Artigo: CARTÓRIO, O TEATRO DA VIDA CIVIL – Por Luiz Gustavo Leão Ribeiro

*Luiz Gustavo Leão Ribeiro

Agora, vamos lá:

Quando se nasce, registra-se em cartório. O último suspiro também perpetua-se nos livros e registros do cartório. Entre eles, a autenticação do diploma para matrícula na faculdade, o contrato de financiamento do primeiro carro, o casamento, a compra da casa própria, o registro dos filhos, a separação, o divórcio, o novo casamento, os novos filhos, a casa nova, o testamento para evitar a briga dos herdeiros; em suma, as grandes conquistas da vida se fazem diante de um notário ou registrador. É o cartório o palco para o grande teatro da vida civil.

O curioso é que passamos nossa vida inteira nos relacionando diretamente com a atividade notarial e registral e, ainda assim, esta permanece sendo um mundo quase que desconhecido da população, até mesmo das pessoas mais informadas.

Quando se pensa em cartório hoje no Brasil, fala-se de um universo de cerca de 20 mil serviços notariais e de registro, espalhados por todos os municípios. Universo habitado por centenas de milhares de empregados diretos, e outras centenas de milhares de indiretos. Pode-se afirmar, com segurança, que mais de 1 milhão de pessoas se sustentam com a atividade notarial e de registro.

Os cartórios são hoje a mais extraordinária e eficiente máquina de fiscalização tributária do País. Ninguém compra ou vende um imóvel sem que a transação seja imediatamente informada à Receita Federal, seja pelo notário ou pelo registrador, para se verificar a compatibilidade das declarações de renda com o patrimônio. Nenhuma escritura é lavrada se não for apresentada a certidão de regularidade com o IPTU, além do pagamento do Imposto de Transmissão (ITBI). Se for feito por instrumento particular, este não será registrado sem estas comprovações. Nenhuma construção é averbada sem a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias dos operários que trabalharam na respectiva obra, com a apresentação no Registro de Imóveis da CND – Certidão Negativa de Débitos do INSS.

Graças aos registradores civis, que informam gratuitamente ao INSS todos os óbitos ocorridos no mês, o sistema previdenciário brasileiro economiza milhões de reais com a suspensão imediata do pagamento de benefícios que, sem esta informação, continuariam a ser pagos indevidamente.

Qual o custo para o Estado deste exército de fiscalização? Absolutamente nenhum. Quanto custaria trocar esta eficientíssima estrutura por contingentes de milhares de fiscais tributários – vale acrescentar que para cada tabelião seria necessários, no mínimo, um fiscal da Receita Federal, um fiscal da Fazenda Estadual, um fiscal da Fazenda Municipal e um fiscal da Previdência Social, além dos técnicos e de todo o corpo administrativo necessário para movimentar a máquina estatal.

Acrescente-se que além de funcionarem como fiscais gratuitos, os tabeliães ainda se tornam devedores solidários dos tributos que porventura deixarem de fiscalizar o devido recolhimento. Além de contar com o serviço gratuito destes “fiscais”, as Fazendas Públicas ainda multiplicam sua capacidade de arrecadação, com fundamento na responsabilidade do notário ou registrador.

A responsabilidade é um dos pilares do sistema registral brasileiro, que é exemplo e modelo no mundo. Os notários e registradores, além de responderem pessoalmente e solidariamente pelos tributos que têm obrigação de fiscalizar, são responsáveis diretos por todos os atos praticados no cartório. Quando se reconhece uma firma, autentica-se um documento, lavra-se uma escritura, registra-se um imóvel, notifica-se uma pessoa, protesta-se um título, outorga-se uma procuração pública, em todos estes atos, muito além do carimbo do cartório, agrega-se a este documento uma espécie de seguro, baseado na responsabilidade e fé pública do tabelião.

E esta responsabilidade, que garante efetivamente a segurança jurídica e econômica dos atos praticados em cartório, é decorrência direta e imediata da autonomia e independência dos notários e registradores, que exercem a atividade em caráter privado, por delegação do Poder Público. Somente a manutenção do modelo atual, do exercício privado da atividade, garante a eficiência dos serviços e a garantia da responsabilidade do tabelião. Além do mais, assegura ao Estado a mais eficiente e segura estrutura de fiscalização, sem nenhum custo para os cofres públicos.

* Luiz Gustavo Leão Ribeiro é Registrador do 1º Ofício de Registro de Imóveis do DF.

Fonte: Anoreg-AL.

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Artigo: CÉDULA DE CRÉDITO RURAL E QUESTIONAMENTO DE SEUS EMOLUMENTOS – Por Marla Camilo

*Marla Camilo

A cédula de crédito rural é uma promessa de pagamento em dinheiro, sem ou com garantia real cedularmente constituída, regulamentada pelo Decreto-Lei 167/67. Existem as seguintes modalidades de cédulas de crédito rural: I — Cédula Rural Pignoratícia; II — Cédula Rural Hipotecária; III — Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária; IV — Nota de Crédito Rural.

As cédulas de crédito rural, para terem eficácia contra terceiros, devem ser registradas no Cartório do Registro de Imóveis (art. 30 do DL 167/67 c/c art. 167, I, 13, Lei 6.015/73).

Ocorre que a Federação de Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais não concordou com o valor cobrado e ajuizou ação judicial questionando essa fixação alegando que a cobrança dos emolumentos para o registro de cédula de crédito rural deveria ficar limitada aos valores previstos no art. 34 do decreto-lei 167/1967.

Decretos-leis têm força de lei e foram expedidos por Presidentes da República em dois períodos: de 1937 a 1946 e de 1965 a 1989. Nossa atual Constituição não prevê essa possibilidade, mas alguns decretos-leis ainda permanecem em vigor como é o caso do decreto-lei 167/1967.

Por conseguinte, o valor do registro de cédula de crédito rural é fixado em lei estadual porquanto a Lei nº 10.169/2000, que fixa o valor emolumentos, afirma em seu art. 1º que:

Art. 1o Os Estados e o Distrito Federal fixarão o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos respectivos serviços notariais e de registro, observadas as normas desta Lei. Parágrafo único. O valor fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados.

Nessa medida, definiu o STJ que o art. 34 do decreto-lei 167/1967 foi derrogado pela Lei º 10.169/2000, que autorizou os Estados/DF a fixarem o valor dos emolumentos. STJ. 1ª Turma. REsp 1.142.006-MG, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF da 1ª Região), Rel. para acórdão Min. Regina Helena Costa, julgado em 16/6/2016 (Info 587). Isso porque o referido decreto legislativo é anterior à CF/1988 e à Lei nº 10.169/2000, a qual, ao regulamentar o art. 236, § 2º, da CF/1988, conferiu novo regime jurídico ao tema, instituindo novas regras sobre os emolumentos, as quais hão de prevalecer, prestigiando a competência dos Estados membros de legislar sobre o assunto, em homenagem ao princípio federativo.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Decreto-lei 167 de 14 de fevereiro de 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0167.htm. Acesso em 11 out. 2016.

_______. Jusbrasil. Medida cautelar nº 16.912. Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/15451785/medida-cautelar-mc-16912. Acesso em 11 out. 2016.

_______. Lei 10.169 de 19 de dezembro de 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L10169.htm. Acesso em 11 out. 2016.

DE OLIVEIRA NETTO. Sérgio. Critérios solucionadores do conflito das leis que se sucedem no tempo. Disponível em: file:///C:/Users/Pc/Downloads/sergionetto_-_criteriossolucionadoresdoconflito.pdf. Acesso em 17 out. 2016.

CAVALCANTE. Márcio André Lopes. Disponível em: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2016/09/info-587-stj.pdf. Acesso em: 11 out. 2016.

OTÁVIO. Noronha. Serjus: STJ decide que emolumentos de cédula rural sejam calculados de acordo com lei estadual. Disponível em:http://www.irib.org.br/noticias/detalhes/serjus-stj-decide-que-emolumentos-de-cedula-rural-sejam-calculados-de-acordo-com-lei-estadual. Acesso em: 11 out. 2016.

Fonte: Blog CNB/CF | 27/07/2017.

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Artigo: Pensão alimentícia entre cônjuges é categoria em extinção – Por Mário Luiz Delgado

*Mário Luiz Delgado

Em um passado não tão distante, ainda marcado por uma profunda assimetria entre os gêneros, os alimentos fixados normalmente em favor da ex mulher tinham o objetivo  de manter o padrão social . O Código Civil Brasileiro, quando se refere aos alimentos entre cônjuges (artigo 1.694), ainda persiste em afirmar que essa verba deve ser fixada de modo a permitir ao outro “viver de modo compatível com a sua condição social”. Entretanto, esse cenário mudou radicalmente e os alimentos deixaram de ser analisados sob a ótica de assegurar à mulher o mesmo “conforto econômico” de que desfrutava enquanto casada, mas , sim, sob uma perspectiva da inclusão da mulher no mercado de trabalho , visando, ao final, colocá-la em  posição de igualdade frente ao homem.

O Superior Tribunal de Justiça do Brasil (STJ) decidiu recentemente, em mais um recurso tendo por objeto demanda de exoneração de alimentos, que deve ser extinta a “obrigação alimentar quando a alimentada for pessoa saudável, com condições de exercer sua profissão e tiver recebido a pensão alimentícia por tempo suficiente para que pudesse se restabelecer e seguir a vida sem o apoio financeiro do ex-cônjuge”.

Essa decisão resume a posição que tem prevalecido nos tribunais brasileiros, no sentido de que “os alimentos devidos entre ex-cônjuges devem ser fixados por prazo certo, suficiente para, levando-se em conta as condições próprias do alimentado, permitir-lhe uma potencial inserção no mercado de trabalho em igualdade de condições com o alimentante.

O precedentes refletem a evolução da obrigação alimentar entre cônjuges, ao longo dos últimos anos no Brasil, notadamente no que tange à substituição do binômio tradicional necessidade/possibilidade pelo trinômio contemporâneo da necessidade/possibilidade/razoabilidade, e que trouxe aos alimentos devidos entre ex-cônjuges o conceito de excepcionalidade,  que repudia a anacrônica presunção de que aquele que recebe os alimentos possa permanecer inerte (quando tenha capacidade laboral), deixando ao outro a perene obrigação de sustentá-lo. Em outras palavras, não basta que o devedor tenha possibilidade de pagar e que o credor tenha necessidade de receber os alimentos. É preciso investigar se o pagamento de um cônjuge a outro, por longo tempo, é também razoável.

O dever de assistência material entre os cônjuges, previsto no Código Civil e que se converte em obrigação alimentar quando da dissolução do vínculo, não se presta como supedâneo de “aposentadoria” ao cônjuge que se mantém omisso e que não procura, por seu próprio esforço, obter os meios necessários à sobrevivência. Admitir-se o contrário, seria premiar o enriquecimento sem causa.

É certo que o fundamento jurídico da obrigação alimentar não se esgota na conjugalidade. Existe, ainda, o princípio da solidariedade, previsto na Constituição do Brasil, a justificar a permanência do dever de mútua assistência material mesmo após a dissolução do vínculo. Especialmente porque aqueles que vivenciaram a conjugalidade nunca serão dois desconhecidos e não podem se comportar como estranhos. Entre eles, com mais razão, é de se impingir a concretização do princípio da solidariedade.

Porém, não ao ponto de se manterem os deveres conjugais, especialmente o de assistência material, de forma permanente, definitiva ou vitalícia, depois de rompida a convivência, de modo a que um ex-cônjuge se torne eternamente devedor do outro, pouco importando o tempo decorrido desde o divórcio. Mesmo porque, a obrigação de sustento, decorrente do princípio da solidariedade, deve ser direcionada preferencialmente aos parentes, especialmente aos filhos maiores e capazes, quando os houver,  e não ao ex-cônjuge, em relação aos qual já foram rompidos (ou desgastados) os laços de afetividade que poderiam justificar a continuidade da prestação de assistência material.

A jurisprudência consolidada no âmbito do STJ mostra-se, assim, consentânea com a nova realidade de isonomia entre os parceiros conjugais e aponta para um norte muito claro de extinção dos alimentos devidos entre ex-cônjuges, que só devem ser fixados em situações muito excepcionais, quando um dos cônjuges encontra-se impossibilitado de trabalhar e, simultaneamente, não possua outra fonte de renda. Verificada tal situação, os alimentos podem  ser expressamente   fixados  com lastro na incapacidade  laboral  permanente  ou  na impossibilidade prática de inserção  no  mercado  de  trabalho. Repita-se que, mesmo nesses casos, a obrigação de sustento, decorrente do princípio da solidariedade, deve ser direcionada preferencialmente aos parentes, especialmente aos filhos maiores e capazes.

Entretanto, não se pode negar que esse novo momento da jurisprudência brasileira tem causado situações de perplexidade, como nos casos em que pessoas, há muitos anos em situação de dependência dos alimentos, são surpreendidas com a cessação do pagamento, sem qualquer período de transição. Nem mesmo a idade de quem recebe os alimentos tem sido determinante para manutenção da obrigação alimentar.

Em um julgamento paradigmático, o STJ determinou a exoneração da obrigação alimentar que perdurava por mais de 18 anos, cuja alimentanda contava com 60 anos quando do julgamento do recurso.

Em outros casos, pessoas que se divorciam após décadas de convivência e estando, por idêntico período, fora do mercado de trabalho, recebem alimentos transitórios, limitados a períodos muito curtos, normalmente de um a dois anos, o que se mostra absolutamente insuficiente para uma apropriada reinserção no mercado, especialmente em um país com tamanhas distorções, como sói acontecer no Brasil.

Em um outro caso, um juiz havia fixado pensão alimentícia para a ex mulher no percentual de 10% sobre a remuneração do ex-marido, pelo período de três anos. Decorrido menos de um ano e meio, o STJ modificou a decisão do juiz e decidiu que a ex-mulher não deveria continuar a receber a verba alimentícia , por se tratar de “pessoa aparentemente jovem, que não sofre de nenhum problema que a incapacite para o trabalho”.

A decisão é coerente com a opção que vem sendo trilhada pelas cortes brasileiras, ao mesmo tempo em que reforça o receio de situações de injustiça, pois, nesse caso concreto, o tempo de transitoriedade dos alimentos (pouco mais de um ano) talvez não tenha sido suficiente o bastante para assegurar a tão sonhada inserção da mulher no mercado de trabalho, em igualdade de condições com o homem.

Fonte: ConJur | 26/07/2017.

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