitáveis para o caso – dependem de requerimento do loteador.

Desse modo, ainda que o município não tenha comprovado a inconveniência para o desenvolvimento urbano ou a realização de melhoramentos na área loteada, o cancelamento não poderia ser obtido, pois requerido por quem não tem poderes para tanto.

É certo que a recorrida afirma ter adquirido todo o empreendimento imobiliário, de modo que se sub-rogou em todos os direitos da proprietária original do terreno, entre os quais está o de requerer o cancelamento.

No entanto, ao contrário do alegado a fls. 6, a escritura pública por meio da qual os lotes foram alienados à recorrida não faz qualquer referência ao fato de que, a partir daquela data, Camper Empreendimentos Ltda. passara a ter legitimidade para pedir o cancelamento. Pelo contrário. A escritura de fls. 265/274 simplesmente descreve os quinze lotes negociados.

Ou seja, como ponderado no recurso do município, o cancelamento pretendido transferirá três bens de natureza pública (uma passagem particular, uma praça e uma faixa sanitária) à recorrida, empresa que não adquiriu essas áreas e que nunca foi proprietário delas.

Note-se que o §1° do artigo 23 da Lei n° 6.766/79 possibilita a reversão de bem público ao patrimônio do particular, mesmo sem a concordância do município. Essa reversão, todavia, pela letra da lei, beneficia aquele que era proprietário de toda área loteada, incluídos aí os terrenos afetados por ocasião do registro do loteamento (artigo 22 da Lei n° 6766/79[2]).

Aqui a situação é outra.

Com o cancelamento do loteamento, a recorrente, adquirente de todos os lotes – e só dos lotes – receberia, sem qualquer justificativa, área considerável (700m²) que passou a integrar o patrimônio público em 1982.

Nesses termos, proponho a Vossa Excelência:

a) o recebimento da apelação como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário Estadual;

b) que seja dado provimento ao recurso do Município de São Paulo, para impedir o cancelamento do loteamento na forma proposta.

Sub censura.

São Paulo, 7 de junho de 2017.

Carlos Henrique André Lisboa

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação como recurso administrativo e a ele dou provimento, para impedir o cancelamento do loteamento. Publique-se. São Paulo, 08 de junho de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: EDUARDO MIKALAUSKAS, OAB/SP 179.867, MARCO ANTONIO ZIEBARTH, OAB/SP 296.852, DEUANY BERG FONTES, OAB/SP 350.245 e FERNANDO BRANDÃO ESCUDERO, OAB/SP 303.073.

Diário da Justiça Eletrônico de 15.09.2017

Decisão reproduzida na página 243 do Classificador II – 2017

Notas:

[1] Artigo 246 – De todos os atos e decisões dos Juízes corregedores permanentes sobre matéria administrativa ou disciplinar, caberá recurso voluntário para o Corregedor Geral da Justiça, interposto no prazo de 15 (quinze) dias, por petição fundamentada, contendo as razões do pedido de reforma da decisão.

[2] Art. 22. Desde a data de registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo.

Parágrafo único. Na hipótese de parcelamento do solo implantado e não registrado, o Município poderá reguerer, por meio da apresentação de planta de parcelamento elaborada pelo loteador ou aprovada pelo Município e de declaração de que o parcelamento se encontra implantado, o registro das áreas destinadas a uso público, gue passarão dessa forma a integrar o seu domínio.

Fonte: INR Publicações.

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Ação de indenização – Pretensão da indenização prevista no Provimento nº 14/91, correspondente a um salário por ano de serviço prestado, conforme previsto no Provimento 14/91 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, item 49 e subitem 49.1 – Inadmissibilidade – Referida norma legal encontra-se superada pelo advento da Lei Federal nº 8.935/94 – Revogação do aludido – Provimento – Sentença de improcedência mantida – Recurso desprovido.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1012434-49.2017.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante MARIO SERGIO FRANÇA LEMOS, é apelado OFICIAL DO SEXTO TABELIÃO DE PROTESTO DE TITULOS DE SÃO PAULO – SP.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores OSCILD DE LIMA JÚNIOR (Presidente), AROLDO VIOTTI E RICARDO DIP.

São Paulo, 12 de junho de 2018.

Oscild de Lima Júnior

Relator

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº 21.407

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1012434-49.2017.8.26.0053

COMARCA: SÃO PAULO

APELANTE: MARIO SERGIO FRANÇA LEMOS

APELADO: OFICIAL DO SEXTO TABELIÃO DE PROTESTO DE TITULOS DE SÃO PAULO – SP

Juíza de 1ª Instância: Ana Luiza Villa Nova

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – Pretensão da indenização prevista no Provimento nº 14/91, correspondente a um salário por ano de serviço prestado, conforme previsto no Provimento 14/91 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, item 49 e subitem 49.1 – Inadmissibilidade – Referida norma legal encontra-se superada pelo advento da Lei Federal nº 8.935/94 – Revogação do aludido – Provimento – Sentença de improcedência mantida.

Recurso desprovido.

Trata-se de ação de indenização ajuizada por Mário Sérgio França Lemos contra José Mário Bimbato – Oficial do Sexto Tabelião de Protesto de Letras e Títulos de São Paulo – SP.

Sustenta o autor que foi admitido no dia 25/5/76 para exercer a função de preposto auxiliar, que passou a exercer a função de escrevente a partir de 22/11/84 até 2/8/16, quando foi demitido sem justa causa, nos termos da certidão de tempo de serviço que apresenta. Diz que a demissão ocorreu quando estava em vias de se aposentar e que, portanto, não poderia ser realizada, e que o réu não lhe pagou a indenização a que faz jus, conforme previsto no Provimento 14/91 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, item 49 e subitem 49.1.

Alega que resta receber o pagamento correspondente a 39 anos, 11 meses e 23 dias de salário, considerando ainda que o seu ingresso ocorreu antes do advento da Constituição Federal de 1988 e que não fez a opção pela transformação do regime jurídico, portanto, está enquadrado na hipótese prevista no §2º do artigo 48 da Lei 8.935/94.

Pede a procedência da ação, com a condenação do réu ao pagamento da indenização prevista no Provimento nº 14/91, correspondente a um salário por ano de serviço prestado, ou seja, 39 anos, 11 meses e 23 dias, calculados com base no último vencimento percebido, no valor de R$ 15.720,99, o que totaliza o valor de R$ 627.529,51, com correção monetária pela Tabela do Tribunal de Justiça, a contar da data da demissão, e juros de mora de 1% ao mês.

A r. sentença de fls. 127/132 julgou a ação improcedente e extinto o processo com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condenou o autor ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixou no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) nos termos do artigo 85, §8º, do Código de Processo Civil, que aplicou por analogia, considerando o elevado valor da causa, de modo que a incidência de percentual sobre tal valor, ainda que no mínimo, resultaria em valor excessivo, incompatível com a natureza da causa, não obstante o zelo e qualidade do trabalho exercido pelos patronos do réu.

Apelação do autor (fls. 134/158), requerendo, preliminarmente, os benefícios da Assistência Judiciaria Gratuita. No mérito, sustenta a não revogação do Provimento nº 14/91, diante do parecer do ano de 2012 do Processo CG nº 41723/2012 que define a situação e estabelece a obrigação dos novos titulares, em relação aos Escreventes e Auxiliares do Regime Especial. No mais, conforme letra da própria lei 8.935/94, em momento algum houve revogação da norma do provimento CG 14/1991.

O recurso foi respondido (fls. 226/243).

É o relatório.

Inicialmente, concede-se ao autor apelante os benefícios da gratuidade processual, pois, conforme os documentos (fls. 193/223), ele não possui condições financeiras de arcar com as custas de preparo do recurso de apelação, ainda mais se considerar o elevado valor da causa (R$ 627.529,51).

A r. sentença está correta e merece ser mantida, pelos seus próprios e jurídicos, que ficam integralmente adotados por esta Instância, com o respaldo dado pela norma do artigo 252 do Regimento Interno do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a qual dispõe que “Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar osfundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver mantê-la.”

A prova produzida nos autos é suficiente para que se reconheça a improcedência da ação.

Cuida-se de ação promovida pelo autor, ora apelante, buscando o recebimento de indenização que entende lhe seja devida em função de demissão sem justa causa, nos termos do item 49.1 do Provimento 14/91 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo. Sustenta que prestou serviços ao Tabelionato réu, ora apelado, por 39 anos, 11 meses e 23 dias, iniciando seus préstimos no cargo de preposto auxiliar de cartório, pelo regime estatutário, em 25/05/1976, exercendo essa função até sua demissão, ocorrida em 02/08/2016, quando estava em vias de se aposentar.

Eis os fatos.

De fato, o autor não faz jus, no caso, à indenização pleiteada com base no Provimento nº 14/91 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, uma vez que a referida norma legal encontra-se superada pelo advento da Lei Federal nº 8.935/94, bem como por outras normas internas deste Egrégio Tribunal editadas sobre a matéria, em consonância com o decidido, aliás, na Apelação nº 1006204-27.2014.8.26.0269, de relatoria do eminente Desembargador Aliende Ribeiro, que se reporta aos termos de parecer da Corregedoria Geral elaborado nos autos do Processo CG nº 2428/2001, ou seja, no sentido de revogação do aludido Provimento.

Destaca-se do aludido acórdão:

Com relação ao Provimento CG nº 14/91, reportome, de início, os termos do parecer elaborado nos autos do Processo CG nº 2428/2001, instaurado em função de consulta então realizada pelo 5º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital com o objetivo de obter manifestação acerca da vigência dos Provimentos CG nº 1/82, nº 16/86, nº 14/91 e nº 5/96:

“Os Provimentos CG nºs 1/82 (depois alterado pelo Provimento CG nº 16/86) e 14/91 instituíram, o primeiro antes da vigência da Constituição Federal de 1988 e o último no período entre a promulgação da Carta e a publicação da Lei Federal nº 8.935/94, que regulamentou o artigo 236 da Constituição Federal, segundo a terminologia utilizada em cada um, as ‘Normas do Pessoal das Serventias não Oficializadas’ e as ‘Normas do Pessoal das Serventias Extrajudiciais’, normatizando, no Estado de São Paulo, ‘a atividade funcional dos servidores dos ofícios de justiça e cartórios não oficializados do Estado’ e ‘a estrutura básica laborativa dos serviços extrajudiciais’.

Estas normas gerais regulamentares tinham por pressuposto o sistema anterior à Constituição Federal de 1988, e que foi por esta alterado na sua essência, em razão do rompimento com a ordem anterior instituído pelo artigo 236 e seus parágrafos da nova Carta, que, ao estabelecer que a atividade notarial e de registros seria exercida em caráter privado, por delegação do Estado, não recepcionou o sistema cartorial precedente, fundado na existência de cargos públicos, cartórios, classes e carreira.

Essa modificação estrutural, embora já se verificasse com a promulgação da Constituição Federal, somente passou a ser compreendida em sua inteireza a partir da publicação da Lei Federal nº 8.935/94, que, na esteira do comando constitucional, fixou as regras gerais definidoras da atividade delegada, determinando, sem margem de dúvida, a competência do delegado para o gerenciamento administrativo e financeiro da unidade de serviço, assim como, a partir da sua vigência, o regime obrigatório da CLT para a contratação dos prepostos, cabendo ao Poder Público a fiscalização dos serviços.

A revogação das regras previstas nos Provimentos CG nºs 1/82 e 14/91 decorre, portanto, da vigência da Lei Federal nº 8.935/94, que disciplinou todo um sistema absolutamente incompatível com a referida normatização administrativa.

O Provimento CG nº 5/96, ao regulamentar de forma integral e nova as questões pertinentes ao pessoal dos serviços extrajudiciais apenas explicitou a revogação dos regramentos administrativos anteriores, dentre os quais se incluem, especialmente, os Provimentos CG nºs 1/82, 16/86 e 14/91, ora questionados pelo 5º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital.

Em decorrência, firmou-se a orientação administrativa, recentemente reiterada em parecer aprovado por Vossa Excelência nos autos do Processo CG nº 1.268/01, de que o gerenciamento da unidade é, nos termos dos artigos 20 e 21 da Lei Federal nº 8.935/94, questão de atribuição exclusiva do registrador ou notário, cujas conseqüências, no que se refere aos direitos dos prepostos atingidos ou à responsabilidade dos anteriores designados para responder pelo expediente vago, dependem de apreciação jurisdicional.

É importante lembrar que neste aspecto, relativo ao pessoal, facultou a lei a quem já era escrevente ou auxiliar de notas ou de registro, mediante regras de opção, a passagem para o regime da CLT ou a permanência no regime anterior, regra que a Corregedoria Geral da Justiça, nos limites da sua atividade administrativa, sempre buscou respeitar.

(…).

Causa espécie a possibilidade de que um empregador que sempre cumpriu regras legalmente vigentes e jamais questionadas, seja próprio pelo empregado ou por qualquer órgão ou pessoa titular de legitimidade para a defesa de interesses difusos ou coletivos, seja, após a aposentadoria de seu preposto, acionado por um funcionário que durante muitos anos se beneficiou de um regime que lhe conferia uma série de benefícios inexistentes no regime da CLT, inclusive regime previdenciário próprio, e venha a ser condenado ao pagamento de verbas devidas por regime diverso, em flagrante enriquecimento sem causa do prestador dos serviços.

Não se mostra razoável, por outro lado, que um delegado, aprovado em concurso público de provas e títulos realizado pelo Estado, seja impedido de exercer o regular gerenciamento da unidade que lhe foi outorgada.

Tais situações são objeto de presente e séria preocupação por parte da Corregedoria Geral, pois podem, efetivamente, comprometer a saúde financeira de determinada unidade ou a prestação do serviço público delegado, em detrimento do Poder Público outorgante da delegação e do público usuário desses serviços.

Em suma, a perplexidade exposta pelo 5º Oficial de Registro de Imóveis é justificada, mas somente será solucionada quando a reiteração de julgados em um ou em outro sentido vier a pacificar a jurisprudência.

Portanto, o parecer que nos permitimos submeter ao elevado exame de Vossa Excelência é no sentido de que, não apenas em razão da publicação do Provimento CG nº 5/96, mas já em decorrência da vigência da Lei Federal nº 8.935/94, encontram-se revogados, no âmbito administrativo, os Provimentos CG nºs 1/82, 16/86 e 14/91, ressalvada a necessidade da via jurisdicional para a solução de quaisquer discussões que envolvam direitos individuais específicos.”

Assim, uma vez promulgada a Lei nº 8.935/94 – e levada em consideração a inexistência de direito adquirido a regime jurídico, conforme jurisprudência do C. STF -, não há, com base no Provimento CG nº 14/91, como reconhecer o direto da autora à indenização por dispensa imotivada, ao pagamento de aviso prévio e de um mês de salário por ano de serviço prestado, especialmente se considerada a circunstância de que seu desligamento se deu em 30/04/2013, após a concessão, pela Carteira de Previdência das Serventias Notarial e de Registro do Estado de São Paulo, de pedido de aposentadoria formulado nos termos do artigo 5º, XI, da Lei nº 14.016/2010, que deu nova redação ao artigo 20, II, da Lei nº 10.393/70 (f. 50). (grifo no original)

De outro lado, a consulta na qual se firma a insurgência do Apelante, enfatiza que a opinião exarada pela Corregedoria Geral da Justiça no processo 1012434-49.2017.8.26.0053 (Parecer da Corregedoria no Processo nº 2012/41.723), nos limites de sua regulação, não ingressa no mérito da indenização eventualmente devida aos funcionários dispensados, conforme trecho abaixo copiado [item II – fls. 190 dos autos]:

Pelo todo exposto, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de:

I) estabelecer que os escreventes e os auxiliares, particularmente os admitidos nos serviços notariais e de registro antes da Constituição Federal de 1988, não têm estabilidade e, portanto, podem ser livre e imotivadamente dispensados pelos notários e oficiais de registro;

II) que, à regulação confiada a esta Corregedoria, é estranha qualquer deliberação sobre a indenização eventualmente devida aos dispensados e a responsabilidade pelo seu pagamento;

III) reconhecer que os notários e registradores não pretendendo contar, para o desempenho de suas funções, com a colaboração dos escreventes e dos auxiliares não-optantes, não submetidos, nos termos do artigo 48 da Lei n.° 8.935/1994, à legislação trabalhista -, têm, em relação àqueles que, ao tempo da investidura, prestavam serviços na serventia onde nucleados os serviços notariais e de registro que titularizam, a obrigação de formalizar a dispensa, comunicando à Corregedoria Geral da Justiça em sessenta dias, contados do início da atividade notarial ou de registro;

IV) obrigar os titulares dos serviços notariais e de registro aprovados e investidos nos últimos sete Concursos Públicos de Provas e Títulos para Outorga de Delegações – que, ao iniciarem a atividade notarial e de registro, não reconheceram, como prepostos, os escreventes e os auxiliares nãooptantes, porém vinculados à serventia já à época da investidura -, a relacionar os escreventes e os auxiliares não recepcionados, não incorporados aos serviços que passaram a titularizar, formalizando a dispensa, a ser comunicada à Corregedoria Geral da Justiça em sessenta dias, contados da publicação da respeitável decisão que aprovar este parecer; e

V) constar, dos próximos editais dos Concursos Públicos de Provas e Títulos para Outorga de Delegações, a obrigação a que se refere o item III deste parecer. (grifo nosso)

Assim, como bem esclarece o Parecer da Corregedoria no Processo nº 2012/41.723, versando sobre as obrigações dos titulares dos serviços notariais e de registro, no sentido de que, “à regulação confiada a esta Corregedoria, é estranha qualquer deliberação sobre a indenização eventualmente devida aos dispensados e a responsabilidade pelo seu pagamento”.

Portanto, não se vislumbra direito à indenização prevista no Provimento nº 14/91, pois tal norma, além de superada pela posterior edição da Lei Federal nº 8.935/94 e outras normas internas do Tribunal editadas sobre a matéria, extrapolou o âmbito de atuação da Corregedoria Geral de Justiça, a quem não compete fixar indenização por rompimento de vínculo entre serventuário e serventia extrajudicial.

Neste sentido, recentes julgados deste E. Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL – SERVIDOR – ADMISSÃO ANTERIORMENTE À CONSTITUIÇÃO DE 1988 – NOMEAÇÃO PARA RESPONDER INTERINAMENTE PELA SERVENTIA – PRETENDIDA REINTEGRAÇÃO NA FUNÇÃO DE ESCREVENTE – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS OU EM DOBRO – INADMISSIBILIDADE. 1. Serventia Extrajudicial. Escrevente. Reintegração. Descabimento. Serventuário sujeito ao regime especial ou híbrido. Estabilidade inexistente. Possibilidade de dispensa ou não recepção imotivada. Delegação do serviço notarial ou registral é feita de forma originária e personalíssima, mediante concurso público, sem qualquer vínculo com o anterior responsável. Inexistência de vínculo laboral com a nova titular. Solução de continuidade verificada. Serventuário nomeado para responder interinamente pela serventia. Precariedade da investidura no período anterior à nova titular. Inteligência dos arts. 37 e 236 da CF e 19 do ADCT. 2. Indenização. Descabimento. Provimento nº 14/91 que, além de superada pela posterior edição da Lei Federal nº 8.935/94 e outras normas internas do Tribunal editadas sobre a matéria, extrapolou o âmbito de atuação da Corregedoria Geral de Justiça, a quem não compete fixar indenização por rompimento de vínculo entre serventuário e serventia extrajudicial. Inteligência do Parecer da Corregedoria no Processo nº 2012/41.723, de 02/07/2012. Precedentes. 3. Danos morais. Inocorrência. Redução dos honorários advocatícios. Admissibilidade. Recurso provido, em parte. (TJSP; Apelação 0016792-43.2011.8.26.0196; Relator (a): Décio Notarangeli; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Público; Foro de Franca – 3ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 28/03/2018; Data de Registro: 28/03/2018)

Ação de indenização proposta por ex-servidor de cartório extrajudicial, não optante pelo regime celetista, sob fundamento de injusta ruptura de seu contrato de trabalho – Pretensão de responsabilização do atual Oficial de Registro pelo passivo trabalhista – Competência da Justiça Comum Estadual – Inexistência de nulidade do ato de citação, bem como de cerceamento de defesa – Legitimidade passiva do atual Oficial de Registro – Descabimento de denunciação da lide aos anteriores Oficiais de Registro (titular e interino) da Serventia – Autor que não faz jus, no entanto, às verbas remuneratórias e indenizatórias pleiteadas (licençasprêmio; quinquênios sobre os vencimentos integrais e indenização com base no Provimento CG nº 14/91) – Sentença de procedência parcial da ação – Preliminares afastadas – Desprovimento do recurso do autor – Provimento do recurso do réu para o decreto de improcedência da ação. (TJSP; Apelação 0207868-56.2011.8.26.0100; Relator (a): Osvaldo Magalhães; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro Central Cível – 22ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/09/2017; Data de Registro: 06/09/2017)

Mantém-se, pois, no mérito, a decisão de primeiro grau em seus exatos termos e por seus próprios fundamentos.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso, mantida a r. sentença tal como proferida, majorando os honorários advocatícios, nos termos do art. 85, §11º do CPC, para R$ 5.000,00, observando-se a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.

OSCILD DE LIMA JÚNIOR

Relator

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1012434-49.2017.8.26.0053 – São Paulo – 11ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Oscild de Lima Júnior – DJ 15.06.2018

Fonte: INR Publicações.

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