STJ/CGJSP: Registro Civil – Alteração de nome em virtude de conversão ao judaísmo – Possibilidade – Situação autorizadora de modificação do registro civil – Princípio da imutabilidade do nome civil que não é absoluto – Ausência de prejuízo a terceiros – Sentença reformada – Recurso provido.


  
 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1012168-76.2021.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante R. M. C. A., é apelado O JUÍZO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS (Presidente sem voto), GIFFONI FERREIRA E HERTHA HELENA DE OLIVEIRA.

São Paulo, 1º de outubro de 2021.

ALVARO PASSOS

relator

Assinatura Eletrônica

Voto nº 37202/TJ – Rel. Álvaro Passos – 2ª Câm. Dir. Privado

Apelação Cível nº 1012168-76.2021.8.26.0100.00000

Apelante: R.M.C.A.

Apelado: O Juízo

Comarca: Foro Central Cível 2ª Vara de Registros Públicos

Juiz(a) de 1ª Inst.: Juliana Forster Fulfaro

EMENTA

REGISTRO CIVIL – Alteração de nome em virtude de conversão ao judaísmo – Possibilidade – Situação autorizadora de modificação do registro civil – Princípio da imutabilidade do nome civil que não é absoluto – Ausência de prejuízo a terceiros – Sentença reformada – Recurso provido.

Vistos.

Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença de fls. 79/81, cujo relatório se adota, que julgou improcedente pedido feito em ação de alteração no de assento no registro civil em virtude de conversão ao judaísmo.

Inconformada, insurge-se a apelante requerendo a reforma da r. sentença pelas razões expostas à fls. 86/91, apontando que em 16.02.2016 se converteu ao judaísmo, sendo batizada com o nome “Batya Chaya Aranha”, sendo que para que realmente fosse considerada judia, viajou para a terra santa em 2015 para finalizar o processo de conversão e obter o certificado necessário, que por fim, houve a alteração de seu nome para um nome de origem judaica e bíblica conforme certidão juntada aos autos. Aponta que sua conversão levou mais de 03 anos e que não é algo simples, não concordando com o parecer ministerial de que poderia querer mudar de religião novamente. Aduz que a alteração de seu nome civil completaria o seu propósito e que já é reconhecida assim na sua vida religiosa, sendo que o nome, na religião judaica, tem uma importância grande.

Com parecer da d. Procuradoria Geral de Justiça (fls. 111/113), os autos vieram para reexame.

Com base no Comunicado do Conselho Superior da Magistratura, publicado em 13 de março de 2.020, relativo às medidas necessárias para o enfrentamento da pandemia do coronavírus, do qual consta, “– recomendar prioridade na realização de julgamentos virtuais nas Turmas Recursais e em Segundo Grau”, os autos foram remetidos para julgamento virtual.

É o relatório.

Respeitando entendimento diverso, o recurso comporta provimento.

No caso em tela, a apelante pretende ter o seu nome civil alterado para que seja igual ao seu nome religioso, ao qual foi batizada ao se converter ao judaísmo, no ano de 2016. Aponta que o processo de conversão é complexo e que teve que ir, inclusive, a terra santa para concretização. Alega que apenas com a alteração do nome atingirá o seu propósito.

Em se tratando da alteração em si, como é sabido, quanto aos registros públicos das pessoas naturais, a legislação brasileira segue a regra da imutabilidade de nome, autorizando a sua relativização para a sua alteração nos termos da lei e, conforme os arts. 56 e 57 da Lei nº 6.015/73, desde que por exceção e motivadamente.

No caso em comento, há motivação idônea, a respeitar a liberdade de crença e a dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, a exceção autorizada para relativizar a imutabilidade do nome.

Nesse sentido, inclusive em ação envolvendo o judaísmo, é o entendimento deste Eg. TJSP:

Retificação de registro civil – Pedido formulado em razão de afirmadas convicções religiosas – Requerente que provou conversão ao judaísmo – Existência de previsão a respeito na lei dos registros públicos – Sentença de procedência – Preliminar de nulidade rejeitada – Recurso do Ministério Público não provido. (TJSP; Feito não especificado 9136750-46.2006.8.26.0000; Relator (a): J. G. Jacobina Rabello; Órgão Julgador: Orgão Julgador Não identificado; SÃO PAULO-REG PUBL – 2.VARA REG PUBL; Data do Julgamento: N/A; Data de Registro: 16/11/2006).

Faz-se essencial, ainda, para eventual alteração, que seja seguido o princípio da segurança jurídica e assegurada a inviabilidade de prejudicar terceiros. No caso em apreço, ao que consta, resta inexistente prejuízo a terceiro.

Ademais, em que pese a imutabilidade apontada, tal não é absoluta, conforme apontado anteriormente.

Nas lições de ANDERSON SCHREIBER: “A concepção rígida do nome, como sinal distintivo imodificável, foi sendo gradativamente temperada pela legislação brasileira. Permite-se, hoje, a alteração em um conjunto variado de hipóteses, que abrange a retificação da grafia do nome em virtude do erro no registro, a tradução do nome estrangeiro em casos de naturalização, a alteração do prenome suscetível de expor o seu titular ao ridículo, a alteração ou substituição do prenome com a inclusão de apelido público notório, a alteração do nome em virtude de adoção, a alteração do nome no primeiro ano após a maioridade civil desde que não prejudique os nomes de família, e assim por diante” (“Direitos da Personalidade”, Ed. Atlas, 2011, p. 182).

Destarte, dentro da relatividade da legislação no que tange à imutabilidade do nome, determino a retificação dos registros da parte para constar a alteração do nome tal como pretendida na exordial.

Por derradeiro, a fim de evitar a oposição de embargos de declaração, única e exclusivamente votados ao prequestionamento, tenho por expressamente prequestionada, nesta instância toda matéria, consignando que não houve ofensa a qualquer dispositivo a ela relacionado.

Na hipótese de interposição de embargos de declaração contra o presente acórdão, ficam as partes desde já intimadas a se manifestarem no próprio recurso a respeito de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do art. 1º da Resolução nº 549/2011 do Órgão especial deste E. Tribunal, entendendo-se o silêncio como concordância.

Sendo manifestamente protelatória a apresentação dos embargos de declaração, aplicar-se-á a multa prevista no art. 1.026, §§ 2º e 3º, do CPC.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso.

ALVARO PASSOS

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1012168-76.2021.8.26.0100 – São Paulo – 2ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Alvaro Passos – DJ 05.10.2021

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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