Artigo: A incidência da gratuidade da justiça para os emolumentos: possibilidade e procedimento pelo Novo Código de Processo civil – Por Alberto Gentil de Almeida Pedroso e Caio Bartine

*Alberto Gentil de Almeida Pedroso e Caio Bartine

1ª PARTE – SISTEMÁTICA TRIBUTÁRIA NACIONAL: AS CUSTAS E OS EMOLUMENTOS SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL E JURISPRUDENCIAL

A nossa Constituição Federal dedica um capítulo específico sobre a disciplina tributária, regulando de maneira minuciosa a funcionalidade do sistema tributário brasileiro. Mesmo ante a observância de países pelos quais o direito brasileiro sofre influência, nada se compara a sistemática complexa adotada no Brasil. Em sua essência, o Sistema Tributário é nacional, vinculando-se, de igual modo, a todos os entes federativos.

É sabido que temos divergências doutrinárias quanto às espécies de tributos. Independentemente das discussões doutrinárias, o Tribunal Constitucional Brasileiro adotou a classificação pentapartida como aquela que embasa a atual sistemática tributária brasileira em posição oposta àquela inserida no Código Tributário Nacional, adotando-se a classificação tripartida, conforme assinalado no art. 5º:

“Art. 5º. Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”.

Nas afirmações do então Ministro Moreira Alves, quando do julgamento do RE 146.733,“de efeito, a par das três modalidades de tributos (impostos taxas e contribuições de melhoria) a que se refere o artigo 145 da Constituição Federal para declarar que são competentes para instituí-los a União, os Estados, o DF e os Municípios, os artigos 148 e 149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as contribuições sociais, inclusive as de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas”. 

O art. 145, II, da Constituição Federal indica a possibilidade dos entes federativos instituírem taxas devidas em razão do exercício do poder de policia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.

Conforme aludido na Constituição Federal, trata-se de uma característica fundamental aplicável às taxas o desempenho de uma atividade específica do Poder Público, sendo o valor exigido do contribuinte proporcional ao custo estimado do serviço ou da atividade de fiscalização. Nas palavras do Ministro Celso de Mello, no julgamento da ADI 2.551 MC-QO, “se o valor da taxa ultrapassar o custo do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, dando causa, assim, a uma situação de onerosidade excessiva, que descaracterize essa relação de equivalência entre os fatores referidos (o custo real do serviço, de um lado, e o valor exigido do contribuinte, de outro) configurar-se-á, então, quanto a essa modalidade de tributo, hipótese de ofensa à cláusula vedatória inscrita no art. 150, IV, da Constituição da República”.

É cediço que a atividade notarial e registral, mesmo executada no âmbito das serventias extrajudiciais, constitui, em decorrência de sua própria natureza, uma função revestida de estatalidade, sujeita a um regime jurídico de direito público.

O fato de a Constituição da República estabelecer, em seu art. 236, que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público não descaracteriza a estatalidade que reveste a atividade.

As serventias extrajudiciais, instituídas pelo Poder Público, são destinadas a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, constituindo-se órgãos públicos titularizados por agentes públicos e terão a fixação dos emolumentos relativos aos atos praticados mediante lei federal, em conformidade com o disposto no art. 236, §2º da Constituição da República.

A temática da natureza jurídica das custas e emolumentos já foi amplamente debatida entre os juristas e na própria Corte Constitucional. No julgamento da ADI 1.378-5, a jurisprudência do STF firmou entendimento no sentido de que as custas judiciais e os emolumentos concernentes ao serviços notariais e registrais possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços públicos, sujeitando-se, em consequência, quer no que concerne à sua instituição e majoração, quer no que concerne à sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam, dentre outras, as garantias essenciais da reserva de competência impositiva, da legalidade, da isonomia e da anterioridade.

Superada a discussão sobre a natureza jurídica conferidas as custas e aos emolumentos, passamos a considerar a concessão de benefícios fiscais, uma vez que todos os tributos incluídos na Constituição da República – e isto se aplica, de igual forma, às taxas – sujeitam-se ao regime jurídico-constitucional imposto na sistemática tributária brasileira.

Reza o art. 150, §6º, in verbis: 

“Art. 150 (…)

§6º. Qualquer subsídio ou isenção, redução da base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativas aos impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, §2º, XII, g”.

A lei que deve ser utilizada para desoneração dos tributos deve ser editada pelo próprio titular da competência impositiva, sob pena de flagrante afronta ao princípio da autonomia tributária das pessoas constitucionalmente previstas. Entretanto, impõe-se a edição de lei específica, não bastando a edição de uma simples lei genérica editada pelo titular da competência tributária.

Ademais, além da observância aos ditames constitucionais, a lei de responsabilidade fiscal limita a ação do legislador na concessão de incentivos de natureza tributária, conforme determina o art. 14 da LC 101/00:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário – financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; 

II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. 

§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

§ 3o O disposto neste artigo não se aplica: 

I – às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1o; 

II – ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.”

Busca-se, nesse dispositivo, uma gestão fiscal responsável, transparente, visando prevenir desequilíbrios orçamentários. Entretanto, vemos que o legislador anda em descompasso com os ditames estabelecidos em lei, notadamente na prestação de serviços notariais e registrais, senão vejamos:

I) independentemente do serviço notarial e registral ser prestado em caráter privado, por delegação do Poder Público, é cediço que o mesmo está revestido de estatalidade, estando sujeito a um regime jurídico de direito público;

II) as custas e emolumentos das serventias extrajudiciais revestem-se de natureza jurídica tributária, notadamente de taxas de serviços a serem cobrados dos usuários pela prestação do serviço público notarial e registral, estando, portanto, sujeitos a toda sistemática constitucional tributária;

III) os benefícios fiscais e renúncias fiscais devem ser conferidas pelo próprio ente político dotado de competência tributária, sendo instituídos mediante lei específica e em consonância com o disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Pontuadas tais premissas, nos deflagramos com o disposto no art. 98 da Lei 13.105/15 (Novo Código de Processo Civil), que revela:

A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

De fato, estamos diante de uma situação pela qual uma norma geral processual confere a possibilidade de pessoas físicas ou jurídicas terem direito a uma gratuidade de custas, ao arrepio de todos os itens acima expostos.

Tal gratuidade soa, mediante simples interpretação, como uma forma de renúncia de receita tributária, vez que as custas e emolumentos, conforme amplamente demonstrado e debatido, têm natureza jurídica de taxa de serviço. Ora, em sendo uma taxa, não se subsumi ao disposto no art. 150, §6º do texto constitucional? Não se aplica ao regramento exposto no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal?

A simples indicação do artigo em comento, visando atender o amplo acesso à justiça, não pode repudiar preceitos constitucionais e legais que podem comprometer o bom funcionamento na prestação de serviços públicos das serventias extrajudiciais.

Há necessidade de melhor entendimento sistemático e estudo mais aprofundado do tema, que não se faz presente nesse artigo, servindo apenas como uma ponderação sobre a importância do debate à lume dos preceitos constitucionais tributários e da política tributária. 

2ª PARTE: PROCEDIMENTO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA E O SERVIÇO EXTRAJUDICIAL

Apresentada a questão inicialmente sob a ótica da possibilidade técnica-legislativa de previsão ampliativa da gratuidade da justiça aos emolumentos extrajudiciais, passamos a enfrentar criticamente o tema em observância ao modelo criado pelo Código de Processo Civil.

Inaugurando o Livro III, Título I, Capítulo II, Seção IV, do Código de Processo Civil, dispõe o art. 98, “caput”, sobre a gratuidade da justiça:

A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

Ainda que de fácil compreensão a extensão expressa da gratuidade as pessoas físicas e jurídicas, brasileiras ou estrangeiras, ponto que merece destaque e enfrentamento refere-se ao melhor entendimento do termo “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas e os honorários (..)”.

De fato, a Lei processual civil comum não exigiu expressamente para concessão da gratuidade da justiça à declaração de pobreza do interessado – conforme previa o art. 4º, parágrafo 1º, da Lei 1.060/50, (revogado pelo Código de Processo Civil em seu art. 1.072, III) – mas a ausência de tal condição deve ser entendida de que forma?

Para Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (Novo Código de Processo Civil Comentado, 2ª ed., RT, pág. 241) dispensada a demonstração da condição de pobreza para gratuidade de justiça, basta a afirmação que a parte não tenha recursos suficientes para pagar as custas judiciais, as despesas do processo e os emolumentos extrajudiciais que fará jus a benesse legal. Mesmo que a pessoa tenha patrimônio suficiente, se estes bens não têm liquidez para adimplir com essas despesas, há direito à gratuidade.

Todavia, respeitada a opinião dos festejados doutrinadores, entendemos que a melhor compreensão do termo “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas e os honorários (..)” ainda é exigir da parte interessada na benesse legal à demonstração de insuficiência econômica para o custeio das despesas do processo e emolumentos. Deste modo, prestigiado o acesso efetivo à justiça na busca da concretização de direitos dos necessitados, ainda manteremos um sistema pautado na boa-fé objetiva e razoabilidade.

Boa-fé objetiva, pois trata-se de comportamento leal da parte arcar com as despesas judiciais e extrajudiciais se possui patrimônio suficiente para tanto, ainda que tenha que se desfazer de parte dele. Afinal, prestado um serviço público que exige contrapartida, não se mostra razoável a concessão da gratuidade apenas pela falta de liquidez patrimonial do beneficiado. É nesse sentido, inclusive, que se mantém boa parte da jurisprudência após a vigência do Novo Código de Processo Civil:

(…) Com efeito, a gratuidade da justiça é devida apenas àqueles com comprovada insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, conforme vigente regramento do NCPC, art. 98. Mesmo na plena vigência da Lei 1.060/50, os requisitos ali estabelecidos eram avaliados à luz do que dispõe a CF- art. 5º, LXXIV, que determina que a assistência jurídica integral e gratuita é devida aos que efetivamente comprovarem insuficiência de recursos. Assim, é lícito ao Juízo tanto exigir a apresentação de documentos comprobatórios quanto denegar o benefício se os elementos dos autos desde logo indicarem a ausência dos requisitos para a concessão do benefício. No caso concreto, o que se verifica é que um dos agravantes tem valores expressivos em aplicações financeiras (fls.  155), marcadas pela fácil liquidez, situação a elidir a declaração de pobreza apresentada. Disso tudo decorre que os agravantes não são pobres na acepção jurídica do termo, de modo que foi bem o juízo monocrático ao indeferir os benefícios da justiça gratuita. (…) (TJSP, Agravo de instrumento n° 2118797-42.2016.8.26.0000, 1ª C. de Direito Privado, relator Durval Augusto Rezende, data do julgamento 09/09/2016)

E

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – POLICIAL MILITAR – Decisão que indeferiu o benefício da justiça gratuita – Pleito de reforma da decisão – Inadmissibilidade – Agravante que não pode ser enquadrado na condição de necessitado, com rendimento líquido de 4,9 salários mínimos – Declaração de pobreza e documentos juntados aos autos que não são suficientes para demonstrar a hipossuficiência – Decisão mantida – Agravo não provido. (TJSP, Agravo de instrumento n° 2132492-63.2016.8.26.0000, 3ª C. de Direito Público, rel. Kleber Leyser de Aquino, data do julgamento 06/09/2016). 

O segundo ponto que merece análise é a possibilidade de modulação do benefício da gratuidade da justiça, previsão inovadora do Código de Processo Civil, prevista no art. 98, parágrafos 5º e 6º, nos seguintes termos:

(…) § 5º – a gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.

§ 6º – conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. 

Diante do novo quadro legal, poderá o juiz, no caso concreto, conceder o benefício da gratuidade da justiça em relação a um especifico ato ou a todos os atos processuais, ou reduzir o percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. Torna-se possível também ao magistrado deferir apenas o parcelamento das despesas processuais, após análise pormenorizada da condição da parte, valor das custas para fixação do número de parcelas para pagamento integral das custas, despesas processuais e emolumentos.

Entendemos que diante da estrutura criada pelo Código de Processo Civil de acesso concreto à justiça pela parte efetivamente necessitada o sistema de modulação do benefício da gratuidade pode atingir todas as hipóteses de custas e despesas previstas no art. 98, § 1º- I – as taxas ou as custas judiciais; II – os selos postais; III – as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios; IV – a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; V – as despesas com a realização de exame de código genético – DNA e de outros exames considerados essenciais; VI – os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira; VII – o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução; VIII – os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório; IX – os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. 

A modulação da gratuidade da justiça é uma ferramenta processual muito útil, pois autoriza o magistrado que análise de maneira fundamentada a capacidade econômica do interessado e atribua a cada parte, de forma personalizada, o montante exato da benesse que lhe é devida. Oxalá os juízes utilizem o dispositivo legal para tornar efetivo o espírito da norma jurídica, de maneira a tornar gratuito todos os atos que de fato devem ser, mas sem abusos ou exageros.

O último ponto que merece ser destaque e apreciação é o disposto no art. 98, § 8º do Código de Processo Civil, que assim dispõe:

§ 8a – na hipótese do § 1ª, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6° deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento. 

A autorização do art. 98, em seu § 8º, do Código de Processo Civil, para que o registrador ou tabelião, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, solicite, após praticar o ato que lhe compete, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação do benefício ou mesmo sua modulação (revogação parcial ou parcelamento), reforça a ideia que a concessão e manutenção do benefício deve ser exclusivamente para os necessitados.

Todavia, entendemos que a norma jurídica precisa de alguns acabamentos interpretativos para sua plena aplicação:

a. Prazo para solicitação pelo tabelião ou registrador para que o juiz module o benefício da gratuidade ou até revogue: 15 dias úteis contados da data em que praticou o ato que lhe competia, pois é exatamente esse o prazo concedido no art. 98, § 8º, ao beneficiário da gratuidade para se manifestar sobre o requerimento impugnativo. A solução apresentada respeita o equilíbrio de forças com a concessão de prazos idênticos (igualdade de tratamento) e a observância da segurança jurídica, no tocante a certeza que a impugnação não poderá ocorrer a qualquer tempo;

b. O requerimento pode ser formulado diretamente pelo tabelião ou registrador nos autos: ante a falta de ressalva em sentido contrário, entendemos que o próprio titular da serventia extrajudicial poderá formular o pedido de revogação total ou parcial do benefício da gratuidade ou parcelamento dos emolumentos;

c. Competência para apreciação do pedido impugnativo do tabelião ou registrador, ou seja, melhor interpretação da expressão “juízo competente para decidir questões notariais ou registrais”: tratando de benesse legal conferida na esfera jurisdicional pelo juiz do processo, entendemos que o pedido impugnativo apresentado pelo tabelião ou registrador deverá ser encaminhado e apreciado pelo magistrado que conduz o processo judicial e não pelo juiz corregedor permanente. O juiz do processo é o “juízo competente para decidir questões notariais ou registrais” relativos àquele processo e as partes envolvidas. A via administrativa não se presta a revisar, reformar, modificar ou cancelar decisão judicial proferida no âmbito jurisdicional. Afinal, é entendimento firmado pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo e pelo Conselho Superior da Magistratura que a via administrativa não pode rever decisões oriundas da via jurisdicional – precedentes do E. CSM nesse sentido: 0006128-03.2012.8.26.0362, 1025290-06.2014.8.26.0100,0001717-77.2013.8.26.0071, 1025290-06.2014.8.26.0100. Em reforço, vale trazer à baila parecer da lavra do Juiz Auxiliar da Corregedoria Dr. Álvaro Mirra, nos autos do processo CG n° 2008/66457: ocorre que a pretendida retificação do título judicial referido não pode ser obtida nesta esfera administrativo-correcional, dada a impossibilidade de revisão pela Corregedoria Permanente e mesmo pela Corregedoria Geral da Justiça de decisões proferidas na esfera jurisdicional. De fato, o indeferimento da correção do formal de partilha, na espécie, como referido, se deu por decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito nos autos do processo de arrolamento, de natureza jurisdicional, de sorte que somente no âmbito jurisdicional poderá ela ser reexaminada e, eventualmente, reformada para finalidade pretendida pelo Recorrente.

Em linhas gerais são estas as ponderações que entendíamos pertinentes em relação à previsão da gratuidade da justiça para os emolumentos do extrajudicial no Novo Código de Processo Civil. O tema é relevante e a discussão indispensável, sendo o objetivo deste trabalho simplesmente fomentar a reflexão na busca do constante aprendizado.

Fonte: iRegistradores | 15/12/2016.

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Artigo: Cartórios – Segurança e Eficiência – Por Rogério Bacellar e Patrícia Ferraz

*Rogério Bacellar e Patrícia Ferraz

Vivemos na era da informação. Apenas com um telefone celular é possível ter acesso a dados, notícias e fatos que ocorrem em qualquer parte do mundo. No entanto, em boa parte das vezes esse aglomerado de informações não se transforma em conhecimento e, pior, com frequência são reproduzidos discursos maldosos, conceitos errôneos e julgamentos equivocados.

Embora a atividade notarial e de registro tenha origem no Egito antigo e decorra da natural necessidade do ser humano de revestir de segurança, clareza e eficácia seus atos e negócios, ainda hoje há quem não compreenda essa função.

Daí a necessidade de esclarecer alguns aspectos relacionados à atuação dos cartórios extrajudiciais no Brasil, unidades de desempenho das funções notarial e de registro, sob responsabilidade de pessoas aprovadas em concursos públicos promovidos pelo Poder Judiciário e por ele fiscalizados, como determina a Constituição Federal.

O notariado de tipo latino, como o brasileiro, existe em quase todos os países da União Europeia. A União Internacional do Notariado compreende quase 100 países em todos os continentes, o que representa 2/3 da população mundial, que somam, segundo os estudos, 60% do PIB mundial. Cartórios, enfim, existem em praticamente todos os sistemas econômicos organizados, com variações em sua nomenclatura.

Cabe aos cartórios (de Registro de Imóveis, Notas, Protesto, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas, Civil de Pessoas Naturais e de Distribuição), que não são empresas, o papel de verificar o cumprimento da legislação, conferindo eficácia, autenticidade, publicidade e segurança aos negócios e atos que lhes são apresentados, evitando, com isso, a ocorrência de conflitos e o ajuizamento de ações perante o Poder Judiciário para solucioná-los. A missão dos cartórios brasileiros, portanto, é grande.

Mesmo assim, de acordo com o Doing Business 2015, publicado pelo Banco Mundial, nosso País é o que apresenta um dos menores custos do mundo para a realização do registro de propriedade imobiliária – cerca de 60% do custo nos países ricos e de 40% dos países da América Latina (mesmo considerando que nos valores dos atos de notas e registros em torno de 50% é recolhido em favor de instituições diversas, como o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Fazendas Estaduais, etc. e como impostos aos Municípios e União Federal).

Recentes pesquisas de satisfação feitas junto aos usuários dos cartórios mostram o sucesso do sistema brasileiro, que serve de parâmetro para vários países do Leste Europeu, Ásia e América Latina.

Segundo estudo realizado pelo Instituto Paraná, junto aos usuários dos cartórios, o índice de confiança e credibilidade de 9,1 – coloca os cartórios na posição de instituição melhor avaliada dentre todas as públicas e privadas. Pesquisa realizada a pedido da Associação dos Registradores de Imóveis do Estado de São Paulo, junto ao público, apurou que 83% dos usuários individuais e 93% dos corporativos acreditam que os cartórios de imóveis conferem mais segurança aos negócios. O Datafolha está concluindo uma pesquisa junto aos usuários dos cartórios de quatro Capitais e do Distrito Federal a respeito de sua satisfação quanto às atividades que notários e registradores, profissionais do direito, desempenham.

Esses profissionais do direito têm se esmerado no cumprimento de sua tarefa constitucional.

Em 10 anos, o número de crianças não registradas em cartórios no ano do nascimento caiu de 18,8% em 2003 para 5,1% em 2013, de acordo com relatório do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com isso, o país se aproxima da erradicação do subregistro – crianças não registradas dentro do prazo legal (organismos internacionais consideram que o percentual de 5% equivale à erradicação). Essa conquista só foi possível graças ao trabalho eficiente dos registradores civis de pessoas naturais e de iniciativas como a instalação de postos de atendimento dos cartórios nas maternidades e campanhas nacionais de registro tardio por eles promovidas.

É importante ressaltar que em razão de convênios com a Receita Federal, os Registros de Pessoas Naturais passarão a emitir o CPF dos nascidos vivos já na maternidade, enquanto os Registros de Pessoas Jurídicas emitirão o CNPJ de sociedades e associações. Com isso, ao registrar sua entidade, o que hoje já faz no Registro Civil em prazo exíguo, o empreendedor sairá do cartório com a situação regular de seu negócio e com o número do CNPJ respectivo.

Além de contribuírem com os cidadãos para desatar os nós das formalidades legais (burocracia), permitindo-lhes usufruir o mais rapidamente de seus direitos e gozar de segurança jurídica, os cartórios têm contribuído enormemente para o desafogamento do Poder Judiciário, seja porque previnem litígios, quando intervém de modo preventivo e saneador nos atos e negócios das pessoas físicas e jurídicas, seja por conta dos vários procedimentos que conduzem na forma da lei, de modo eficiente, célere e de menor custo.

São inúmeros os atos realizados de forma gratuita, como os registros de nascimento, casamento ou óbito, procurações previdenciárias, registros de constrições judiciais, como penhoras trabalhistas e fiscais, além de outros garantidos em lei.

Além disso, um sem número de informações são disponibilizadas também gratuitamente à Administração Pública e ao Poder Judiciário, inclusive em ações de combate à corrupção. Somente com o Ofício Eletrônico e desde 2005, os registradores de imóveis já forneceram mais de 483 milhões de informações gratuitas, o que proporcionou a economia de mais de R$ 4 bilhões em impressões e postagem e poupou mais de 673.000 árvores em razão da supressão do papel para estas pesquisas.

Para garantir a segurança, aprimorar o acesso dos usuários e incrementar o seu índice de satisfação, os cartórios têm investido em gestão, capacitação e tecnologia. Nesse sentido, nos dedicamos constantemente ao aperfeiçoamento do sistema, para proporcionarmos ao cidadão acesso fácil e rápido a informações e serviços.

Apenas a título de exemplo, em São Paulo o registro de escrituras eletrônicas e de penhoras judiciais eletrônicas no cartório de Registro de Imóveis é realizado em cinco dias. Certidões de matrículas de imóveis são fornecidas imediatamente na maioria dos cartórios do Brasil, além de ser possível solicitar certidões eletrônicas e em papel pelas plataformas de registradores da internet. Nos Estados de São Paulo, Santa Catarina, Amazonas, Rondônia, e no Distrito Federal é possível obter gratuitamente informações sobre protesto de títulos de todos os seus cartórios. No Rio de Janeiro a pesquisa contempla 93% das cidades e, em Minas Gerais, 80%. O Colégio Notarial do Brasil disponibiliza centrais de escrituras, procurações e testamentos. Os Registros Civis de Pessoas Naturais estão interconectados e trocam entre si informações pertinentes.

A ANOREG BR e todos os notários e registradores do Brasil reafirmam seu compromisso com a sociedade brasileira, bem como com ações que promovam o desenvolvimento econômico e social do país, com respeito às leis, à segurança jurídica e à privacidade do cidadão.

Mas cabe uma indagação final. Porque uma instituição desenhada para proteger direitos fundamentais do cidadão, como a sua casa, seu negócio e seus compromissos, que historicamente têm sido muito bem avaliada por seus usuários, cujo rol de acertos é notável e cujo empenho em seu aperfeiçoamento é sua meta permanente, tem sido alvo de tantos questionamentos, se há tanto a aperfeiçoar em outras searas?

Fonte: Anoreg/AL.

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ARTIGO: PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA E NEGÓCIO CONSIGO – POR JOSÉ HILDOR LEAL

*José Hildor Leal

A procuração em causa própria, agonizante por desuso, foi ressuscitada pelo Código Civil de 2002, diante das disposições do art. 685: Conferido o mandado com a cláusula “em causa própria”, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.

O legislador perdeu boa oportunidade de acabar com o instituto, que na prática é uma alienação disfarçada de mandato (compra e venda, cessão de crédito…), feita em exclusivo interesse do mandatário, que pode alienar a terceiro, ou transferir o bem ou direito para si, sem necessidade de prestar contas, sendo irrevogável, afora valer mesmo em caso de morte. Logo, corresponde a negócio feito e acabado – há pagamento do preço e quitação.

É, portanto, negócio jurídico com aparência de procuração, porque em verdade o mandatário passa a agir em seu nome, e não em representação ao mandante. Na procuração em causa própria o vínculo entre mandante e mandatário não constitui uma relação típica de mandato, pela qual alguém recebe de outrem poderes para em seu nome praticar atos ou administrar interesses (art. 653, CC).

Tanto é que no Estado do Rio Grande do Sul a Consolidação Normativa Notarial e Registral dispõe no art. 620: “As procurações em causa própria relativas a imóveis deverão conter os requisitos da compra e venda (a coisa, o preço e o consentimento), e por suas normas serão regidas”.

Exige ainda, para a sua lavratura, recolhimento prévio do imposto de transmissão, e os emolumentos são os mesmos da escritura com valor determinado.

Assim, parece não haver dúvida quanto à natureza da procuração em causa própria, tratando-se de ato de alienação, a exemplo da compra e venda ou da cessão.

Ao dizer que o legislador deixou passar boa oportunidade para acabar com o instituto, justifica-se haver outro tipo de mandato a substitui-lo, com vantagem, no próprio código civil, em seu artigo 117: Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por contra de outrem, celebrar consigo mesmo.

Verifica-se semelhança com a cláusula em causa própria, pois o mandante permite ao mandatário negociar consigo mesmo, com a diferença que com a procuração em causa própria existe alienação, deixando de ser simples autorização representativa, enquanto que pela autorização contida no art. 117 a alienação para o próprio mandatário poderá ocorrer ou não.

O que se deve exigir, para a hipótese, é que a procuração traga em seu bojo a fixação do preço, para que não fique a critério exclusivo do procurador (comprador). O artigo 489 do mesmo diploma fulmina de nulidade o negócio em que a fixação do preço é de livre arbítrio de uma só das partes, e embora não exista previsão de prazo, aconselha-se que seja este determinado, para que eventual desvalorização da moeda não venha a causar prejuízo ao mandante.

Embora a semelhança, não há como confundir os institutos. Na procuração em causa própria o mandato é irrevogável, há pagamento e quitação, e prevalece mesmo com a morte, enquanto que na procuração referida no art. 117 os poderes podem ser revogados, a qualquer tempo, não há pagamento ou quitação, e revoga-se por óbito.

Fonte: CNB/SP – CNB/CF | 14/12/2016.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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