CGJ/SP: Alienação Fiduciária de Imóvel – Possibilidade de o contrato ser firmado por pessoa jurídica que não integre o SFI – Contrato que pode validamente revestir formas pública ou particular – Arts. 22 e 38 da Lei 9.514/97, e item 230, Capítulo XX, das NSCGJ – Precedente – Recurso Desprovido.


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 0049648-26.2012.8.26.0002
(156/2016-E)

Alienação Fiduciária de Imóvel – Possibilidade de o contrato ser firmado por pessoa jurídica que não integre o SFI – Contrato que pode validamente revestir formas pública ou particular – Arts. 22 e 38 da Lei 9.514/97, e item 230, Capítulo XX, das NSCGJ – Precedente – Recurso Desprovido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso interposto em face de r. sentença que entendeu pela possibilidade de averbação de instrumento particular de alienação fiduciária de imóvel, firmado por pessoa jurídica que não integra o Sistema Financeiro Imobiliário.

Sustentaram os recorrentes, devedores fiduciantes, que a validade do contrato em comento dependeria de forma pública, nos termos do art. 108 do Código Civil. Ponderaram que somente pessoas jurídicas integrantes do Sistema Financeiro Imobiliário poderiam firmar negócio jurídico com tal teor. Requereram a nulidade da averbação do contrato em pauta.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Trata-se de verificar a possibilidade de averbação de contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, firmado por instrumento particular, com pessoa jurídica que não integra o Sistema Financeiro Imobiliário.

Diversamente do quanto sustentando pelo recorrente, a matéria é regulada pela Lei 9.514/97, que cuida, em capitulas distintos, tanto do Sistema Financeiro Imobiliário (Capitulo I), quanto da alienação fiduciária de coisa imóvel (Capítulo II). Por se tratar de regra mais específica, sobrepõe-se ao Código Civil, ao menos quanto à disciplina dos temas referidos.

Assim é que não incide á espécie o aventado artigo 108 do Diploma Civil, cuja redação, não bastasse, contém, logo de início, expressa ressalva de que sua torça somente se fará sentir “não dispondo a lei em contrário”. Em síntese, o próprio artigo 108 do Código Civil abre explicita ensancha à aplicação da Lei 9.514/97.

Neste passo, o artigo 22, § 1°, da Lei 9.514/97 prevê, às claras, a possibilidade de a alienação fiduciária ser contratada por pessoa jurídica que não integre o Sistema Financeiro Imobiliário:

“Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

§ 1º A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa tisica ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena:”

O item 230 do Capítulo XX das NSCGJ segue o mesmo norte:

“A alienação fiduciária, regulada pela Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, e suas alterações, é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência da propriedade resolúvel de coisa imóvel ao credor, ou fiduciário, que pode ser contratada por qualquer pessoa, física ou jurídica, e não é privativa das entidades que operam no Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI).

Note-se que o item aludido reforça a noção de que a alienação fiduciária de bem imóvel é regulada pela Lei 9.514/97. E o respectivo artigo 38 dispõe:

“Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.”

Resta patente, então, que contratos de alienação fiduciária de imóvel são daqueles a que não se exige forma pública, podendo ser validamente celebrados por instrumento particular.

Por fim, questão idêntica já havia sido analisada por esta Egrégia Corregedoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do Ilustre Magistrado Gustavo Henrique Bretas Marzagão:

“NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA – CAPÍTULO XX – Requerimento apresentado pelo Colégio Notarial do Brasil, Seção São Paulo – Alienação fiduciária de imóveis – Forma – Escritura pública ou instrumento particular para quaisquer dos contratos previstos na Lei n° 9.514/97 ou resultantes de sua aplicação – Proposta de utilização doinstrumento particular com efeitos de escritura pública apenas nos lavrados por entidade integrante do SFI – Não acolhimento.” (Autos 131.428/2012, Corregedor Des. Elliot Akel. DJ 19/3/14, grifos não constam do original)

Por todo o aduzido, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de se negar provimento ao recurso administrativo.

Sub censura.

São Paulo, 19 de julho de 2016.

Iberê de Castro Dias

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo O parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 20.07.2016. – (a) – MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS – Corregedoria Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 11.08.2016
Decisão reproduzida na página 96 do Classificador II – 2016

Fonte: Boletim Eletrônico INR – Pareceres dos Juízes Auxiliares da CGJ Nº. 156/2016-E – DJE/SP | 08/12/2016.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Compromisso de compra e venda de unidade autônoma – Pedido de registro do instrumento – Desqualificação – Necessidade de prévio registro da incorporação – Inteligência do artigo 32 da Lei nº 4.591/64 – Precedentes deste Conselho Superior – Artigo 39 da Lei nº 4.591/64 inaplicável à espécie – Apelação desprovida.


ACÓRDÃOS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1003072-13.2016.8.26.0100

Registro: 2016.0000807674

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1003072-13.2016.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante BEATRIZ KIER KRUTMAN, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:“Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

São Paulo, 18 de outubro de 2016.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1003072-13.2016.8.26.0100

Apelante: Beatriz Kier Krutman

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo

VOTO Nº 29.557

Registro de Imóveis – Compromisso de compra e venda de unidade autônoma – Pedido de registro do instrumento – Desqualificação – Necessidade de prévio registro da incorporação – Inteligência do artigo 32 da Lei nº 4.591/64 – Precedentes deste Conselho Superior – Artigo 39 da Lei nº 4.591/64 inaplicável à espécie – Apelação desprovida.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Beatriz Krier Krutman contra a sentença de fls. 91/93, que manteve a recusa ao registro de instrumento particular de compromisso de compra e venda na matrícula nº 71.152 do 1º RI da Capital, celebrado em 13 de maio de 2015, entre a apelante e Construtora e Incorporadora Atlântica Ltda., sob o argumento de ser necessário o prévio registro da incorporação imobiliária.

Sustenta a apelante: que o título pode ser registrado com fundamento no artigo 167, I, 29, da Lei nº 6.015/73 (compra e venda condicional); que o óbice ao registro favorece aquele que desrespeitou o artigo 32 da Lei nº 4.591/64; e que o artigo 39 da Lei nº 4.591/64 permite a negociação de futuras unidades autônomas sem o registro da incorporação imobiliária. Pede, por fim, o provimento do recurso para julgar improcedente a dúvida ou, subsidiariamente, a averbação do negócio jurídico com fundamento no artigo 246 da Lei nº 6.105/73 (fls. 111/128).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 142/144).

É o relatório.

Segundo consta, a apelante, por meio de instrumento particular de compromisso de compra e venda, adquiriu o apartamento nº 13 de edifício a ser construído na Rua Cubatão, 1.140, nesta Capital (fls. 20/22).

No entanto, a análise da matrícula nº 71.152 do 1º Cartório de Registro de Imóveis da Capital revela que a incorporação imobiliária não foi objeto de registro (fls. 28/34).

Esse fato justificou a qualificação negativa do título (fls. 19).

Agiu corretamente o Oficial.

Preceitua o artigo 32 da Lei nº 4.591/64:

Art. 32. O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos:

Após a listagem dos vários documentos que devem ser apresentados, enunciam os §§ 1º, 3º e 7º do mesmo artigo:

§ 1º A documentação referida neste artigo, após o exame do Oficial de Registro de Imóveis, será arquivada em cartório, fazendo-se o competente registro.

(…)

§ 3º O número do registro referido no § 1º, bem como a indicação do cartório competente, constará, obrigatoriamente, dos anúncios, impressos, publicações, propostas, contratos, preliminares ou definitivos, referentes à incorporação, salvo dos anúncios “classificados”.

(…)

§ 7º O Oficial de Registro de Imóveis responde, civil e criminalmente, se efetuar o arquivamento de documentação contraveniente à lei ou der certidão … (VETADO) … sem o arquivamento de todos os documentos exigidos.

O caput e os parágrafos acima transcritos mostram com clareza que a venda das unidades autônomas de condomínio edilício somente pode ocorrer após o registro da incorporação. Se a venda ou promessa de venda dos apartamentos depende do registro da incorporação, obviamente o registro da aquisição da unidade autônoma que é ato subsequente também não pode acontecer antes da incorporação imobiliária.

Esse é o posicionamento consolidado neste Conselho Superior:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Escritura de venda e compra de fração ideal de terreno – Incorporação imobiliária não registrada (Lei nº 4.591/64, art. 32) – Qualificação negativa do título – Recurso não provido.

O título foi qualificado negativamente porque não registrada previamente a incorporação imobiliária, nos termos do art. 32 da Lei nº 4.591/64

(…)

Portanto, houve alienação de unidade autônoma antes de registrada a incorporação imobiliária. O Conselho Superior da Magistratura já decidiu, em mais de uma oportunidade, que não há falar em unidade autônoma futura sem o prévio cumprimento do art. 32 da Lei nº 4.591/64 (Apelações Cíveis 59.953-0/5 e 59.954-0/0, relatadas pelo então Corregedor Geral da Justiça Des. Sérgio Augusto Nigro Conceição, julgadas em 6.12.99)” (Apelação nº 0046210-49.2009.8.26.0114, Rel. Des. Maurício Vidigal).

No mesmo sentido, apelação nº 9000003-14.2015.8.26.06023, por mim relatada:

Registro de Imóveis – Alienação de unidades autônomas de condomínio edilício antes da incorporação – Impossibilidade – Precedentes do Conselho Superior da Magistratura – Recurso desprovido” (j. em 8/4/2016).

Sobre as razões que justificam a exigência do prévio registro da incorporação, ensina Caio Mário da Silva Pereira:

No entanto, a grande inovação, diríamos mesmo, a revolução operada pela Lei n. 4.591/64, no sistema vigente, foi a fixação dos requisitos para que uma incorporação seja lançada e as unidades comprometidas ou vendidas.

Ao contrário do que antes ocorria, quando o incorporador negociava sem oferecer garantias e o adquirente realizava verdadeiro salto no escuro, sob todos os aspectos a lei nova cuidou particularmente do assunto e fez dele um capítulo, imprimindo-lhe ênfase toda especial (Condomínio e Incorporações: 12ª ed. rev. e atual. Forense – fls. 210).

Nota-se que a Lei de 1964 objetivou justamente proteger o consumidor que, no regime anterior, adquiria unidades autônomas em situação de total insegurança, sem qualquer garantia de que o empreendimento iria efetivamente ser finalizado.

A pretexto de proteger a apelante e afastando-se da letra da lei, não se poderia admitir o registro de compromisso de compra e venda de unidade autônoma antes do registro da incorporação.

Decisão nesse sentido serviria de incentivo justamente para a prática que se quer evitar, qual seja, a venda de unidades autônomas antes do registro da incorporação.

Considerar-se o título, para fins de registro, como compra e venda condicional (art. 167, I, 29, da lei nº 6.015/73), ao invés de compromisso de compra e venda (art. 167, I, 9, da Lei nº 6.015/73), também não se pode aceitar.

Em primeiro lugar, o instrumento de fls. 20/22 foi nomeado “instrumento particular de compromisso de venda e compra” e seu conteúdo confirma isso: trata-se de promessa irretratável de compra e venda, por meio da qual a promitente vendedora obrigou-se a vender à compromissária compradora (apelante) determinado imóvel e a outorgar-lhe a escritura definitiva oportunamente. Assim, se o título instrumentaliza um compromisso de compra e venda, inviável que seja ele registrado como uma compra e venda condicional.

Em segundo lugar, seja compromisso de compra e venda, seja compra e venda condicional, o prévio registro da incorporação é necessário, de modo que essa mudança em nada alteraria a desqualificação do título.

Ressalte-se, ainda, que o artigo 39 da Lei nº 4.591/64 [1] não serve de justificativa para permitir o ingresso do compromisso de compra e venda de unidades autônomas antes do registro da incorporação.

O dispositivo em questão trata de situação bastante específica, qual seja, incorporação imobiliária em terreno pago total ou parcialmente em unidades a serem construídas. Trata-se, portanto, de hipótese bem diferente da que aqui se analisa, o que já mostra a impossibilidade de aplicação analógica.

Ademais, o artigo 39 da Lei nº 4.591/64, embora permita o pagamento do terreno mediante a promessa de entrega de unidades autônomas futuras, em nenhum momento autoriza, antes da incorporação, o registro de título que faça menção a unidade específica.

Desse modo, ainda que as ponderações da apelante sejam respeitáveis e sua situação seja delicada pois a aquisição do imóvel, por ora, não pode ser registrada, nada justifica a modificação da posição já consolidada neste Conselho.

Por fim, inviável o requerimento subsidiário formulado pela apelante.

Isso porque a divulgação da alienação de unidade autônoma específica antes do registro da incorporação imobiliária, ainda que por meio de averbação notícia (artigo 246 da Lei nº 6.015/73), provocaria exatamente o que a Lei nº 4.591/64 visou a impedir, ou seja, o ingresso registral de um negócio que ainda não poderia ter sido realizado.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Art. 39. Nas incorporações em que a aquisição do terreno se der com pagamento total ou parcial em unidades a serem construídas, deverão ser discriminadas em todos os documentos de ajuste:

I – a parcela que, se houver, será paga em dinheiro;

II – a quota-parte da área das unidades a serem entregues em pagamento do terreno que corresponderá a cada uma das unidades, a qual deverá ser expressa em metros quadrados.

Parágrafo único. Deverá constar, também, de todos os documentos de ajuste, se o alienante do terreno ficou ou não sujeito a qualquer prestação ou encargo. (DJe de 07.12.2016 – SP)

Fonte: INR Publicações – DJE/SP | 07/12/2016.

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