1ª VRP/SP: Registro civil de pessoas jurídicas – pedido de providências – irresignação parcial – averbação de Ata de Assembléia Geral Extraordinária – pessoa jurídica de vocação religiosa que não se dedica somente ao culto – mandato por tempo vitalício – possibilidade.


Processo 1112077-67.2016.8.26.0100 – Pedido de Providências – Tabelionato de Protestos de Títulos – Templo de Umbanda Familia Pena Azul – – Fernanda Moreira Sadiró Novaes – Registro civil de pessoas jurídicas – pedido de providências – irresignação parcial – averbação de Ata de Assembléia Geral Extraordinária – pessoa jurídica de vocação religiosa que não se dedica somente ao culto – mandato por tempo vitalício – possibilidade – Pedido prejudicadoVistos. Trata-se de pedido de providências formulado pelo Templo de Umbanda Família Pena Azul, em face da negativa do Oficial do 5º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital em proceder à averbação da Assembleia Geral Extraordinária, realizada em 02.04.2016, para a lavratura da ata de fundação e votação do Estatuto Social da Entidade. O Oficial emitiu nota devolutiva (fls.32/33), apontando várias irregularidades na redação do Estatuto Social, sendo que a requerente discordou apenas de algumas delas, quais sejam: a) que a entidade não pode ser caracterizada como “organização religiosa”, como consta em seu estatuto, pois dedica-se a outras atividades não atinentes à liturgia e culto; b) necessidade de se adequar a terminologia utilizada no Estatuto, com a consequente substituição dos termos associados, associação, sócios e sociedade; c) existência de divergência entre a data da efetiva fundação da organização religiosa constante do Estatuto (0.01.2012) e a data da Assembléia Geral na qual deliberou-se sobre a fundação (02.04.2016); d) que deve haver a fixação de mandato por prazo determinado para o Ministro Religioso. Em relação aos outros óbices, houve concordância com o cumprimento das exigências. Houve a juntada de documentos pela requerente (fls.10/35). O Ministério Público opinou pela prejudicialidade do pedido ante a impugnação parcial das exigências e, no mérito, pela parcial procedência do pedido (fls.47/51).É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o Registrador e o Douto Promotor de Justiça. Na presente hipótese houve impugnação parcial das exigências formuladas pelo Registrador. A requerente demonstrou irresignação apenas em relação a três exigências das onze formuladas, quais sejam: a) que a entidade não pode ser caracterizada como “organização religiosa” como consta em seu estatuto, pois dedica-se a outras atividades não atinentes à liturgia e culto, conforme previsto no artigo 3º, IV e VI do Estatuto; b) exigência da utilização do termo membro, em vez de associado; c) mandato de duração do ministro religioso. A concordância parcial com as exigências do Oficial prejudica o pedido, que só admite duas soluções: a determinação da averbação do título protocolado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava no momento em que surgida dissenso entre a apresentante e o Oficial de Registro de Imóveis; ou a manutenção da recusa do Oficial. Para que se possa decidir se o título pode ser registrado ou não é preciso que todas as exigências – e não apenas parte delas – sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Egrégio Conselho Superior da Magistratura. No mérito verifico que a pretensão seria parcialmente procedente. A obediência ao Estatuto Social garante os interesses próprios da associação, nos termos em que foi criada, a par da vontade de seus associados, devendo ser clara e precisa em seus termos. De acordo com o artigo 3º , incisos IV, VI e VII do Estatuto Social:”Artigo 3º: A organização religiosa observará os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da eficiência, com as seguintes finalidades:(…)IV – manter o intercambio cultural e cooperação com entidades religiosas afins;(…)VI – dar assistência material à comunidade carente, inclusive colaborando em campanhas públicas de auxilia às pessoas;VII – promover atividades de organização associativas ligadas à Cultura, a Arte e Educação”. Vê-se que a entidade prevê em seu Estatuto prestação de serviços a terceiros que não são membros da crença. Esta peculiaridade é importante, sobretudo diante da atual jurisprudência da E. Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. Cito:CGJSP – PROCESSO:54.191/2015 Relator:Elliot Akel”Ora, aqui a situação é completamente diferente. A recorrente prestará assistência material não a terceiros, mas, somente, a seus próprios membros, que não são associados, mas clérigos, exclusivamente. Isso não desvirtua, absolutamente, a natureza de organização religiosa da recorrente, nem lhe dá feição mista. A prestação de assistência material aos seus clérigos – Bispos, Sacerdotes Católicos e Diáconos da Igreja Católica Apostólica Romana – é inerente aos próprios fins__ da organização religiosa. Trata-se dos meios para que se alcance o fim de propagação da fé. Repita-se: nem a assistência material será prestada a terceiros, nem os membros podem associar-se como se daria numa associação qualquer. Membros, aqui, são apenas os clérigos, assim reconhecidos pela Igreja Católica Apostólica Romana.” (grifo nosso)CGJSP – PROCESSO:51.999/2015 Relator:Elliot Akel”O presente caso, contudo, é diferente. Analisando-se o estatuto da recorrente, verifica-se que ela não se dedica a outras atividades, mas apenas ao culto e à liturgia, com uma única exceção no art. 18, que menciona a assistência aosfiéis necessitados, algo que não a caracteriza como entidade religiosa mista (na lição de Pontes de Miranda).”De acordo com os ensinamentos de Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado: Parte Geral – Introdução – Pessoas físicas e jurídicas. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954. t. 1, p. 324,§ 82, 6):”6. Sociedades e associações pias ou morais. O fato de ter nome de santo, ou aludir a alguma religião o nome da associação pia, ou moral, não a faz sociedade ou associação religiosa. Sociedade religiosa é a que se dedica ao culto. Se, ao lado do culto, pratica beneficência, ou ensino moral ou assistência moral, é mista. Se o culto é secundário, cessa qualquer caracterização como sociedade ou associação religiosa.”E ainda, de acordo com Paulo Lobo (Direito Civil: parte geral. 3.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 186-187): “A CF, art. 5º, VI, assegura a liberdade de exercício de cultos religiosos e garante, na forma da lei, “a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Vê-se que a liberdade de organização religiosa está limitada às finalidades de culto e liturgia. Somente para esses fins pode ser considerada organização religiosa e assim registrada. Se a comunidade religiosa desenvolve outras atividades, de caráter econômico, como instituições educacionais ou empresariais, estas não se consideram incluídas no conceito de “organizações religiosas” para os fins da Constituição e do CC, pois não destinadas diretamente para culto ou liturgia. Essas outras atividades deverão ser organizadas sob outras formas de personalidade jurídica (…), ainda que seus resultados econômicos sejam voltados para dar sustentação a projetos desenvolvidos pela respectiva comunidade religiosa”(g.n.) Concluise que as recentes decisões elencadas modificam a posição anterior da doutrina e jurisprudência ao dizer que as organizações religiosas não estão restritas as atividades de culto e liturgia, podendo prestar assistência a seus membros. No caso em análise contata-se que o intercambio cultural e cooperação com entidades religiosas afins, bem como participação em campanhas públicas de auxílio às pessoas e atividades de organização relacionadas a Cultural, Arte e Educação, não podem ser consideradas atividades exclusivamente religiosas, tendo sido aventadas de forma ampla, sendo que sequer se restringem aos seus fiéis ou pessoas a eles relacionadas. Conforme decidido pelo MMº Juiz Josué Modesto Passos, no Processo nº 0015547-23.2013 desta Vara:”O problema posto pela má técnica da Lei n. 10.825/03, que inseriu na lei um termo (“organização religiosa”) sem dar-lhe uma definição, está em saber onde inserir a pessoa jurídica que, criada e mantida com os fins últimos de dar culto e propagar a fé, desempenhe também outras atividades, como sucede com a requerente”Ademais, o rol de pessoas jurídicas de direito privado previsto no art. 44 do Código Civil não é exaustivo, conforme o enunciado da III Jornada de Direito Civil: “144 Art. 44: A relação das pessoas jurídicas de direito privado constante do art. 44, incs. I a V, do Código Civil não é exaustiva.”Assim, podemos entender que também é possível a pessoa jurídica “associação religiosa”, voltada para as entidades que além do culto e baseada em princípios religiosos, prestam assistência a terceiros, sendo assim, nas palavras de Pontes de Miranda, “associações mistas”. Analisando os incisos I, II e III verifica que o Templo Família Pena Azul presta serviços religiosos consistente em propagar a fé em Jesus Cristo, realizar trabalhos espiritualistas de umbanda, visando o bem estar e a elevação espiritual do Homem e difundir o conhecimento da doutrina umbandista por todos os meios admitidos em lei. Com isso, negada a possibilidade da requerente se caracterizar como organização religiosa devido a suas atividades voltadas a terceiros, a retificação para constar em seu estatuto, como “associação religiosa” afastaria o óbice corretamente apresentado pelo Oficial. No mais, em relação ao segundo óbice, correta a exigência do Registrador. A necessidade de substituição dos termos “associados”, “associação”, “sócios” e “sociedade” está correta, já que referem-se à várias espécies de pessoas jurídicas diversas daquela escolhida pela requerente. Ao contrário do que faz crer a interessada, não se trata de mero jogo de palavras, mas a adequação técnica do Estatuto Social. A respeito do assunto já decidiu o Egrégio Conselho Superior da Magistratura:”Ressalte-se, por derradeiro, que há total pertinências nas exigências realizadas pelo zeloso registrador, quais sejam, a necessidade o emprego da correta terminologia (“associação” e “associados” e não “sociedade” e “sócios”) e do prévio registro na serventia onde esteja, arquivados seus atos constitutivos; da uniformização do nome social e, ainda, da colheita das assinaturas dos eleitos na lista de presença”. (CSMSP – Apelação Cível 00.737-6-5 – Rel. Gilberto Passos de Freitas). Não merece acolhida o pedido de requerente para constar como data real de fundação janeiro de 2012, tendo em vista que a Assembleia Geral Extraordinária, momento em que foi votado o Estatuto e deliberado sobre sua constituição, foi realizada em 02.04.2016, sendo considerada esta última. Note-se que a presença de duas datas divergentes causará dúvidas em detrimento de terceiros. Por fim, em relação ao último óbice, referente à fixação de um mandato para o ministro religioso, deve ser o estatuto claro sobre o lapso temporal de sua duração ou sobre eventual vitaliciedade. Diante do exposto, julgo prejudicado o pedido de providências formulado pelo Templo de Umbanda Família Pena Azul, em face do Oficial do 5º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, com observação. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: RAFAEL NOVAES DA SILVA (OAB 300696/SP)

Fonte: DJE/SP | 29/11/2016.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.




1ª VRP/SP: PP – Registro de Imóveis- Pleito de ato registrário sem o recolhimento das custas e emolumentos.


Processo 1088945-78.2016.8.26.0100 – Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Noelia de Abreu – Vistos. Trata-se de pedido de providências formulado por Noelia de Abreu em face do Oficial do 3º Registro de Imóveis da Capital, pleiteando que se efetue ato registrário sem o recolhimento das custas e emolumentos. Relata que, em 06.06.2016, foi lavrada perante o 26º Tabelionato de Notas da Capital, escritura de inventário e adjudicação do Espólio de Geralda de Abreu, sendo que tal ato foi praticado com isenção total de custas e emolumentos. Todavia, ao apresentar o título para registro, lhe foi exigido o depósito prévio dos emolumentos. Assim, sob o argumento da ausência de condições financeiras, requerer o registro de transferência de propriedade independentemente de pagamento. Juntou documentos às fls.08/19. O Registrador informa que o novo Código de Processo Civil não contemplou qualquer dispositivo relativo à gratuidade dos emolumentos dos atos notariais de inventário extrajudicial, bem como não houve menção quanto à gratuidade dos atos de registro. Esclarece que mesmo não sendo obrigado a acatar a gratuidade concedida pelo Tabelião, propôs uma redução no percentual de 50% dos seus emolumentos, bem como o adimplemento em 12 parcelas mensais (fls. 25/28). Intimada da proposta do Registrador, a requerente reiterou seus argumentos, afirmando que a totalidade de sua renda é utilizada para gastos necessários à sobrevivência. O Ministério Público requereu o encaminhamento do feito ao Colégio Notarial do Brasil. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Entendo não ser adequada a solicitação de parecer ao Colégio Notarial do Brasil, tendo em vista que a questão versa sob a gratuidade dos emolumentos em relação ao registro, logo, a competência para eventual análise seria da Associação dos Registradores de São Paulo (ARISP). Entre as várias inovações trazidas com o advento do Novo Código de Processo Civil, não há qualquer dispositivo específico sobre a gratuidade dos emolumentos, sendo tal tema abarcado de foram genérica nos artigos 98 a 102:”Art. 98: A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.§ 1º A gratuidade da justiça compreende:… IX – os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido” (g.n)Ora, o dispositivo é claro ao estabelecer que somente em cumprimento de decisão judicial ou para continuidade de processo judicial deverão os registradores e notários praticar atos sem depósito das custas e emolumentos. Neste contexto, ao tratar das isenções e gratuidade, a Lei Estadual nº 11.331/2002, prevê em seu artigo 9º, II, que são gratuitos “os atos praticados em cumprimento de mandados judiciais expedidos em favor da parte beneficiária da justiça gratuita, sempre que assim for expressamente determinado pelo Juízo”Com efeito, a garantia da gratuidade na esfera dos emolumentos por atos de registro predial se opera por reflexo de decisão judicial proferida pelo juízo do processo que defere à parte, no feito próprio, o benefício da assistência judiciária. Logo, não é por pedido formulado ao Registrador, sem prévia decisão judicial de concessão da gratuidade, que se pode instituir a dispensa da cobrança da contraprestação pelo serviço prestado ou dos tributos devidos. Pertinente transcrever, também, trecho do parecer emitido pelo Meritíssimo Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. João Omar Marçura, aprovado pelo eminente Desembargador Luiz Tâmbara, então Corregedor Geral da Justiça:’REGISTRO DE IMÓVEIS – Gratuidade da Justiça – Concessão pelo Juiz Corregedor Permanente no âmbito administrativo – Inadmissibilidade – Isenção de taxa – Necessidade de previsão legal – Recurso provido para revogar a concessão. (…) Respeitado o entendimento do ilustre corregedor permanente, a isenção depende de lei expressa e, no caso dos autos, têm-se a incidência conjugada do artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal e do artigo 9º, II, da Lei Estadual 11.331/2002, de sorte que a isenção só haveria por ordem judicial, assim entendida aquela emanada de processo judicial e não administrativo, como ocorreu nestes autos. A razão de ser da Lei Estadual é clara, ou seja, visa a eficácia dos atos judiciais que se projetam no registro imobiliário.’ (Proc. CG n. 710/2003)”. Não há espaço para o exame e deferimento da gratuidade na esfera administrativa, nos termos do artigo 98 do CPC. Como bem explanou o Registrador: “a extensão do benefício aos atos extrajudiciais não necessários à efetivação da decisão judicial ou à continuidade do processo judicial seria uma interpretação da lei com uso de analogia, forma de interpretação vedada pelo Código Tributário Nacional que determina a interpretação literal nos casos de exclusão do crédito ou isenção. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido de providências formulado por Noelia de Abreu em face do Oficial do 3º Registro de Imóveis da Capital. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: ANDRÉ FERREIRA (OAB 346619/SP)

Fonte: DJE/SP | 29/11/2016.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.