CSM/SP: Registro de imóveis – Negativa de Registro de Escritura Pública de venda e compra de imóvel – Necessidade de regularização do parcelamento do solo, apresentação da certidão de conclusão de obra (habite-se) e da certidão negativa de débitos referente à construção – Cumprimento de uma das exigências formuladas pelo registrador no curso da dúvida – Dúvida prejudicada – Demais exigências cabíveis – Sujeição ao registro especial do artigo 18 da lei 6.766/79 que não foi observado – Apelação não conhecida.


Apelação Cível nº 1000440-26.2024.8.26.0361

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1000440-26.2024.8.26.0361
Comarca: MOGI DAS CRUZES

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1000440-26.2024.8.26.0361

Registro: 2024.0000772765

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000440-26.2024.8.26.0361, da Comarca de Mogi das Cruzes, em que é apelante ZAILDA DA SILVA FIRMINO, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MOGI DAS CRUZES/SP.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Não conheceram da apelação e deram por prejudicada a dúvida, v. u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 15 de agosto de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1000440-26.2024.8.26.0361

Apelante: Zailda da Silva Firmino

Apelado: 2º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mogi das Cruzes/SP

VOTO Nº 43.509

Registro de imóveis  Negativa de Registro de Escritura Pública de venda e compra de imóvel  Necessidade de regularização do parcelamento do solo, apresentação da certidão de conclusão de obra (habite-se) e da certidão negativa de débitos referente à construção – Cumprimento de uma das exigências formuladas pelo registrador no curso da dúvida  Dúvida prejudicada  Demais exigências cabíveis  Sujeição ao registro especial do artigo 18 da lei 6.766/79 que não foi observado  Apelação não conhecida.

Trata-se de apelação (fls. 85/89) interposta por ZAILDA DA SILVA FIRMINO contra a r. sentença (fls. 76/79) proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Mogi das Cruzes, que julgou procedente a dúvida suscitada, mantendo a recusa do ingresso no fólio real de escritura pública de venda e compra de imóvel (terreno e prédio), destacado de área maior, formado pela união dos lotes nºs 21 a 30, da quadra “S”, da Vila Cintra, perímetro urbano do Distrito de Brás Cubas, matriculado sob o n° 17.744 daquela serventia.

A apelante alega, em síntese, que: (i) a exigência de apresentação de documentos que demonstrem a regularização do loteamento e/ou parcelamento do solo havido não pode prevalecer, eis que é antigo (remonta há mais de 40 anos) e que se omissão de fiscalização houve, é responsabilidade da Municipalidade, frisando que o IPTU é adimplido desde 1994 (fl. 52); (ii) nos autos há cópia da planta da área maior com a especificação da construção das 28 casas, contendo, ainda, o carimbo de aprovação do Departamento de Obras da Prefeitura de Mogi das Cruzes e do “HABITE-SE”, o que, no seu entender, afasta a necessidade da regularização formal prevista na Lei 6.766/79; (iii) o loteamento possui obras de infraestrutura e está consolidado; (iv) diversos proprietários de imóveis localizados na mesma área lograram o registro de seus títulos de propriedade anteriormente, por meio de averbações de desmembramentos, assim como de construções neles erigidas, conforme comprova a CRI de fls. 44/49; (iv) se compromete a sanar as outras exigências consubstanciadas na nota de devolução se superada a exigência da necessidade de regularização do loteamento e desmembramento do solo; (v) a exigência quanto à complementação do ITBI foi superada, conforme informou o próprio Oficial a fl. 05; e, por fim; (vi) anexou ao seu recurso certidão emitida pela Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos que outorgou “Habite-se” a diversos prédios localizados na mesma área, emitida em 26/07/1991 (fls. 85/89).

Requer, então, a reforma da sentença, para o registro da escritura pública de fls. 14/15 (prenotada sob nº 307022) na matrícula nº 17.744 (fls. 44/49), sem as exigências da Nota Devolutiva de nº 2684, expedida em 03/08/2022 (fl. 24), que, após reapresentação, foi reiterada em 21/11/2023 (Nota de devolução nº 5859, mencionada a fl. 09).

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 108/111).

É o relatório.

Após o falecimento da adquirente do bem imóvel, Maria das Dores Silva Firmino – fl. 31, descrita na escritura pública de compra e venda lavrada em 19/04/1996 (fls. 14/15), a herdeira ZAILDA DA SILVA FIRMINO (escritura pública de inventário e partilha – fls. 34/40) reapresentou a registro o referido título (fls. 21/28, procuração a fl. 29) que foi prenotado sob o nº 303587.

Necessário esclarecer que a primeira apresentação do título ocorreu em 05/06/2014, apenas para exame e cálculo das custas e emolumentos (protocolo nº 2526, de 05/06/2014), tendo sido desqualificado pelas razões descritas na Nota de Devolução de nº 84, de 23/06/2014.

Decorridos oito anos, o título reingressou para fins de registro, mediante a prenotação nº 292.760, de 20/07/2022, tendo sido também desqualificado, de acordo com as razões lançadas na Nota de Devolução nº 2684, de 03/08/2022, tudo conforme relato do Sr Oficial a fls. 02/05.

O terceiro e atual reingresso do título ocorreu por meio da petição de fls. 21/28 e foi novamente negado pelo Oficial, que expediu a Nota de Devolução de nº 5859 de 21/11/2023 (fl. 09).

Apesar da nota de devolução não se encontrar nos autos, o Sr. Oficial transcreveu as razões de desqualificação do título ao suscitar a presente dúvida (fls. 05/07):

“(i) irregularidade do parcelamento do solo; e, (ii) não apresentação da certidão de conclusão de obra (Habitese) e da Certidão Negativa de Débitos referente à construção.”

A ora recorrente, então, insurgiu-se contra as exigências da Nota de devolução de nº 5859 de 21/11/2023, por meio da petição de fls. 09/13.

Após a suscitação da dúvida pelo Oficial, a interessada ofertou a impugnação de fls. 64/68 e o Ministério Público proferiu o parecer de fls. 71/74, opinando pelo indeferimento do registro e a consequente procedência da dúvida registral de fls. 01/08.

Sobreveio a r. sentença que manteve os óbices registrários e julgou procedente a dúvida (fls. 76/79).

A dúvida, todavia, está prejudicada.

Para que se possa decidir se o título pode ser registrado ou não, é preciso que todas as exigências, e não apenas parte delas, sejam impugnadas. A anuência em relação a um ou mais óbices igualmente impede seja prolatada decisão quanto à registrabilidade do título.

A ausência de insurgência contra uma ou mais exigências registrais, e, do mesmo modo, a anuência em relação a qualquer um dos óbices prejudica a dúvida, a qual só admite duas soluções: a) a determinação do registro do título protocolado e prenotado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava quando surgida dissensão entre o apresentante e o Oficial de Registro de Imóveis; ou b) a manutenção da recusa do Oficial.

Com efeito, a anuência (ou o cumprimento) de uma ou mais exigências faz com que o presente recurso assuma um caráter meramente doutrinário, ou teórico, o que não se admite.

Isto porque redundaria na prolação de decisão condicional quando, na realidade, como dito, somente pode comportar duas soluções: a afirmação da possibilidade ou não da prática do ato, considerando o título tal como foi apresentado ao Oficial registrador e por este qualificado.

O processo de dúvida não se presta à solução de dissenso relativo à apenas parte dos óbices ao ingresso do título no fólio real, pois, eventualmente afastados os questionados, restariam os demais, não questionados, que, não atendidos, impediriam, de toda sorte, o registro.

Nesse sentido, destaca-se julgado da E. Corregedoria Geral da Justiça, no Recurso Administrativo nº 1011526-59.2017.8.26.0451, com parecer de nº 52/2021-E, proferido pela MMª Juíza Assessora Stefânia Costa Amorim Requena e aprovado em 18/02/2021 pelo então Exmo. Corregedor do TJSP Desembargador Ricardo Anafe:

“REGISTRO CIVIL DE PESSOA JURÍDICA – Averbação de ata de assembleia geral – Ausência do título original – Não impugnação de todas as exigências apresentadas pelo registrador – Pedido de providências prejudicado – Recurso não conhecido.”

Diante da pertinência, transcreve-se trecho do pronunciamento opinativo:

“Com efeito, a aceitação de parte dos óbices apontados atribui ao procedimento natureza consultiva, certo que a pretendida averbação dependerá de novo protocolo e, consequentemente, de nova qualificação do título.

(…)

Para que se possa decidir se a averbação pretendida pode ou não ocorrer é preciso que todas as exigências – e não apenas parte delas – sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente e, na hipótese de recurso, também pela Corregedoria Geral da Justiça.

E nem mesmo a manifestação apresentada posteriormente, no curso do presente procedimento (fls. 127/129), pode favorecer a recorrente, eis que, além de ser por demais genérica, representa verdadeira burla ao prazo da prenotação (a parte tem um prazo determinado para cumprir as exigências, ou impugnálas).”

Na espécie, a dúvida está prejudicada porque houve o cumprimento de uma das exigências no curso do processo. Por consequência, o recurso de apelação também está prejudicado.

De fato, em seu recurso de apelação a recorrente colacionou o documento de fl. 90, que afirma ser o “Habite-se” cuja apresentação estava inclusa nas exigências registrárias supracitadas.

Ademais, expressamente disse que: “Corolário lógico à dialética do presente recurso, vencida a exigência da necessidade de regularização do loteamento e desmembramento do solo, a apelante se compromete a sanar as outras determinações estampadas na nota de devolução, como a apresentação da CND do INSS para averbação da construção, considerando que o comprovante de pagamento do ITBI, outra exigência do oficial de registro, foi pago no ato da outorga da escritura, conforme o comprovante de fls. 19.” (g.n.)

Ainda que assim não fosse, os óbices que remanesceram justificam a procedência da dúvida.

No caso em apreço, verifica-se que o imóvel objeto se encontra em indubitável loteamento irregular, sem que tenham sido cumpridas as exigências da Lei nº 6.766/79 que rege o parcelamento do solo.

De fato, pela análise da matrícula de fls. 44/49, percebesse que a proprietária IRMÃOS EURICO – ADMINISTRADORA DE BENS S/C. LTDA. empreendeu a construção de unidades residenciais de maneira segmentada, de acordo com as averbações de n.01 a 07, 14 a 17 e 20 (fls. 44/49).

Pelo que consta da certidão de matrícula, a proprietária realizava o desmembramento dos respectivos lotes com suas construções (Av.08 a Av.13, fls. 46/47).

Contudo, esse desmembramento foi realizado de maneira totalmente irregular, já que também estava sujeito ao registro especial previsto na Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, notadamente no §2º do artigo 2º, e nos artigos 10, 11 e 18.

No mesmo sentido, dispõe o item 165 e seus subitens (165.1 a 165.5), do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça:

“165. O registro especial, previsto no art. 18, da Lei nº 6.766/79, será dispensado nos seguintes casos:

a) as divisões “inter vivos” celebradas anteriormente a 20 de dezembro de 1979;

b) as divisões “inter vivos” extintivas de condomínios formados antes da vigência da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979;

c) as divisões consequentes de partilhas judiciais, qualquer que seja a época de sua homologação ou celebração;

d) os desmembramentos necessários para o registro de cartas de arrematação, de adjudicação ou cumprimento de mandados;

e) quando os terrenos tiverem sido objeto de compromissos formalizados até 20 de dezembro de 1979, mesmo com antecessores;

f) Quando os terrenos tiverem sido individualmente lançados para o pagamento de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para o exercício de 1979, ou antes.

NOTA Consideram-se formalizados os instrumentos que tenham sido registrados em Registro de Títulos e Documentos; ou em que a firma de, pelo menos, um dos contratantes tenha sido reconhecida; ou em que tenha havido o recolhimento antecipado do imposto de transmissão.

165.1. Nas divisões, em geral, o registro especial somente será dispensado se o número de imóveis originados não ultrapassar o número de condôminos aos quais forem atribuídos.

165.2. Os desmembramentos de terrenos situados em vias e logradouros públicos oficiais, integralmente urbanizados, ainda que aprovados pela Prefeitura Municipal, com expressa dispensa de o parcelador realizar quaisquer melhoramentos públicos, ficam, também, sujeitos ao registro especial do art. 18, da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979. (g.n.)

165.3. Igualmente sujeitos ao mesmo registro especial estarão os desmembramentos de terrenos em que houver construção, ainda que comprovada por documento público adequado. (g.n.)

165.4. Nos desmembramentos, o oficial, sempre com o propósito de obstar expedientes ou artifícios que visem a afastar a aplicação da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, cuidará de examinar, baseado em elementos de ordem objetiva, especialmente na quantidade de lotes parcelados, se se trata ou não de hipótese de incidência do registro especial. Na dúvida, recusará a averbação. (g.n.)

165.5. Para a dispensa do registro especial, o oficial registrador deverá ter especial atenção à verificação das seguintes circunstâncias:

(1) não implicar transferência de área para o domínio público;

(2) não tenha havido prévia e recente transferência de área ao Poder Público, destinada a arruamento, que tenha segregado o imóvel, permitido ou facilitado o acesso a ela, visando tangenciar as exigências da Lei nº 6.766/79;

(3) resulte até 10 lotes;

(4) resulte entre 11 e 20 lotes, mas seja servido por rede de água, esgoto, guias, sarjetas, energia e iluminação pública, o que deve ser comprovado mediante a apresentação de certidão da Prefeitura Municipal;

(5) não ocorram desmembramentos sucessivos, exceto se o novo desmembramento não caracterizar intenção de afastar o cumprimento das normas que regem o parcelamento do solo urbano em razão do tempo decorrido entre eles, da alteração dos proprietários dos imóveis a serem desmembrados, sem que os novos titulares do domínio tenham participado do fracionamento anterior;

(6) Na hipótese do desmembramento não preencher os itens acima, ou em caso de dúvida, o deferimento dependerá de apreciação da Corregedoria Permanente.

165.6. Em qualquer hipótese de desmembramento não subordinado ao registro especial do art. 18, da Lei nº

6.766, de 19 de dezembro de 1979, sempre se exigirá a prévia aprovação da Prefeitura Municipal.

165.7. Os loteamentos ou desmembramentos requeridos pela União, Estado, Municípios, CDHU, COAHBS e assemelhados estão sujeitos ao processo do registro especial, dispensando-se, porém, os documentos mencionados nos incisos II, III, IV e VII, do

art. 18, da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, que forem incompatíveis com a natureza pública do empreendimento.”

Da leitura atenta das supracitadas normas verifica-se que os desmembramentos realizados sujeitavam-se ao registro especial que, por sua vez, não foi observado, concluindo-se, portanto, que o registro pretendido não é possível sem que a regularização do parcelamento do solo seja efetuada.

Nesse sentido já se decidiu:

“REGISTRO DE IMÓVEIS. DÚVIDA. JULGADA PROCEDENTE. CARTA DE ADJUDICAÇÃO. LOTEAMENTO NÃO REGISTRADO. NECESSIDADE DE PRÉVIA REGULARIZAÇÃO. DISPONIBILIDADE. ESPECIALIDADE OBJETIVA. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.” (Apelação Cível 1005093-68.2022.8.26.0223; Relator (a): Fernando Torres Garcia (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Guarujá – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/09/2023; Data de Registro: 12/09/2023)

Contudo, frise-se que à apelante resta alternativa, como bem observou o Sr. Oficial, eis que a regularização pode ser efetuada “quer pela proprietária e empreendedora, quer pela ação do Poder Público local mediante o instrumento jurídico da regularização fundiária.” (fl. 07, item 2.9).

De se acrescentar que também existe a via da usucapião para obter a declaração de domínio sobre o imóvel, desde que observados os correspondentes preceitos legais e normativos (fls. 07, item 2.10).

Assim sendo, não fosse a dúvida prejudicada, seria o caso de manter os óbices remanescentes, pelas razões expostas.

Ante o exposto, pelo meu voto, não conheço da apelação e dou por prejudicada a dúvida.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 23.02.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.




CSM/SP: Registro de imóveis – Negativa de Registro de Instrumento Particular de Compra e Venda com força de escritura pública – Título e demais documentos digitalizados e encaminhados por intermédio do ONR pelo responsável pela digitalização – Hipótese que não equivale à apresentação de título eletrônico (nato-digitais ou digitalizados com padrões técnicos) – Digitalização de documento físico para remessa eletrônica à serventia imobiliária que deve observar as normas e disposições legais que regem a matéria – Exigências formuladas pelo registrador que não podem ser afastadas – Dúvida prejudicada por ausência de prenotação – Recurso não conhecido.


Apelação Cível nº 1066698-25.2024.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1066698-25.2024.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1066698-25.2024.8.26.0100

Registro: 2024.0000772767

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1066698-25.2024.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante SPE EMPREENDIMENTOS MC VILA PRUDENTE II LTDA., é apelado 6º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram por prejudicada a dúvida e não conheceram do recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 15 de agosto de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1066698-25.2024.8.26.0100

Apelante: SPE Empreendimentos MC Vila Prudente II Ltda.

Apelado: 6º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 43.504

Registro de imóveis – Negativa de Registro de Instrumento Particular de Compra e Venda com força de escritura pública – Título e demais documentos digitalizados e encaminhados por intermédio do ONR pelo responsável pela digitalização – Hipótese que não equivale à apresentação de título eletrônico (nato-digitais ou digitalizados com padrões técnicos) – Digitalização de documento físico para remessa eletrônica à serventia imobiliária que deve observar as normas e disposições legais que regem a matéria – Exigências formuladas pelo registrador que não podem ser afastadas – Dúvida prejudicada por ausência de prenotação – Recurso não conhecido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por SPE Empreendimento MC Vila Prudente II LTDA contra a r. sentença de fls. 119/126, proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do 6º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, que manteve a recusa em se proceder ao registro de instrumento particular de compra e venda com força de escritura pública envolvendo a futura unidade n. 808 do empreendimento Metrocasa Vila Prudente II, objeto da matrícula n. 253.434 daquela serventia (prenotação n. 834.788 fl. 09).

Fê-lo a r. sentença sob o argumento de que o título, originalmente físico, foi digitalizado pelo apresentante e encaminhado eletronicamente ao Oficial por meio do sistema eletrônico do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis ONR; que o título e os demais documentos que o acompanharam foram unificados pela parte em um único arquivo de extensão “.PDF” e denominado “AC003466739 CONTRATO E DECLARACOES ID ANEXO11590219”, no qual consta apenas a assinatura digital do responsável pela digitalização, Cláudio Marcos de Souza Lima, representante da Construtora Metrocasa S/A, o que não permite assegurar a integridade do documento digitalizado e confirmar a participação das pessoas indicadas no instrumento particular; que o título foi digitalizado sem a observância dos padrões técnicos exigidos pelo artigo 5º do Decreto n. 10.278/2020, pelo artigo 324 do Provimento CNJ n. 149/2023 e pelos itens 365 e 366, do Capítulo XX, das NSCGJ; que não basta a remessa eletrônica do título, sendo necessário analisar se este é considerado título nato-digital ou digitalizado; que o título em questão não se trata de documento nato-digital, pois não foi gerado em PDF/A, não há a assinatura de notário, registrador ou seus prepostos com Certificado Digital ICP-Brasil nem constam as assinaturas dos demais signatários indicados no instrumento particular; que o título particular pode ser acolhido em formato eletrônico, mas desde que estruturado conforme padrões próprios de arquitetura eletrônica para o recebimento de assinatura digital de todos os signatários e testemunhas; que a digitalização do título não atende aos requisitos exigidos pelo Decreto n. 10.278/2020, o que impede sua recepção; que não procede a alegação de que, por se tratar de operação realizada no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), não incidem as regras do Decreto n. 10.278/2020, o qual, em verdade, não se aplica às operações e transações realizadas no Sistema Financeiro Nacional, já que a matéria deve ser regulada pelo Banco Central do Brasil, por meio do Conselho Monetário Nacional; que o artigo 5º da Lei n. 14.063/2020 exige a utilização de assinatura eletrônica qualificada nos atos de transferência e de registro de direitos reais sobre imóveis (fls. 119/126).

Com a certificação do trânsito em julgado pelo primeiro grau, o Oficial informou o cancelamento da prenotação (fls. 133 e 136).

A parte apelante sustenta, em síntese, que o recurso é tempestivo, pois incorreta a certificação do trânsito em julgado da sentença na mesma data de sua publicação no Diário da Justiça eletrônico; que o Decreto n. 10.278/2020 não se aplica ao presente caso, conforme determina seu artigo 2º, parágrafo único, inciso II, já que o instrumento contratual celebrado entre as partes está inserido no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação SFH, o qual, por sua vez, integra o Sistema Financeiro Nacional SFN; que, ainda que assim não fosse, o título está de acordo com as normas técnicas que regem a matéria, inclusive com o artigo 5º do Decreto n. 10.278/2020, embora este não seja aplicável à hipótese; que o documento foi assinado por assinatura eletrônica validada pela ICP-Brasil; que os requisitos previstos nos anexos do Decreto n. 10.278/2020 foram observados, especialmente quanto aos formatos e metadados exigidos (fls. 137/143).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 164/168).

É o relatório.

De início, verifica-se que o recurso interposto em 05/06/2024 é tempestivo: a serventia judicial certificou, equivocadamente, que o trânsito em julgado da sentença, que se daria somente em 19/06/2024, ocorreu na mesma data de sua publicação no Diário da Justiça (27/05/2024 fls. 133 e 144/145).

Em seguida, o Oficial informou o cancelamento da prenotação n. 834.788 (fls. 09 e 136).

Assim, ainda que sem culpa da parte, a dúvida está prejudicada pela ausência de prenotação válida, razão pela qual o recurso não pode ser conhecido, o que não impede, entretanto, o exame das exigências a fim de orientar futura prenotação.

Note-se que a necessidade de prévia prenotação do título, ainda que por força de dúvida inversa, decorre de interpretação lógica da Lei nº 6.015/73, que, em seu artigo 182, determina que todos os títulos tomarão no protocolo o número de ordem correspondente à sequência de apresentação, em seu artigo 198, §1º, I, dispõe sobre anotação da dúvida no Livro nº 1 Protocolo, para conhecimento da prorrogação do prazo da prenotação, e, em seu artigo 203, prevê os efeitos do julgamento da dúvida em relação ao registro e, em consequência, ao resultado da qualificação realizada depois da respectiva prenotação do título.

Diante disso, não se admite dúvida para análise do resultado de título cuja prenotação e, consequentemente, a prioridade estejam extintas.

A ausência de protocolo válido prejudica o seu exame, pois, ainda que com julgamento improcedente, o título não terá a prioridade garantida por lei e precisará ser reapresentado.

No mérito, a parte recorrente pretende o registro de instrumento particular de compra e venda com força de escritura pública envolvendo a futura unidade n. 808 do empreendimento Metrocasa Vila Prudente II, objeto da matrícula n. 253.434 do 6º Oficial de Registro de Imóveis da Capital (fls. 10/36, 37/41, 42/45, 46/47, 48/49, 50, 51, 52/56 e 77/95).

Para tanto, apresentou o título e demais documentos por meio do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis ONR, unificados em um arquivo de extensão “.PDF” denominado “AC003466739 CONTRATO E DECLARACOES ID ANEXO11590219”, no qual consta apenas a assinatura digital do responsável pela digitalização, Cláudio Marcos de Souza Lima, representante da Construtora Metrocasa S/A (fls. 03 e 52/56).

A matéria em debate é regida pela Lei n. 14.063/2020, que disciplina o uso de assinaturas eletrônicas em interações com entes públicos, classificando, em seu artigo 4º, as assinaturas eletrônicas em três categorias: simples, avançada e qualificada.

A assinatura eletrônica qualificada, definida no inciso III, do artigo 4º, da lei em questão, se restringe àquela que utiliza certificado digital nos termos do §1º, do artigo 10, da MP n. 2.200-2/2001, ou seja, àquela produzida mediante processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil.

Por sua vez, para os atos de transferência e de registro de bens imóveis, a mesma lei impõe a utilização de assinatura eletrônica qualificada, ressalvado o registro de atos perante as juntas comerciais:

Art. 5º No âmbito de suas competências, ato do titular do Poder ou do órgão constitucionalmente autônomo de cada ente federativo estabelecerá o nível mínimo exigido para a assinatura eletrônica em documentos e em interações com o ente público. (…)

§ 2º É obrigatório o uso de assinatura eletrônica qualificada:

(…)

IV – nos atos de transferência e de registro de bens imóveis, ressalvado o disposto na alínea “c” do inciso II do § 1º deste artigo; (…)

§ 4º O ente público informará em seu site os requisitos e os mecanismos estabelecidos internamente para reconhecimento de assinatura eletrônica avançada.

§ 5º No caso de conflito entre normas vigentes ou de conflito entre normas editadas por entes distintos, prevalecerá o uso de assinaturas eletrônicas qualificadas”.

Trata-se de lei especial que permanece em vigor e não foi alterada pela Lei n. 14.620/23, a qual modificou o artigo 784 do CPC para tratar de assinatura eletrônica nos títulos executivos.

No âmbito da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, a matéria vem tratada nos itens 365, 366, 366.1, 366.5 e 366.6, do Capítulo XX, das Normas de Serviço:

“365. A postagem e o tráfego de traslados e certidões notariais e de outros títulos, públicos ou particulares, elaborados sob a forma de documento eletrônico, para remessa às serventias registrais para prenotação (Livro nº 1 Protocolo) ou exame e cálculo (Livro de Recepção de Títulos), bem como destas para os usuários, serão efetivados por intermédio da Central Registradores de Imóveis.

366. Os documentos eletrônicos apresentados aos serviços de registro de imóveis deverão atender aos requisitos da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico) e serão gerados, preferencialmente, no padrão XML (Extensible Markup Language), padrão primário de intercâmbio de dados com usuários públicos ou privados e PDF/A (Portable Document Format/Archive), ou outros padrões atuais compatíveis com a Central de Registro de Imóveis e autorizados pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo.

366.1. É permitida a recepção para registro de imagens de documentos, preferencialmente no formato PDF, ou padrão mais atual a ser definido pela Central Registradores e autorizado pela Corregedoria Geral da Justiça, desde que o acesso ao original nato digital possa ser realizado para conferência através de sites confiáveis. (…)

366.5. A recepção de instrumentos públicos ou particulares, em meio eletrônico, quando não enviados sob a forma de documentos estruturados segundo prevista nestas Normas, somente será admitida para o documento digital nativo (não decorrente de digitalização) que contenha a assinatura digital de todos os contratantes.

366.6. Documentos notarias digitais, decorrentes de digitalização de documentos físicos, somente podem ser recepcionados pela Central Registradores se adotado, preferencialmente, o padrão PDF/A e se a assinatura, via CENAD, e o atributo do subscritor puderem ser verificadas na Central de serviços do Colégio Notarial do Brasil”.

No mesmo sentido é o Provimento CNJ n. 149/2023, que revogou recentemente o Provimento CNJ n. 94/2020 e instituiu o Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ, disciplinando a matéria em análise nos seguintes termos:

Art. 324. Todos os oficiais dos Registros de Imóveis deverão recepcionar os títulos nato-digitais e digitalizados com padrões técnicos, que forem encaminhados eletronicamente para a unidade a seu cargo, por meio das centrais de serviços eletrônicos compartilhados ou do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR), e processá-los para os fins do art. 182 e §§ da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973.

§ 1º Considera-se um título nativamente digital:

I – o documento público ou particular gerado eletronicamente em PDF/A e assinado com Certificado Digital ICP-Brasil por todos os signatários e testemunhas;

II – a certidão ou traslado notarial gerado eletronicamente em PDF/A ou XML e assinado por tabelião de notas, seu substituto ou preposto;

III – o resumo de instrumento particular com força de escritura pública, celebrado por agentes financeiros autorizados a funcionar no âmbito do SFH/SFI, pelo Banco Central do Brasil, referido no art. 61, “caput” e parágrafo 4º da Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1.964, assinado pelo representante legal do agente financeiro;

IV – as cédulas de crédito emitidas sob a forma escritural, na forma da lei;

V – o documento desmaterializado por qualquer notário ou registrador, gerado em PDF/A e assinado por ele, seus substitutos ou prepostos com Certificado Digital ICP-Brasil.

VI – as cartas de sentença das decisões judiciais, dentre as quais, os formais de partilha, as cartas de adjudicação e de arrematação, os mandados de registro, de averbação e de retificação, mediante acesso direto do oficial do Registro de Imóveis ao processo judicial eletrônico, mediante requerimento do interessado.

§ 2º Consideram-se títulos digitalizados com padrões técnicos aqueles que forem digitalizados de conformidade com os critérios estabelecidos no art. 5º do Decreto nº 10.278, de 18 de março de 2020”.

No caso concreto, porém, verifica-se que o contrato apresentado não atende aos requisitos técnicos exigidos pela Lei n. 14.063/2020, pelas NSCGJ e, notadamente, pelo Provimento CNJ n. 149/2023: além de não ser nato-digital, já que digitalizado (art. 324, § 1º), o título não foi gerado em PDF/A, mas, sim, em PDF, sendo que também não foi assinado com Certificado Digital ICP-Brasil por todos os signatários, contando apenas com a assinatura digital do responsável pela digitalização, Cláudio Marcos de Souza Lima, representante da Construtora Metrocasa S/A (art. 324, § 1º, inciso I), segundo o relatório de conformidade emitido pelo verificador do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (21/04/2024 fls. 52/56 e 57).

O documento físico também não foi desmaterializado por notário ou registrador, gerado em PDF/A e assinado por ele, seus substitutos ou prepostos com Certificado Digital ICP-Brasil, conforme exige o artigo 305 do Provimento CNJ n. 149/2023, que revogou o Provimento CNJ n. 100/2020 (art. 324, § 1º, inciso V, do Provimento CNJ n. 149/2023):

“Art. 305. A desmaterialização será realizada por meio da CENAD nos seguintes documentos:

I – na cópia de um documento físico digitalizado, mediante a conferência com o documento original ou eletrônico; e

II – em documento híbrido.

§ 1º Após a conferência do documento físico, o notário poderá expedir cópias autenticadas em papel ou em meio digital.

§ 2º As cópias eletrônicas oriundas da digitalização de documentos físicos serão conferidas na CENAD.

§ 3º A autenticação notarial gerará um registro na CENAD, que conterá os dados do notário ou preposto que o tenha assinado, a data e hora da assinatura e um código de verificação (hash), que será arquivado.

§ 4º O interessado poderá conferir o documento eletrônico autenticado pelo envio desse mesmo documento à CENAD, que confirmará a autenticidade por até cinco anos”.

Ademais, não há como considerar que o título foi digitalizado com padrões técnicos, pois não foram observados os critérios estabelecidos no artigo 5º do Decreto n. 10.278/2020, que regulamenta a técnica e os requisitos para digitalização dos documentos públicos e privados para que produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais, aplicando-se aos serviços extrajudiciais (artigo 324, § 2º, do Provimento CNJ n. 149/2023):

Art. 5º O documento digitalizado destinado a se equiparar a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato perante pessoa jurídica de direito público interno deverá:

I – ser assinado digitalmente com certificação digital no padrão da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICPBrasil, de modo a garantir a autoria da digitalização e a integridade do documento e de seus metadados;

II – seguir os padrões técnicos mínimos previstos no Anexo I; e

III – conter, no mínimo, os metadados especificados no Anexo II”.

Os Anexos I e II mencionados acima exigem, dentre outros requisitos, que o arquivo seja criado em formato PDF/A, o que não ocorreu no presente caso.

Como se vê, não basta que o título tenha sido digitalizado e encaminhado ao Oficial por intermédio do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis ONR apenas com a assinatura digital do responsável pela digitalização.

Portanto, é preciso que o título seja: (i) nativamente digital, gerado eletronicamente em PDF/A e assinado com certificado Digital ICPBrasil por todos os envolvidos; (ii) desmaterializado por notário; ou (iii) digitalizado com padrões técnicos, de acordo com o artigo 5º do Decreto n. 10.278/2020.

Não sendo possível atendimento aos requisitos citados acima, pode o Oficial exigir a apresentação do original em meio físico.

Vale observar, ainda, que as disposições do Decreto n. 10.278/2020 se aplicam ao contrato em questão, nos termos de seu artigo 2º (destaque nosso):

“Art. 2º Aplica-se o disposto neste Decreto aos documentos físicos digitalizados que sejam produzidos:

I – por pessoas jurídicas de direito público interno, ainda que envolva relações com particulares; e

II – por pessoas jurídicas de direito privado ou por pessoas naturais para comprovação perante:

a) pessoas jurídicas de direito público interno; ou

b) outras pessoas jurídicas de direito privado ou outras pessoas naturais.

Parágrafo único. O disposto neste Decreto não se aplica a:

(…)

II – documentos referentes às operações e transações realizadas no sistema financeiro nacional (…)”.

Em outros termos, apesar de o contrato ter sido produzido por entidade vinculada ao Sistema Financeiro da Habitação, referido Decreto somente não se aplica aos documentos referentes a operações e transações realizadas no âmbito do Sistema Financeiro Nacional (fls. 10/36 e 50).

Como bem observado pelo Oficial, o Decreto n. 10.278/2020 não trata dos documentos relativos a operações e transações realizadas no âmbito do Sistema Financeiro Nacional porque a matéria é regulada pela Resolução n. 4.474/2016 do Banco Central do Brasil, a qual “dispõe sobre a digitalização e a gestão de documentos digitalizados relativos às operações e às transações realizadas pelas instituições financeiras e pelas demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, bem como sobre o procedimento de descarte das matrizes físicas dos documentos digitalizados e armazenados eletronicamente”.

Em suma, a mera digitalização do documento físico para remessa eletrônica ao Oficial não é suficiente para assegurar a integridade e a confiabilidade do documento digitalizado e confirmar a efetiva participação das pessoas indicadas no instrumento particular (artigo 4º, inciso I, do Decreto n. 10.278/2020).

Justamente por isso, ainda que a dúvida não estivesse prejudicada, registro não seria possível.

Ante todo o exposto, pelo meu voto, dou por prejudicada a dúvida e não conheço do recurso.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 23.08.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.