ITBI. O FATO GERADOR OCORRE NA DATA DO REGISTRO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. 1ª VARA DE REGISTROS PÚBLICOS DE SÃO PAULO.

ITBI. O fato gerador ocorre na data do registro no Registro de Imóveis. 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo. Processo nº 1123213-95.2015.8.26.0100. DJe 07.06.2016.

“O contrato social não apresenta qualquer vício formal que obste o seu registro para a transferências dos imóveis que integralizam o capital social da empresa. Houve o recolhimento do ITBI, conforme documentos de fls. 31/32.Como se sabe, a transferência de propriedade de bens imóveis só acontece no momento de seu registro. Desta forma, o fato gerador do ITBI tem como data o dia da formalização deste ato, e não o dia da celebração do negócio jurídico consubstanciado no título que será registrado. É este sentido o comando do art. 1245, caput, do Código Civil e artigo 35, I, do Código Tributário Nacional:”Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.”Art. 35. O imposto de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:I a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil.”Nesse sentido já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça: “TRIBUTÁRIO. ITBI. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. REGISTRO DE TRANSMISSÃO DO BEM IMÓVEL. 1. Rechaço a alegada violação do art. 458 do CPC, pois o Tribunal a quo foi claro ao dispor que o fato gerador do ITBI é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel. A partir daí, portanto, é que incide o tributo em comento. 2. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes do STJ. 3. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 215.273/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 15/10/2012).””.

Caderno 3

1ª VARA

Processo 1123213-95.2015.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – MFS Administração e Participações Ltda. – Vistos. Fls.76/77: O prazo da impugnação é de 15 (quinze) dias, contados a partir da notificação da parte interessada, devendo o representante legal da suscitada estar atento em relação a prazos processuais e o correto encaminhamento das petições. Feita esta observação, considero como intempestiva a impugnação apresentada às fls.58/60, que será considerada como mera informação a este Juízo.Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital a requerimento da empresa MFS Administração e Participações LTDA, em face da negativa em se proceder ao registro do Instrumento Particular de Conferência, relativo ao imóvel matriculado sob nº 117.801, a fim de integralizar o capital social da pessoa jurídica.Após reiteradas qualificações do título, restou apenas um óbice, referente ao correto recolhimento do ITBI. O comprovante de depósito demonstra que houve o pagamento do tributo com atraso e a DTI foi preenchida erroneamente em relação à data de transação, sendo que o correto seria 13.05.2015. Consequentemente o tributo deveria ser recolhido, segundo a previsão legal, em até 10 dias após esta data. Todavia, na guia apresentada consta a data da transação 21.05.2015 e o recolhimento do tributo em 18.06.2015. Juntou documentos às fls.06/52.O suscitante apresentou intempestivamente impugnação (fls.58/60), conforme certidões de fls.53 e 75.O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fl.57).A Municipalidade de São Paulo sustenta que a dúvida é procedente, uma vez que não se pode admitir registro de título aquisitivo sem prova do correto recolhimento do valor do ITBI, nos termos do artigo 29, I, do Decreto Municipal nº 55.196/14 (fls. 70/72).É o relatório.Passo a fundamentar e a decidir.O contrato social não apresenta qualquer vício formal que obste o seu registro para a transferências dos imóveis que integralizam o capital social da empresa. Houve o recolhimento do ITBI, conforme documentos de fls. 31/32.Como se sabe, a transferência de propriedade de bens imóveis só acontece no momento de seu registro. Desta forma, o fato gerador do ITBI tem como data o dia da formalização deste ato, e não o dia da celebração do negócio jurídico consubstanciado no título que será registrado. É este sentido o comando do art. 1245, caput, do Código Civil e artigo 35, I, do Código Tributário Nacional:”Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.”Art. 35.

O imposto de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:I a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil.”Nesse sentido já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça: “TRIBUTÁRIO. ITBI. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. REGISTRO DE TRANSMISSÃO DO BEM IMÓVEL. 1. Rechaço a alegada violação do art. 458 do CPC, pois o Tribunal a quo foi claro ao dispor que o fato gerador do ITBI é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel. A partir daí, portanto, é que incide o tributo em comento. 2. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes do STJ. 3. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 215.273/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 15/10/2012).” No mais, por força dos artigos 289, da Lei 6.015/73, 134, VI, do Código Tributário Nacional e inciso XI do art. 30 da Lei 8.935/1994, ao Registrador incumbe fiscalizar o devido recolhimento de tributos referentes somente às operações que serão registradas, ressaltando-se que essa fiscalização limita-se em aferir o pagamento do tributo e não a exatidão de seu valor:”Ao oficial de registro incumbe a verificação de recolhimento de tributos relativos aos atos praticados, não a sua exatidão” (Apel. Cív. 20522-0/9- CSMSP – J.19.04.1995 – Rel. Antônio Carlos Alves Braga)”Todavia, este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor.” (Apel. Cív. 996-6/6 CSMSP J. 09.12.2008 Rel.Ruy Camilo)”Este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor.”(Ap. Civ. 0009480-97.2013.8.26.0114 – Campinas – j.02.09.2014 – Rel. des. Elliot Akel)Ressalto que o Oficial deve proceder à qualificação com liberdade, evitando situações que venham fragilizar o sistema registral ou que possam vir a lhe acarretar responsabilidade, administrativa ou civil. Dessa forma, existindo flagrante incorreção no recolhimento do tributo não está ele impossibilitado de apontar a mácula e obstar o ingresso do título.No presente caso o imposto incide na data da transferência do domínio, ou seja, o registro foi efetuado em 21.05.2015 (fl.23) e o tributo recolhido em 18.06.2015. Em razão do depósito com atraso, ou seja, após 10 (dez) dias do término do prazo estabelecido, houve a incidência de multa de R$ 1.720,53.Destarte, não há óbice para o ingresso do título, tal como apresentado, no fólio real.Do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento da empresa MFS Administração e Participações LTDA, afastando óbice levantado pelo Oficial.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo com as cautelas de praxe.P.R.I.C.São Paulo, 03 de junho de 2016.Tania Mara Ahualli Juíza de Direito – ADV: RODRIGO FIRMO DA SILVA PONTES (OAB 249253/SP) (DJe de 07.06.2016 – SP).

Fonte: iRegistradores | 09/06/2016.

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CGJ/SP: Processo CG n° 2015/22469 (Parecer 164/2015-E) e Processo CG n° 2013/167709 (Parecer 47/2015-E)

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2015/22469
(164/2015-E)

Disciplinar – Pedido de Providências – Decisão de arquivamento – Recurso Administrativo – Ata Notarial lavrada por preposto do Tabelião que se apresenta regular sob o aspecto formal – Inexistência de conduta ilícita e de ato infracional passível de providência correcional – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto por Hoist Jib Equipamentos de Elevação de Cargas Eireli contra a decisão da MMª. Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do 30° Subdistrito – Ibirapuera – da Comarca da Capital, que determinou o arquivamento do “Pedido de Providências” instaurado por provocação da recorrente, sob os seguintes fundamentos: é atribuição da corregedoria permanente a apuração de indícios de prática de infração disciplinar e instauração de processo administrativo exclusivamente em face dos delegados do serviço público; a pretendida declaração de nulidade da ata notarial refoge ao âmbito administrativo; os elementos probatórios dos autos não revelam a prática de irregularidade por ocasião da lavratura da ata notarial, e, no que tange ao alegado impedimento do preposto de atuar na unidade extrajudicial por estar inscrito como advogado nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, não há prova de que este tenha praticado advocacia após a sua nomeação na unidade delegada, embora seja necessário providenciar o cancelamento da inscrição.

O recorrente afirma que o preposto do Tabelião estava impedido de exercer a advocacia e que está provada a atuação simultânea como advogado e como escrevente da unidade extrajudicial.

Diz que o Tabelião deveria ter fiscalizado a baixa da inscrição antes da contratação, em observância ao artigo 28 da Lei n°. 8.906/94, e que nestas condições o preposto não é pessoa habilitada ao exercício regular de sua profissão, razão pela qual deve ser declarada nula a ata notarial por ele lavrada. Aduz que houve falsa apresentação do escrevente na ocasião em que foi feito o cadastro para ingresso na feira no Pavilhão de Exposições do Anhembi, no qual constou que se tratava de estagiário da empresa Maory, e que quando o preposto apresentou seu documento de identificação, não contestou os dados inseridos no seu cadastro, além de ter confirmado, enquanto esteve no “stand” da feira, que era estagiário da empresa, e ter gravado todas as conversas enquanto lá permaneceu.

Acrescenta que a ata apresenta irregularidades, tais como erro de data, inserção de imagens, não descreve as pessoas que apresentaram declarações, e não foi lida. Alega que tais fatos demonstram o conluio existente entre o contratante do serviço e o preposto, e a configuração de crime de falsidade ideológica.

A decisão recorrida foi mantida pela MMª. Juíza Corregedora Permanente.

O Tabelião manifestou-se em contrarrazões do recurso.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo parcial provimento do recurso.

E o relatório.

Opino.

Inicialmente consigno que embora o recurso tenha sido interposto e recebido como de apelação, cuida-se, na realidade, de recurso administrativo, nos termos do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo.

A recorrente insurge-se contra a conduta do escrevente do Tabelião, sob a alegação de que a ata notarial lavrada está eivada de irregularidades, a começar pelo fato de o preposto ter sido contratado e iniciado o exercício da atividade notarial concomitantemente com a prática da advocacia, pois, permaneceu como mandatário nas procurações que lhes foram outorgadas em várias ações, não providenciou a baixa de seu registro na Ordem dos Advogados do Brasil, além de ter se apresentado falsamente como estagiário para fins de elaboração de cadastro que permitiu seu acesso ao local onde prestou serviço, agindo em conluio com o contratante do serviço. Imputa ao preposto a prática de crime de falsidade ideológica e alega que a ata notarial lavrada foi forjada e é ineficaz, além de conter erros, razão pela qual deve ser declarada nula, sem prejuízo das providências cabíveis no âmbito disciplinar.

Da análise do que consta dos autos, verifica-se que o preposto do Tabelião, Ricardo Ruggero Turelli, de fato, era advogado, e, ao tempo da contratação, não providenciou a baixa de seu registro na Ordem dos Advogados do Brasil. Não obstante a falta desta providência, não há, como bem observou a MMª Juíza Corregedora Permanente em sua r. decisão, nenhuma prova da prática da advocacia após a contratação e início das atividades notariais, ocorrida em 25 de fevereiro de 2014 (fls.102/103).

Com efeito, a petição e procuração apresentadas pela recorrente são do ano de 2013 (fls.80/91 e 92), anteriores, pois, ao início das atividades notariais do preposto, assim como aquelas juntadas a fls.131, 133/140, 143/148 e 149, e, ainda que este tenha permanecido como outorgado nos instrumentos de mandato, juntamente com outra advogada que com ele atuava, o que importa é que não há nenhuma prova de que ele tenha atuado nestas ou em quaisquer outras causas nas quais ainda constava como mandatário, quando já laborava como escrevente do Tabelião.

A Lei 8.906/94, de 4 de julho de 1994, dispõe em seu artigo 28, inciso IV, que a advocacia é incompatível com os que exercem serviços notariais e de registro, e, do mesmo modo, a Lei nº 8.935/94, de 18 de novembro de 1994, em seu artigo 25, dispõe acerca desta incompatibilidade. Dúvida alguma há de que tais dispositivos legais vedam o exercício simultâneo da advocacia e da atividade notarial, portanto, o fato de o preposto estar inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, e, consequentemente, estar autorizado legalmente a exercer a advocacia, não significa obrigatoriamente que a está efetivamente exercendo. (Destaquei)

Destarte, a infringência às normas legais acima mencionadas, por parte do preposto contratado pelo Tabelião, somente estaria configurada se houvesse prova do concomitante exercício da advocacia com a atividade notarial, o que não se confunde com a situação de “ativo” (inscrito) na Ordem dos Advogados do Brasil, embora se reconheça a configuração da situação irregular decorrente da possibilidade de atuação pelo fato de o escrevente permanecer inscrito junto à autarquia, de modo a se exigir imediata regularização, mediante baixa do registro.

Ocorre que, tão logo o Tabelião tomou conhecimento deste fato, em agosto de 2014, quando se manifestou nestes autos (fls. 96/101) o seu preposto tratou de apresentar renúncia nas causas em que ainda constava como procurador juntamente com outra advogada. O fato de alguns dos mandantes não terem sido notificados nos autos sobre a renúncia, é irrelevante, pois, a outra advogada que também recebeu poderes para representá-los, continuou no patrocínio das causas. A regra do artigo 45 do Código de Processo Civil deve ser observada somente nos casos em que o renunciante é o único advogado constituído pela parte.

Além do mais, assim que a MMª. Juíza Corregedora Permanente consignou na r. decisão proferida, que era necessário providenciar a baixa do registro do preposto junto à Ordem dos Advogados do Brasil, incumbindo ao Tabelião a fiscalização desta providência, a ordem foi cumprida, pois, este tomou ciência da r. decisão no dia 14/11/14 (fls.181 verso) e instruiu com as contrarrazões do recurso a prova da baixa do registro de seu preposto junto à Ordem dos Advogados do Brasil (fls.207).

No mais, a ata notarial, sob o aspecto formal, extrínseco, que deve ser examinado neste âmbito administrativo, foi lavrada regularmente, e não é da atribuição da Corregedoria Permanente e desta Corregedoria Geral da Justiça, adentrar no mérito de seu conteúdo, ou seja, dos aspectos intrínsecos, nem tampouco reconhecer e declarar a nulidade almejada pela recorrente, pois, tal pretensão, é de competência do âmbito jurisdicional.

As Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça tratam da ata notarial no Capítulo XIV, nos seguintes termos:

“737. Ata notarial é a narração objetiva, fiel e detalhada de fatos jurídicos presenciados ou verificados pessoalmente pelo Tabelião de Notas.

137.1 A ata notarial é documento dotado de fé pública.

137.2 A ata notarial será lavrada no livro de notas.

138. A ata notarial conterá:

a) local, data, hora de sua lavratura e, se diversa, a hora em que os fatos foram presenciados ou verificados pelo Tabelião de Notas;

b) nome e qualificação do solicitante;

c) narração circunstanciada dos fatos;

d) declaração de haver sido lida ao solicitante e, sendo o caso, às testemunhas;

e) assinatura e sinal público do Tabelião de Notas.

139. A ata notarial poderá:

a) conter a assinatura do solicitante e de eventuais testemunhas;

b) ser redigida em locais, datas e horas diferentes, na medida em que os fatos se sucedam, com descrição fiel do presenciado e verificado, e respeito à ordem cronológica dos acontecimentos e à circunscrição territorial do Tabelião de Notas;

c) conter relatórios ou laudos técnicos de profissionais ou peritos, que serão qualificados e, quando presentes, assinarão o ato;

d) conter imagens e documentos em cores, podendo ser impressos ou arquivados em classificador próprio. 140. O Tabelião de Notas deve recusar a prática do ato, se o solicitante atuar ou pedir-lhe que aja contra a moral, a ética, os costumes e a lei. 140.1 E possível lavrar ata notarial quando o objeto narrado constituir fato ilícito.

Da análise da ata ora impugnada, verifica-se que há identificação completa do escrevente que a lavrou, Ricardo Ruggero Turelli, há menção de que este está autorizado e é competente para tanto, que o faz em atendimento à solicitação da empresa Money Cred Serviços de Cobrança – Eirele, a qual está devidamente qualificada.

Consta, também, a finalidade da ata, o dia, hora e local em que o escrevente compareceu para a constatação dos fatos, quem o acompanhava, a qualificação destes acompanhantes, e, em seguida, a descrição pormenorizada dos fatos constatados. Ao encerrar o ato, houve menção ao horário do seu término, além de ter constado que o instrumento é composto pelo texto e imagem vinculados ao longo da ata, inseridos a pedido da solicitante.

O mencionado erro referente à data em que foi feita a constatação, pois, ficou consignado o dia 24/05/14 ao invés de 23/05/14, é meramente material, o qual não tem nenhuma interferência significativa na finalidade e conteúdo do ato, e pode ser retificado a qualquer momento, inclusive de ofício. A inserção de imagens é permitida pelas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

Quanto à identificação do escrevente, não há nenhuma determinação legal ou normativa de que este esteja obrigado a anunciar no local em que comparece que é escrevente do Tabelião e que lá está para lavrar ata notarial, inclusive, em determinadas circunstâncias, para não dizer na maioria delas, tal proceder pode frustrar ou prejudicar a eficácia da constatação. E certo que se for exigido ou se for perguntado ao preposto do Tabelião sua profissão, será necessário se identificar, porém, no caso em tela, onde a empresa interessada na prática do ato o levou à uma feira de exposição do ramo de comércio em que atua, e providenciou o cadastro dele para fins de ingresso, não há motivo para não crer que ele se limitou a entregar seu documento oficial de identificação, e que não teve participação alguma neste procedimento burocrático e interno, cujas regras são voltadas exclusivamente ao controle das empresas participantes e das pessoas por estas levadas ao local. Tanto é assim, que o nome do escrevente no crachá de uso obrigatório está vinculado apenas ao nome da empresa que o levou ao local, sem nenhuma especificação de sua função ou profissão.

No mais, quanto aos fatos descritos em decorrência da constatação, não há nada a indicar que o escrevente não tenha se limitado a narrar o que assistiu, e que apenas acompanhou aqueles que descreveu na ata como interessados, sem que tenha participado das conversas ativamente, mas apenas como expectador, ou que tenha se apresentado como estagiário da empresa, com o fim de influenciar de alguma forma e favorecer ou prejudicar quem quer que seja, como tenta fazer crer a recorrente. As próprias declarações juntadas aos autos pela recorrente, nada mencionam neste sentido, pois, de um modo geral, atestam a presença de Ricardo, mas indicam que as conversas foram mantidas com os senhores Marcelo e Nelson. As declarações de fls. 77/77-A, mencionadas pelo digno Procurador de Justiça oficiante, foram prestadas por pessoas diretamente ligadas à empresa recorrente e que trabalharam no “stand” dela, portanto, devem ser consideradas com reservas, e são isoladas.

O ato lavrado tem a fé pública do notário, a qual está revestida de presunção de veracidade, e, embora tal presunção não seja absoluta, por ora, prevalece, à mingua de indícios de conduta indevida do preposto do Tabelião, de modo que, qualquer prova em contrário e com o fim de obter declaração de nulidade da ata, deve ser produzida na via jurisdicional, própria e adequada para tal finalidade, e, se eventualmente, ficar demonstrada a participação ilícita do escrevente do Tabelião, tal fato deverá ser noticiado, para as providências pertinentes.

Em suma, a ata notarial está formalmente em ordem, não se vislumbra a prática de qualquer ilícito ou falta funcional passível de providência censório disciplinar.

A vista do exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao exame de Vossa Excelência, é de que seja negado provimento ao recurso.

Sub Censura.

São Paulo, 25 de maio de 2015.

ANA LUIZA VILLA NOVA

Juíza Assessora da Corregedoria Geral da Justiça

DECISÃO: Aprovo o parecer da MMª. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. Publique-se. São Paulo, 27.05.2015. – (a) – HAMILTON ELLIOT AKEL – Corregedoria Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 18.06.2015
Decisão reproduzida na página 88 do Classificador II – 2015

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2013/167709
(47/2015-E)

Disciplinar – Registro de Imóveis – Averbação de penhora – Título judicial passível de qualificação – Erro de qualificação – Inexistência de decisão judicial subsequente do juízo que enfrentou e afastou a recusa do registrador – Reiteração no erro de qualificação mesmo depois de alertado – Falha que implicou demora de quase um ano para averbação da penhora – Medidas posteriores adotadas pelo registrador que não excluem o erro – Indícios de infração disciplinar – Necessidade de instauração de processo disciplinar.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

O presente expediente foi inaugurado em virtude do ofício enviado pelo MM. Juízo da 39ª Vara Cível Central da Capital relatando descumprimento injustificado de ordem eletrônica de penhora pelo 12° Oficial de Registro de Imóveis da Capital.

O ofício e os documentos que o acompanham foram encaminhados ao MM. Juízo Corregedor Permanente que, em expediente próprio, entendeu que o feito perdeu o objeto e que o registrador não praticou falta disciplinar (fls. 155/157).

A r. decisão foi encaminhada pelo MM. Juízo a V. Exa. para ciência.

É o relatório.

Opino.

Distinguem-se título e ordem judicial.

O título judicial, embora com alguma mitigação[1], também se sujeita à qualificação do registrador. Já a ordem judicial, salvo hipóteses excepcionais de patente ilegalidade, tem de ser necessariamente cumprida, sob pena de desobediência.

Assim, ao receber um título judicial (formal de partilha, certidão de penhora, carta de arrematação), o registrador – respeitados alguns limites como, por exemplo, a não incursão no mérito judicial – é livre para qualificá-lo negativamente sem que isso configure descumprimento de ordem judicial.

Todavia, se o MM. Juízo que expediu o título examinar e afastar a recusa do registrador e, ato contínuo, determinar-lhe o ingresso no registro de imóveis, o que antes era um título torna-se uma ordem judicial, cujo cumprimento não pode ser postergado, sob pena de desobediência[2].

No caso em exame, o MM. Juízo da 39ª Vara Cível Central, na mesma decisão em que deferiu a penhora sobre o imóvel descrito na matrícula n° 49.465, do 12° Registro de Imóveis, reconheceu a ocorrência de fraude à execução (593, II, CPC):

b) o imóvel de matrícula nº 49.465 do 12°. CRI de São Paulo (fls. 230), na medida em que a alienação ocorreu em 7.4.06, quando já pendia contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência (o devedor foi citado na ação monitoria em agosto de 2.005, com a formação do título executivo judicial em dezembro do mesmo ano), presente a hipótese descrita no artigo 593, inciso II do Código de Processo Civil, a justificar a ineficácia do ato de disposição pela fraude à execução. (fl. 03)

Ordenou, assim, que a serventia judicial providenciasse a imediata solicitação da averbação da penhora no sistema eletrônico, o que foi atendido. Do respectivo formulário eletrônico da penhora on-line, constou em campo específico e de forma expressa que o juízo reconhecera a fraude à execução (fls. 04 e 05/07).

Ao receber a certidão de penhora, o registrador a qualificou negativamente ao argumento de que faltou apresentar mandado judicial determinando a averbação das ineficácias das alienações.

Ao receber a qualificação negativa do registrador, o MM. Juízo não a examinou e a afastou na seara judicial, isto é, não determinou a averbação da penhora a despeito do óbice imposto que, a seu ver, seria prescindível; remeteu peças a esta Corregedoria para providencias.

Embora tenha havido erro na qualificação do registrador, não houve descumprimento de ordem judicial, pois a recusa, como visto, não foi examinada e afastada pelo juízo. Não havia, assim, ordem judicial a cumprir, mas apenas título judicial a qualificar.

A inexistência de descumprimento de ordem judicial, porém, não afasta a necessidade de se examinar a conduta do registrador ao qualificar o título judicial.

A r. decisão do juízo que determinou a penhora do imóvel descrito na matrícula n° 49.465 considerou presente a hipótese de fraude à execução (fls. 03/04). O formulário da penhora on-line (certidão da penhora) foi preenchido corretamente e trazia, no campo especialmente destinado a isso, a anotação de que foi reconhecida a fraude à execução, com indicação da data da decisão, folhas e dispositivo do CPC (fls. 05/07).

Apesar disto, o registrador qualificou negativamente a penhora, exigindo em nota devolutiva informação que já constava em campo próprio do título que lhe foi apresentado.

A situação ainda se agrava porque: a) o registrador, instado a prestar informações, em vez de retificar desde logo o erro evidente a fim de demonstrar alguma eficiência, insistiu por mais duas vezes na qualificação incorreta (fls. 66 e 88). Apenas na terceira oportunidade em que se manifestou nos autos, o registrador reconheceu o erro e solicitou ao juízo que encaminhasse novo título (fl. 96):

Inadvertidamente, no caso presente, esta Serventia não observou que no próprio texto da Certidão da Penhora Online havia a decretação às fls. 07, resultando assim na exigência de fls. 11, obviamente, deforma infundada. (fl. 96)

É preciso observar, ainda, que o erro do registrador deu causa a quase nove meses de atraso no andamento da execução, em evidente prejuízo ao exequente, haja vista que a penhora, cuja certidão data de julho de 2013, só foi averbada em maio de 2014 (fls. 07 e 120). Colocou, ainda, em risco a bom andamento da execução porque o bem poderia, neste interregno, ter sido alienado a terceiro de boa fé.

Esse quadro demonstra, em tese, erro grosseiro de qualificação que pode caracterizar as infrações disciplinares previstas nos incisos I e V, do art. 31, da Lei n° 8.935/94.

Por isso, respeitado o convencimento do MM. Juízo Corregedor Permanente, não houve perda de objeto, na medida em que o fato de o registrador ter, depois de muita insistência e de longo atraso, averbado a penhora na matrícula n° 49.465 não tem o condão de fazer desaparecer o erro de qualificação ocorrido.

Esta Corregedoria Geral tem entendido que o reconhecimento do erro e a adoção de medidas posteriores a ele não o apagam nem elidem a responsabilidade. Em caso semelhante ao ora examinado, que também envolvia erro na qualificação de título judicial, frisou o então Corregedor Geral da Justiça José Renato Nalini que:

Ao reconhecer o equívoco e tomar providências para minimizar o dano, o Oficial agiu adequadamente. Mas isso não elimina a sua responsabilidade. (CG 2012/11002).

Diante deste cenário, o caso era, salvo melhor juízo de V. Exa., de instauração de processo disciplinar; não de arquivamento.

E, diante do que dispõem os itens 13[3] e 18, ambos do Capítulo XIII, do NSCGJ, que permitem a V. Exa. que, de ofício, reveja as decisões proferidas no âmbito das Corregedorias Permanentes, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que seja anulada a r. decisão de 1º grau e se determine o retorno dos autos à MMª. Juíza Corregedora Permanente para que instaure o procedimento administrativo cabível, a fim de apurar a falta disciplinar.

Sub censura.

São Paulo, 25 de fevereiro de 2015.

Gustavo Henrique Bretas Marzagão

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, anulo a decisão de 1º grau e determino que os autos tornem à MMª. Juíza Corregedora Permanente para que instaure o procedimento administrativo cabível a fim de apurar eventual falta disciplinar. Publique-se. São Paulo, 27.02.2015. – (a) – HAMILTON ELLIOT AKEL – Corregedor Geral da Justiça.

Notas:

[1] CSM: Apelação Cível n° 1025290-06.2014.8.26.0100, relator Des. Elliot Akel

[2] CGJSP: 12.566/2013, DJ: 07/03/2013, Relator: José Renato Nalini íntegra:

[3] 13. O Corregedor Geral da Justiça poderá, a pedido ou de ofício, avocar os pedidos de providências, as apurações preliminares, as sindicâncias e os processos administrativos em qualquer fase, e designar Juízes Corregedores Processantes para apurar as faltas disciplinares, produzir provas e proferir decisões.

18. O Corregedor Geral da Justiça poderá, de ofício ou mediante provocação, rever as decisões proferidas no âmbito das Corregedorias Permanentes.

Diário da Justiça Eletrônico de 06.03.2015
Decisão reproduzida na página 31 do Classificador II – 2015

Fonte: INR Publicações | 09/06/2016.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura pública de desapropriação – Indenização pela aquisição do bem imóvel desapropriado – Inocorrência – Pagamento correspondente apenas aos direitos possessórios – Expropriação não consumada – Desqualificação registral confirmada – Recurso desprovido.

ACÓRDÃOS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 9000002-29.2015.8.26.0602

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 9000002-29.2015.8.26.0602, da Comarca de Sorocaba, em que é apelante MUNICÍPIO DE SALTO DE PIRAPORA, é apelado 2° OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SOROCABA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.“, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTÔNIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

São Paulo, 8 de abril de 2016.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n.° 9000002-29.2015.8.26.0602

Apelante: MUNICÍPIO DE SALTO DE PIRAPORA

Apelado:2.° OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SOROCABA

VOTO N° 29.172

Registro de imóveis – Escritura pública de desapropriação – Indenização pela aquisição do bem imóvel desapropriado – Inocorrência – Pagamento correspondente apenas aos direitos possessórios – Expropriação não consumada – Desqualificação registral confirmada – Recurso desprovido.

O oficial de registro, ao suscitar dúvida e justificar a desqualificação do título que lhe foi apresentado, alegou que adesapropriação de direitos de meação e hereditários não tem acesso ao fólio real, pois não diz respeito a bens imóveis. [1]

Ao impugnar, o interessado, ora apelante, argumentou que a desapropriação é modo originário de aquisição da propriedade e, por isso, o título objeto da desqualificação registral é suscetível de ingresso no álbum imobiliário. [2]

Após o parecer do Ministério Público [3], a dúvida foi julgada procedente [4], razão pela qual o interessado, reiterando suas primeiras alegações, interpôs apelação [5], recebida no duplo efeito [6]. No mais, enviados os autos ao Conselho Superior da Magistratura, a Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo desprovimento do recurso [7].

É o relatório.

Com relação à desapropriação como modo originário de aquisição da propriedade, reporto-me a precedente deste C. Conselho Superior da Magistratura, expresso no julgamento da Apelação Cível n.° 0000025-73.2011.8.26.0213, rel. Des. Renato Nalini, j. 19.7.2012:

A desapropriação é o procedimento administrativo identificado pela prática de uma série encadeada de atos preordenados à perda da propriedade, pelo particular, mediante transferência forçada de seus bens para o Poder Público, precedida, em regra, do pagamento de prévia e justa indenização em dinheiro.

O despojamento compulsório da propriedade pelo Poder Público pode estar fundado a) em necessidade ou utilidade pública ou interesse social (artigo 5.°, XXIV, da CF), b) em descumprimento do Plano Diretor do Município – quando dispensada a prévia indenização e admitido o pagamento mediante títulos da dívida pública (artigo 182, § 4.°, III, da CF) –, c) visar, à luz do descumprimento da função social do imóvel rural, à reforma agrária – hipótese em que autorizado o pagamento da indenização por meio de títulos da dívida agrária (artigo 184 da CF) –, d) ou apoiar-se na utilização criminosa dos bens, situação que desobriga o pagamento de indenização (artigo 243 da CF).

A desapropriação, amigável ou judicial, concluída extrajudicialmente, na via administrativa, ou por meio de processo litigioso, com a intervenção do Poder Judiciário, revela-se, sempre, um modo originário de aquisição da propriedade: inexiste um nexo causal entre o passado, o estado jurídico anterior, e a situação atual.

A propriedade adquirida, com a desapropriação, liberta-se de seus vínculos anteriores, desatrela-se dos títulos dominiais pretéritos, dos quais não deriva e com os quais não mantêm ligação, tanto que não poderá ser reivindicada por terceiros nem pelo expropriado (artigo 35 do Decreto-lei n.° 3.365/1941), salvo no caso de retrocessão.

Trata-se de entendimento compartilhado, além do mais, pela melhor doutrina: Miguel Maria de Serpa Lopes [8], Hely Lopes Meirelles [9], Celso Antônio Bandeira de Mello [10], Maria Sylvia Zanella di Pietro [11], Lúcia Valle Figueiredo [12], Diogenes Gasparini [13], José Carlos de Moraes Salles [14] e Marçal Justen Filho [15].

A propósito da desapropriação amigável, Diogenes Gasparini acentua: mesmo ela, na qual, igualmente, a transferência é imposta pelo Poder Público, a aquisição da propriedade é originária, “dado que o expropriante e o expropriado ajustam seus interesses apenas em relação à indenização, às condições de pagamento e à transferência da posse.” [16]

Na mesma linha, Celso Antônio Bandeira de Mello destaca a natureza compulsória da aquisição da propriedade realizada via desapropriação, causa autônoma suficiente para incorporação do bem expropriado ao patrimônio do Poder Público, apoiada na sua vontade, no seu poder de império, e no pagamento da indenização, malgrado encerrado o procedimento extrajudicialmente, com acordo. [17]

Enfim, ainda que a segunda fase do procedimento expropriatório bifásico, a executiva (a primeira fase é a declaratória), termine no âmbito administrativo, com a lavratura da escritura pública amigável de desapropriação, a ser registrada no Registro de Imóveis, a desapropriação, a despeito do acordo extrajudicial, não se desnatura, ou seja, não se transmuda em modo derivado de aquisição da propriedade.

Consoante Marçal Justen Filho, “a concordância do particular não atribui natureza consensual à desapropriação,” [18]que, assim – implicando supressão da propriedade privada por iniciativa estatal, para a qual indiferente a anuência do expropriado –, “não se confunde com uma compra e venda”, ainda que haja “aquiescência no tocante ao valor da indenização.” [19]

Por sua vez, o Colendo Conselho Superior da Magistratura, por anos, acompanhou o posicionamento doutrinário exposto, sem fazer distinção, com relação ao modo de aquisição da propriedade, entre as desapropriações amigável e judicial.

Conforme se extrai dos julgamentos da Apelação Cível n.° 9.461-0/9, no dia 30 de janeiro de 1989, relator Corregedor Geral da Justiça Milton Evaristo dos Santos, e da Apelação Cível n.° 12.958-0/4, no dia 14 de outubro de 1991, relator Corregedor Geral da Justiça Onei Raphael, a desapropriação, mesmo a amigável, era compreendida, tal como a judicial, como modo originário de aquisição da propriedade.

Todavia, com o julgamento da Apelação Cível n.° 83.034-0/2, no dia 27 de dezembro de 2001, relator Corregedor Geral da Justiça Luis de Macedo, houve alteração da jurisprudência: passou-se a entender que a desapropriação amigável, consumada na fase administrativa, é meio derivado de aquisição da propriedade, retratando um negócio jurídico bilateral, oneroso e consensual, instrumentalizado mediante escritura pública.

Doravante, tal concepção do assunto prevaleceu – segundo demonstra, a título de exemplo, o julgamento da Apelação Cível n.° 39-6/0, em 18 de setembro de 2003, relator Corregedor Geral da Justiça Luiz Tâmbara até um novo reexame da questão, recentemente promovido, por ocasião do julgamento da Apelação Cível n° 990.10.415.058-2, no dia 07 de julho de 2011, relator Corregedor Geral da Justiça Maurício Vidigal, quando restabelecido o anterior entendimento, a ser prestigiado, porque afirmado, em harmonia com o acima aduzido, que a desapropriação amigável, inclusive, é modo originário de aquisição da propriedade.

Não sem razão, uma vez que o acordo extrajudicial, elemento identificador da desapropriação amigável espécie de expropriação também contemplada no artigo 10 do Decreto-Lei 3.365/1941 [20] , versa, exclusivamente, convém insistir, sobre a indenização a ser desembolsada pelo expropriante: ou seja, a escritura pública amigável de desapropriação não é título translativo da propriedade.

O despojamento da propriedade é coativo, mesmo na desapropriação amigável: inexiste, na desapropriação, em quaisquer de suas espécies, transferência consensual da propriedade para o Poder Público. A perda compulsória da propriedade, acompanhada de sua aquisição originária pelo expropriante, é resultante do procedimento administrativo desencadeado pelo Estado.

O risco de fraude e a falta da garantia prevista para a desapropriação judicial, representada pela apuração da regularidade dominial como condição para o levantamento da indenização (artigo 34 do Decreto-Lei n.° 3365/1941 [21]), não justificam a desvirtuação da natureza da expropriação, ainda que amigável.

Ao terceiro prejudicado, restará a sub-rogação de seus supostos direitos na indenização desembolsada pelo ente expropriante (artigo 31 do Decreto-Lei n.° 3.365/1941 [22]) ou, inviabilizada esta, perseguir, judicialmente, o reconhecimento de eventual responsabilidade do Estado.

Dentro do contexto exposto reconhecido o modo originário de aquisição da propriedade pelo Poder Público, precedida da perda compulsória do bem pelo particular , a observação do princípio registrai da continuidade é prescindível [23], ainda mais diante da regra emergente do artigo 35 do Decreto-Lei n.° 3.365/1941 [24].

Destarte, pouco importa, aqui, a constatação de que o imóvel relacionado com a desapropriação não se encontra registrado em nome dos desapropriados. É irrelevante o fato da matrícula n.° 2.317 do 2.° Registro de Imóveis de Sorocaba, apontar, como proprietária, a Arysta LifeScience do Brasil Indústria Química e Agropecuária Ltda., atual denominação daHonko do Brasil Indústria Química e Agropecuária Ltda., para quem o desapropriado Waldomiro de Góes Vieira e sua esposa Joaquina dos Santos Viera, genitora da desapropriada Neiva de Góes Santos Ortiz, alienaram, antes, o imóvel. [25]

De todo modo, a dúvida é procedente. E isso porque a escritura de desapropriação contemplou somente indenização pelos direitos possessórios dos desapropriados, insuscetíveis de inscrição imobiliária. Nada se ajustou, com os desapropriados, a respeito do preço do bem imóvel. Nada se pagou, em particular, pela aquisição do imóvel desapropriado. Portanto, impõe confirmar o juízo negativo de qualificação registral, com respaldo, ademais, em precedente do C. Conselho Superior da Magistratura [26].

Ora, a desapropriação idealizada pelo recorrente, então deflagrada por meio da declaração de utilidade pública, a pressupor, todavia, para fins de sua perfectibilização, indenização prévia como contrapartida pela perda do direito de propriedade, não se consumou.

Em outras palavras, o acordo formalizado pela escritura apresentada para registro, não tendo por objeto indenização correspondente ao valor do imóvel desapropriado, é insuficiente à concretização da aquisição compulsória do direito de propriedade.

Isto posto, nega-se provimento ao recurso interposto.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

______________________________

Notas:

[1] Fls. 5-7.

[2] Fls. 26-29.

[3] Fls. 31-34.

[4] Fls. 36-37.

[5] Fls. 42-54.

[6] Fls. 55.

[7] Fls. 64-67.

[8] Tratado dos Registros Públicos. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/a, 1957. p. 173. v. IV.

[9] Direito Administrativo brasileiro. 19.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 509.

[10] Curso de Direito Administrativo. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 581-582.

[11] Direito Administrativo. 13.ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 164.

[12] Curso de Direito Administrativo. 5.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 313.

[13] Direito Administrativo. 6.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 625-626.

[14] A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 6.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 427/428.

[15] Curso de Direito Administrativo. 8.ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 600/601

[16] Op. cit., p. 626.

[17] Op.cit., p. 581-582 e 587.

[18] Op. cit.,p. 617.

[19] Op. cit., 600

[20] Art. 10. A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará.

[21] Art. 34. O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.

Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo.

[22] Art. 31. Ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado.

[23] Apelação Cível n.° 3.604-0, rel. Des. Marcos Nogueira Garcez, j. 3.12.1984; Apelação Cível n.° 9.461-0/9, rel. Des. Milton Evaristo dos Santos, j. 30.1.1989; Apelação Cível n.° 12.958-0/4, rel. Des. Raphael, j. 14.10.1991; e Apelação Cível n.° 990.10.415.058-2, rel. Des. Maurício Vidigal, j. 7.7.2011;

[24] Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.

[25] Fls. 15-18.

[26] Apelação Cível n.° 496-6/4, rel. Des. Gilberto Passos de Freitas, j. 11.5.2006. (DJe de 30.05.2016 – SP)

Fonte: INR Publicações – DJE/SP | 09/06/2016.

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