1VRP/SP: Registro de Imóveis. Quando há alvará para alienação de bens do espólio, não há necessidade de participação da viúva meeira e, também, titular do domínio.


Processo 1113164-82.2021.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Lana Administração de Bens Imóveis e Participações Ltda – Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 17º Registro de Imóveis da Capital para afastar o óbice registrário e, em consequência, determinar o registro do título. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: JOAO PAULO GUIMARAES DA SILVEIRA (OAB 146177/SP), FERNANDA HENGLER DINHI (OAB 198990/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1113164-82.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 17º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Suscitado: Lana Administração de Bens Imóveis e Participações Ltda

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 17º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Lana Administração de Bens Imóveis e Participações Ltda, tendo em vista negativa em se proceder ao registro de escritura de compra e venda relativa ao imóvel objeto da transcrição n. 71.992 daquela serventia.

Segundo o Oficial, a negativa foi motivada por violação ao princípio da continuidade, vez que o título indica como vendedor apenas o espólio de Mario Amato, não havendo participação da viúva meeira e, também, titular do domínio, Rogéria Pinto Coelho Amato, no negócio.

Documentos vieram às fls. 08/83.

A parte suscitada manifestou-se às fls. 88/95, aduzindo que, com o falecimento de Mario, o patrimônio do casal passou ao estado de indivisão em razão de serem eles casados sob o regime de comunhão universal de bens, pelo que desnecessária a assinatura da viúva na escritura.

O Ministério Público opinou pela improcedência (fls. 99/101).

É o relatório. Fundamento e decido.

No mérito, a dúvida é improcedente. Vejamos os motivos.

De início, vale destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação, positiva ou negativa, para ingresso no fólio real.

Cabe, portanto, ao oficial qualificá-los conforme os princípios que regem a atividade registral, dentre eles o da continuidade registrária.

Nesse sentido, o E. Conselho Superior da Magistratura já pontuou que a qualificação negativa do título judicial não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7). E, ainda: Ap. Cível n. 0003968-52.2014.8.26.0453; Ap. Cível n. 0005176-34.2019.8.26.0344 e Ap. Cível n. 1001015-36.2019.8.26.0223.

No caso concreto, porém, verifica-se que o juízo do inventário, 12ª Vara da Família e Sucessões desta Comarca, considerando o estado de indivisão do patrimônio do casal titular do domínio do imóvel, autorizou a alienação do bem.

O alvará expedido permitiu que Rogério Pinto Coelho Amato, na condição de inventariante, alienasse o imóvel da matrícula n. 71.992 (fl. 60).

Tal autorização encontra suporte no entendimento jurisprudencial no sentido de que a meação, até a partilha, integra o monte-mor numa relação de continuidade decorrente da transmissão mortis causa, pelo que não se justifica a participação do cônjuge sobrevivo em eventual alienação de bens que integrem o acervo, mormente quando autorizado pelo juízo do inventário após serem ouvidos os interessados.

A respeito do exposto, vale citar trecho extraído de decisão proferida pela E. CGJSP (com nossos destaques):

“O Conselho Superior da Magistratura já manifestou entendimento de que o espólio reúne todos os bens que integravam o patrimônio do casal até o óbito de um dos cônjuges: “O espólio é uma universalidade de bens que reúne todos aqueles que integravam o patrimônio do casal, em comum até a data do óbito de um dos cônjuges. Com a morte esse patrimônio assume inteiramente o estado de indivisão já referido, sendo indispensável a partilha do todo, para resolver essa situação” (CSMSP – Apelação Cível: 62.986-0/2, Relator Desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição, 06/12/1999). No mesmo sentido, a doutrina de Afrânio de Carvalho: “Antes da partilha, portanto, subsiste a comunhão nos bens do espólio, vale dizer, um só acervo em que são interessados primacialmente o cônjuge sobrevivente e os herdeiros. O cônjuge sobrevivente filia o seu direito ao regime matrimonial, e os herdeiros, ao direito das sucessões, mas estão jungidos ou presos pelo elo da indivisibilidade na comunhão até que se ultime a partilha. A partilha abrange todo o patrimônio do morto e todos os interessados, desdobrando-se em duas partes, a societária e a sucessória. Só então aparece a herança, separando-se, na deliberação da partilha, a meação do cônjuge sobrevivo, quer este haja adotado o regime da comunhão geral de bens, quer o da comunhão parcial, agora dominante, pois neste sobrevém a comunhão dos aquestos. Os praxistas antigos, assim como os partidores, designavam o acervo comum de “monte mor” e o acervo disponível de “monte partível”” (Títulos Judiciais e o Registro de Imóveis, Coordenador Diego Selhane Péres, São Paulo: IRIB, 2005, p.279). Portanto, no caso dos autos, não se vê mácula no fato do espólio ter vendido a integralidade do bem. À lavratura da escritura compareceram o viúvo Nelson Formigone, inventariante, e todos os filhos do casal (fl. 25). Logo, não há o que ser retificado. O R.4 da matrícula deixa claro, conforme a escritura, que todo o imóvel foi vendido para a recorrente (fl. 31)” (Processo de autos n. 188.594/2013, Relator: Des. Elliot Akel).

Nessa mesma linha, este juízo já tinha se posicionado em caso análogo (processo de autos n. 001441-0/99):

“Não há como se negar a possibilidade de transmissão de bens em nome do espólio, tanto que expressamente admitido em lei (Código de Processo Civil, art. 992, inciso I).

Visto que a meação, embora se distinga da herança, até que seja o acervo patrimonial partilhado, integra o monte-mor, numa relação jurídica de continuidade decorrente da transmissão “causa-mortis”, não há justificativa a que se exija a participação do cônjuge sobrevivo em eventual alienação de bens que integrem o acervo.

A administração do patrimônio compete ao inventariante, que pode alienar bens do espólio, se devidamente autorizado pelo Juízo, após ouvidos os interessados.

No caso dos autos, comprovada a autorização do Juízo do inventário, evidentemente houve a aquiescência dos demais interessados, inexistindo razão para o comparecimento do cônjuge sobrevivo ao de alienação.

A transmissão do bem, autorizada pelo Juízo do inventário, considerada a universalidade jurídica, não implica em quebra de continuidade como entende o Senhor 15° Oficial de Registro de Imóveis, daí não ser pertinente o óbice imposto.

Assim, ante o exposto e o mais que dos autos consta, julgo improcedente a presente dúvida”.

Tal posicionamento foi mantido em caso análogo analisado mais recentemente, conforme mencionado pelo Ministério Público (processo de autos n. 0048840-37.2020.8.26.0100).

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 17º Registro de Imóveis da Capital para afastar o óbice registrário e, em consequência, determinar o registro do título.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 11 de novembro de 2021.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 16.11.2021 – SP).

Fonte: DJE/SP.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis com valores distintos e torna – Negócio jurídico oneroso – ITBI recolhido – Inexistência de fato gerador do ITCMD – Exigência de comprovação do pagamento do imposto estadual afastada – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida determinando o registro do título.


Apelação Cível nº 1099753-06.2020.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1099753-06.2020.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1099753-06.2020.8.26.0100

Registro: 2021.0000750797

ACÓRDÃO–

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1099753-06.2020.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes RENATO MUNHÓS DE CARVALHO e WILSON BARBOZA DE OLIVEIRA JUNIOR, é apelado 4° OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 26 de agosto de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1099753-06.2020.8.26.0100

Apelantes: Renato Munhós de Carvalho e Wilson Barboza de Oliveira Junior

Apelado: 4° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 31.539

Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis com valores distintos e torna – Negócio jurídico oneroso – ITBI recolhido – Inexistência de fato gerador do ITCMD – Exigência de comprovação do pagamento do imposto estadual afastada – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida determinando o registro do título.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Renato Munhós de Carvalho e Wilson Barboza de Oliveira Junior contra a r. sentença proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do 4º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, que manteve a negativa de registro da escritura pública de permuta de bens imóveis em razão da não apresentação de prova da quitação do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doações ITCMD (fl. 64/67).

Em suas razões, os recorrentes, em síntese, além da alegação de nulidade do procedimento de dúvida por ausência de cientificação de um dos apresentantes do título para a impugnação, afirmam que a permuta é um negócio jurídico oneroso e, como tal, devido apenas o Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos” de bens imóveis, pouco importando que o valor atribuído a um dos imóveis negociado seja inferior ao seu valor venal de referência. A discrepância de valores é insuficiente para caracterizar a gratuidade inerente ao contrato de doação e assim justificar a incidência do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doações ITCMD. Por isso, aguardam o acolhimento da pretensão recursal para afastar o óbice ao ingresso do título na tábua registral (fl. 77/96).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 121/125).

É o relatório.

De rigor o afastamento da alegação de nulidade do procedimento.

A ausência de cientificação de um dos apresentantes do título para a impugnação não maculou este procedimento de dúvida.

Vale registrar que o apresentante devidamente cientificado do prazo, que se fez representar pelo outro apresentante, advogado, nesta via recursal, sequer apresentou impugnação.

Ademais, o recurso de apelação contra a r. sentença foi interposto por ambos os interessados, permitindo o exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa.

Superado isso, no mérito recursal, a razão está com os recorrentes.

O registro da escritura pública de permuta de bens imóveis com torna foi negado pelo Oficial, que expediu nota de devolução com o seguinte teor (fl. 10):

“Considerando a diferença entre os valores fiscais dos imóveis permutados, uma vez que o Conjunto 101 do Edifício Santos Dumont possui valor venal de referência de R$ 1.552.647,00 e a Sala para Escritório nº 806, do Edifício First Office Flat, o valor venal de R$ 354.522,00, e que o valor atribuído na permuta ao Conjunto 101 é muito inferior ao venal de referência, apresentar recolhimento do ITCMD, correspondente à diferença. Sobre esse entendimento cita-se decisão proferida no Processo n 1003262-68.2019.8.26.0100 da 1ª Vara de Registros Públicos.”

A questão, pois, cinge-se à exigência do recolhimento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doações ITCMD.

De acordo com a escritura pública lavrada aos 14 de agosto de 2020, pelo 22º Tabelião de Notas desta Capital, os recorrentes permutaram os imóveis matriculados sob nºs 137.339 e 145.644, o primeiro com valor venal de referência de R$ 1.552.647,00 e o segundo com valor venal de referência de R$ 307.433,00 sendo atribuídos aos bens, para efeito da permuta, as quantias de R$ 660.000,00 e R$ 360.000,00, respectivamente, com torna de R$ 300.000,00 (fl. 27/36).

O Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos” de bens imóveis ITBI foi recolhido nos importes de R$ 46.579,41 e R$ 10.800,00 (fl. 37/40).

Os recolhimentos observaram o maior valor entre o declarado e o venal de referência para cada um dos imóveis, quais sejam, R$ 1.552.647,00 e R$ 360.000,00.

A permuta de bens com valores desiguais atribuídos e contraprestação pecuniária, igualando-os, não deixa dúvida sobre o caráter oneroso do negócio a atrair a incidência do Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos” de bens imóveis ITBI.

Nos exatos termos da Lei Municipal nº 11.154, de 30 de dezembro de 1991, que dispõe sobre o Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos”, a qualquer título por ato oneroso, de bens imóveis:

“Art.2º Estão compreendidos na incidência do imposto:

(…);

III – a permuta;

(…);”

Nelson Rosenvald ao discorrer sobre o contrato de permuta ou troca pontua que:

“Cuida-se de um contrato bilateral e oneroso, pelo qual

as partes transferem, reciprocamente, quaisquer objetos diversos do dinheiro de sua propriedade para a outra.

Assumem, pois, os permutantes ou tradentes, obrigações recíprocas, com sacrifícios e vantagens comuns, mesmo que, eventualmente, os bens tenham valores diversos (o que, aliás, acontecerá no mais das vezes).” (Código Civil Comentado, Coordenador Ministro Cezar Peluso, 14ª ed., São Paulo: Manole, 2020, p. 573)

A discrepância entre o valor atribuído a um dos bens permutados e o seu valor venal de referência não descaracteriza a onerosidade do contrato celebrado, afastando assim a hipótese de incidência do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doações ITCMD, prevista no art. 2º, II, da Lei Estadual nº 10.705, de 28 de dezembro de 2000.

Também nas palavras de Nelson Rosenvald, ao conceituar o contrato de doação:

“A doação é uma relação jurídica (contrato) pela qual uma pessoa física ou jurídica (doador ou benfeitor) assume a obrigação de transferir um bem jurídico ou uma vantagem para o patrimônio de outra pessoa (donatário ou beneficiário), decorrente de sua própria vontade e sem qualquer contraprestação.” (Código Civil Comentado, Coordenador Ministro Cezar Peluso, 14ª ed., São Paulo: Manole, 2020, p. 579)

Portanto, não há como condicionar a inscrição do título ao recolhimento deste tributo.

O dever de fiscalização do Oficial de Registro pressupõe o recolhimento de impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados, em razão do seu ofício, conforme o disposto no art. 289 da Lei de Registros Públicos.

Por todo o exposto, pelo meu voto, afastada a alegação de nulidade do procedimento, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida, determinando o ingresso do título no fólio real.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 12.11.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

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