2VRP/SP: Tabelionato de Notas. Reconhecimento de firma por semelhança. Firmes são os precedentes desta Corregedoria Permanente no sentido de que se houve o devido cumprimento das normas incidentes sobre a matéria e a assinatura reconhecida não se trata de forja grosseira, não há que se imputar responsabilidade ao Notário, que apenas cumpre seu mister de comparar as chancelas e certificar o fato.


Processo 1053611-07.2021.8.26.0100

Pedido de Providências – Petição intermediária – C.Q.S. – Juiz(a) de Direito: Dr(a). Marcelo Benacchio VISTOS, Trata-se de representação formulada pela Senhora C. Q. S., noticiando suposta falsidade em reconhecimento de firma em seu nome aposto em Contrato de Seguro e realizado perante o Senhor 4º Tabelião de Notas da Capital. O documento debatido encontra-se acostado às fls. 16 e 20. O Senhor Titular prestou esclarecimentos (fls. 35/40, 85/86, 96/101 e 111/114). A Senhora Representante tornou aos autos para reiterar os termos de seu protesto inicial (fls. 43/76 e 117/118). O Ministério Público acompanhou o feito e ofertou parecer conclusivo, pelo arquivamento do expediente, às fls. 90/92 e 123/124. É o breve relatório. DECIDO. Cuida-se de representação formulada pela Senhora C. Q. S., que noticia a ocorrência de falsidade em reconhecimento de firma em seu nome aposto em Contrato de Seguro e realizado perante o Senhor 4º Tabelião de Notas da Capital. Em suma, alega a Senhora Representante que a assinatura reconhecida pelo Senhor Notário não lhe pertence e foi indevidamente certificada pela serventia. Juntou inclusive laudo grafotécnico, que concluiu pela falsidade da assinatura, para comprovar suas alegações (fls. 47/76). O Senhor Delegatário veio aos autos para esclarecer que, de fato, o ato foi realizado perante sua serventia, em reconhecimento datado de 09.03.2020, no qual todas as formalidades legais e acautelatórias foram devidamente observadas. Nesse sentido, apontou que a signatária possui duas fichas de firma arquivadas na unidade, abertas em 1973 e 1981, onde constam quatro assinaturas pela signatária, sendo a chancela contida nos cartões e aquela aposta no documento deveras semelhantes. Com efeito, explanou que não constam documentos de identificação da interessada, arquivados na unidade, uma vez que à época dos depósitos das fichas tal providência não era adotada. Adicionalmente, indicou que não é exigida a apresentação de documento do reconhecido quando do ato de certificação por semelhança, até porque, muitas vezes, não é o próprio signatário que comparece à unidade para a realização do ato. Relativamente à antiguidade das fichas de firma, destacou o Senhor Notário que apenas exige a renovação das chancelas quando a assinatura submetida à análise suscita dúvida quanto a sua autoria, o que não ocorreu no presente caso analisado, em que os traços apresentados eram compatíveis com os padrões arquivados na unidade. No mais, em sua defesa, o Senhor Titular destaca que o item 183, do Cap. XVI, das Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça não aponta a obrigatoriedade de renovação das fichas de firma, que são documentos sem prazo de validade. Por fim, noticiou o Senhor Delegatário que, à luz da ocorrência, reorientou os prepostos e determinou que quando deparados com atos fundamentados em fichas de firma antiga, exijam a presença do signatário, para renovação da chancela, mesmo que não tenha havido alteração no padrão gráfico analisado. A Senhora Representante manteve os termos de sua insurgência inicial, rechaçando a falta de cautela na certificação efetuada. Todavia, noticiou satisfação com as medidas assecuratórias adotadas pelo Delegatário, que implementou melhorias na rotina de trabalho da unidade, diante dos fatos ora noticiados. A seu turno, o nobre Representante do Ministério Público opinou pelo arquivamento dos autos, ante a ausência de indícios de descumprimento de dever funcional por parte da serventia correicionada. Em adição, fez sugestão de alteração das NSCGJ, tornando obrigatória a renovação da ficha de firma a cada 10 (dez) anos (fls. 104). Bem assim, ressalto, por pertinente à matéria posta em análise, que o reconhecimento de firma por semelhança, conforme realizado sobre o ato ora debatido, não exige o comparecimento ou identificação pessoal do signatário, quando este já possui cartão de firma válido depositado na unidade, conforme ocorreu no caso em questão. Nesse sentido, leciona Leonardo Brandelli [in: Teoria Geral do Direito Notarial. 4ª edição, Saraiva. Cap VI, item 8]: O reconhecimento de firma é o ato notarial mediante o qual o notário atesta, com fé pública, que determinada assinatura é de certa pessoa. O notário atesta a autoria da assinatura aposta em documento privado, com diferentes graus de eficácia, conforme a espécie de reconhecimento de firma. (…) O reconhecimento de firma pode ser ainda por semelhança, quando o tabelião atesta a similitude entre a assinatura aposta no documento apresentado e a aposta na ficha-padrão arquivada no tabelionato. Para que possa ser reconhecida uma firma por semelhança, mister se faz que o signatário tenha comparecido previamente ao tabelionato e aberto ficha-padrão contendo, dentre outros elementos, a sua assinatura, que será comparada com a assinatura aposta nos documentos, a qual se queira reconhecer. No reconhecimento por semelhança, ao contrário do que ocorre no por autenticidade, o notário não atestará que foi determinada pessoa quem assinou o documento, mas sim que a assinatura aposta no documento é semelhante à assinatura aposta na ficha-padrão arquivada no tabelionato. Se não houver similitude, o notário recusará o reconhecimento. Com efeito, firmes são os precedentes desta Corregedoria Permanente (a exemplo, processos nº 0014415-81.2021.8.26.0100, 1123125-81.2021.8.26.0100, 0000458-76.2021.8.26.0100, 0042081-57.2020.8.26.0100), no sentido de que se houve o devido cumprimento das normas incidentes sobre a matéria e a assinatura reconhecida não se trata de forja grosseira, não há que se imputar responsabilidade ao Notário, que apenas cumpre seu mister de comparar as chancelas e certificar o fato. Igualmente, a E. Corregedoria Geral da Justiça já se manifestou incidentalmente sobre o tema, no bojo do Recurso Administrativo interposto nos autos de nº 1078855-40.2018.8.26.0100 [DJ: 15.07.2019; DJE: 29.07.2019; Relator: Desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, da lavra do i. Juiz Assessor da ECGJ, Dr. Paulo Cesar Batista dos Santos], referindo que “de fato, para os atos civis em geral, o reconhecimento de firma por semelhança é o previsto em lei e mais utilizado, feito por comparação entre a assinatura constante no documento e as assinaturas da ficha de firma do interessado”. Bem assim, a despeito da fraude perpetrada, verifica-se que não há indícios convergindo no sentido de que a serventia extrajudicial concorreu diretamente para o ato vicioso engendrado, uma vez que a assinatura reconhecida não se cuida de forja grosseira ou simples adulteração de traços, sendo que para se constatar sua falsidade foi necessária a elaboração de laudo pericial. Por conseguinte, a hipótese dos autos não dá margem à adoção de providência censório-disciplinar em relação ao serviço correicionado, não se vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar a instauração de procedimento administrativo. Não obstante, pese embora as NSCGJ se calem a respeito da renovação da ficha de firma, e assista razão ao Senhor Tabelião quanto a perpetuidade dos cartões, a cautela certamente recomenda que não se certifique assinaturas atuais com base em fichas de firma de tamanha antiguidade, sendo medida de prudência sua renovação em período de tempo razoável a se garantir a segurança jurídica do ato efetuado. Bem por isso, advirto o Senhor Notário para que se mantenha atento e zeloso à orientação e fiscalização de seus prepostos, observando com rigidez os deveres de prudência e cautela com o fito de garantir a segurança jurídica dos atos praticados, que é pilar fundamental da atividade notarial e registrária. Outrossim, reputo conveniente a extração de peças de todo o expediente para encaminhamento à CIPP, nos termos do artigo 40 do Código de Processo Penal. Oportunamente, determino o arquivamento dos autos. Encaminhe-se cópia das principais peças destes autos (conforme relatório) à E. Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente como ofício, inclusive para as considerações que a sugestão de alteração normativa deduzida pelo i. Promotor de Justiça, às fls. 104, merecer. Ciência ao Senhor Titular e ao Ministério Público. P.I.C. – ADV: LUIZ ROSELLI NETO (OAB 122478/SP), RUI MEDEIROS TAVARES DE LIMA (OAB 301551/SP) (DJe de 21.10.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de promessa de compra e venda de unidade imobiliária – Impossibilidade do registro com efeito translativo da propriedade, ainda que quitado o preço – Necessidade de escritura pública definitiva – Inteligência dos arts. 108, 1.245. 1.417 e 1.418 do Código Civil – Aplicação do art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79 que se restringe a loteamentos – Óbice mantido – Dúvida procedente – Recurso não provido.


Trata-se de recurso de apelação interposto por JULIA MOHOVIC contra a r. sentença proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do 18º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, que manteve a negativa de registro da escritura pública de promessa de compra e venda firmada por Gafisa S/A Julia Mohovic relativa ao imóvel matriculado sob nº 194.598 como título para a transmissão da propriedade (fl. 76/79).

Alega a apelante, em síntese, que a escritura pública de promessa de compra e venda quitada serve como título para a transmissão da propriedade, dispensada nova escritura pública definitiva. Para ancorar sua pretensão, socorre-se do disposto no art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, o qual deve ser aplicado ao caso em tela promessa de compra e venda pactuada sob o regime jurídico da Lei nº 4.591/64 – diante da omissão legislativa, em prestígio à tutela do consumidor. Por isso, requer o provimento do recurso para julgar improcedente a dúvida, valendo como título para registro da propriedade a escritura pública de promessa de compra e venda quitada (fl. 85/97).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 114/117).

É o relatório.

Pretende a recorrente o registro da escritura pública de promessa de compra e venda quitada não com efeito de direito real de aquisição (art. 1.417 do Código Civil), mas sim como sucedâneo de título translativo de propriedade de acordo com o art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79.

O contrato de promessa de compra e venda de unidade futura integrante de incorporação imobiliária foi celebrado por instrumento público e o pagamento do preço de R$135.279,60 efetivado à vista (fl. 42/57).

Ainda assim, o título não é hábil à transferência do domínio.

Como regra, a promessa de compra e venda firmada por instrumento público ou particular, sem cláusula de arrependimento, registrada no Cartório de Registro de Imóveis, atribui ao promitente comprador direito real à aquisição do imóvel, oponível a terceiros (arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil).

Direito real de aquisição que não se confunde com o direito de propriedade.

Logo, a promessa de compra e venda mesmo que já saldado o seu preço não constitui título hábil à transferência do domínio do imóvel, sendo indispensável a celebração do contrato definitivo e seu registro posterior, nos termos dos arts. 108 e 1.245 do Código Civil.

No contrato preliminar – como a promessa de compra e venda – ainda que concentrada a maioria da carga negocial, o seu objeto é a outorga da escritura definitiva.

Inclusive, no caso concreto, em que pese o pagamento do preço à vista, as partes comprometeram-se a finalizar, a posteriori, o contrato de compra e venda, mediante futura outorga de escritura definitiva (cláusula 3.4).

Não se olvida que o pacto em questão foi celebrado sob o regime jurídico da Lei nº 4.591/64, o qual submete-se ao regramento estatuído para as promessas de compra e venda reguladas pelo Código Civil, observadas as peculiaridades da lei de regência que também deixa bem claro que o único direito conferido ao promitente comprador que se acautelou e levou a registro o seu contrato é o direito real (art. 32, § 2º, da Lei de Incorporação Imobiliária).

À evidência, a hipótese em testilha não se ajusta àquela preconizada no art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, in verbis:

“§ 6º Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação.”

Apenas o compromisso de compra e venda de lote urbano, firmado entre o loteador e o adquirente, quando acompanhado da prova de quitação do preço, serve como título para a transmissão da propriedade imobiliária perante o Cartório de Registro de Imóveis, dispensando a lavratura de escritura pública, independentemente do valor do negócio ou do imóvel.

Trata-se, pois, de exceção à regra geral e, como tal, sua interpretação deve se dar no contexto da legislação em que prevista.

Outra não é a conclusão de Francisco Eduardo Loureiro, que aponta:

“Embora defenda José Osório de Azevedo Júnior a tese da possibilidade da dispensa da escritura definitiva, substituída pelo compromisso acompanhado de prova de quitação, tal conclusão implica violação ao disposto no art. 108 do CC (‘O compromisso de compra e venda’. In: FRANCIULLI NETO, Domingos (coord.), MENDES, Gilmar Ferreira & MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O novo Código Civil: estudos em homenagem ao prof. Miguel Reale. São Paulo, LTr, 2003, p.450).

Não pode prevalecer, portanto, o Enunciado n. 87 do Centro de Estudos Judiciários do CJF, por ocasião da Jornada de Direito Civil realizada entre 11 e 13 de setembro de 2002, cujo teor é o seguinte: ‘Considera-se também título translativo, para fins do art. 1.245 do CC, a promessa de compra e venda devidamente quitada (arts. 1.417 e 1.418 do CC e § 6°do art. 26 da Lei n. 6.766/79)” (Código Civil Comentado, Coordenador Ministro Cezar Peluso, 14ª ed., São Paulo: Manole, 2020, p. 1.497).

No mesmo sentido, a apelação nº 1036475-31.2020.8.26.0100 de minha relatoria:

Apelação – Dúvida – Recusa a transmissão da propriedade – Termo de quitação de compromisso de venda e compra que não constitui título translativo do domínio – Necessidade de título hábil Inteligência do art. 1.417 do Código Civil – Promitente comprador que adquire direito à aquisição do imóvel – Aplicação restrita do art. 26, §6º, da Lei nº 6.766/79 aos casos em que o compromisso de venda e compra foi celebrado pelo próprio loteador – Inteligência do art. 167, II, item 32 da Lei de Registros Públicos para fins específicos – Desprovimento do recurso.”

O título apresentado a registro não é apto a transferir o domínio à recorrente, portanto.

Por todo o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 20.10.2021 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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