Jurisprudência mineira – Agravo de instrumento – Ação de inventário – Colação de bens – Bens adquiridos com recursos do falecido – Decisão mantida

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INVENTÁRIO – COLAÇÃO DE BENS – PRECLUSÃO – ART. 1.011 DO CPC – INOCORRÊNCIA – BENS ADQUIRIDOS COM RECURSOS DO FALECIDO – NECESSIDADE DE IGUALAR LEGÍTIMAS – DECISÃO MANTIDA

– Não ocorre preclusão consumativa do direito da parte recorrida à colação dos bens, tendo em vista que, nos termos do art. 1.011 do CPC, a descrição dos bens a serem inventariados somente finda com o termo das últimas declarações, nas quais as primeiras declarações podem ser editadas.

– Demonstrado nos autos que, apesar de o veículo e o apartamento terem sido registrados em nome do agravante, foram adquiridos por recursos do falecido, necessária a colação dos bens para igualar as legítimas. 

Agravo de Instrumento Cível nº 1.0024.08.195004-0/001 – Comarca de Belo Horizonte – Agravante: S.A.S.G.M. – Agravado: Espólio de W.S.M., representado pela inventariante K.C. – Interessada: K.C. – Relator: Des. Afrânio Vilela

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.
Belo Horizonte, 19 de agosto de 2014. – Afrânio Vilela – Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. AFRÂNIO VILELA – Em análise, agravo de instrumento interposto por S.A.S.G.M. contra a decisão de f. 24-TJ, que, nos autos do inventário dos bens de W.S.M., acolheu o parecer ministerial de f. 382 dos autos originais e determinou a intimação do agravante, pessoalmente, por mandado, para cumpri-lo.

O agravante afirmou que não seria cabível a colação do imóvel e do veículo para fins de igualar os quinhões hereditários, porque não estariam presentes os requisitos legais para a configuração da colação, bem como tendo em vista a incidência de preclusão consumativa e temporal sobre a matéria. Alegou que o fato de o nome do inventariado constar na compra e venda do imóvel não seria suficiente para configurar a doação, porque era absolutamente incapaz à época e, por isso, necessitava ser representado no negócio jurídico firmado. Aduziu que a expressão “dependente econômico” significava que era não emancipado judicialmente na data da escritura lavrada. Ressaltou que não teriam sido preenchidos os requisitos formais da doação, quais sejam o contrato escrito, a escritura pública e o recolhimento de ITCD. Observou que esses bens não constaram nas primeiras declarações (preclusão consumativa), tampouco houve retificação da omissão existente no prazo previsto no art. 1.000, I, do CPC (preclusão temporal). Asseverou, por fim, que todos os bens inventariados foram avaliados e o ITCD foi recolhido, motivo pelo qual não seria possível a colação do imóvel e do veículo nessa fase em que se encontra o processo.

Os agravados, devidamente intimados, ofertaram contraminuta, batendo-se, em resumo, pela manutenção da decisão agravada (f. 119/125-TJ).

A d. Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer, opinando pelo desprovimento do recurso (f. 145-TJ).

É o relatório.

O cerne da questão trazida a julgamento no presente recurso cinge-se à análise do acertamento da decisão que acolheu o parecer ministerial de f. 382 dos autos originais e determinou a intimação do agravante, pessoalmente, por mandado, para cumpri-lo.

Por meio do parecer de f. 21/22, a Promotora de Justiça, Flávia Albergaria Bilac Pinto, assim se manifestou: 

“[…] quanto à colação pretendida pela inventariante, a fim de que o herdeiro S. […], conterá por termos nos autos os bens que recebeu do finado, entendo procedente o pedido em questão. Certo é que o autor da herança adquiriu, por si só, o bem constituído pelo apartamento 503 da Rua […], nesta cidade, em nome do então menor S., constando expressamente da escritura pública do imóvel a dependência econômica deste em relação ao pai. Aplica-se o mesmo raciocínio quanto ao veículo Celta, placa […], sendo certo tratar-se ambos os casos das chamadas doações indiretas, as quais estão sujeitas à colação. Destarte, requeiro a intimação de S.A.S.G.M. para que promova o retorno dos bens imóvel e móvel descritos nesta peça ao acervo inventariado, com o fim de se possibilitar uma equitativa apuração das quotas hereditárias dos sucessores do extinto”. Ressalta-se que não há que se falar em preclusão consumativa do direito da parte recorrida à colação dos bens, tendo em vista que, nos termos do art. 1.011 do CPC, a descrição dos bens a serem inventariados somente finda com o termo de últimas declarações, nas quais as primeiras declarações podem ser editadas. Veja-se:

“Art. 1.011. Aceito o laudo ou resolvidas as impugnações suscitadas a seu respeito, lavrar-se-á em seguida o termo de últimas declarações, no qual o inventariante poderá emendar, aditar ou completar as primeiras”. Importante frisar que as últimas declarações ainda não foram firmadas pelo inventariante.

Demais disso, conforme constou no parecer da d. Procuradoria-Geral de Justiça, da lavra do Procurador Márcio Heli de Andrade: “[…] sabe-se que omissão na declaração dos bens do espólio não acarreta a sua não inclusão na partilha, mas tão somente a remoção do inventariante, conforme, por sinal, é a previsão dos arts. 995 c/c o art. 1.040 do Código de Processo Civil” (f. 145v.- TJ).

Passa-se, portanto, à análise da necessidade de colação dos bens móvel e imóvel descritos no parecer ministerial.

A parte agravada alega que o falecido doou, de modo inoficioso, um veículo e um imóvel ao agravante, motivo pelo qual esses bens devem ser objeto de colação nos autos, para fins de igualar a legítima.

Com relação ao imóvel, extrai-se da escritura de compra e venda de f. 32/33-TJ que constou como “outorgado comprador S.A.S.G.M., menor impúbere, representado, neste ato, por seu pai, de quem é dependente econômico, o Sr. W.S.M., divorciado, professor, CIC […], CI […], brasileiros, residentes […]”.

Tem-se, dessa forma, que da escritura de compra e venda do imóvel constou não apenas que o agravante era representado pelo pai, por ser menor, mas também que era financeiramente dependente dele.

No registro do imóvel, constou ainda que o imóvel foi “pago e quitado pelo pai do comprador, o Sr. W.S.M.” (f. 37-TJ). Ressalta-se, ainda, que tanto o automóvel quanto o apartamento constam como bens e direitos do falecido descritos em seu imposto de renda do exercício de 2008 (f. 129/130-TJ) e foram adquiridos quando o agravante era absolutamente incapaz. Demonstrado nos autos, portanto, que, apesar de o veículo e o apartamento terem sido registrados em nome do agravante, foram adquiridos por recursos do falecido, motivo pelo qual se faz necessária a colação dos bens para igualar as legítimas. Sobre esse assunto, oportuna a transcrição do elucidativo voto da Ministra Nancy Andrighi no Recurso Especial 1198168/RJ: 

“A caracterização de doação inoficiosa é vício que, se não invalida o negócio jurídico originário – doação -, impõe ao donatárioherdeiro obrigação protraída no tempo, de que, à época do óbito do doador, deverá trazer o patrimônio à colação, para igualar as legítimas, caso não seja herdeiro necessário único, no grau em que figura. A razão de ser da fórmula é a necessidade de igualdade entre os descendentes e o cônjuge supérstite – quando este concorre na herança -, fórmula de há muito adotada pelo Direito pátrio, que consolidou a ideia de que, mesmo quando, por qualquer razão, o ascendente quiser privilegiar algum de seus possíveis herdeiros, com quinhão diferenciado, fica limitado em sua liberalidade pela legítima. Nessa senda, e tomando por premissa que a doação inoficiosa é aferida no momento da liberalidade, nota-se claramente que houve preterição do nascituro B.H.P., que não foi elencado como donatário por seu pai. No entanto, tal fato, por si, não gera a invalidade perseguida pelo espólio recorrente, porque, nos termos do art. 1.171 do CC-16 – aplicável à espécie por força do momento em que foi entabulado o negócio jurídico doação – a legítima do não donatário, individualmente tomada, é o quantum que deve estar salvaguardado da doação, sob pena de caracterizar a inoficiosidade da liberalidade. Três eram os herdeiros necessários à época da doação: os recorridos (filhos do primeiro casamento do de cujus) e o nascituro – prole de um segundo relacionamento -, e apenas os dois primeiros foram contemplados com a liberalidade. Nesse contexto, podia ser doado, para os dois descendentes, até, aproximadamente, 83,3% (oitenta e três inteiros e três décimos por cento) do patrimônio total (50% da parte disponível, acrescido das correspondentes frações da legítima, que importavam em, aproximadamente, 33,2% (trinta e três inteiros e dois décimos por cento). Como a doação não atingiu 57% do patrimônio existente à época, doação inoficiosa não houve, cabendo, agora, apenas se trazer o bem doado à colação, para fins de equilibrar ou igualar a legítima. Note-se que, aqui, o sobejo patrimonial do de cujus é o objeto da herança, apenas devendo a fração correspondente ao adiantamento da legítima, já embutido na doação aos dois primeiros descendentes, ser equalizado com o direito à legítima dos herdeiros não contemplados na doação, para assegurar a esses outros a respectiva quota da legítima, e, ainda, às respectivas participações em eventuais sobras patrimoniais. Cita-se, nesse sentido, o posicionamento de Arnaldo Rizzardo: ‘Daí depreender-se que o art. 549 (art. 1.176 do Código anterior) não proíbe a doação que ultrapassar a metade dos bens, e sim a que ultrapassar o valor que o testador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento. Necessário, pois, que se tenha em vista a norma do art. 1.846 (art. 1.721 do Código revogado)’: ‘Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima'. De onde se chega a que, possuindo um pai viúvo cem mil metros quadrados de terra apenas, e doando a um estranho sessenta por cento do imóvel, configurar-se-á doação inoficiosa. Mas não se o pai tem dois filhos, e o beneficiado for um deles. Isso porque, segundo ilustra Agostinho Alvim, a legítima dos descendentes é a metade do patrimônio, ou seja, cinquenta por cento dos bens, que, no caso, equivale ao disponível. Portanto, cada filho fará jus a vinte e cinco por cento do patrimônio, o que importa em afirmar que a um deles faculta-se ao pai doar toda a sua parte disponível (cinquenta por cento) e mais a legítima do filho (vinte e cinco por cento), atingindo o quanto de setenta e cinco por cento. Assim, a busca da invalidade da doação, ante o preterimento dos herdeiros nascidos do segundo relacionamento do de cujus somente seria cabível se, e na medida em que, fosse constatado um indevido avanço da munificência sobre a legítima que, repita-se, no debate envolvendo a inoficiosidade da doação, deve ser aferida no momento do negócio jurídico. No mais, o instituto da colação irá, por primeiro, assegurar que os não contemplados com a doação possam, ainda assim, ter resguardado o seu quinhão na legítima, mesmo que seja por redução na doação e, de outra banda, garantir que a vontade do doador seja respeitada no limite da possibilidade legal. Essa é a essência da construção teórica que deságua na fórmula da colação, pois não se pode tolher a liberdade do indivíduo em beneficiar alguém com o patrimônio que lhe é próprio, desde que respeite os limites legais – 50% do patrimônio. Se terceiros podem ser alvo dessa munificência, quanto mais os descendentes, mesmo porque pode o ascendente doador querer, em face de relações peculiares de gratidão, ou situação pessoal do donatário, diferenciar positivamente, na parte que lhe é disponível, o quinhão hereditário de um dos seus filhos. Dessa forma, não merece reforma o acórdão recorrido. Forte em tais razões, nego provimento ao recurso especial” (STJ – REsp. 1198168/RJ – Relatora: Ministra Nancy Andrighi – Terceira Turma – Data do julgamento: 06.08.2013 – Data da publicação: 22.08.2013). 

Isso posto, nego provimento ao recurso, de modo a manter integralmente a decisão agravada.

Custas recursais, pelo agravante.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Marcelo Rodrigues e Raimundo Messias Júnior.

Súmula – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Recivil – DJE/MG | 11/09/2014.

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Para TJGO, marido não é parte ativa em processo que envolve herança

“É parte ilegítima para ingressar no processo de inventário o esposo da herdeira, ainda que casado em comunhão universal de bens, pois, para ele, há apenas uma expectativa de direito enquanto não for ultimada a partilha”. Com esse entendimento, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) manteve decisão de primeiro grau que negou o ingresso de J.B.M. no inventário de seu sogro, A.F.R.

Consta dos autos que durante o trâmite processual foram nomeados vários inventariantes e que J.B.M. considerou que essa prática foi um “ardil” para se apropriarem dos bens do espólio, em prejuízo da viúva de A.F.R. Na qualidade de esposo de uma das herdeiras, ele, então, requereu a nulidade do processo, por não ter recebido nenhuma intimação.

Na petição, alegou que, por ser casado com uma das herdeiras em regime de comunhão universal, teria também o direito de adquirir os bens que se incorporaram ao patrimônio dela, após a morte de seu pai. No entanto, o relator do voto, juiz substituto em segundo grau Delintro Belo de Almeida Filho (foto), frisou que a esposa é quem recebe a herança a partir da morte de seu pai e, portanto, é ela quem deve atuar na ação de inventário.

Além disso, o magistrado salientou que a esposa não está prejudicada na ação, pois ela foi citada no processo e atua em defesa dos seus direitos, sendo assim, não existe necessidade de participação de J.BM. no caso.

Texto: Jovana Colombo – estagiária do Centro de Comunicação Social do TJGO.

Fonte: TJGO | 08/08/2013.

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