CGJ/SP: Recurso Especial – Direito de Família – Partilha de verba trabalhista – Reserva para garantir a meação – Possibilidade – 1. As verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação – 2. Recurso especial provido.


RECURSO ESPECIAL Nº 1954275 – RS (2021/0244987-0)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

RECORRENTE : D W A

ADVOGADOS : ANDRE ROBERTO MALLMANN – RS022940

LUCAS JOSÉ MARIANI – RS055788

MÁRIO APPEL BASSEGIO – RS086789

RICARDO DANI BECKER – RS093434

RECORRIDO : E A

ADVOGADOS : VANICE REICHERT – RS042017

VERA LÚCIA DE SOUZA FONTANA – RS010438

JOSUÉ DA ROSA – RS087716

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. PARTILHA DE VERBA TRABALHISTA. RESERVA PARA GARANTIR A MEAÇÃO. POSSIBILIDADE.

1. As verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação.

2. Recurso especial provido.

DECISÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

1. Cuida-se de recurso especial interposto por DWA, com fundamento no art. 105, III, c, da Constituição da República, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DIVÓRCIO. DETERMINAÇÃO DE BLOQUEIO DE METADE DAS VERBAS RESCISÓRIAS ADVINDAS DE RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. DESCABIMENTO. INCOMUNICABILIDADE DOS PROVENTOS DE TRABALHO PESSOAL. PRECEDENTES.

A incomunicabilidade dos proventos de trabalho pessoal de cada cônjuge/companheiro, causa de exclusão prevista no inciso VI do art. 1.659 do CCB, abarca as verbas rescisórias e os créditos originados em ação trabalhista. Portanto, considerando sua natureza, não é admissível a partilha, vez que valores percebidos por quaisquer dos cônjuges em razão do exercício de atividade profissional não integram o patrimônio comum do casal, porquanto considerados frutos civis do trabalho.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO (fl. 211).

Opostos embargos de declaração, foram acolhidos parcialmente, sem efeitos infringentes (fls. 311-319).

Em suas razões recursais, aponta a recorrente, além de dissídio jurisprudencial, ofensa ao disposto nos arts. 1.659, VI, e 1.660, I, do Código Civil. Sustenta, em síntese, a comunicabilidade das verbas pleiteadas em reclamatória trabalhista na constância do casamento.

Não foram apresentadas contrarrazões ao recurso especial, consoante certidão à fl. 425.

Crivo positivo de admissibilidade na origem (fls. 429-433).

É o relatório. Decido.

2. A irresignação merece prosperar.

Este recurso é tirado de agravo de instrumento interposto contra a decisão de fls. 94-95 por meio da qual o juiz de piso, “analisando os documentos juntados aos autos às fls. 202/261”, determinou “o bloqueio da metade do valor das verbas trabalhistas devidas ao cônjuge” até que sobrevenha deliberação definitiva a respeito.

Na sequência, o agravo de instrumento foi provido, ao fundamento de que não seria devida a partilha, pois tais valores seriam “considerados frutos civis do trabalho”.

No entanto, as verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação. Nessa linha:

PROCESSO CIVIL. PARTILHA. COMUNICABILIDADE DE VERBA INDENIZATÓRIA TRABALHISTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.658 E 1.659, VI, DO CC. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC CONFIGURADA.

1. No regime de comunhão parcial ou universal de bens, o direito ao recebimento dos proventos não se comunica ao fim do casamento, mas, ao serem tais verbas percebidas por um dos cônjuges na constância do matrimônio, transmudam-se em bem comum, mesmo que não tenham sido utilizadas na aquisição de qualquer bem móvel ou imóvel (arts. 1.658 e 1.659, VI, do Código Civil).

2. O mesmo raciocínio é aplicado à situação em que o fato gerador dos proventos e a sua reclamação judicial ocorrem durante a vigência do vínculo conjugal, independentemente do momento em que efetivamente percebidos, tornando-se, assim, suscetíveis de partilha. Tal entendimento decorre da ideia de frutos percipiendos, vale dizer, aqueles que deveriam ter sido colhidos, mas não o foram. Precedentes.

3. No caso, conquanto alegue a recorrente que o ex-cônjuge ficou desempregado durante a constância do casamento, é certo que o Tribunal de origem (TJ/SP), a despeito da determinação anterior deste Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.193.576/SP) para que explicitasse qual o período em que teve origem e em que foi reclamada a verba auferida na lide trabalhista, negou-se a fazê-lo, em nova e manifesta ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil.

4. Recurso especial provido.

(REsp 1358916/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 15/10/2014).

………………………………………………………………………………………………..

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DIVÓRCIO. PARTILHA. CRÉDITO TRABALHISTA. COMUNICABILIDADE DA PARTE REFERENTE AO PERÍODO DO MATRIMÔNIO. RESERVA PARA GARANTIR A MEAÇÃO. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE QUE AS VERBAS DE NATUREZA INDENIZATÓRIA DEVEM SER EXCLUÍDAS DA PARTILHA POR TEREM CARÁTER PERSONALÍSSIMO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a verba de natureza trabalhista adquirida e pleiteada, na constância da união, comunica-se entre os cônjuges, devendo, portanto, ser partilhada. Precedentes.

2. A tese de que as verbas de natureza indenizatória devem ser excluídas da partilha por terem caráter personalíssimo não foi suscitada anteriormente nos autos pelo agravante no agravo de instrumento, tampouco nas contrarrazões ao recurso especial, configurando verdadeira inovação recursal, o que obsta o conhecimento desta matéria.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1696458/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 29/05/2018).

3. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para reconhecer o direito à partilha de verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial tenham ocorrido na constância do casamento, restabelecendo a decisão de primeira instância agravada “a fim de que o valor fique indisponível ao requerido até que sobrevenha decisão definitiva nestes autos” (fl. 95).

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 24 de agosto de 2021.

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.954.275 – Rio Grande do Sul – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 01.09.2021

Fonte: INR Publicações.

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CGJ/SP: Registro Civil das Pessoas Naturais – Retificação de assento de óbito – União estável que, além de incontroversa, foi demonstrada por escritura pública declaratória e outros documentos – Óbito não declarado pelo ex-companheiro ou pelas descendentes da falecida – Divergência sobre a data do início da união estável – Fato alheio ao registro do óbito – Recurso provido em parte.


Número do processo: 1007339-90.2018.8.26.0477

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 572

Ano do parecer: 2019

 

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1007339-90.2018.8.26.0477

(572/2019-E)

Registro Civil das Pessoas Naturais – Retificação de assento de óbito – União estável que, além de incontroversa, foi demonstrada por escritura pública declaratória e outros documentos – Óbito não declarado pelo ex-companheiro ou pelas descendentes da falecida – Divergência sobre a data do início da união estável – Fato alheio ao registro do óbito – Recurso provido em parte.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso interposto contra r. decisão que indeferiu requerimento administrativo de retificação de assento de óbito visando constar a existência de união estável mantida entre o recorrente e Josefa Tereza de Lima, iniciada no ano de 1988, com remessa dos interessados à esfera jurisdicional (fls. 127/131).

O recorrente alegou, em suma, que a existência e a data de início da união estável estão provadas pela escritura pública declaratória outorgada por sua ex-companheira e pelos demais documentos que apresentou. Disse que a filha de Josefa interveio no procedimento e admitiu a existência da união estável que deve ser averbada no assento de óbito (fls. 139/143).

Simone Fideles da Silva, filha de Josefa Tereza de Lima Silva, ofereceu contrarrazões em que alegou a inexistência de previsão legal para a anotação da união estável no assento de óbito e que a união estável, embora mantida por sua genitora, teve início em data posterior à indicada pelo recorrente (fls. 154/158).

A douta Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 149/152).

É o relatório.

Anoto, inicialmente, que a r. decisão de fls. 21, em que determinada a adoção do procedimento previsto no art. 110 da Lei nº 6.015/73 para a retificação do assento de óbito, não foi objeto de recurso, tornando-se, portanto, preclusa.

Por sua vez, em que pese a necessidade de ação de jurisdição voluntária para as retificações a que se refere o art. 109 da Lei nº 6.015/73, neste caso concreto não há impedimento para a retificação do assento de óbito para que conste que a falecida manteve união estável com o recorrente.

A admissibilidade da indicação da união estável no assento de óbito decorre do item 94, “d” e “e”, do Capítulo XVII do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, assim redigidos:

“94. O assento de óbito deverá conter:

(…)

d) se era casado ou vivia em união estável, o nome do cônjuge ou companheiro supérstite, mencionando-se a circunstância quando separado judicialmente, divorciado, ou de união estável dissolvida; se viúvo ou companheiro supérstite, o nome do cônjuge ou companheiro pré-morto; e o Registro Civil das Pessoas Naturais do casamento ou união estável;

e) no caso da alínea anterior, a menção se limitará as relações de estado civil atuais, salvo se o declarante apresentar as informações relativas a toda cadeia de casamentos e uniões estáveis anteriores;”.

Ainda em conformidade com o item 94 do Capítulo XVII do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, a anotação da união estável pode ser promovida mediante informação pelo declarante do óbito.

No presente caso, o óbito não foi declarado pelas descendentes e pelo ex-companheiro (fls. 07) que, ademais, não divergem sobre a existência da união estável na data do óbito.

Por isso, inexistindo controvérsia, não há vedação para a retificação do assento de óbito mediante indicação de que Josefa Tereza de Lima manteve união estável com o recorrente.

Não bastasse a ausência de controvérsia sobre esse fato, a união estável foi reconhecida por Josefa mediante declaração promovida em escritura pública lavrada em 05 de setembro de 2017 (fls. 08/10) e foi por ela declarada na ficha da internação hospitalar realizada em 19 de março de 2018 (fls. 40/41), um mês antes do óbito (fls. 07).

O litígio existente entre o recorrente e as filhas de Josefa diz respeito, unicamente, à data de início da união estável (fls. 154/155), o que não impede a retificação do registro para constar a referida união porque a consignação dessa data não é elemento essencial do assento de óbito.

Portanto, in casu, mostra-se possível a retificação administrativa do assento de óbito de Josefa Tereza de Lima para que seja consignado que manteve união estável com Arnaldo Alves, sem referência à data do início da união.

Observo, por fim, que havendo litígio sobre a data de início da união estável a retificação também não poderia, quanto a esse fato, ser promovida no procedimento de jurisdição voluntária a que se refere o art. 109 da Lei nº 6.015/73, devendo a data da constituição ser declarada por meio de ação própria, contenciosa.

Ante o exposto, o parecer que submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de dar parcial provimento ao recurso para que seja promovida a retificação do assento de óbito de Josefa Tereza de Lima, lavrado pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Praia Grande (fls. 07), somente para constar que a falecida manteve união estável com Arnaldo Alves.

Sub censura.

São Paulo, 15 de outubro de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou parcial provimento ao recurso administrativo para que seja promovida a retificação do assento de óbito de Josefa Tereza de Lima, lavrado pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Praia Grande (fls. 07), somente para constar que a falecida manteve união estável com Arnaldo Alves. O mandado de retificação será expedido pelo MM. Juiz Corregedor Permanente. Intimem-se. São Paulo, 17 de outubro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogadas: IZABEL CRISTINA COSTA ARRAIS ALENCAR DORES, OAB/SP 99.327, PATRÍCIA AYRES LOVARINHAS, OAB/SP 339.131 e MARINA OLIVEIRA DE VASCONCELOS, OAB/SP 389.286.

Fonte: INR Publicações.

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