FAR – cláusulas sob fiscalização do Oficial | CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida – Imóvel alienado pelo FAR, operado pela Caixa Econômica Federal, sem prévio arrendamento – Inteligência dos artigos 1º, §3º, art. 2º, §7º, II e art. 8º, §1º, da Lei nº 10.188/01 – Exigências corretas – Irresignação parcial – Recurso não conhecido.

Em recente decisão no julgamento da Apelação Cível nº 0017000-98.2015.8.260224-Guarulhos, DJE de 09/03/2017, o Egrégio Conselho Superior da Magistratura (CSM) entendeu que o Oficial deve fiscalizar, entre outras cláusulas, se houve cumprimento da exigência legal de que a transmissão se dê em favor do arrendatário do imóvel. E, em outra hipótese, afirmou o CSM a necessidade de constar do contrato as informações gerais do processo de licitação, que autorizou a venda, ou da justificativa de dispensa ou inexigibilidade de licitação. Ressaltou o Acórdão, que o contrato deverá contemplar “cláusula impeditiva de o adquirente, no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, vender, prometer vender ou ceder seus direitos sobre o imóvel alienado. Veja a íntegra da decisão:

CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida – Imóvel alienado pelo FAR, operado pela Caixa Econômica Federal, sem prévio arrendamento – Inteligência dos artigos 1º, §3º, art. 2º, §7º, II e art. 8º, §1º, da Lei nº 10.188/01 – Exigências corretas – Irresignação parcial – Recurso não conhecido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 0017000-98.2015.8.26.0224

Registro: 2017.0000074114

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 0017000-98.2015.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, em que são partes é apelante BANCO CAIXA ECONOMICA FEDERAL, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE GUARULHOS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Julgaram prejudicada a dúvida, deixando de conhecer o recurso, v.u. Declarará voto convergente o Desembargador Ricardo Dip.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU.

São Paulo, 2 de fevereiro de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 0017000-98.2015.8.26.0224

Apelante: BANCO CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Apelado: 2º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Guarulhos

VOTO Nº 29.636

Registro de Imóveis – Dúvida – Imóvel alienado pelo FAR, operado pela Caixa Econômica Federal, sem prévio arrendamento – Inteligência dos artigos 1º, §3º, art. 2º, §7º, II e art. 8º, §1º, da Lei nº 10.188/01 – Exigências corretas – Irresignação parcial – Recurso não conhecido.

Inconformada com a sentença que manteve a recusa do 2º Oficial de Registro de Imóveis de Guarulhos em registrar instrumento particular de venda e compra, a Caixa Econômica Federal interpõe recurso de apelação.

A recusa baseou-se em dois pontos: a 2ª ressalva das informações adicionais/ressalvas do contrato deve ser excluída; cuidando-se de oferta de imóvel em licitação, na modalidade concorrência pública, tendo em vista o disposto no art. 17, I, o contrato deverá atender a todos os requisitos do art. 61 da Lei nº 8.666/93.

A recorrente pretende o registro de instrumento através do qual aliena imóvel sob o regime da Lei 10.188/01, não por meio de arrendamento residencial, mas por oferta em licitação, na modalidade concorrência pública/venda direta. Entende, por isso, que se aplica o art. 1º, §3º, da referida lei, de maneira isolada, razão pela qual o requisito temporal impeditivo de posterior alienação, do art. 8º, §1º – O contrato de compra e venda referente ao imóvel objeto de arrendamento residencial que vier a ser alienado na forma do inciso II do § 7o do art. 2o desta Lei, ainda que o pagamento integral seja feito à vista, contemplará cláusula impeditiva de oadquirente, no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, vender, prometer vender ou ceder seus direitos sobre o imóvel alienadonão incide.

Dessa forma, pretende o registro do título com a 2ª ressalva das informações adicionais/ressalvas: “Para este negócio não deve existir a restrição de 24 meses para revender o imóvel, com fundamento no §3º do art. 1º da Lei 10.188/01: Fica facultada aalienação, sem prévio arrendamento, ou a cessão de direitos dos imóveis adquiridos no âmbito do Programa.

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo não conhecimento do recurso, em razão da concordância em face de uma das exigências. No que diz respeito à exigência impugnada, opinou pelo seu afastamento.

É o relatório.

O recurso não deve ser conhecido, na medida em que não houve impugnação em relação à exigência de adaptação do titulo à Lei de Licitações.

A concordância parcial com as exigências do Oficial prejudica o pedido, que só admite duas soluções: a determinação do registro do título protocolado e prenotado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava no momento em que surgida dissensão entre a apresentante e o Oficial de Registro; ou a manutenção da recusa do Oficial. Para que se possa decidir se o título pode ser registrado ou não é preciso que todas as exigências e não apenas parte delas sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior.

Contudo, muito embora prejudicada a dúvida, deve-se analisar a questão de fundo, a fim de evitar que, supridas as exigências, a interessada venha a ter que se valer, novamente, do procedimento.

Não se trata de exame de consulta, em tese, mas de análise de caso concreto. O Conselho não atua como mero órgão consultivo, mas como regulador de uma situação de fato. Uma vez resolvida a controvérsia, o tema não será mais levado à Corregedoria Permanente, dado que o Oficial já terá orientação clara sobre como proceder.

Ao contrário do exercício de função jurisdicional, cuja essência é teleológica, a função administrativa, exercida no âmbito do julgamento das dúvidas, tem caráter disciplinador. Enquanto, na função jurisdicional, visa-se ao julgamento do mérito, com posterior formação de coisa julgada e impossibilidade de rediscussão para as partes, o julgamento das dúvidas não se presta somente a decidir o caso concreto, mas a servir de orientação aos registradores para casos análogos.

Logo, por esses dois ângulos é importante a análise do mérito, ainda que prejudicada a dúvida:

a) evita-se a nova suscitação;

b) fixa-se orientação para casos similares.

Passa-se ao exame do caso, portanto.

A necessidade de adaptação do contrato ao art. 61 da Lei de Licitações é cogente. Basta ler o teor do dispositivo: Art. 61. Todo contrato deve mencionar os nomes das partes e os de seus representantes, a finalidade, o ato que autorizou a sua lavratura, o número do processo da licitação, da dispensa ou da inexigibilidade, a sujeição dos contratantes às normas desta Lei e às cláusulas contratuais.

Da leitura do título, não se verifica, porém, a teor do art. 24, V – quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condiçõespreestabelecidas qualquer justificativa para a ausência de repetição da licitação, ainda que na modalidade de concorrência (art. 17, I, da Lei nº 8.666/93).

A exigência nesse sentido de mais a mais, não impugnada deve, assim, ser cumprida.

No que toca ao afastamento da restrição contida no art. 8º, §1º, da Lei nº 10.188/01, também tem razão o Oficial. A 2ª ressalva feita no campo das informações adicionais/ressalvas é inadmissível.

A recorrente aduz que a restrição, por 24 meses, para a revenda do imóvel pelo adquirente não se aplica, defendendo, para isso, uma leitura isolada do art. 3º, §1º, da Lei nº 10.188/01. Essa, porém, não parece a melhor interpretação.

A Lei nº 10.188/01 criou o programa de arrendamento residencial e instituiu o arrendamento residencial com opção de compra. Por seu intermédio, criou-se o PAR Programa de Arrendamento Residencial, cuja gestão cabe ao Ministério das Cidades, e a operacionalização, à Caixa Econômica Federal. Já para a operacionalização do Programa, a CEF foi autorizada a criar um fundo, que se denomina FAR Fundo de Arrendamento Residencial.

Tal Fundo, a teor do art. 2º, §3º, é constituído de bens e direitos, que não se comunicam com o patrimônio da CEF; não integram seu ativo; não respondem direta ou indiretamente por qualquer obrigação da CEF; não compõem a lista de bens e direitos da CEF para efeitos de liquidação judicial ou extrajudicial; não podem ser dados em garantia de débito de operação da CEF; não são passíveis de execução por credores da CEF; quantos aos imóveis, não são passíveis de constituição de ônus reais (incisos I a VI).

Vale dizer, trata-se de um Fundo exterior à CEF, passível, conforme o art. 2º-A, §2º, de direitos e obrigações próprias, pelas quais responde com seu patrimônio.

Por isso, no contrato, figuram; o FAR, como vendedor; a Caixa Econômica Federal, como credora fiduciária; a pessoa física, como compradora e devedora fiduciante.

Vale dizer, alienou-se o imóvel à pessoa física, sem prévio arrendamento, contratando-se um mútuo, garantido por alienação fiduciária do imóvel.

A recorrente afirma que o art. 1º, §3º, da Lei nº 10.188/01 permite essa operação e, à falta de prévio arrendamento, não se aplica a restrição temporal, para revenda, do art. 8º, §1º.

Não é isso, no entanto, o que traduz uma leitura atenta e sistemática da Lei nº 10.188/01.

Três dispositivos interessam à presente discussão: os artigos 1º, §3º, 2º, §7º, II e 8º, §1º. Por que eles devem ser lidos em conjunto? Porque todos foram inseridos pela mesma Lei nº 11.474/07. Vejamos, mais uma vez, suas redações:

Art. 1º, §3º Fica facultada a alienação, sem prévio arrendamento, ou a cessão de direitos dos imóveis adquiridos no âmbito do Programa.

Art. 2º, § 7o A alienação dos imóveis pertencentes ao patrimônio do fundo a que se refere o caput deste artigo será efetivada diretamente pela CEF, constituindo o instrumento de alienação documento hábil para cancelamento, perante o Cartório de Registro de Imóveis, das averbações pertinentes às restrições e ao destaque de que tratam os §§ 3o e 4o deste artigo, observando-se:

I – o decurso do prazo contratual do Arrendamento Residencial; ou

II – a critério do gestor do Fundo, o processo de desimobilização do fundo financeiro de que trata o caput deste artigo.

Art. 8º, §1º – O contrato de compra e venda referente ao imóvel objeto de arrendamento residencial que vier a ser alienado na forma do inciso II do § 7o do art. 2o desta Lei, ainda que o pagamento integral seja feito à vista, contemplará cláusula impeditiva de o adquirente, no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, vender, prometer vender ou ceder seus direitos sobre o imóvel alienado.

Pois bem. Ao alterar a Lei nº 10.188/01, a Lei nº 11.474/07, a um só tempo, teve que assentar, em suas disposições gerais:

a) a possibilidade de alienação, sem prévio arrendamento;

b) a figura da desimobilização;

c) consequentemente, a criação do prazo de carência de 24 meses para revenda.

A intenção foi a de viabilizar a alienação dos imóveis não adquiridos, sem a necessidade de arrendamento, mas através da venda com pagamento à vista ainda que através de mutuo, com alienação fiduciária. Para tanto, previram-se a exceção ao arrendamento (art. 1º, §3º) e a figura da desimobilização (art. 2º, §7º, II), mas, ao mesmo tempo, para evitar a especulação imobiliária, desvirtuando-se a intenção da lei oferta de moradia à população carente –, impediu-se a revenda por 24 meses, em qualquer forma (vender, prometer vender ou ceder seus direitos sobre o imóvel alienado).

Logo, não é pertinente a leitura estanque de apenas um dos dispositivos acrescidos pela Lei nº 11.474/07. A alicerçar essa conclusão, tome-se notícia extraída da “Agência Câmara de Notícias”, de 27/03/2007, a respeito da Medida Provisória nº 350/07, posteriormente convertida na Lei nº 11.474/07 (http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/100280.html):

“Câmara aprova compra antecipada de imóvel arrendado.

O Plenário aprovou nesta terça-feira a Medida Provisória 350/07, que modifica as regras do Programa de Arrendamento Residencial (PAR). A medida permite a venda direta de imóveis pela Caixa Econômica Federal (CEF) à população de baixa renda que participe do programa sem a necessidade de se cumprir contrato de arrendamento por 15 anos.

Com a MP, o prazo de arrendamento não precisa mais ser cumprido se o participante do programa tiver o dinheiro para a compra. As diretrizes para essa venda direta serão estabelecidas pelo Ministério das Cidades, que deverá editar uma portaria regulamentado o tema. A MP também faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e ainda será votada pelo Senado.

A matéria foi aprovada na forma de um projeto de lei de conversão apresentado pelo deputado Dagoberto (PDT-MS), que fez poucas modificações no texto original. Uma das mudanças torna mais claro que a Caixa poderá vender os imóveis já adquiridos sem arrendamento prévio.

Prazo de venda

Outro ponto alterado pelo relator diminui de 30 para 24 meses o prazo durante o qual o participante do PAR não poderá vender o imóvel comprado por meio da alienação direta agora permitida pela MP. Esse impedimento deve constar do contrato de compra e venda do imóvel. Dagoberto manteve ainda artigo que permite a redução do prazo segundo critério a ser definido pelo Ministério das Cidades.

Por tais razões, ambas as exigências foram corretas.

Nesses termos, pelo meu voto, julgo prejudicada a dúvida, deixando de conhecer o recurso.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação Cível 0017000-98.2015.8.26.0224 SEMA

Dúvida de registro

VOTO 45.329 (com divergência):

1. Acompanho a conclusão do respeitável voto de Relatoria.

2. Peço reverente licença, entretanto, para não aderir à “análise de mérito” a que se lançou após afirmar não conhecer do recurso.

3. Ao registrador público, tendo afirmada, per naturam legemque positam, a independência na qualificação jurídica (vide arts. 3º e 28 da Lei n. 8.935, de 18-11-1994), não parece possam impor-se, nessa esfera de qualificação, “orientações” prévias e abstratas de caráter hierárquico.

Assim, o registrador tem o dever de qualificação jurídica e o direito de efetivá-la com independência profissional, in suo ordine.

4. Vem a propósito que a colenda Corregedoria Geral da Justiça paulista, em seu código de normas, enuncia:

“Os oficiais de Registro de Imóveis gozam de independência jurídica no exercício de suas funções e exercem essa prerrogativa quando interpretam disposição legal ou normativa. (…)” (item 9º do cap. XX das “Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo”).

5. Se o que basta não bastara, calha que os órgãos dotados de potestas para editar regras técnicas relativas aos registros públicos são os juízes competentes para o exercício da função correcional (o que inclui a egrégia Corregedoria Geral da Justiça; cf. inc. XIV do art. 29 da Lei n. 8.935/1994). Essa função de corregedoria dos registros, em instância administrativa final no Estado de São Paulo, não compete a este Conselho Superior da Magistratura, Conselho que, a meu ver, não detém, ao revés do que respeitavelmente entendeu o venerando voto de relação, “poder disciplinador” sobre os registros e as notas (v., a propósito, os incs. XVII a XXXIII do art. 28 do Regimento Interno deste Tribunal).

6. Averbo, por fim, que a admitir-se a pretendida força normativa da ventilada “orientação”, não só os juízes corregedores permanentes estariam jungidos a observá-la, mas também as futuras composições deste mesmo Conselho.

Deste modo, voto no sentido de que se exclua a r. “orientação para casos similares”.

É, da veniam, meu voto de vencido.

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público (DJe de 09.03.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações – DJE/SP | 09/03/2017.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Conferência de bens – Bens transferidos pelos sócios para sociedade simples limitada – Óbice ao registro pela não formalização da transferência dos imóveis por escritura – Sentença de procedência da dúvida – Reforma da decisão – Sociedade simples limitada que é regida pelas normas aplicáveis às sociedades empresárias limitadas (arts. 983 e 1.150 do CC) – Certidão de alteração de sociedade simples limitada, passada pelo Registro Civil da Pessoa Jurídica, que constitui documento hábil para a transferência de bens imóveis – Inteligência dos artigos 983, 1.150, do CC, e 64, da Lei n.º 8.934/94 – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida.

ACÓRDÃOS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1036892-23.2016.8.26.0100

Registro: 2017.0000074099

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1036892-23.2016.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes são apelantes JORGE SAAD SOUEN e MARLI TADEA GIANNOTTI SOUEN, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU.

São Paulo, 2 de fevereiro de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1036892-23.2016.8.26.0100

Apelantes: Jorge Saad Souen e Marli Tadea Giannotti Souen

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 29.591

Registro de imóveis – Conferência de bens – Bens transferidos pelos sócios para sociedade simples limitada – Óbice ao registro pela não formalização da transferência dos imóveis por escritura – Sentença de procedência da dúvida – Reforma da decisão – Sociedade simples limitada que é regida pelas normas aplicáveis às sociedades empresárias limitadas (arts. 983 e 1.150 do CC) – Certidão de alteração de sociedade simples limitada, passada pelo Registro Civil da Pessoa Jurídica, que constitui documento hábil para a transferência de bens imóveis – Inteligência dos artigos 983, 1.150, do CC, e 64, da Lei n.º 8.934/94 – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Jorge Saad Souen e Marli Tadea Giannotti Souen contra a sentença de fls. 77/79, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 1.º Registro de Imóveis da Capital, impedindo o registro de instrumento particular de alteração contratual da Clínica Jorge Saad Souen Ltda.

Sustentam os apelantes, em síntese, que, embora a clínica seja uma sociedade simples, o registro da conferência dos bens imóveis prescinde da lavratura de escritura pública, pois o artigo 64 da Lei nº 8.934/94 aplica-se a toda sociedade que adote forma empresarial (fls. 84/90).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 105/108).

É o relatório.

Dispõe o artigo 108 do Código Civil:

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Ou seja, para os negócios jurídicos que envolvam direitos reais relativos a imóveis de valor superior a trinta salários mínimos o que abrange a grande maioria dos bens dessa natureza , a escritura pública é essencial, salvo disposição de lei em contrário.

O artigo 64 da Lei n.º 8.934/94 é um dos dispositivos que abre exceção à regra da escritura pública:

Art. 64. A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social.

A questão é saber se uma sociedade simples, que adota o modelo da sociedade limitada, pode obter a transferência da propriedade de imóvel utilizado para a formação ou aumento de capital social, apresentando a registro certidão expedida pelo Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

E a resposta é positiva.

Não há dúvida de que o artigo 64 da Lei n.º 8.934/94 faz referência a “sociedades mercantis” e a Juntas Comerciais. Também não se questiona que, pela literalidade do Código Civil, a sociedade simples se contrapõe à sociedade empresária (artigo 982 do CC [1]) e que a inscrição de seus atos não ocorre na Junta Comercial, mas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas (artigo 1.150 do CC [2]).

No entanto, o artigo 983 do Código Civil possibilita a constituição de sociedades simples com a adoção da estrutura de um dos tipos de sociedade empresária. Nessa hipótese, a contrario sensu do dispositivo abaixo transcrito, serão aplicáveis a essa sociedade simples as normas relativas ao modelo de sociedade empresária adotado. Senão vejamos:

Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. (grifei)

Ora, se a legislação que rege uma sociedade simples limitada é aquela que se aplica a uma sociedade empresária limitada (artigo 983 do CC), não há razão para que a regra do artigo 64 da Lei n.º 8.934/94 não seja estendida à primeira.

Nem se argumente que o arquivamento dos atos da sociedade simples no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, e não na Junta Comercial, impede a pretensão dos requerentes. Isso porque o Registro Civil das Pessoas Jurídicas está para as sociedades simples, assim como a Junta Comercial para as sociedades empresárias. Não se pode admitir que uma certidão emitida por um Registro Civil das Pessoas Jurídicas serventia extrajudicial dirigida por um titular devidamente aprovado em concurso público tenha um valor probante menor que o mesmo tipo de certidão emitida por uma Junta Comercial. É o que ocorreria se na primeira hipótese fosse exigida a lavratura de escritura pública para a transferência de bem imóvel.

A parte final do artigo 1.150 do Código Civil também não deixa dúvida sobre a aplicação da Lei n.º 8.934/94 ao caso. Repitase seu teor:

Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária.

A expressão “o qual” se refere ao Registro Civil das Pessoas Naturais. Esse órgão há de obedecer às normas fixadas para os registros na JUCESP, se a sociedade simples adotar um dos tipos da sociedade empresária. No presente caso, foi adotado um desses tipos: a sociedade limitada. Portanto, o Registro Civil, no que toca às regras de registro, obedecerá à Lei n.º 8.934/94, especialmente, aqui, o artigo 64.

A medida, assim, dá relevo à função do Registrador Civil de Pessoas Jurídicas, pressupondo zelo e prudência em sua atuação.

Ademais, parece excessivamente burocrático exigir que para um ato de conferência de bens, o sócio tenha que: a) registrar o instrumento particular no Registro Civil das Pessoas Jurídicas; b) lavrar escritura em um Cartório de Notas; e c) registrar esta última no Registro de Imóveis.

São três cartórios diversos para regularizar uma única situação.

Desse modo, a aceitação da certidão passada pelo Registro Civil das Pessoas Jurídicas como título para a transferência imobiliária, além de encontrar guarida em nossa legislação, simplifica o procedimento a ser seguido pelo interessado.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.

[2] Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. (DJe de 09.03.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações – DJE/SP | 09/03/2017.

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Valor da meação do cônjuge não integra base de cálculo de emolumentos das escrituras de inventário

A Corregedoria-Geral do TJ/SP uniformizou entendimento de que não faz parte da base de cálculo, para fins de emolumentos das escrituras de inventário, o valor da meação do cônjuge.

O Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo pretendia a inclusão do valor da meação do cônjuge sobrevivente na base de cálculo dos emolumentos relativos à lavratura de escritura de inventário e partilha.

O juiz assessor da Corregedoria, Carlos Henrique André Lisboa, citou na decisão que o desembargador Gilberto Passos de Freitas, então corregedor-Geral da Justiça, por meio da portaria 1/2007, instituiu Grupo de Estudos para o exame e aplicação prática das novidades trazidas pela lei 11.441/07.

Fizeram parte os desembargadores José Roberto Bedran e José Renato Nalini; os então juízes das Varas de Registros Públicos da Capital e hoje desembargadores Marcelo Martins Berthe e Márcio Martins Bonilha Filho; o então juiz Auxiliar da Corregedoria e hoje desembargador Vicente de Abreu Amadei; o defensor público Vitore André Zilio Maximiano; a advogada Márcia Regina Machado Melaré; e o tabelião Paulo Tupinambá Vampré.

E, à época, com exceção do tabelião que fazia parte do grupo, todos os outros componentes concluíram que a meação do cônjuge supérstite não poderia integrar a base de cálculo dos emolumentos.

Ausência de justificativa

O juiz Carlos Henrique afirmou na decisão que, como não há partilha dos bens que serão atribuídos ao meeiro, não se justifica que o valor desses bens seja utilizado para o cálculo dos emolumentos devidos pela lavratura da escritura. E, pelo mesmo motivo – ausência de efetiva transmissão –, o ITCMD não incide sobre o valor da meação.

“Faz uma década que os cartórios de notas passaram a prestar esse novo serviço, sem indício de que a exclusão do valor da meação no cálculo dos emolumentos da escritura de inventário e partilha inviabilizasse financeiramente o serviço. Se tecnicamente a exclusão da meação fosse o caminho mais acertado, mas, na prática, isso acarretasse prejuízo aos notários, talvez o tema realmente devesse ser revisto.”

No voto, o magistrado consigna que não se pode afastar a ideia de que parte do sucesso na lavratura de inventários e partilhas extrajudiciais seja decorrente da razoabilidade do valor cobrado pelo serviço, e que a inclusão do valor da meação, os emolumentos, em alguns casos, praticamente dobrariam.

“Isso, provavelmente, faria com que parte dos usuários optasse pela via judicial, ou mesmo que deixasse a realização do inventário e da partilha para momento posterior.”

Por fim, o parecer sugeriu:

a) que a nota explicativa 3.1.1 da tabela dos Tabelionatos de Notas instituída pela lei Estadual 11.331/02, ao mencionar “escritura de partilha”, refere-se tão-somente às escrituras desse tipo lavradas na forma do art. 2.015 do CC (partilha amigável a ser homologado pelo juiz);

b) que para o cálculo dos emolumentos das escrituras de separação e divórcio seguidos de partilha, aplica-se o item 78.2 do Capítulo XIV das NSCGJ;

c) que para o cálculo dos emolumentos das escrituras de inventário e partilha (lei 11.441/07), aplica-se o item 78.3 do Capítulo XIV das NSCGJ;

d) o indeferimento do pleito formulado pelo Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo, com a manutenção da redação do item 78.3 do Capítulo XIV das NSCGJ, excluindo-se o valor da meação do cônjuge sobrevivente do cálculo dos emolumentos relativos à lavratura de escritura de inventário e partilha.

Com a aprovação do parecer, este foi publicado na íntegra no DJ-e.

Processo: 2016/204317

Fonte: Migalhas | 08/03/2017.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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