Registro de Imóveis – Registro de instrumento particular com força de escritura pública – Cancelamento de registro por meio de averbação – Erro na identificação do objeto do negócio jurídico – Impossibilidade de retificação ou de cancelamento – Situação que implicaria modificação da declaração de vontade das partes e da substância do negócio jurídico realizado – Recurso não provido.


Número do processo: 1001572-91.2017.8.26.0320

Ano do processo: 2017

Número do parecer: 259

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1001572-91.2017.8.26.0320

(259/2017-E)

Registro de Imóveis – Registro de instrumento particular com força de escritura pública – Cancelamento de registro por meio de averbação – Erro na identificação do objeto do negócio jurídico – Impossibilidade de retificação ou de cancelamento – Situação que implicaria modificação da declaração de vontade das partes e da substância do negócio jurídico realizado – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto contra a sentença de fls. 101/103, que, acolhendo as razões expostas pelo registrador, impediu a inscrição de “termo aditivo ao contrato celebrado por instrumento particular de compra e venda de terreno e construção e mútuo com obrigações a alienação fiduciária e garantia”.

Sustenta a recorrente, em síntese, que a propriedade do imóvel matriculado sob n.° 76.815 foi atribuída de forma equivocada aos compradores Ademilson Cassio Pereira e Daniele Valim de Almeida Pereira; e que o termo aditivo é instrumento adequado para resolver a questão, já que resultará na averbação do cancelamento dos registros que atribuíram a propriedade do imóvel aos compradores equivocadamente e novo registro na matrícula correta (fls. 108/118).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 128/130).

É o relatório. Opino.

Inicialmente, importa observar que o recurso foi impropriamente denominado apelação. A impropriedade decorre do fato de que neste expediente não se está a tratar de procedimento dúvida, o qual é restrito aos atos de registro em sentido estrito. Na verdade, nestes autos, discute-se a possibilidade de cancelamento ou retifícação de informações que constam de registros anteriores, ato que deverá ser materializado por meio de averbação, na forma do artigo 213, § 1º, da Lei n.° 6.015/73.

De toda forma, cabíveis o recebimento e o processamento da irresignação como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo.

Embora recebido e processado, o recurso deve ser improvido, mantida a sentença que negou o pedido de averbação do termo aditivo de fls. 49/51.

Em novembro de 2015, houve o registro do “instrumento particular de compra e venda de terreno e construção e mútuo com obrigações e alienação fiduciária em garantia, com recursos do FGTS no âmbito do programa especial de crédito habitacional ao cotista do FGTS – pró-cotista e do sistema financeiro de habitação – SFH, com utilização do FGTS do comprador”. O título que foi levado a registro tinha por objeto o lote 30 da quadra K do loteamento denominado Jardim Campo Verde I (fls. 05/38).

A análise da matrícula 76.815 do 2° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Limeira revela a absoluta coincidência entre o conteúdo do título e o registro (título de fls. 05/38 e registros 04 e 05 de fls. 40/41).

No termo aditivo que se pretende averbar, os contratantes mencionaram ter havido “equívoco”, “erro material” na descrição do imóvel (fls. 49/50), afirmando que o negócio jurídico celebrado deveria ter como objeto o lote 32 e não o lote 30, ambos da quadra K. E, com base nesse fundamento, a recorrente apresentou o termo aditivo e solicitou que fosse averbado o cancelamento dos registros n.° 04 e 05 da matrícula 76.815.

Ocorre que, na verdade, não se trata de retificação de registro imobiliário, pois, o que consta no fólio real tem absoluta correlação com o título.

E é justamente por isso que não se cogita da retificação do registro, providência que pressupõe erro ou omissão no registro. Realizado o registro de acordo com o título apresentado, no caso o “instrumento particular de compra e venda de terreno e construção” (fls. 05/38), não há que se falar em retificação para corrigir erro cometido pelos próprios interessados, que teriam indicado lote errado por ocasião da celebração do negócio jurídico.

Tampouco é possível autorizar o pretendido cancelamento dos registros. Conquanto o cancelamento dos registros, averbações ou das próprias matrículas seja previsto em Lei (artigo 250 da Lei n.° 6.015/73), a melhor doutrina entende não ser possível o cancelamento de registro de aquisição de propriedade por simples requerimento dos interessados. A aquisição de propriedade imobiliária não se desfaz por mero pedido de cancelamento, mas exige a celebração de novo negócio jurídico. Os efeitos desse novo negócio não retroagem e está sujeito a nova tributação.

A retificação ou cancelamento não são possíveis para a alteração da substância do negócio jurídico realizado. E, no caso, pretende a recorrente a alteração de substância do negócio jurídico, isto é, do próprio objeto.

Afasta-se, assim, a possibilidade de retificação e cancelamento do registro (artigo 213 e 250 da Lei n.° 6.015/73).

Por essas razões, somente a lavratura de escritura de permuta resolverá o problema da apelante.

Nesses termos, o parecer que submeto a Vossa Excelência propõe, respeitosamente, o recebimento da apelação como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário Estadual, e que se negue provimento do recurso.

Sub censura.

São Paulo, 10 de julho de 2017.

Paula Lopes Gomes

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 10 de julho de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: MARCELO ROSENTHAL, OAB/SP 163.855, JÉSSICA MORAES DIAS, OAB/SP 378.151 e FRANCISCO CASSOLI JORRAS, OAB/SP 197.722.

Diário da Justiça Eletrônico de 25.07.2017

Decisão reproduzida na página 203 do Classificador II – 2017

Fonte: INR Publicações.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.




CSM/SP: Registro de imóveis – Carta de sentença expedida em ação de separação consensual – Pretensão de cisão do título para registro somente da partilha, por não interessar à beneficiária o registro do direito real de habitação – Necessidade de manifestação da renúncia ao direito real de habitação por meio de ato ou instrumento próprio, uma vez que foi constituído no mesmo título em que promovida a partilha do imóvel – Renúncia à meação pela separanda, assumindo o ex-cônjuge a propriedade do imóvel e a obrigação de pagar integralmente o débito garantido por hipoteca – Renúncia translativa que enseja, em tese, a incidência do imposto de transmissão “causa mortis” e doação – ITCMD, ressalvada eventual isenção a ser reconhecida pela fazenda do estado – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido, com manutenção da recusa do registro.


Apelação nº 1050704-98.2017.8.26.0100

Espécie: APELACÃO
Número: 1050704-98.2017.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1050704-98.2017.8.26.0100

Registro: 2018.0000208950

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1050704-98.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante SILVIA REGINA GUERRA SANT’ANNA, é apelado 3º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso e mantiveram a recusa do registro do título, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 16 de março de 2018.

PINHEIRO FRANCO

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 1050704-98.2017.8.26.0100

Apelante: Silvia Regina Guerra Sant’Anna

Apelado: 3º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 37.312

Registro de imóveis – Carta de sentença expedida em ação de separação consensual – Pretensão de cisão do título para registro somente da partilha, por não interessar à beneficiária o registro do direito real de habitação – Necessidade de manifestação da renúncia ao direito real de habitação por meio de ato ou instrumento próprio, uma vez que foi constituído no mesmo título em que promovida a partilha do imóvel – Renúncia à meação pela separanda, assumindo o ex-cônjuge a propriedade do imóvel e a obrigação de pagar integralmente o débito garantido por hipoteca – Renúncia translativa que enseja, em tese, a incidência do imposto de transmissão “causa mortis” e doação – ITCMD, ressalvada eventual isenção a ser reconhecida pela fazenda do estado – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido, com manutenção da recusa do registro.

Trata-se de apelação interposta por Sílvia Regina Guerra Sant’Anna contra r. sentença que manteve a recusa do Sr. 3º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo em promover o registro, na matrícula nº 64.829, de carta de sentença extraída de ação de separação judicial porque não foi comprovado o pagamento ou demonstrada a isenção do Imposto de Transmissão “causa mortis” e Doação ITCMD devido pela atribuição da totalidade do imóvel ao ex-marido, e porque não foi atribuído valor para a constituição do direito real de habitação em favor da apelante e de seu filho, devendo esse valor ser apurado por meio de avaliação, ou com uso do valor venal do imóvel, para fim de cálculo dos emolumentos.

Alega a apelante, em suma, que renunciou à propriedade do imóvel por não ter recursos para pagar as parcelas do financiamento garantido por hipoteca, assumindo seu ex-marido a obrigação de efetuar esse pagamento de forma integral. Afirma que permaneceu no imóvel depois da separação judicial, com seu filho, mas acabou por desocupá-lo por não ter meios para arcar com os débitos que sobre ele incidiam. Apesar disso, e em razão da falta de registro da carta de sentença, acabou sendo condenada a pagar as despesas condominiais que são devidas por seu ex-marido. Aduz que necessita do registro da carta de sentença para não mais responder pelos débitos que recaem sobre o imóvel e que não pretende o registro do direito real de habitação, pois descaracterizado pela desocupação voluntária do imóvel (fls. 109/117).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fls. 189/191).

É o relatório.

A certidão de fls. 16/18 demonstra que a apelante e seu ex-marido são proprietários do apartamento 16 do 1º andar do Bloco “B” do Edifício Casabela, objeto da matrícula nº 64.829 do 3º Registro de Imóveis de São Paulo, e que o deram em hipoteca constituída em favor do Banco Bradesco S.A. que, por sua vez, promove execução hipotecária em que o imóvel foi penhorado.

A apelante pretende o registro de carta de sentença (fls. 28/58) extraída de ação de separação consensual em que, mediante transação, renunciou à sua meação sobre o imóvel e aos direitos decorrentes de ação de execução movida pelo credor hipotecário, assumindo seu ex-marido a totalidade do débito (fls. 33).

Pretende, também, a cisão do título para que não seja registrado o direito real de habitação constituído para si e em favor do filho do casal, nascido em 24 de outubro de 1990, porque não mais residem no imóvel e não têm recursos para arcar com os débitos que sobre ele incidem.

O direito de habitação foi previsto na separação judicial em cláusula com a seguinte redação: “A separandaterá direito a habitação do imóvel junto com seu filho, sem ônus e por tempo indeterminado” (fls. 33/34).

Segundo alegado, a apelante seu filho já não residem no imóvel e não pretendem exercer direito de habitação porque não podem se responsabilizar pelas despesas que sobre ele incidem.

No Registro de Imóveis vigora o princípio da rogação, ou da instância, com necessidade de solicitação do registro pelo apresentante do título ou pela autoridade competente.

Porém, a existência de dois ou mais atos distintos no mesmo título impõe o registro de todos quando forem ligados entre si, sendo nesse sentido a lição de Afranio de Carvalho (“Registro de Imóveis”, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1988, p. 272):

“(…) Em suma, a atividade de ofício caberá:

(…)

C) quando, no mesmo título, se reunirem dois ou mais atos distintos, mas ligados entre si, caso em que se fará o o registro de todos“.

Cuida-se de norma de proteção dos titulares dos diferentes direitos reais que decorrerão do registro dos dois ou mais atos contidos no mesmo título e que não pode ser afastada pela simples manifestação da apelante, no procedimento de registro, no sentido de que não pretende a constituição do direito real de habitação.

Não há vedação para que a apelante e seu filho renunciem ao direito real de habitação constituído em seu favor, mas desde que o façam mediante uso do instrumento próprio que, neste caso concreto, poderá consistir em manifestação ao Juízo da separação, para homologação da renúncia e aditamento da carta de sentença, ou na lavratura do instrumento de renúncia, observada a forma prevista em lei e a regular representação do filho da apelante que ainda não completou 18 anos de idade.

Por sua vez, a renúncia da apelante à meação na propriedade do imóvel tem requisitos distintos daqueles incidentes para a renúncia ao direito real de habitação.

A propriedade por ser um direito real patrimonial permite o exercício de disposição por seu titular, enquanto exercício da autonomia privada.

Contudo, de acordo com Miguel Maria de Serpa Lopes (Tratado dos registros públicos. v. IV. Brasília: Brasília Jurídica, 1997, p. 158):

“A verdadeira renúncia é a abdicativa. Pode ser definida como o ato unilateral em que se manifesta a vontade de perder um direito com a completa ausência de uma intenção principal e direta de com isso outorgar uma vantagem a quem quer que seja”.

Porém, não é incomum o uso do termo renúncia para designar ato de disposição do domínio, ou de outro direito real, em favor de pessoa certa.

A renúncia translativa, em favor de pessoa certa, tem natureza de doação quando realizada por liberalidade do renunciante, caracterizando-se, neste caso, a hipótese de incidência do imposto de transmissão “causa mortis” e por doação vigente no Estado de São Paulo.

Ainda in casu, a renúncia efetuada pela apelante em sua separação consensual tem nítido aspecto translativo porque teve como finalidade atribuir ao seu ex-marido a totalidade da propriedade do imóvel e, em conjunto, a responsabilidade pelo pagamento integral dos débitos decorrentes do contrato de financiamento garantido por hipoteca:

A Separanda renuncia à parte que lhe caberia no bem imóvel financiado, assim como do desfecho da Ação de Execução Hipotecária que lhes movem o Banco Bradesco S/A, acima citado, sendo certo que o Separando assume em caráter geral e de forma irrevogável pelo despacho do litígio mencionado, ou seja, toda a dívida que incidir sobre o imóvel ‘sub judice’, cabendo a ele a responsabilidade de informar àquele Juízo, bem como a parte contrária junto aos Contratos firmados nas datas de 05 de dezembro de 1989 e 05 de junho de 1990 (docs. )” (fls. 33).

Disso decorre a caracterização da renúncia como sendo translativa.

Ademais, a existência de débito garantido por hipoteca impedia a renúncia abdicativa sem a anuência do credor hipotecário que, porém, não foi apresentada.

Assim porque a renúncia não pode afetar direitos de terceiros, e assim ocorrendo há necessidade do consentimento dos titulares dos direitos afetados, ou segundo José Alberto C. Vieira (Direitos reais. Coimbra: Coimbra, 2008, p. 448/449):

Encontrando-se o direito de usufruto onerado, o poder dedisposição é afectado pela medida da oneração. Comoresultado, sempre que o titular do direito real cause com arenúncia a extinção de outros direitos reais sobre a coisa, eledeve obter antecipadamente o consentimento dos titulares dosdireitos implicados”.

A renúncia manifestada pela apelante, portanto, não se revestiu dos requisitos necessários para a caracterização de renúncia abdicativa, razão pela qual se mostra correta a exigência de comprovação da declaração e recolhimento do Imposto de Transmissão “causa mortis” e por Doação ITCMD, ou de sua isenção.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso e mantenho a recusa do registro do título.

PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 02.05.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações | 08/05/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.