CSM/SP: Registro de Imóveis – Instrumento particular de alienação de fração ideal, em valor inferior a trinta salários mínimos – Imóvel que, considerado em seu todo, tem valor superior a trinta salários mínimos – Necessidade de escritura pública – Inteligência do art. 108 do Código Civil, e precedentes do Conselho Superior da Magistratura – Bem de família voluntário, com constituição, pelo seu registro, antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002 – Regime do Código de 1916, a teor do art. 2.035 do Código Civil de 2002 – Uma das exigências, portanto, afastada – Mantida a outra, porém, ao recurso é negado provimento, com observação.


Apelação nº 0008251-52.2015.8.26.0302

Espécie: APELAÇÃO
Número: 0008251-52.2015.8.26.0302
Comarca: JAÚ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 0008251-52.2015.8.26.0302

Registro: 2017.0000300507

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação n.º 0008251-52.2015.8.26.0302, da Comarca de Jaú, em que são partes é apelante EDSON PINHO RODRIGUES JUNIOR, é apelado PRIMEIRO OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE JAÚ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, com observação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente sem voto), ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE), PAULO DIMAS MASCARETTI(PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), XAVIER DE AQUINO (DECANO), LUIZ ANTONIO DE GODOY(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 25 de abril de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação n.º 0008251-52.2015.8.26.0302

Apelante: Edson Pinho Rodrigues Junior

Apelado: Primeiro Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Jaú

VOTO N.º 29.726

Registro de Imóveis – Instrumento particular de alienação de fração ideal, em valor inferior a trinta salários mínimos – Imóvel que, considerado em seu todo, tem valor superior a trinta salários mínimos – Necessidade de escritura pública – Inteligência do art. 108 do Código Civil, e precedentes do Conselho Superior da Magistratura – Bem de família voluntário, com constituição, pelo seu registro, antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002 – Regime do Código de 1916, a teor do art. 2.035 do Código Civil de 2002 – Uma das exigências, portanto, afastada – Mantida a outra, porém, ao recurso é negado provimento, com observação.

O 1º Oficial do Registro de Imóveis de Jaú suscitou dúvida, porque os interessados quiseram registrar instrumento particular de venda de fração ideal de imóvel, que, considerado em sua totalidade, tem valor superior a trinta salários mínimos. Daí a necessidade de escritura pública. Exigiu, também, a extinção judicial da instituição do bem de família, cujo registro ainda consta do R.6, da matrícula n.º 4.075.

O entendimento do Oficial foi albergado em sentença.

O recorrente alega que o valor do negócio é inferior a trinta salários mínimos, uma vez que se refere à fração de 6,10% do imóvel, e, portanto, seria desnecessária escritura pública. Aduz que não pode ser levado em consideração o valor total do imóvel, já que não é isso que foi alienado. No que toca à instituição do bem de família, recorda que o registro é anterior ao Código Civil de 2002 e, dessa maneira, conforme o art. 2.035, seus preceitos não se aplicam ao caso.

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Decido.

Analisemos as duas exigências.

O imóvel, considerado em sua totalidade, tem valor superior a trinta salários mínimos. A fração ideal alienada, 6,10%, tem valor inferior. Trata-se de dois pontos incontroversos.

Portanto, o dissenso, aqui, repousa sobre a necessidade de formalização do negócio por escritura pública, ainda que a fração ideal alienada tenha valor inferior a trinta salários mínimos. Em termos simples: qual valor considerar, o do todo ou da parte?

A resposta já foi dada, mais de uma vez, por este Conselho Superior da Magistratura. Por todos, veja o voto da apelação n.º 0007514-42.2010.8.26.0070, de 28 de julho de 2011, da lavra do então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Mauricio Vidigal, acompanhado de forma unânime:

“A divergência entre a apelante e o registrador está fulcrada na interpretação do art. 108 do Código Civil. Esse dispositivo determina que os negócios jurídicos que visem à constituição, modificação, transferência ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o salário mínimo, sejam feitos por escritura pública.

A fração ideal foi adquirida pela apelante por quantia inferior ao limite legal; mas o valor do imóvel, como um todo, ultrapassa o teto.

A redação do dispositivo legal não deixa dúvida: o valor a ser considerado é o do imóvel, não o da fração ideal. Não fosse assim, a lei teria estabelecido como teto o valor da transação. A “ratio legis” foi evitar a possibilidade de fraudes, já que um imóvel de valor superior poderia ser fracionado e vendido em partes, para evitar-se a escritura pública.

Dispondo a lei que o valor a ser considerado é o do imóvel, a eventual inviabilidade de fraude no caso concreto, não pode justificar solução diversa. A lei, prevenindo possíveis tentativas de burla, determinou qual o valor a ser considerado. Se em determinado caso, não é possível a fraude, nem por isso se há de solucioná-lo de forma diversa da prevista, dada a aplicação geral da lei.”

Não há razão para alterar esse entendimento. De fato, basta ler o art. 108 do Código Civil:

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

É o valor do imóvel que deve ser considerado, não o valor do negócio, da parte alienada. Qualquer constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais, independentemente de sua extensão ou valor, mas que recaia sobre imóvel de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País, necessita, para sua validade, da forma de escritura pública.

Correta, dessa maneira, a primeira exigência.

A instituição do bem de família, porém, não configura óbice ao registro. Ele foi instituído, pelo R.6 da matrícula nº 4.075, em 13 de março de 1987, pelos cônjuges Antônio Prado Galvão de Barros e Ruth Nabuco de Araújo Galvão. Visou à proteção deles e dos sete filhos, que constituíam, então, a família. À época, vigorava o Código Civil de 1916, que dispunha sobre o bem de família voluntário nos artigos 70 a 73. Mais especificamente, rezava o art. 70, parágrafo único:

Art. 70. É permitido aos chefes de família destinar um prédio para domicilio desta, com a cláusula de ficar isento de execução por dividas, salvo as que provierem de impostos relativos ao mesmo prédio. Parágrafo único. Essa isenção durará enquanto viverem os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade

É certo, por outro lado, que ambos os cônjuges já faleceram (ele em 1997 e ela em 2013) e que os filhos, todos, já atingiram a maioridade (basta, para tanto, uma conta matemática).

Conforme o art. 2.035 do Código Civil de 2002, a validade dos negócios e atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores. Logo, devem ser analisados, apenas, os requisitos de extinção do referido art. 70, parágrafo único, do Código Civil de 1916.

Se for assim, a extinção do bem de família é automática, não havendo qualquer necessidade de que se recorra à via jurisdicional. Basta a via administrativa, eis que não há qualquer questão de alta indagação ou imperatividade do contraditório. Superados, indubitavelmente, os requisitos de extinção, basta declará-la, averbando-se o cancelamento.

Nesses termos, pelo meu voto, mantida uma das exigências, nega-se provimento ao recurso, com a observação acima.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 09.06.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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Parecer CGJ SP: Pedido de Providências – Desdobro – Insuficiência da aprovação pelo ente municipal, que leva em consideração, então, aspectos urbanísticos, e não registrários – Desmembramento condicionado à prévia retificação registral – Vedada, in concreto, a mitigação do princípio da especialidade objetiva, até porque se intenciona, aqui, a criação de duas novas unidades imobiliárias – Pedido rejeitado – Sentença confirmada – Recurso desprovido.


Número do processo: 1126531-86.2015.8.26.0100

Ano do processo: 2015

Número do parecer: 274

Ano do parecer: 2016

Ementa

Pedido de Providências – Desdobro – Insuficiência da aprovação pelo ente municipal, que leva em consideração, então, aspectos urbanísticos, e não registrários – Desmembramento condicionado à prévia retificação registral – Vedada, in concreto, a mitigação do princípio da especialidade objetiva, até porque se intenciona, aqui, a criação de duas novas unidades imobiliárias – Pedido rejeitado – Sentença confirmada – Recurso desprovido.

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1126531-86.2015.8.26.0100

(274/2016-E)

Pedido de Providências – Desdobro – Insuficiência da aprovação pelo ente municipal, que leva em consideração, então, aspectos urbanísticos, e não registrários – Desmembramento condicionado à prévia retificação registral – Vedada, in concreto, a mitigação do princípio da especialidade objetiva, até porque se intenciona, aqui, a criação de duas novas unidades imobiliárias – Pedido rejeitado – Sentença confirmada – Recurso desprovido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Inconformadas com a r. sentença que prestigiou o juízo de desqualificação registral [1], FLAVIA AUGUSTA ZAMPIERI e SHEILA MARIA ZAMPIERI interpuseram apelação, conhecida como recurso administrativa [2], com vistas, então, à averbação do pretendido desdobro da mat. n° 55.467 do 12° RI desta Capital, a ser sucedido pela abertura de duas novas matrículas, afirmando que o desmembramento foi aprovado pelo ente municipal e que o imóvel não sofreu modificações quanto a sua estrutura e dimensões [3].

Após as contrarrazões da Municipalidade de São Paulo, que se posicionou pela manutenção da r. sentença impugnada [4], a Procuradoria Geralde Justiça, com o envio dos autos a esta E. CGJ, opinou pelo desprovimento do recurso [5].

É o relatório. OPINO.

A irresignação não procede.

A aprovação do ente municipal, expressa no alvará de desdobro, toma em consideração os aspectos urbanísticos. Malgrado indispensável, pressuposto do ato registral pretendido, revela-se, no caso vertente, insuficiente, porquanto o desmembramento encontra óbice em princípio orientador do sistema registral, o da especialidade objetiva.

In concreto, não há como mitigar, como flexibilizar tal princípio, porque, com o desmembramento, as recorrentes objetivam a criação de duas novas unidades imobiliárias. E, assim sendo, as atuais imprecisões, as noticiadas lacunas na matrícula matriz, obstaculizam o fracionamento requerido.

Destarte, o desdobro debatido fica condicionado à prévia retificação da descrição documentada na mat. n° 55.467 do 12° RI desta Capital, imprescindível, uma vez que a realidade registral, ao que tudo indica, não mais espelha a extrarregistral.

Ora, os problemas noticiados pelo Oficial, relativos à rua João Martinho Neto, que então não aparece na matrícula, à faixa desapropriada – e, com isso, à eficácia extintiva da desapropriação –, aos confrontantes e à ausência de referência à área na matrícula [6], estão a exigir essa providência saneadora, requisito para o desmembramento.

Não há como pular etapas: o registro do formal de partilha depende do desmembramento e da abertura de novas matrículas, que, por sua vez, pressupõem a retificação registral de área, deflagrada extrajudicialmente, porém não concluída, pelo que se deduz das notas devolutivas juntadas aos autos [7].

Pelo todo exposto, o parecer que respeitosamente submeto à apreciação de Vossa Excelência propõe o desprovimento do recursoadministrativo.

Sub censura.

São Paulo, 9 de dezembro de 2016.

Luciano Gonçalves Paes Leme

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que ora adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 12 de dezembro de 2016. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça. Advogados: MARCELO MENNITTI, OAB/SP 198.524 e LILIANA MARIA CREGO FORNERIS, OAB/SP 100.212.

Diário da Justiça Eletrônico de 23.01.2017

Decisão reproduzida na página 9 do Classificador II – 2017

Notas:

[1] Fls. 210-213.

[2] Fls. 237.

[3] Fls. 220-230.

[4] Fls. 239-241.

[5] Fls. 248-253.

[6] Fls. 130 e 176-177.

[7] Fls. 129 e 132-135.

Fonte: INR Publicações.

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