Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial – Usucapião especial – 1. Bem financiado com recursos do SFH e pertencente à CEF. Pretensão rechaçada pela jurisprudência do STJ – 2. Análise dos requisitos para configuração da usucapião. Súmula 7 do STJ – 3. Alegação de ofensa aos arts. 1.204, 1.238, 1.240-A do Código Civil/2002 e existência de divergência jurisprudencial. Inovação recursal – 4. Agravo interno improvido

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.151.574 – RJ (2017/0200922-0)

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE

AGRAVANTE : MAGNA CARLA PENEDO PEREIRA

ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

AGRAVADO : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

AGRAVADO : EMPRESA GESTORA DE ATIVOS – EMGEA

ADVOGADOS : LEONARDO YUKIO DUTRA DOS SANTOS KATAOKA – RJ106420

LUCÍLIA ANTUNES DE ARAÚJO SOLANO E OUTRO(S) – RJ119937

AGRAVADO : COOPERATIVA HAB DOS SERVIDORES INT BRASILEIRO DO CAFE

ADVOGADO : FELIPE ARTIMOS DE OLIVEIRA E OUTRO(S) – RJ115055

EMENTA

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO ESPECIAL. 1. BEM FINANCIADO COM RECURSOS DO SFH E PERTENCENTE À CEF. PRETENSÃO RECHAÇADA PELA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 2. ANÁLISE DOS REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DA USUCAPIÃO. SÚMULA 7 DO STJ. 3. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 1.204, 1.238, 1.240-A DO CÓDIGO CIVIL/2002 E EXISTÊNCIA DE DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. INOVAÇÃO RECURSAL. 4. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. O Tribunal local asseverou ser inviável a usucapião de imóveis vinculados ao SFH, diante do viés público desse tipo de bem, pois são financiados por meio de fundo público. Nesse passo, verifica-se que o aresto impugnado encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Casa de Justiça no sentido de ser impossível a usucapião de imóveis construídos com recursos do SFH e pertencentes à CEF.

2. Ademais, a verificação dos requisitos necessários, para usucapir o imóvel, demanda o revolvimento fático-probatório dos autos, situação vedada pela Súmula 7 do STJ.

3. Segundo esta Corte Superior, “é vedado, em sede de agravo interno, ampliar-se o objeto do recurso especial, aduzindo-se questões novas, não suscitadas no momento oportuno, em virtude da ocorrência da preclusão consumativa” (STJ, AgInt no REsp 1.536.146/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 14/09/2016).

4. Agravo interno improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 06 de fevereiro de 2018 (data do julgamento).

MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Cuida-se de agravo interno interposto por Magna Carla Penedo Pereira contra a decisão desta relatoria, que conheceu do agravo para conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fl. 680):

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO URBANA. 1. BEM FINANCIADO COM RECURSOS DO SFH E PERTENCENTE À CEF. PRETENSÃO RECHAÇADA PELA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 2. INVERSÃO DAS CONCLUSÕES DO ACÓRDÃO. ÓBICE. SÚMULA 7/STJ. 3. AGRAVO CONHECIDO PARA CONHECER PARCIALMENTE DO RECURSO ESPECIAL E, NESSA EXTENSÃO, NEGAR-LHE PROVIMENTO.

Nas razões do agravo interno (e-STJ, fls. 690-702), a insurgente busca o afastamento do óbice da Súmula 7 desta Corte.

Aduz que o Tribunal de origem deixou de analisar a contento “o direito de posse do imóvel por parte da agravante” (e-STJ, fl. 695).

Sustenta a “possibilidade de reconhecimento de usucapião no tocante a imóvel da Caixa Econômica Federal relacionado ao Sistema Financeiro de Habitação”, conforme precedente do STF (RE n. 536.297/MA, de Relatoria da Ministra Ellen Gracie, DJE 25/11/2010) – (e-STJ, fl. 701).

Por fim, pleiteia a reconsideração da decisão agravada ou a submissão do inconformismo ao Órgão colegiado.

Não foi apresentada impugnação (e-STJ, fl. 706).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR):

A irresignação não merece prosperar.

O Tribunal local asseverou ser inviável a usucapião de imóveis vinculados ao SFH, diante do viés público desse tipo de bem, pois são financiados por meio de fundo público (e-STJ, fl. 164).

Nesse passo, verifica-se que o aresto impugnado encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Casa de Justiça no sentido de ser impossível a usucapião de imóveis construídos com recursos do SFH e pertencentes à CEF.

A propósito:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. USUCAPIÃO ESPECIAL. IMÓVEL URBANO, FINANCIADO PELO SFH E COM GARANTIA HIPOTECÁRIA. IMPRESCRITIBILIDADE. ENTENDIMENTO DA CORTE DE PISO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PRECEDENTE ESPECÍFICO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 83 DO STJ. REQUISITOS LEGAIS À AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE. REFORMA DO JULGADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA Nº 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. O presente agravo interno foi interposto contra decisão publicada na vigência do NCPC, razão pela qual devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

2. Esta Corte já consolidou o entendimento de que o imóvel da Caixa Econômica Federal vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível (REsp nº 1.448.026/PE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, DJe 21/11/2016).

3. No caso, a revisão do entendimento a que chegaram as instâncias ordinárias acerca do preenchimento dos requisitos autorizadores e necessários para que o imóvel urbano fosse adquirido por usucapião, seria necessário o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, soberanamente delineados pelas instâncias de base, o que é defeso nesta fase recursal a teor da Súmula nº 7 desta Corte.

4. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente recurso não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos.

5. Em virtude do não provimento do presente recurso, e da anterior advertência em relação a incidência do NCPC, incide ao caso a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do NCPC, no percentual de 3% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º daquele artigo de lei.

6. Agravo interno não provido, com imposição de multa.

(REsp nº 1.480.254/AL, Relator Ministro MOURA RIBEIRO, DJe 9/10/2017)

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO URBANO. IMÓVEL DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL VINCULADO AO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI . MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. “O imóvel da Caixa Econômica Federal vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível” (REsp 1.448.026/PE, Rel. Ministra Nancy Andrighi).

2. A Corte de origem, mediante o exame do acervo fático-probatório dos autos, concluiu não ter sido demonstrado o requisito do animus domini para a caracterização da usucapião especial urbana, tendo em vista que o imóvel está vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação e que a parte autora sabia ser pertencente a outrem. Infirmar as conclusões do julgado, para reconhecer a existência de posse mansa e pacífica, demandaria o revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(REsp nº 1.584.104/AL, Relator Min. RAUL ARAÚJO, DJe 8/9/2017)

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. IMÓVEL DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL VINCULADO AO SFH. IMPRESCRITIBILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO.

1. Ação de usucapião especial urbana ajuizada em 18/07/2011, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 11/01/2013 e concluso ao Gabinete em 01/09/2016.

2. Cinge-se a controvérsia a decidir sobre a possibilidade de aquisição por usucapião de imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação e de titularidade da Caixa Econômica Federal.

3. A Caixa Econômica Federal integra o Sistema Financeiro de Habitação, que, por sua vez, compõe a política nacional de habitação e planejamento territorial do governo federal e visa a facilitar e promover a construção e a aquisição da casa própria ou moradia, especialmente pelas classes de menor renda da população, de modo a concretizar o direito fundamental à moradia.

4. Não obstante se trate de empresa pública, com personalidade jurídica de direito privado, a Caixa Econômica Federal, ao atuar como agente financeiro dos programas oficiais de habitação e órgão de execução da política habitacional, explora serviço público, de relevante função social, regulamentado por normas especiais previstas na Lei 4.380/64.

5. O imóvel da Caixa Econômica Federal vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível.

6. Alterar o decidido pelo Tribunal de origem, no que tange ao preenchimento dos requisitos legais para o reconhecimento da usucapião, seja a especial urbana, a ordinária ou a extraordinária, exige o reexame de fatos e provas, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7/STJ.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (REsp 1448026/PE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 21/11/2016)

Ademais, consta do acórdão recorrido (e-STJ, fls. 529-539):

Cuida-se de apelação de Magna Carla Penedo Pereira, que objetiva a desconstituição da penhora que recaiu sobre o imóvel à Rua Oliveiro Rodrigues Alves, 522/307.

A Cooperativa Habitacional dos Servidores do Instituto Brasileiro de Café celebrou contrato com o BNH e a Caixa Econômica Federal, sendo concedido o valor de Cr$ 19.906.800.000,00, em 8 de setembro de 1981, com o objetivo de construir 45.000 unidades habitacionais, através do Programa de Cooperativas Habitacionais, Prosindi e Prohasp, fls 36/46, dos autos da execução por título extrajudicial, processo nº 2008.51.01.000338-9.

Cláusula Primeira O BNH, nos termos do contrato de abertura de crédito firmado em 22/10/1980, ajustou com a CEF o fornecimento de recursos da ordem de Cr$ 19.906.800.000,00 equivalentes, àquela data, a 30.000.000 de UNIDADES PADRÃO DE CAPITAL (UPC) do BNH, de Cr$ 663,56 cada uma, correspondente a 50% dos recursos a serem alocados pela CEF para produção, de cerca de 45.000 unidades habitacionais, através do Programa de Cooperativas Habitacionais, do Programa Nacional de Habitação para o Trabalhador Sindicalizado de Baixa Renda – PROSINDI e do Programa Habitacional para os Servidores Púlicos – PROHASP.

Observa-se no referido contrato, que o empréstimo seria liquidado com a celebração de contratos de financiamentos com os terceiros, que assumiriam o pagamento das parcelas relativas a seu apartamento, quitando a dívida da executada, conforme a cláusula do art. 6º, do referido contrato.

A cláusula 7ª refere-se a hipoteca do imóvel e das construções que fossem edificadas, conforme descrito a seguir:

Cláusula Sétima (…) PARÁGRAFO ÚNICO – Em garantia dos recursos recebidos por força do Contrato de Abertura de Crédito referido na Cláusula Primeira deste instrumento, CEF dará ao BNH, em caução, nos termos do Decreto nº 24.77, de 14 de julho de 1934, os direitos creditórios decorrentes do empréstimo ora ajustado, no ato de constituição da hipoteca aludida no “caput” desta cláusula, apresentando ao BNH, a respectiva certidão comprobatória.

A apelante alega na apelação que esta na posse do imóvel em questão há mais de cinco anos, sem qualquer oposição, de maneira ininterrupta com animus dominiTodavia, não apresentou contrato de promessa de compra e venda do imóvel. Conforme decidido nasentença, trata-se de mera ocupação, que não goza de proteçãopossessória, não tendo direito a interpor embargos de terceiro.

A jurisprudência tem admitido a oposição de embargos de terceiros por quem adquiriu imóvel residencial, com promessa de compra e venda sem registro no RGI, em nome do princípio da boa-fé [1] .

Ocorrendo a transferência do domínio do imóvel da construtora para os adquirentes finais, ora embargantes, por escritura pública de compra e venda ou de promessa de compra e venda ou escritura de cessão de direitos, o crédito dos agentes financeiros imobiliários passa a incidir sobre “os direitos decorrentes dos contratos de alienação das unidades habitacionais integrantes do projeto financiado”. Por conseguinte, a garantia hipotecária instituída pela construtora em favor do agente imobiliário, que financiou o projeto, resta ineficaz em relação àqueles adquirentes finais, uma vez que a garantia passa a onerar os valores recebidos dos embargantes, e não as suas unidades imobiliárias.

Todavia, os imóveis do Sistema Financeiro de Habitação não podem sofrer usucapião, pois violaria os princípios constitucionais garantidores dos direitos à moradia e à dignidade da pessoa humana, tendo em vista que a propriedade é para recuperar os recursos indispensáveis à manutenção do Sistema Financeiro de habitação e de políticas públicas no setor.

Assim, a apelante vem ocupando bem público de forma irregular e clandestina, como mera detentora, sem efeitos possessórios.

A jurisprudência da Sexta Turma já se manifestou sobre o assunto, afirmando que permitir a aquisição de imóvel vinculado ao SFH por usucapião consiste em privilegiar o interesse puramente particular em prejuízo da sociedade e do interesse público e permitir a burla do ordenamento jurídico, favorecendo-se o mutuário inadimplente que transfere o imóvel irregularmente, em detrimento do mutuário que mantém em dia as suas obrigações contratuais [2] .

Deste modo, a sentença recorrida dever ser mantida, sendo certo, ainda, que a fundamentação ora expendida afasta a aplicação de todos os dispositivos invocados na apelação.

Do exposto, nego provimento ao recurso.

Tendo o Tribunal de origem afirmado que a recorrente nunca exerceu posse sobre o imóvel, mas mera detenção, não é possível afirmar o contrário sem reexaminar fatos e provas. Destarte, a pretensão esbarra no óbice do enunciado n. 7 desta Corte.

Ressalte-se que a alegação de afronta aos arts. 1.204, 1.238, 1.240-a do Código Civil e a existência de divergência jurisprudencial somente foram suscitadas nas razões do presente agravo interno, constituindo indevida inovação recursal, sendo inviável a análise do pleito ante a configuração da preclusão consumativa.

Confira-se:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73. INOVAÇÃO RECURSAL, EM SEDE DE AGRAVO INTERNO. NÃO CABIMENTO. ASTREINTES. REDUÇÃO DO VALOR. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESSA PARTE, IMPROVIDO. I. Agravo interno aviado contra decisão publicada em 01/03/2017, que julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/73. II. Trata-se, na origem, de ação de obrigação de fazer, proposta pela parte ora agravada em face do Estado de Pernambuco, objetivando o fornecimento de medicação necessária ao tratamento de doença que a acomete. III. No presente Agravo interno, a parte agravante suscita tese de violação ao art. 535 do CPC/73, que não fora objeto das razões do Recurso Especial, tratando-se, portanto, de indevida inovação recursal, em sede de Agravo interno, que não merece ser conhecida, na forma da jurisprudência. IV. No caso, o Tribunal a quo, diante do quadro fático delineado nos autos, manteve o valor das astreintes em R$ 500,00 (quinhentos reais), por dia de descumprimento, concluindo que tal valor encontra-se dentro dos parâmetros da razoabilidade e dos limites legais, razão pela qual entendeu não haver ilegalidade ou exorbitância em sua fixação. V. Consoante a jurisprudência do STJ, “rever o entendimento do Tribunal de origem, que consignou pela manutenção da multa cominatória fixada pelo Juízo de 1º Grau por descumprimento da decisão de fornecimento de medicamento, demandaria necessário revolvimento de matéria fática, o que é inviável em sede de recurso especial, à luz do óbice contido na Súmula n. 7/STJ” (STJ, AgInt no AREsp 728.833/PE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 09/06/2016). No mesmo sentido: STJ, AgRg no AREsp 844.841/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2016; VI. Agravo interno parcialmente conhecido, e, nessa parte, improvido.

(AgInt no AREsp n. 1.055.094/PE. Relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 24/8/2017).

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

Dados do processo:

STJ – AgInt no AREsp nº 1.151.574 – Rio de Janeiro – 3ª Turma – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJ 26.02.2018

Fonte: INR Publicações.

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Artigo: A problemática da averbação da CDA nos registros públicos de imóveis – Por Rodrigo Marcos Antonio Rodrigues

*Rodrigo Marcos Antonio Rodrigues

“A inscrição é ato que tem por condão legitimar a origem dos créditos em favor da Fazenda Pública, tornando-os aptos à cobrança pela via executiva judicial.”
(RODRIGUES, 2016, p. 297).

De fato, não há execução sem título executivo, o qual, no caso dos débitos não tributários, a exemplo das receitas patrimoniais devidas à União (taxa de ocupação, foro e laudêmio), é formado com a inscrição do respectivo débito na Dívida Ativa da União (DAU).

Abordemos como exemplo, para o enfrentamento da problemática proposta, exatamente as receitas patrimoniais devidas à União em decorrência da utilização do bem público.

A competência para inscrição na DAU é exclusiva da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

A PGFN inscreve na DAU a receita patrimonial “inadimplida” a partir de informações recebidas da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), órgão que administra os bens da União.

Cabe à PGFN apurar a liquidez e certeza dos débitos que lhe são submetidos e representar a União na cobrança e execução da dívida inscrita.

Sobre essa apuração, é “importante salientar que somente poderão ser inscritos os débitos em que a Fazenda verificar estarem isentos de qualquer vício que importe na incerteza de sua exigibilidade, pois a inscrição se constitui no ato de controle administrativo de legalidade, a ser levado a efeito por esse órgão competente” (RODRIGUES, 2016, p. 298).

A Certidão de Dívida Ativa (CDA) é documento formado com os elementos constantes do Termo de Inscrição de Dívida Ativa. Trata-se do próprio título executivo.

A inscrição na DAU, por si só, gera diversas consequências à pessoa física ou jurídica inscrita. Uma delas é a impossibilidade de obtenção da Certidão Conjunta Negativa de Débitos Relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União em seu nome, o que a impede de participar de licitações, além de embaraçar diversas espécies de negócios jurídicos. Outra consequência é a retenção, pela Receita Federal, de eventual Imposto de Renda a receber. O débito aumenta vertiginosamente com a adição de juros, multas e demais encargos. Mas esses são apenas alguns dos exemplos do que podemos chamar de “sanções” administrativas diretas e indiretas.

Além dessas “sanções”, a Fazenda Pública dispõe, desde a entrada em vigor da Lei 12.767/2012, de outro mecanismo para compelir o devedor a pagar os débitos inscritos em seu nome, que é a possibilidade de protestar extrajudicialmente o título (CDA).

Referida lei foi questionada no Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Direta de Constitucionalidade 5.135/DF, tendo sido fixada a seguinte tese: “O protesto das Certidões de Dívida Ativa constituí mecanismo constitucional e legítimo por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política”.

Registre-se que o julgamento da ADI não foi unânime, tendo sido vencidos os ministros Edson Fachin, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, e não estando presentes no julgamento os ministros Gilmar Mendes e Teori Zavascki.

Essa ação teve seu trânsito em julgado certificado em 17/2/2018.

Interessante observar que o ministro Roberto Barroso, que exerceu a relatoria do caso, em seu voto, ao rechaçar um dos fundamentos da autora da referida ADI, em relação à violação, ou não, do “princípio da proporcionalidade” da medida, assim pontuou: “Em primeiro lugar, ao contrário do que alega a CNI, entendo que o protesto é, em regra, mecanismo que causa menor sacrifício ao contribuinte do que os demais instrumentos de cobrança disponíveis, em especial a Execução Fiscal. Por meio do protesto, exclui-se o risco de penhora de bens, renda e faturamento e de expropriação do patrimônio do devedor, assim como se dispensa o pagamento de diversos valores, como custas, honorários sucumbenciais, registro da distribuição da execução fiscal e possibilita-se a redução do encargo legal” (grifamos).

Extrai-se do entendimento acima que a “penhora de bens” é mecanismo que causa maior sacrifício ao contribuinte.

O que se dizer então da chamada averbação “pré-executória”? Seria mecanismo menos gravoso ao contribuinte do que o protesto? Seria uma medida “proporcional”?

Note-se que o “frenesi” por retirar as questões do Judiciário, na carona do fenômeno da desjudicialização, a despeito de não se tratar de questões consensuais (das quais somos plenamente favoráveis), ocorre a ponto de, recentemente, ter sido autorizada a averbação da CDA em todo e qualquer órgão de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, o que inclui, por óbvio, os serviços registrais imobiliários, tornando esses bens “indisponíveis”. É o que se convencionou chamar de averbação “pré-executória”.

Veja o que diz o artigo 20-B da Lei 10.522/2002, introduzido pela Lei 13.606/2018, no seu parágrafo 3º, inciso II:

“Art. 20-B. Inscrito o crédito em dívida ativa da União, o devedor será notificado para, em até cinco dias, efetuar o pagamento do valor atualizado monetariamente, acrescido de juros, multa e demais encargos nela indicados […]

§ 3º Não pago o débito no prazo fixado no caput deste artigo, a Fazenda Pública poderá:

I – comunicar a inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres; e

II – averbar, inclusive por meio eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis” (grifamos).

O artigo 20-E da referida lei dispõe que caberá à PGFN regulamentar a medida por meio da edição de atos complementares.

Tomamos ciência da Portaria PGFN 33, de 8 de fevereiro de 2018, publicada no DOU de 9/2/2018, que regulamenta o artigo 20-B. Comentaremos essa portaria durante o presente ensaio.

A justificativa para permitir essa constrição de cunho “inquisitório”, a nosso ver, busca respaldo na mesma conferida ao protesto da CDA, que é a tentativa de desjudicializar as questões que envolvem a cobrança de créditos fiscais, conferindo à Fazenda Pública mecanismos mais “coercitivos”, por assim dizer, para a cobrança judicial administrativa.

É que estudo do CNJ (2017, p. 109) aponta que cerca de 40% das ações que tramitam no país são executivos fiscais, portanto, sendo essa categoria de ação uma das grandes responsáveis pelo assoberbamento da máquina judiciária.

Verdade é que não são apenas os executivos “fiscais” que emperram a máquina judiciária. A fase de execução do processo cível, que deveria ser célere, acaba sendo mais morosa do que o processo de conhecimento.

Nessa linha de pensamento, apresenta-se mais uma solução paliativa, a nosso ver, e, arriscamos dizer, contrária à estrada da desjudicialização.

Se a penhora de bens já é algo gravoso, mesmo quando determinada judicialmente, imagine na sua forma extrajudicial.

Poder-se-ia sustentar o seguinte: não se trata de averbar a “penhora”, mas, sim, a CDA, a fim de conferir-lhe publicidade e tornar indisponível o bem.

Ocorre que há, pelo menos, duas interpretações possíveis do novo texto da lei. Uma é que a averbação atingirá todo o patrimônio do devedor que estiver sujeito a arresto ou penhora. A outra é que será eleito um ou mais bens para garantia e futura satisfação do crédito fazendário.

Se for um ou mais bens para garantia, o ato é de constrição, assemelhando-se, em princípio, ao arresto. Se forem todos os bens, podemos afirmar que se assemelha à indisponibilidade de bens prevista no artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992).

A primeira vincula os bens à satisfação do crédito. A segunda, não, dado que seu efeito imediato é impedir que os bens do acusado da prática do crime sejam alienados, o que configura grave restrição ao direito de propriedade.

O fato de a averbação “pré-executória” não ser uma penhora, em strictu sensu, não afasta seu caráter constritório, afinal, não estamos falando de uma averbação premonitória (artigo 828 do novo CPC), que tem por finalidade, tão somente, dar publicidade à existência da ação, a fim de que eventual alienação a terceiro presuma-se ter sido feita em fraude à execução. A medida viola direito líquido e certo do contribuinte, pois atenta contra, pelo menos, um princípio fundamental da Carta Magna: o de que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal (artigo 5º, inciso LIV).

E o que significa “devido processo legal”? Segundo Nelson Nery Junior (2012, p. 228), “trata-se do postulado fundamental do direito constitucional (gênero), do qual derivam todos os outros princípios (espécies). Genericamente, a cláusula due process se manifesta pela proteção à vida-liberdade-propriedade em sentido amplo. O texto foi inspirado nas emendas 5ª e 14ª à CF americana, e não indica apenas tutela processual, mas sim geral, bipartindo-se o princípio em devido processo legal substancial e processual”.

No sentido “processual” do princípio é que a doutrina brasileira vem interpretando a cláusula due process, cujas manifestações visam garantir aos litigantes: “Acesso à justiça (direito de ação e defesa), igualdade de tratamento, publicidade dos atos processuais, regularidades do procedimento, contraditório e ampla defesa, realização de provas, julgamento por juiz imparcial (natural e competente), julgamento de acordo com provas obtidas licitamente, fundamentações das decisões judiciais etc.” (NERY JUNIOR, 2012, p. 228).

A Portaria PGFN 33/2018, que regulamentou o artigo 22-B da Lei 10.522/2002, reza que o contribuinte poderá, em até 10 dias do recebimento da notificação de pagamento do débito inscrito na DAU, “apresentar Pedido de Revisão de Dívida Inscrita (PRDI)” nas hipóteses taxativamente previstas, ou seja, antes que se proceda à averbação pré-executória, além de outras medidas relacionadas a sanções e à cobrança administrativa.

Ocorre que o julgamento desse pedido de revisão, invariavelmente, não observará as garantias da cláusula due process, como o julgamento por um juiz imparcial.

A citada portaria permite, ainda, que o contribuinte, depois de notificado, ofereça bens por iniciativa própria e apresente impugnação, neste caso se averbada a CDA no registro de bem ou direito que lhe pertencer.

Sobre um dos efeitos da averbação “pré-executória”, qual seja o da “indisponibilidade de bens”, é bom que se tenha em mente o Provimento CG 13/12 da CGJSP, que instituiu a “Central de Indisponibilidade de Bens”.

Veja o que diz o seu artigo 2º:

“A Central de Indisponibilidade de Bens será constituída por Sistema de Banco de Dados Eletrônico (DBMS) que será alimentado com as ordens de indisponibilidade decretadas pelo Poder Judiciário e por órgãos da Administração Púbica, desde que autorizados em lei”.

Observe-se a previsão expressa de a central receber ordens de indisponibilidade decretadas pela administração pública, desde que autorizadas em lei. A disposição encaixa-se perfeitamente no caso sub examine.

Os notários e registradores de imóveis são obrigados a consultar a central, antes da prática de qualquer ato notarial ou registral que tenha por objeto bens imóveis ou direitos a eles relativos (exceto testamento).

Note-se, agora, uma das constrições causadas pela medida, conforme dá conta o parágrafo 1º do artigo 12 do citado provimento:

“No caso de procuração com poderes para alienação ou oneração de bens em que o outorgante esteja com seus bens atingidos por indisponibilidade, essa circunstância deverá ser expressamente consignada no instrumento, com destaque gráfico e a observação de tratar-se de negócio jurídico cuja eficácia está subordinada ao prévio cancelamento da indisponibilidade noticiada” (grifamos).

Trata-se de restrição a um dos direitos de propriedade, que é o de livremente dispor do bem (vide também o artigo 14, parágrafo 1º, do Provimento CG 39/2014 do CNJ).

A Ordem dos Advogados do Brasil já se pronunciou no sentido de que ajuizará uma ADI perante o STF por entender que o novo procedimento viola “as mais elementares garantias constitucionais inerentes ao Estado de Direito”.

A bem da verdade, o problema não está no executivo fiscal, mas, sim, na formação do título executivo. Tomando como exemplo nosso exemplo (sim, a redundância foi proposital), observe-se como são formadas as CDAs no caso das receitas patrimoniais oriundas da utilização dos bens da União.

A SPU possui um cadastro deficiente de parte significativa dos imóveis que administra, seja por não tê-los demarcado e incorporado regularmente ao patrimônio da União[1], seja por não manter atualizado, como deveria, o cadastro de seus ocupantes, em nome de quem lança a cobrança de taxa de ocupação, e de seus foreiros, em nome de quem lança a cobrança do foro.

O controle administrativo de legalidade dos atos não é atribuição somente da PFN, também o é da SPU, que tem o dever de observar princípios como o da irretroatividade da lei, na aferição da hipótese de incidência da receita patrimonial.

Declarar de ofício a decadência de créditos originados em receitas patrimoniais é dever da União, todavia é raro ser declarada. O que muitas vezes se vê é o lançamento dessas receitas, que, desde a sua constituição, encontram-se eivadas por vício insanável.

Aí está um excelente mecanismo de desjudicialização que não é utilizado, pois, se declarada de ofício a decadência, não haveria a necessidade de promover um executivo fiscal cuja probabilidade de êxito é pequena.

A prescrição é outro fenômeno de extinção do crédito não tributário, que raramente é declarada de ofício, o que resulta na judicialização da cobrança, repita-se, com baixa probabilidade de êxito.

O ponto central da questão, a nosso ver, é que a averbação “pré-executória” não trafega na estrada da desjudicialização, tendo em vista sua conflituosa disposição com princípios fundamentais de nossa Carta Magna, daí porque, inexoravelmente, caminha para a judicialização.

E, tomando por esteio a averbação da CDA formada a partir da inscrição de débitos de receitas patrimoniais na DAU, a situação fica ainda mais delicada, em nossa concepção, por causa do deficiente controle administrativo de legalidade.


[1] Para mais considerações a respeito, recomendamos a leitura do artigo: Súmula do STJ está na contramão dos atuais conceitos de registro de propriedade


Referências bibliográficas
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal Comentada e Legislação Constitucional. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
REVISTA JUSTIÇA EM NÚMEROS 2017: ANO-BASE 2016. Brasília: Conselho Nacional de Justiça. 2017 – Anual.
RODRIGUES, Rodrigo Marcos Antonio. Curso de Terrenos de Marinha e seus Acrescidos. 2. ed. São Paulo: Pillares, 2016.

Rodrigo Marcos Antonio Rodrigues é advogado, professor, pós-graduado em Direito Notarial e Registral Imobiliário, presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da Ordem dos Advogados de Santos (SP) e autor do livro Curso de Terrenos de Marinha e seus Acrescidos.

Fonte: ConJur | 12/04/2018.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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