Apelação Cível – Ação de danos morais e materiais – Venda de caminhão – Comunicação da venda pelo Cartório de Notas à Secretaria da Fazenda – Sentença de parcial procedência com condenação do tabelião – Reforma da sentença – Responsabilidade da Secretaria da Fazenda na disponibilização das informações ao DETRAN – Ação julgada improcedente em relação ao Tabelião e procedente em relação à Secretaria da Fazenda – Recurso provido.


  
 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1005498-68.2018.8.26.0248, da Comarca de Indaiatuba, em que é apelante MARCIO PIRES DE MESQUITA, são apelados INDAFRUITI COMERCIAL DE LARANJAS LTDA-ME e ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores EDUARDO GOUVÊA (Presidente), LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA E MOACIR PERES.

São Paulo, 16 de março de 2020.

EDUARDO GOUVÊA

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Apelação Cível – Ação de danos morais e materiais – Venda de caminhão – Comunicação da venda pelo Cartório de Notas à Secretaria da Fazenda – Sentença de parcial procedência com condenação do tabelião– Reforma da sentença – Responsabilidade da Secretaria da Fazenda na disponibilização das informações ao DETRAN – Ação julgada improcedente em relação ao Tabelião e procedente em relação à Secretaria da Fazenda.

Recurso provido

Trata-se de recurso de apelação (fls. 214/235) interposto por Marcio Pires de Mesquita (Tabelião de notas e Protesto de Letras e Título de Indaiatuba) contra a r. sentença (fls. 182/189), que julgou parcialmente procedentes os pedidos para determinar: a) transferência definitiva da propriedade do veículo CAR/CAMINHÃO/C FECHADA VW 8.150, ano/modelo 2002, placa DAO 3575, cor branca, RENAVAM 00793568277, Chassi 9BWAD52R32R220755, para o nome de BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS, CNPJ nº 92.682.038/0198-03, confirmando a tutela deferida às fls. 96/98;

b) DECLARAR a inexigibilidade, em relação ao autor, do débito de R$ 1.758,84 discutido nestes autos, determinando o consequente cancelamento definitivo do protesto correspondente (fls. 36) às expensas do réu MARCIO PIRES DE MESQUITA, confirmando a tutela deferida às fls. 103; c) CONDENAR o réu MARCIO PIRES DE MESQUITA ao pagamento do importe de R$ 10.000,00 a título de danos morais, a ser acrescido de correção monetária pela Tabela Prática do TJSP desde a prolação desta sentença e de juros de mora de 1% ao mês a partir da data do protesto; d) CONDENAR o réu MARCIO PIRES DE MESQUITA ao pagamento do importe de R$ 13,14 a título de danos materiais, a ser acrescido de correção monetária pela Tabela Prática do TJSP desde o desembolso e de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação.

Repisa o recorrente, em apertada síntese, em preliminares pela nulidade da sentença por cerceamento de defesa em razão da alegação de ausência de assinatura do comprador no CRV (fls. 38); ter sido a decisão ‘extra petita’; ausência do interesse de agir e sua ilegitimidade, vez que agiu em conformidade com o artigo 2º, inciso I, Decreto 60.489/2014, que determina aos notários o envio à Secretaria da Fazenda das informações de compra e venda de veículo, sendo esta a responsável por comunicar estas informações ao DETRAN. Explica ter comunicado ao SEFAZ o negócio realizado. Consigna que o adquirente do veículo pode reconhecer sua firma em momento posterior, conforme o §2º, artigo 2º, do Decreto 60.489/2014. Assevera que não houve qualquer pedido administrativo para retificação do ocorrido. Argui pela inexistência de danos morais e materiais o artigo. Afirma que o artigo 134 do CTB ainda é aplicável, apesar do Decreto Estadual nº 60.489/14.

Contrarrazões às fls.250/403.

É o breve relatório.

Cuida-se de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por Indafruiti Comercial de Laranjas Ltda em face 1º Tabelião de Notas e Protesto de Letras e Título de Indaiatuba. O autor afirmou na petição inicial ter sido proprietário do caminhão VW 81500, placas DAO 3575, até sua venda em 02/07/2015 ao Bradesco Auto/Re Companhia de Seguros (fls. 38). Afirma que neste dia foi ao 1ºTabelionato de Indaiatuba para transferir a titularidade do veículo. Mas que, apesar disso, veio a ser protestado pelo valor de R$ 1.758,84 relativo ao IPVA de 2016 (fls. 32/33).

Observa-se nos autos, que a ação foi ajuizada em face do 1º Tabelião de Notas e Protesto de Letras e Título de Indaiatuba, vindo a ser emendada, com a substituição do polo passivo por Marcio Pires de Mesquita, ora apelante (fls. 90/91).

Houve uma nova emenda à inicial para inclusão da Fazenda do Estado no polo passivo (fls. 99/100) com o intuito de declarar a inexigibilidade do débito.

Pois, bem.

Reza o artigo 134 do CTB: No caso de transferência de propriedade, o proprietário antigo deverá encaminhar ao órgão executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de trinta dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação.

Porém, o Decreto Estadual 60.489/2014, diz em seus artigos 2º, incisos I e II, e 4º, respectivamente, in verbisArtigo 2º – Logo após a efetivação do ato de reconhecimento de firma por autenticidade do transmitente/vendedor no documento de transferência de propriedade do veículo o notário deverá enviar à Secretaria da Fazenda, por meio do endereço eletrônico http://www.fazenda.sp.gov.br: I – as informações relativas à operação de compra e venda ou transferência, a qualquer título, da propriedade do veículo, relacionadas no Anexo Único; II – cópia digitalizada, frente e verso, do Certificado de Registro do Veículo – CRV preenchido e com firmas reconhecidas por autenticidade conforme determinado pela legislação de trânsito, em arquivo no formato “PDF” e com assinatura digital contida em documento do tipo P7S. § 2º – Caso o adquirente do veículo venha a reconhecer sua firma autêntica em momento posterior ao reconhecimento da firma do transmitente, os notários deverão enviar as informações relativas ao ato de sua competência e as respectivas cópias previstas neste artigo. Artigo 4º – O cumprimento do disposto no artigo 2º pelo notário dispensa: I – o transmitente e o adquirente de cumprir a obrigação prevista no parágrafo único do artigo 34 da Lei 13.296, de 23 de dezembro de 2008, de comunicar a alienação do veículo às autoridades competentes; II – o transmitente de encaminhar, ao Detran-SP, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade do veículo, devidamente assinado e datado, conforme previsto no artigo 134 da Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro). (grifo nosso).

Nesse sentido, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2115790-13.2014.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é autor FEBRANOR FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES, é réu GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “JULGARAM A AÇÃO IMPROCEDENTE. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

Declaração de inconstitucionalidade. Decreto Estadual n. 60.489/2014, que ao disciplinar a Lei Estadual n. 13.296/2008, estabeleceu que os notários comunicassem reconhecimentos de firmas em certificados de transferência de veículos, por meio eletrônico, à Secretaria da Fazenda. Objetivo de dinamizar o sistema de averbação para controle de segurança do trânsito e fiscalização de recolhimento de tributos. A norma não legisla sobre trânsito, porque não inova ou cria modelo diferente do que existe na prática. O fato de desobrigar os sujeitos de pagarem extra quando reconhecem firmas não implica impor serviço gratuito aos notários, que são remunerados pela abonação da assinatura. Finalidade da norma que se sobrepõe ao interesse dos agentes que atuam por delegação. O comunicar a prática de um ato notarial (reconhecimento de firma) não caracteriza, na essência da fé pública que se delega, função notarial, porque não certifica ou declara a verdade, o que impossibilita sua inserção como elemento novo da tabela de custas e emolumentos. Improcedência…”.

Assim, com o advento do Decreto nº 60.489/2014 ficou estabelecido que os notários comunicassem a Secretaria da Fazenda os reconhecimentos de firmas em certificados de transferência de veículos, por meio eletrônico.

Este Decreto ainda determina, em seu artigo 3º, competir à Secretaria da Fazenda a disponibilização das informações previstas no artigo 2º ao Departamento Estadual de Trânsito Detran-SP, nos seguintes termos: Artigo 3° – A Secretaria da Fazenda disponibilizará as informações previstas no artigo 2º ao Departamento Estadual de Trânsito – Detran-SP que: I – atualizará os registros de seu cadastro de veículos com base nessas informações; II – comunicará à Secretaria da Fazenda, se for o caso, a ocorrência de inconsistências nas informações disponibilizadas.”

No caso em tela, a venda ocorreu em 02/07/2015 (fls. 38), tendo o apelante informado à Secretária da Fazenda sobre a operação de compra e venda do veículo aos 03/07/2015, conforme documentos de fls. 147/150.

Assim, em que pese o documento de fls.38 comprova a venda perante o Cartório de Notas, sendo após a vigência do Decreto Estadual nº 60.489 de 23/05/2014, que incumbiu ao Cartório de Notas a comunicação à Secretaria da Fazenda a respeito das transferências de veículos devidamente registradas. Sendo da Secretaria da Fazenda a comunicação aos DETRAN da venda do veículo.

Nesse sentido já se posicionou esta C. 7ª Câmara de Direito Público do TJSP:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INADMISSIBILIDADE. Venda de veículo automotor. Cartório de Notas que comunicou a venda de veículo automotor à Secretaria da Fazenda, conforme estabelecido pelo Decreto nº 60.489/2014. A responsabilidade pela comunicação da venda de veículo ao Detran é da Secretaria da Fazenda e não do Cartório de Notas. Não configuração de ato omissivo. Inexistência do dever de indenizar. Recurso improvido.” (TJSP; Apelação Cível 1004504-83.2018.8.26.0072; Relator (a): Moacir Peres; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Público; Foro de Bebedouro – 1ª Vara; Data do Julgamento: 11/11/2019; Data de Registro: 12/11/2019)

Deste modo, ante a ausência do nexo de causalidade entre a conduta imputada ao apelante na comunicação ao DETRAN da venda realizada é de rigor a reforma da r. sentença para julgar improcedente a ação em face Marcio Pires de Mesquita.

Diante dos fundamentos supramencionados, a responsabilidade pela disponibilização das informações ao DETRAN recai sobre a Secretaria da Fazenda, neste diapasão é de rigor a condenação da Fazenda do Estado ao pagamento da indenização por danos morais e materiais.

Deste modo, reforma-se parcialmente a r. sentença a fim de condenar a Fazenda do Estado ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais e R$ 1758,84 a título de danos materiais, mantendo-se no mais a r. sentença.

Diante da reforma da r. sentença, condeno a Fazenda do Estado ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação para cada um dos patronos das partes contrárias.

No mais, considero pré-questionadas demais questões que possam vir à baila para fins de acessibilidade às vias judiciais superiores.

Ante o exposto, dá-se provimento ao recurso, nos termos do acórdão.

EDUARDO GOUVÊA

Desembargador Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1005498-68.2018.8.26.0248 – Indaiatuba – 7ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Eduardo Gouvêa – DJ 06.04.2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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