ANOREG/BR: ONR completa cinco anos impulsionando a modernização do Registro de Imóveis.


Criado a partir da Medida Provisória nº 759/2016, convertida na Lei nº 13.465/2017, o ONR comemora cinco anos da aprovação de seu estatuto.

Cinco anos após a aprovação de seu estatuto em 16 de abril de 2020, o Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR) consolida-se como uma das principais iniciativas de modernização do serviço extrajudicial brasileiro. Criado a partir da Medida Provisória nº 759/2016, convertida na Lei nº 13.465/2017, o ONR é responsável por implementar e operar o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) em todo o país. Nesse período, a entidade vem promovendo a integração digital dos Registros de Imóveis, impulsionando a eficiência nos serviços e ampliando a transparência e a segurança jurídica no mercado imobiliário, em estreita colaboração com o Poder Público e a sociedade.

O ONR foi concebido no contexto das reformas introduzidas pela MP 759/2016 (convertida na Lei 13.465/2017), que buscavam modernizar os registros públicos brasileiros – em especial o de imóveis. A aprovação do estatuto do ONR em abril de 2020 marcou o início de suas operações efetivas enquanto entidade responsável por unificar e administrar o sistema registral imobiliário eletrônico. Sua principal missão, conforme destaca o diretor-geral do ONR, Flaviano Galhardo, é “integrar todas as 3.600 unidades de registros de imóveis num único endereço da internet”, promovendo a transformação digital de um serviço de 180 anos em “um serviço que seja rápido, digital e eficiente”​.

Na prática, o ONR centraliza em uma plataforma nacional – o SREI – serviços que vão desde a pesquisa de bens e emissão de certidões digitais até o protocolo eletrônico de títulos, conectando cidadãos, instituições financeiras, órgãos públicos e os cartórios de Registro de Imóveis.

Desafios de implementação em um país continental

Implantar um sistema eletrônico nacional em um país de dimensões continentais trouxe diversos desafios. Transformar em poucos anos uma estrutura centenária, descentralizada e heterogênea em um modelo digital unificado exigiu superar barreiras tecnológicas, logísticas, de comunicação e culturais.

Galhardo observa que, além do desafio tecnológico inerente, o ONR enfrentou “três ordens de desafios”​: o primeiro, de ordem logística, para “chegar com essa tecnologia em todas as unidades de serviço nos quatro cantos do país”​; o segundo, comunicacional, ou seja, a necessidade de levar informação e treinamento sobre o ONR a todas as serventias e usuários – o que levou à criação de uma Diretoria de Comunicação específica no ONR​; e o terceiro, cultural, pois foi preciso “mudar a cultura não só dos próprios registradores… habituados ainda ao papel e ao atendimento presencial, mas também a cultura dos próprios usuários”​.

Cada um desses obstáculos vem sendo trabalhado pela Diretoria do ONR com planejamento, investimentos e arranjos institucionais apropriados, visando engajar todos os cartórios na nova era digital.

Avanços: digitalização, inclusão digital e inteligência artificial

Apesar dos obstáculos, os últimos cinco anos registraram avanços notáveis na modernização dos Registros de Imóveis. Um dos pilares foi a digitalização em massa dos acervos em papel. Por determinação do Conselho Nacional de Justiça (Provimento CNJ n° 143/2022), todos os cartórios do país devem digitalizar suas matrículas imobiliárias e índices até maio de 2025, disponibilizando-os na plataforma do ONR.

Grande parte das serventias já alcançou essa meta com apoio técnico e financeiro da entidade. “Vale lembrar que a certidão digital hoje impera na prestação do serviço” e já corresponde a “mais de 90% das certidões expedidas” pelos cartórios​, destaca Galhardo – um indicador claro da adoção em massa das plataformas eletrônicas nos serviços registrais.

Para equalizar as disparidades de infraestrutura tecnológica entre os cartórios, o ONR lançou o Programa de Inclusão Digital (PID), fornecendo computadores, scanners, impressoras e conexões de internet a serventias de pequeno porte. Em duas etapas já executadas, o PID atendeu cerca de 1.300 cartórios – aproximadamente um terço de todas as serventias de imóveis do país – equipando-os com o básico necessário para operar no meio digital​. “Se os cartórios não têm tecnologia […] não tem como imaginar que eles possam cumprir a segunda etapa” de informatização, ressalta Fernando Pereira, vice-presidente e diretor de Tecnologia do ONR, ao enfatizar a importância desse nivelamento estrutural​

Outra frente de inovação foi o desenvolvimento de soluções de inteligência artificial para agilizar a extração de dados dos documentos antigos. Uma ferramenta batizada de IARI (Inteligência Artificial para Registro de Imóveis) foi criada para ler imagens digitalizadas das matrículas e gerar automaticamente índices de busca (os indicadores real e pessoal), auxiliando os cartórios a cumprirem os prazos do cronograma de digitalização estabelecido pelo CNJ​.

Em sua primeira fase, o IARI foca em extrair os elementos mínimos de informações para viabilizar consultas eletrônicas, usando tecnologias de OCR (reconhecimento óptico de caracteres) e aprendizado de máquina. No futuro, espera-se que essa Inteligência Artificial evolua para reconhecer com precisão até mesmo as caligrafias dos livros manuscritos mais antigos, eliminando de vez a necessidade de digitação manual dos acervos históricos. Além disso, a plataforma de serviço eletrônico – conhecida como “RI Digital” – vêm sendo continuamente aprimoradas. Serviços como o e-Protocolo (protocolo eletrônico de títulos), a emissão online de certidões, a visualização de matrículas e a busca de bens estão mais intuitivos e estáveis.

Nos bastidores, sistemas integradores como a penhora online e a Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB) foram modernizados e conectados ao ONR, reduzindo burocracias e acelerando a comunicação entre os cartórios e outros órgãos. Também foi incorporada ao sistema uma interface cartográfica (“mapa”) que permite visualizar os imóveis geograficamente, agregando uma camada extra de transparência e informação para usuários e autoridades.

Impacto para cartórios, usuários e mercado imobiliário

A modernização promovida pelo ONR trouxe benefícios concretos tanto para os operadores do sistema registral quanto para a população em geral. Nas serventias, muitos processos tornaram-se mais ágeis e menos dependentes de papel.

Para o cidadão comum, os ganhos em comodidade e acesso são evidentes. “O principal beneficiário […] é o cidadão, porque ele é o destinatário final dessa prestação de serviço, na medida em que ele não precisa mais se locomover até uma serventia”, afirma Flaviano Galhardo​. Sem precisar deslocar-se até um cartório físico ou recorrer a intermediários para obter uma certidão ou registrar um título, o usuário economiza tempo e dinheiro. Hoje é possível solicitar certidões ou verificar a situação jurídica de um imóvel de forma inteiramente digital, eliminando obstáculos do passado – quando a busca por informações podia significar folhear pesados livros em arquivos ou até viajar a cidades distantes.

No plano econômico, as melhorias também são significativas. Com registros mais acessíveis e rápidos, operações imobiliárias como compra e venda, financiamentos e garantias tornaram-se mais ágeis e seguras. Títulos de propriedade formalizados eletronicamente geram confiança para bancos concederem crédito com juros menores, já que a garantia imobiliária pode ser constituída e consultada com maior segurança. A facilitação da circulação de riquezas imobiliárias e do crédito com garantia real, proporcionada pelo registro eletrônico, acaba beneficiando toda a economia nacional – um efeito destacado por Galhardo ao afirmar que até o país “ganha com fomento da economia, na medida em que facilita o acesso do mercado imobiliário ao registro de imóveis cada vez mais digital”​.

Parcerias institucionais e próximos passos

Desde sua criação, o ONR atua em sintonia com políticas públicas de desburocratização e digitalização dos serviços. A entidade mantém interlocução constante com o Poder Executivo, o Judiciário e o setor privado para aprimorar o ambiente de negócios imobiliários. Um exemplo é a participação do ONR no Fórum de Direito Imobiliário – instância que reúne representantes dos registradores, construtoras, bancos, tabelionatos e do próprio ONR – para desenvolver soluções conjuntas, como o uso de extratos eletrônicos de documentos nas transações imobiliárias, simplificando procedimentos​. Essa iniciativa, viabilizada por uma alteração legal recente, permite que bancos e cartórios de notas enviem ao registro de imóveis apenas um resumo eletrônico do título, em vez do documento completo, acelerando registros sem perda de segurança jurídica.

No horizonte tecnológico, o ONR prepara a implementação da matrícula totalmente eletrônica, que dispensará de vez as fichas em papel nos cartórios. “Com a implantação do sistema eletrônico, vai ser desnecessário imprimir as fichas. Essa é a grande evolução”, avalia Fernando Pereira​, referindo-se ao uso de soluções de blockchain para armazenar os novos registros digitais de forma inviolável.

Outra frente de grande impacto futuro é a regularização fundiária (Reurb) de áreas urbanas e rurais. O ONR planeja apoiar projetos de mapeamento e cadastro de imóveis ainda não regularizados, em parceria com estados e municípios, incorporando tecnologias de georreferenciamento, drones e bases cartográficas para acelerar a titulação de propriedades informais.

A formalização de imóveis hoje irregulares, além de trazer dignidade jurídica aos proprietários, insere esses bens no circuito econômico, permitindo que sejam dados em garantia e viabilizando novos negócios. “Com a simples regularização fundiária, o preço do imóvel já melhora e permite também que o proprietário dê aquele imóvel em garantia o que coloca dinheiro no mercado”, explica Fernando Pereira, ressaltando que a segurança do registro diminui o risco e o custo do crédito, “fomentando uma diminuição do spread bancário”​

Esse efeito virtuoso reforça o papel social e econômico do registro de imóveis: comunidades regularizadas tendem a atrair mais investimentos públicos e privados, aumentando a qualidade de vida local e impulsionando o desenvolvimento.

Gians Fróiz, AssCom ANOREG/BR

Fonte: ANOREG/BR.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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1VRP/SP: Registro de Imóveis. A integralização do capital social mediante conferência de bens, por sua vez, é ato jurídico único: é necessário que todos os bens sejam transmitidos à pessoa jurídica, sob pena de os registros imobiliários ficarem em desacordo com os atos constitutivos registrados na Junta Comercial.


Processo 1032189-34.2025.8.26.0100
Dúvida – Registro de Imóveis – Elenice Basile – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada, para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: LEANDRO TADEU TEIXEIRA (OAB 439488/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo nº: 1032189-34.2025.8.26.0100
Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis
Suscitante: 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital
Suscitado: Elenice Basile
Juíza de Direito: Dra. Vivian Labruna Catapani
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial Interino do 18º Registro de Imóveis de São Paulo, a requerimento de Elenice Basile, diante de negativa em se proceder ao registro de instrumento particular de contrato social envolvendo os imóveis objetos das matrículas ns. 213.378, 218.971 e 226.724 daquela serventia.
O Interino informa que a parte apresentou instrumento particular de contrato social pretendendo a transmissão de propriedade dos imóveis objetos das matrículas ns. 218.971 e 226.724 da serventia, por conferência de bens, a título de integralização de capital social, para a sociedade empresária Locar Express Participações Ltda.; que feita a qualificação, o Oficial emitiu nota devolutiva exigindo: i) apresentação da guia do ITBI com o comprovante de pagamento, relativamente ao imóvel da matrícula n. 213.378; ii) apresentação do termo de quitação (prenotado separadamente) emitido pelo Itaú Unibanco S/A; além da observação de que a exclusão do imóvel objeto da matrícula n. 218.378 impossibilita o registro pretendido, uma vez que não se aplica o princípio da cindibilidade no que tange ao título translativo de integralização de capital social; que inconformada, a suscitada reapresentou o título, instruído com requerimento datado de 28 de janeiro de 2025, solicitando a suscitação de dúvida; que toda transmissão de bem imóvel com valor superior a trinta salários mínimos deve ser feita por escritura pública, nos termos do artigo 108 do Código Civil, porém, a lei prevê uma exceção, permitindo que a transferência do bem imóvel seja formalizada no próprio contrato ou estatuto social da sociedade e no ato constitutivo da empresa individual, os quais após serem registrados na Junta Comercial ou Registro Civil das Pessoas Jurídicas são documentos hábeis a serem registrados no Registro de Imóveis competente; que a integralização do capital por meio de bens imóveis deve ser acompanhada do procedimento no Registro de Imóveis, pois se trata incorporação do bem à sociedade empresarial, nos termos do artigo 1.245 do Código Civil; que o princípio da cindibilidade determina ao Registrador a cisão do título levado a registro, de modo a aproveitar ou extrair elementos que podem imediatamente ingressar na matrícula, desconsiderando outros que sejam irregistráveis; que, no caso dos autos, a sócia Elenice Basile comprometeu-se a integralizar o capital social da Locar Express Participações Ltda. mediante a transferência de imóveis; que todavia, requereu a cindibilidade do título, solicitando o registro quanto aos imóveis das matrículas ns. 218.971 e 226.724; que, ao proceder a qualificação, constatou-se que, além dos dois imóveis referidos, o capital social é composto também pelo imóvel da matrícula n 213.378, não sendo possível o ingresso ao fólio real quanto a este último, pois conforme R.5/213.378, feito em 04 de fevereiro de 2013, o imóvel encontra-se alienado fiduciariamente em favor de LM – Investimentos Imobiliários Ltda.; que, quando da confecção do instrumento social, a sócia já tinha consciência quanto à impossibilidade de ingresso no folio real da transmissão da propriedade, em razão do princípio da disponibilidade, previsto no artigo 1.228 da Lei n. 10.406/2002; que a integralização do capital social mediante conferência de bens é um ato jurídico único, cujo registro fracionado vai de encontro à supremacia do princípio da segurança jurídica, e cogitar a cisão do título quanto a partição implica diretamente a sua alteração (fls. 01/12).
Documentos vieram às fls. 13/160.
Em manifestação dirigida ao Oficial, e em impugnação apresentada nos autos, a parte suscitada aduz que busca o registro de transferência das matrículas ns. 218.971 e 226.724 do 18º Registro de Imóveis de São Paulo, a título de conferência de bens para a propriedade da sociedade empresária Locar Express Participações Ltda. e consequente integralização de capital social; que, para isso, apresentou documentação de constituição da empresa devidamente registrada na Junta Comercial do Estado de São Paulo, com a integralização, por meio da prenotação n. 935.127 de 12/09/2024, efetuando depósito prévio no valor de R$ 12,74; que, no entanto, o título foi qualificado novamente, com exigências, das quais discorda; que a suscitada justificou que sua pretensão estava apenas no registro das matrículas ns. 218.971 e 226.724, e não da matrícula n. 218.378, objeto da exigência; que o princípio da cindibilidade não é absoluto, sendo possível o registro parcial de direitos, desde que não guardem relação de dependência ou unicidade entre si; que é impossível que a conferência de bens seja parcial, pois estaria em desacordo com as deliberações societárias registradas na JUCESP; que o título que carece de irregularidade momentânea não pode obstar o registro daqueles que estão em perfeitas condições para o registro, uma vez que são matrículas independentes; e que, nesses termos, requer seja determinado o registro pretendido (fls. 161/169).
O Ministério Público ofertou parecer, opinando pela manutenção do óbice (fls. 173/173).
É o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO.
Inicialmente, cumpre ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.
No sistema registral, vigora o princípio da legalidade estrita, pelo qual somente se admite o ingresso de título que atenda aos ditames legais. Assim, o Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.
É o que se extrai do item 117, Cap. XX, das NSCGJ: “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.
No mérito, o pedido é procedente, para manter os óbices.
No caso concreto, a parte suscitada pretende o ingresso registrário do instrumento particular de constituição da sociedade empresária limitada “Locar Express Participações Ltda.”, datado de 1º de agosto de 2024, por meio do qual houve a integralização do capital social da pessoa jurídica por meio da conferência, pela sócia Elenice Basile, dos imóveis objetos das matrículas ns. 218.971, 226.724 e 213.378 do 18º Registro de Imóveis de São Paulo (fls. 34/43).
O Oficial Interino qualificou negativamente o título, sustentando que, para que haja a integralização do capital social mediante a transferência de imóveis à pessoa jurídica, é necessário que todos os bens que compõem o instrumento de constituição estejam em condições de ingresso no fólio real, o que não se verificou no caso (fls. 03/04).
A interessada, então, requereu que o título fosse cindido, permitindo a integralização dos imóveis relativos as matrículas 218.971 e 226.724 do 18º RI, aduzindo que admite-se a divisão do título para ingresso do fólio real da parte passível de registro, mencionando como precedente o processo n. 1031566- 38.2023.8.26.0100.
Pois bem.
Como é perene, pelo princípio da cindibilidade dos títulos, é possível o registro parcial dos direitos neles constantes, desde que não guardem relação de dependência ou unicidade entre si.
A seu respeito, o E. Des. Artur Marques da Silva Filho, por ocasião do julgamento da Apelação Cível n. 0027539-71.2014.8.26.0576, bem observou em voto convergente:
“Ademais, como havia sido exposto em 27.1.2015, no julgamento da Apelação Cível 300543-41.2013.8.26.0601, deste E. Conselho, o princípio da cindibilidade implica o seguinte: a) a cisão possível é a do título formal (= do instrumento), e não do título causal (= do fato jurídico que, levado ao registro de imóveis, dá causa à mutação jurídico- real); b) a possibilidade de cisão decorre do princípio da unitariedade (ou unicidade) da matrícula (LRP/73, art. 176, I); e c) o título formal pode cindir-se em dois casos: ou quando um mesmo e único título formal disser respeito a mais de um imóvel; ou quando um mesmo e único título formal contiver dois ou mais fatos jurídicos relativos a um mesmo e único imóvel, contanto que esses fatos jurídicos não constituam uma unidade indissolúvel”.
A integralização do capital social mediante conferência de bens, por sua vez, é ato jurídico único: é necessário que todos os bens sejam transmitidos à pessoa jurídica, sob pena de os registros imobiliários ficarem em desacordo com os atos constitutivos registrados na Junta Comercial.
Neste sentido, decisão do E. Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível n. 0000048-59.2016.8.26.0531, julgada em 02/02/2017 e relatada pelo Corregedor Geral da Justiça à época, Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças:
“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida registrária – Integralização do Capital Social por meio de certidão da JUCESP – Incidência da regra do artigo 64 da Lei n.º 8.934/1994 – Inaplicabilidade do artigo 108 do Código Civil – Impossibilidade, contudo, de cindibilidade do título – Recurso desprovido”.
A razão para se afastar a cindibilidade no presente caso reside justamente na impossibilidade de que a conferência de bens seja parcial, em desacordo com as deliberações societárias registradas na JUCESP.
Em outros termos, quanto mais imóveis em situação regular forem transferidos, mais próximo se estará da situação jurídica ideal, de forma que a sociedade poderá, aos poucos, regularizar totalmente a situação, com o registro integral da propriedade dos imóveis a ela conferidos.
Quanto à necessidade de comprovação do recolhimento do ITBI sobre a parcela do valor do imóvel que supostamente superou o montante do capital integralizado, também assiste razão ao Registrador.
Não se desconhece que, para os Registradores, vigora ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (artigo 289 da Lei n. 6.015/1973; artigo 134, inciso VI, do CTN e artigo 30, inciso XI, da Lei n. 8.935/1994).
Entretanto, o E. Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a fiscalização devida não vai além da aferição sobre a existência ou não do recolhimento do tributo (e não se houve correto recolhimento do valor, sendo tal atribuição exclusiva do ente fiscal, a não ser na hipótese de flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo).
Nesse sentido, os seguintes julgados do E. Conselho Superior da Magistratura:
“Ao oficial de registro incumbe a verificação de recolhimento de tributos relativos aos atos praticados, não a sua exatidão.” (Apelação Cível 20522-0/9- CSMSP – J.19.04.1995 – Rel. Antônio Carlos Alves Braga).
“Todavia, este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor.” (Apelação Cível 996-6/6 CSMSP, j. 09.12.2008 – Rel. Ruy Camilo).
“Este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor.” (Apelação Cível 0009480- 97.2013.8.26.0114 – Campinas – j. 02.09.2014 – Rel. des. Elliot Akel).
Nessa mesma linha, este juízo vem decidindo pela insubsistência do óbice quando não caracterizada flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo (processos ns. 1115167-78.2019.8.26.0100, 1116491-06.2019.8.26.0100, 1059178-53.2020.8.26.0100, 1079550-52.2022.8.26.0100, 1063599-18.2022.8.26.0100, 1039109-29.2022.8.26.0100 e 1039015-81.2022.8.26.0100).
Cumpre destacar que somente o valor que excede o limite do capital social integralizado está sujeito à incidência do ITBI, conforme tese firmada pelo STF para o tema n. 796 de Repercussão Geral, nos seguintes termos:
“A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”.
Nesse contexto, há que se concluir que incumbe apenas à Municipalidade questionar as informações prestadas pelo contribuinte e exigir o que entender devido pela via adequada, se o caso.
A respeito do tema, convém salientar que este juízo, em julgados recentes, manifestou entendimento de que o Oficial de Registro poderia exigir a comprovação do recolhimento do ITBI incidente sobre o valor do imóvel (tomando como base o do valor venal de referência) que excedesse o capital social integralizado da sociedade (processos ns. 1011958-83.2025.8.26.0100, 1010746-27.2025.8.26.0100, 1200028-21.2024.8.26.0100, 1179441-75.2024.8.26.0100, 1181747-17.2024.8.26.0100 e 1159374-89.2024.8.26.0100).
Contudo, em data recente, o C. Conselho Superior da Magistratura deste Tribunal de Justiça, nos autos da Apelação Cível n. 1159374-89.2024.8.26.010, pronunciou-se no sentido de que não cabe ao Oficial questionar se o valor atribuído pelo proprietário ao imóvel é inferior ou superior ao valor de mercado, ou ao valor venal de referência, e, com base em tal análise, exigir o recolhimento de ITBI sobre a diferença positiva entre tais valores em hipóteses de integralização de capital social.
A respeito, transcrevo trecho elucidativo do voto proferido pelo Relator, Des. Francisco Eduardo Loureiro, atual Corregedor Geral da Justiça, para conhecimento, in verbis (destaques nossos):
“Mesmo com a imunidade decorrente do art. 156, § 2º, I, da Constituição Federal devidamente reconhecida pela Municipalidade por meio das declarações de fls. 44/46, o Oficial sustenta que a diferença entre os valores atribuídos pelo interessado e os valores venais de referência justifica a exigência de prova do recolhimento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Primeiramente, cabe destacar que são reiteradas as manifestações deste Conselho no sentido de que a fiscalização que cabe a notários e registradores não vai além da aferição da existência ou não do recolhimento do tributo, não cabendo ao ente fiscal zelar pela correção do valor recolhido. (…) A par das declarações de imunidade expedidas pela Municipalidade (fls. 44/46), há de se ressaltar que o valor atribuído à não se mostra flagrantemente incorreto, em especial tomando como base as teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 1.937.821/SP (processo paradigma do Tema nº 1.113), sob a sistemática da Repercussão Geral: (…) No caso em análise, o valor declarado pelo contribuinte, que goza de presunção de veracidade, foi devidamente informado ao Município, que emitiu as declarações de imunidade de fls. 44/46. E essa declaração de valores não foi aleatória, uma vez que corresponde às quantias constantes na declaração de imposto de renda do apelante (fls. 47/61), em total consonância com o art. 23 da Lei nº 9.249/95. Indiscutível que os valores atribuídos podem ser afastados pelo fisco, com suposta cobrança de ITBI sobre eventual diferença verificada, mas essa discussão deve ser objeto de processo administrativo próprio. Não está entre as atribuições do registrador, portanto, exigir recolhimento do ITBI se o próprio ente tributante concordou com o pedido de imunidade formulado (fls. 44/46). Aliás, se existe imunidade de jaez constitucional sobre a incidência do ITBI em integralização de capital social como ocorre no caso concreto, não se vê razão lógica ou jurídica para o questionamento feito pelo Oficial Registrador. Eventual incidência de tributo seria o ganho da capital entre o valor atribuído pelo proprietário no imposto de renda e o valor atribuído quando da integralização ao capital da pessoa jurídica. (…) Não cabe ao Oficial questionar se o valor atribuído pelo proprietário ao imóvel, dentro do princípio da autonomia privada, é inferior ou superior ao valor de mercado, ou ao valor de referência. (…)” (TJSP; Apelação Cível 1159374-89.2024.8.26.0100; Relator: Francisco Loureiro (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 13/03/2025; Data de Registro: 21/03/2025).
Em complemento, confira-se a ementa do acórdão de aludido julgamento, proferido em 13 de março de 2025 (destaques nossos):
“DIREITO CIVIL. APELAÇÃO EM DÚVIDA REGISTRÁRIA. REGISTRO DE IMÓVEIS. DÚVIDA IMPROCEDENTE. I. Caso em Exame 1. Apelação interposta contra sentença que negou o registro de instrumento particular de alteração de contrato social visando ao aumento do capital social de pessoa jurídica, mediante integralização de três imóveis de propriedade do sócio apelante. II. Questão em Discussão 2. As questões em discussão consistem em definir (i) se há necessidade de comprovação do recolhimento do ITBI sobre a diferença entre os valores dos bens indicados pelo interessado no instrumento e o valores venais de referência desses mesmos bens e (ii) se há necessidade de retificação da data do fato gerador na declaração de imunidade expedida pela Prefeitura. III. Razões de Decidir 3. A fiscalização de notários e registradores limita-se à existência do recolhimento do tributo, não cabendo a eles zelar pela correção do valor recolhido, em especial diante de situações de fundada dúvida sobe a exigibilidade ou montante do tributo. 4. A apresentação de declaração de imunidade expedida pela Prefeitura, em que os valores declarados dos bens correspondem às quantias constantes na declaração de imposto de renda do apelante, não exige maiores questionamentos por parte do Oficial. 5. A divergência de datas do fato gerador do ITBI é irrelevante, pois o fato imponível ocorre com o registro, conforme entendimento sedimentado do STF. IV. Dispositivo e Tese Recurso provido, com observação. Tese de julgamento: “1. A fiscalização do ITBI por registradores limita-se à existência do recolhimento do tributo, especialmente diante de situações de incerteza jurídica quanto ao seu montante. 2. A data do fato gerador do ITBI é a do registro, tornando irrelevante a divergência de datas”. Legislação Citada – CF/1988, art. 156, § 2º, I; CTN, art. 148; Lei nº 9.249/95, art. 23. Jurisprudência Citada: – CSM/SP, Apelação nº 0002604-73.2011.8.26.0025, Rel. Des. José Renato Nalini, j. em 5/11/2012; CSM/SP, Apelação nº 1009023-43.2016.8.26.0405, Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, j. em 20/7/2017; STF, RE com Agravo nº 1.294.969/SP, Tema nº 1.124.” (TJSP; Apelação Cível 1159374-89.2024.8.26.0100; Relator: Francisco Loureiro (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 13/03/2025; Data de Registro: 21/03/2025).
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada, para manter o óbice registrário.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C.
São Paulo, 10 de abril de 2025.
Vivian Labruna Catapani
Juíza de Direito (DJe de 15.04.2025 – SP)

Fonte: DJE/SP – 15.04.2025

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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