PROVIMENTO CG N° 26/2021

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

PROVIMENTO CG N° 26/2021

Alteração das NSCGJ com revogação do parágrafo único do artigo .226, alteração do inciso III e inclusão dos parágrafos 1° A 4°, bem como alteração da redação dos parágrafos 1° a 4° do artigo 1.226-A, com acréscimo do parágrafo 5°.

Nota da redação INR: Clique aqui para visualizar a íntegra do ato. (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: INR Publicações

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RCPN. Escritura de União Estável. Indeferimento do pedido de alteração do regime de bens da união estável na via extrajudicial ou mesmo diante de via administrativa, junto ao Juízo Corregedor Permanente, uma vez que o requerimento demanda a análise na via judicial pertinente.

Processo 1006520-18.2021.8.26.0100

Pedido de Providências – 2ª Vara de Registros Públicos – VISTOS, Cuida-se de pedido de providências formulado pelo Senhor Tabelião de Notas da Capital, suscitando dúvida quanto a pedido de Retificação e Ratificação em relação ao regime de bens escolhido em Escritura Pública de Declaração de União Estável. Manifestou-se, quanto ao tema, o Colégio Notarial do Brasil Seção São Paulo, às fls. 06/11. Sobrevieram esclarecimentos pelo Senhor Titular, às fls. 21/23. O Ministério Público ofertou parecer opinando pelo indeferimento do pedido, no entendimento de que a via administrativa não é suficiente para a análise do pedido em tela (fls. 27/29). É o breve relatório. Decido. Trata-se de dúvida suscitada pelo Senhor Tabelião de Notas da Capital, relativa a pedido de Retificação do regime de bens apontado em Escritura Pública de Declaração de União Estável. Narra o Senhor Titular que aos 21 de outubro de 2020 foi lavrada em sua serventia de notas a Escritura Declaratória de União Estável entre M. A. S. e D. S. S., escolhendo os conviventes o regime da separação de bens. Ocorre que, aos 11 de janeiro de 2021, o consorte retornou à unidade e referiu que se equivocou quanto ao acordo patrimonial escolhido para a convivência do casal, posto que desejava, na realidade, que a separação obrigatória regesse a união. Destaca o Senhor Tabelião que, em razão da idade do convivente, maior de 70 anos, não se cuidaria, então, propriamente de escolha de regime, mas sim de mera aceitação dos efeitos patrimoniais decorrentes dos dispositivos legais que incidem sobre a matéria. Não obstante todo o explanado, os Senhores Interessados desejam ver a Escritura Declaratória retificada no que tange ao acordo patrimonial, para que dela passe a figurar a separação obrigatória de bens na regência da união estável entre os conviventes (fls. 23). De sua parte, compreende o i. Delegatário que, pese embora a afirmação pelas partes de que cometeram um engano na declaração anterior, a mudança não pode ser feita na via extrajudicial, sendo necessária a manifestação do Judiciário, razão pela qual suscitou a presente dúvida. Noutro turno, veio aos autos o CNB-SP para se manifestar na mesma esteira do d. Notário, isto é, pela impossibilidade de alteração do regime de bens na via extrajudicial, não sendo caso de se aplicar o procedimento previsto no item 55, do Capítulo XVI, das NSCGJ, que trata da feitura da Escritura de Ret-Ratificação, não sendo possível se deduzir, de pronto, que houve erro, inexatidão material ou irregularidade na confecção do ato, tal como lavrado. Nesse sentido, ressaltou o Colegiado que a Escritura de Retificação e Ratificação (item 55) não pode ser utilizada para inovar no ato anteriormente praticado, resultando em modificação na vontade das partes. Ademais, por analogia, aplica-se à união estável a vedação atinente à alteração do regime de bens do casamento, que somente pode se dar na via judicial, por previsão expressa do artigo 1.639, §2º, do Código Civil. Na mesma senda opinou o Ministério Público, aduzindo que a retificação, tal qual pretendida, é inviável na via extrajudicial. Sublinhou, ainda, o d. Promotor de Justiça, importante ponto que merece instrução processual adequada, qual seja, o momento de início da união, que pode ensejar, ou não, a obrigatoriedade do regime de bens. Pois bem. A dúvida levantada pelo Senhor Notário é pertinente e deve ser acolhida, com o indeferimento do pedido efetivado pelos Senhores Interessados, nesta via administrativa. Fundamento. Inicialmente, cabe mencionar o tópico já levantado pelo CNB-SP, no que tange ao fato de que a Escritura de Retificação e Ratificação não se prestar a inovar o conteúdo do negócio jurídico anteriormente pactuado. O item 55, Cap. XVI, das Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça (NSCGJ), é claro em sua dedução de que o instituto da Retificação e Retatificação se utiliza para a correção de erros, inexatidões materiais e irregularidades. Veja que não se cuida de, por meio do documento, realizar novo ato, desconectado do instrumento anterior, inclusive sendo necessário se proceder às decidas anotações e remissões em ambas as notas, em consonância aos itens 55.1 e 55.2, Cap. XVI, das NSCGJ. A despeito do explicitado, mesmo que se insista na alegação da existência de erro, não se deve olvidar que o mesmo não se cuidaria, se o caso, de erro material, tal qual disposto no item 55, supra, mas sim de um error in negotia, isto é, um erro substancial, ou seja, um defeito do negocio jurídico, em conformidade ao artigo 139 do Código Civil. Nesse sentido, refere o mencionado artigo: Art. 139. O erro é substancial quando: I – interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais; II – concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante; III – sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico. [grifo meu] Veja que o equívoco sobre o qual se pretende fazer recair a retificação é parte essencial do contrato de convivência, sendo termo fundamental e indissolúvel da declaração de vontade firmada pelas partes, restando sobremaneira inviável que a alteração se dê da forma singela como pretendem os consortes, haja vista o impacto jurídico que dela pode advir. No que tange à vontade das partes, que se diz manifestada da forma incorreta, resultando num embate entre eventual vontade real e alegado resultado errôneo, ensina Silvio Rodrigues [in: Direito Civil Parte Geral] que, na moderna teoria civil, aplicável ao presente caso, o declarante se responsabiliza pelo pacto firmado, em especial se suposto erro decorre de culpa ou dolo do interessado. In verbis: Embora partindo do pressuposto de que o ordenamento jurídico busca realizar a autonomia da vontade, tal teoria [teoria da responsabilidade] reconhece que, mesmo desacompanhada da vontade, pode a declaração ter efeito obrigatório quando a disparidade entre ela e a vontade real decorrer de culpa ou dolo do declarante. Em tal caso, o declarante vincula-se, a despeito de o não querer, por isso que é responsável pelo desacordo entre o que disse e o que quis. Não se pode aproveitar de sua própria torpeza (se houver dolo), ou de sua própria incúria (se houver culpa), para promover a ineficácia do ato, com prejuízo para os terceiros de boa-fé que confiaram na verdade da declaração emitida. [Rodrigues, Silvio. Direito Civil. V. 1. Parte geral. 34. ed. atual, de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002) – São Paulo: Saraiva, 2003. P. 185] Dentre desse contexto, o regime de bens pactuado entre os cônjuges não se cuida de mera liberalidade íntima, de modo que seus efeitos ultrapassam, e muito, o âmbito do casal e os laços familiares, podendo afetar terceiros sem qualquer relacionamento com os integrantes da avença realizada. Nessa toada, Silvio Rodrigues [idem, P. 186, sobre teoria da confiança], em continuação, indica que quando “a declaração difere da vontade, é a declaração que deve prevalecer, pois a pessoa a quem é dirigida [terceiro, neste caso concreto] decerto não tinha elementos para verificar tal disparidade.” É por isso mesmo, pelo impacto jurídico que se estende para além da relação conjugal, que a alteração do regime patrimonial aplicado ao casamento somente pode ocorrer na via judicial, na decisão do legislador, por força do artigo 1.639, §2º, do Código Civil. Com efeito, sublinhe-se que após longa evolução histórica, que se iniciou com mudanças sociais, seguidas do reconhecimento da união estável como entidade familiar pela Constituição Federal, culminando em recente decisão do Supremo Tribunal Federal (RExt n° 646.721 e 878.694), que equiparou ambos os institutos União e Matrimônio para fins de sucessão, na atualidade, não se pode dizer que há distinções de cunho civil relevantes entre a convivência estável, para fins de constituição de família, e o matrimônio. Assim sendo, igualmente, o regime de bens da união estável também não pode ser mudado na via extrajudicial ou administrativa, sem a participação da supervisão judicial, em analogia ao indicado no supramencionado artigo 1.639, §2º, do Código Civil. Assim também apontou o d. Promotor de Justiça, ao mencionar o REsp 1.383.624/MG, em julgado no qual o Superior Tribunal de Justiça firmou o exato entendimento. Por fim, não verifico a ocorrência de ilícito funcional ou falha na prestação do serviço pelo Senhor Notário na lavra do ato fazendo constar o regime da separação convencional, em situação de existência de causa suspensiva em razão da idade do convivente varão, uma vez que é possível o entendimento de que esse acordo patrimonial é mais gravoso que o estabelecido legalmente, sendo, então, permitida sua escolha, nos termos do Enunciado 634 CJF, aprovado na VIII Jornada de Direito. In verbis: É lícito aos que se enquadrem no rol de pessoas sujeitas ao regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641 do Código Civil) estipular, por pacto antenupcial ou contrato de convivência, o regime da separação de bens, a fim de assegurar os efeitos de tal regime e afastar a incidência da Súmula 377 do STF. Por todo o exposto, à vista do parecer do Ministério Público, acolho a dúvida do Senhor Titular e indefiro o pedido de alteração do regime de bens da união estável na via extrajudicial ou mesmo diante desta via administrativa, junto deste Juízo Corregedor Permanente, uma vez que o requerimento demanda a análise na via judicial pertinente. Nessas condições, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, determino o arquivamento dos autos. Não menos importante, determino à z. Serventia Judicial que publique a presente decisão no DJE, haja vista a pertinência do tema ao serviço extrajudicial. Ciência ao Senhor Titular, que deverá cientificar os Senhores Interessados, ao Ministério Público e ao CNB-SP. P.I.C.  (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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Registro de Imóveis – Recurso de apelação recebido como recurso administrativo – Desdobro – Imóvel localizado em área de preservação permanente, por ser próximo a leito de rio – Inscrição no CAR – Continuidade da existência de área de preservação permanente em área recepcionada como de expansão urbana, que impõe a autorização do órgão competente – Exigência de averbação para o pretendido desdobro – Publicidade registral que tem finalidade diversa da cadastral – Parecer pelo não provimento do recurso.

Número do processo: 1000695-94.2018.8.26.0360

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 4

Ano do parecer: 2020

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1000695-94.2018.8.26.0360

(04/2020-E)

Registro de Imóveis – Recurso de apelação recebido como recurso administrativo – Desdobro – Imóvel localizado em área de preservação permanente, por ser próximo a leito de rio – Inscrição no CAR – Continuidade da existência de área de preservação permanente em área recepcionada como de expansão urbana, que impõe a autorização do órgão competente – Exigência de averbação para o pretendido desdobro – Publicidade registral que tem finalidade diversa da cadastral – Parecer pelo não provimento do recurso.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso de apelação interposto por Edgar Correa Neves contra decisão proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Mococa/SP, que indeferiu averbação de desdobro de imóvel objeto da matrícula nº17.444 daquela serventia predial, por se tratar de imóvel localizado em área de preservação permanente, (fls. 91/94). Sustenta, em síntese, que a Municipalidade aprovou o desdobro e que já consta inscrição no CAR – Cadastro Ambiental Rural, por intermédio do qual foram fixadas as áreas de APP, reserva legal e áreas consolidadas. Aduz que a área foi incorporada ao perímetro urbano, não competindo ao registrador fiscalizar as questões ambientais (fls. 97/105).

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 152/154).

Opino.

Desde logo, cumpre consignar que, em se tratando de pedido de providências, a apelação interposta deve ser recebida como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, certo que o inconformismo da parte foi manifestado contra r. decisão proferida no âmbito administrativo pelo MM. Juiz Corregedor Permanente da Serventia Extrajudicial em questão.

Na hipótese, pretende o recorrente a averbação no fólio real de desdobro de imóvel de sua propriedade, localizado em área de preservação permanente, por se encontrar próxima a leito de rio.

A matrícula nº 17.444, sobre a qual recai a postulação de desdobro deduzida, assegura que o imóvel de propriedade do recorrente tem área total de 38.272m2 e faz divisa com a margem direita do Rio Pardo (fls. 18/22).

A propósito, cumpre lembrar que o Código Florestal de 2012 traz em seu art. 4° a previsão de áreas de preservação permanente em zonas rurais ou urbanas, assim dispondo:

Art. 4º – Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

A Lei Florestal não visa somente proteger as florestas, mas toda formação vegetal de qualquer ecossistema, razão pela qual merece ser aplicada também às vegetações da cidade, seja na zona rural ou urbana.

Logo, a anterior inscrição junto ao CAR – Cadastro Ambiental Rural em nada favorece o recorrente na medida em que, ante a continuidade da existência de área de preservação permanente em área recepcionada como de expansão urbana, há que se ter autorização do órgão competente para o pretendido desdobro.

Desta forma, claro está que o desdobro, sem a identificação e delimitação das áreas de proteção permanente inseridas nos lotes a serem criados e sem a licença ambiental, certamente colidirá com as disposições contidas na Lei 12.651/12 e nas instruções dos Órgãos de Proteção Ambiental.

As áreas de preservação ambiental nas propriedades caracterizam-se como uma limitação administrativa necessária à tutela do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, em harmonia com a função social da propriedade, o que legitima haver restrições aos direitos individuais em benefício dos interesses de toda a coletividade.

De acordo com a jurisprudência do E. STJ, a obrigação de demarcar, averbar e restaurar a área de reserva legal constitui-se uma obrigação propter rem, que se transfere automaticamente ao adquirente ou ao possuidor do imóvel. Por se tratar de conduta em sintonia com todo o sistema de proteção ao meio ambiente, o mesmo deve ocorrer em relação às áreas de preservação ambiental, cumprindo, pois, ao Oficial registrador exigir sua averbação quando do desdobro do imóvel.

A propósito, o Código Florestal reforçou a ideia trazida pelo Código Civil (art. 1.228, § 1º), no sentido de que o direito de propriedade deve atender a sua função social, preservando-se “a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”. Em seu art. 2° prevê que a propriedade deve ser exercida com as limitações que a legislação estabelecer e no § 2º do mesmo artigo dispõe que as obrigações previstas na Lei ambiental têm natureza real, tornando clara a transmissibilidade do dever ambiental para adquirentes do imóvel.

Por outro lado, o princípio da especialidade objetiva, previsto no art. 176 da Lei de Registros Públicos, estabelece que a descrição contida na inscrição do imóvel junto ao registro imobiliário deve permitir a compreensão de sua singularidade, tornando-o inconfundível em face de qualquer outro.

De forma difusa, os precedentes administrativos do Eg. Conselho Superior da Magistratura, fortes nas lições de Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis: comentários ao sistema de registro em face da Lei 6.015/73, 2ª ed., Rio de Janeiro, 1977, p. 219) e de Narciso Orlandi Neto (Retificação do Registro, de Imóveis, Juarez de Oliveira, p. 68), ao examinar atos de registro em sentido estrito afirmam que a especialidade objetiva “exige a identificação do imóvel como um corpo certo impedindo o ingresso de título sem coincidência com o imóvel registrado a partir da aproximação dos elementos constantes no título e na matrícula [1].

O princípio da especialidade objetiva também fornece a certeza da localização física do imóvel e dos direitos nele inscritos, dando forma à segurança jurídica decorrente do registro imobiliário.

O Registro de Imóveis é o guardião do direito de propriedade e a publicidade registral tem outra finalidade que não a cadastral. É por intermédio dos atos de registro que os poderes e deveres inerentes à propriedade são exercidos em sua plenitude, de maneira que, havendo na área do imóvel uma parcela submetida a qualquer regime especial de proteção, no caso, a área de preservação permanente, é necessário que ela integre o rol de informações registrais, garantindo-se sua manutenção.

Veja-se que o E. Conselho Superior da Magistratura e esta C. Corregedoria Geral da Justiça já se posicionaram sobre o tema, consoante se extrai da ementa do voto proferido na Apelação Cível nº 575-6/5, em que figurou como relator o ilustre Desembargador Gilberto Passos de Freitas:

”REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Recusa de registro de escritura pública de divisão de imóvel rural situado em área de proteção de mananciais – Necessidade de manifestação favorável da Secretaria do Meio Ambiente – Inteligência das Leis Estaduais 898/75 e 1.172/76 – Sentença de procedência mantida – Recurso não provido”.

Do mencionado acórdão extrai-se o seguinte: “O imóvel está situado em área de proteção de mananciais, na região da represa Billings. As áreas de proteção de mananciais visam ao estabelecimento de política de mananciais não só para proteger, mas também para possibilitar a recuperação das bacias hidrográficas dos mananciais de interesse regional do Estado de São Paulo, dentre elas, a bacia da represa Billings. Assim, há interesse público na manifestação de áreas de mananciais para a preservação da qualidade da água dos mais importantes reservatórios. As Leis 898/75 e 1.172/76 disciplinam a respeito do uso do solo para proteção dos mananciais, cursos e reservatórios de água e demais recursos hídricos de interesse da Região Metropolitana da Grande São Paulo, distinguem duas categorias de áreas e definem diferentes restrições de uso de solo para cada uma delas”.

A conclusão alcançada no mencionado acórdão é inafastável e pode ser igualmente aplicada ao presente caso: “O parágrafo único do artigo 3º da Lei 898/75 exige a manifestação favorável da Secretaria do Meio Ambiente, mediante parecer da Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Básico e de Defesa do Meio Ambiente para os projetos e a execução de arruamentos, loteamentos, edificações e obras, bem assim a prática de atividades agropecuárias, comerciais, industriais e recreativas, em relação aos imóveis que fazem parte das áreas de proteção de mananciais. Os artigos 14 e 16 da Lei 1.172/76 estabelecem condições para permitir o parcelamento de gleba inserida em área de proteção de mananciais. O recorrente busca, com o fim de justificar a alegada desnecessidade de obtenção do documento da Secretaria do Meio Ambiente, a interpretação literal e isoladas das normas das Leis Estaduais referidas e que regem a matéria, na tentativa de convencer que a simples divisão do imóvel em duas glebas não se enquadra nos artigos das referidas Leis. Da análise conjunta dos dispositivos legais mencionados, o que se faz pela aplicação da interpretação sistemática, não há como não considerar a divisão da área como um dos modos de utilização do solo, e, assim sendo, mostra-se indispensável a manifestação favorável da autoridade estadual competente, diante do pedido de registro de escritura pública de divisão, dada a finalidade destas leis que tem por base o manifesto interesse público de impedir a indevida e desordenada ocupação do solo que integra área de proteção, devido às nocividades decorrentes de práticas irregulares, que afrontam a legislação vigente, e, em consequência, agridem a natureza e acabam por afetar a qualidade da água e a preservação das bacias hidrográficas que servem a população”.

Idêntica orientação prevaleceu em hipótese semelhante, no âmbito da E. Corregedoria Geral da Justiça, por decisão do eminente Desembargador Ruy Pereira Camilo, que acolheu o parecer nº 46/2008-E, proferido pelo MM Juiz Auxiliar Álvaro Luiz Valery Mirra, nos autos do Processo CG nº 2007/4607. Confira-se, por esclarecedor, o conteúdo do aludido parecer: “Nos termos do art. 3º parágrafo único, inciso V, da Lei n. 6.766/1979, não se admite o parcelamento do solo em áreas de preservação ecológica. De acordo, ainda, com o disposto no art. 2º, letra “a”, n. 1, do Código Florestal, considera-se de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural situadas ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água em faixa marginal cuja largura mínima seja de trinta metros para cursos d’água de menos de dez metros de largura. Na hipótese, pretende o Recorrente a averbação no RI de Batatais de desdobro de imóvel de sua propriedade, localizado em faixa marginal ao Córrego das Araras (com menos de dez metros de largura), a uma distância de 18,30 metros deste. Trata-se, sem dúvida, de parcelamento do solo, na modalidade desmembramento (art. 2º § 2º da Lei n. 6.766/1979), a ser realizado dentro de área de preservação permanente, tal como delimitada pelo Código Florestal (art. 2º, letra “a”, n. 1), de trinta metros de largura. Todavia, em que pese essa circunstância, o desdobro contou com a aprovação da Prefeitura Municipal de Batatais, amparada no disposto no art. 1º da Lei Municipal n. 2.325/1998, segundo o qual se considera, como de preservação permanente, para o perímetro urbano do Município, a área situada em faixa de apenas 15 metros ao longo de cursos d’água. Dessa forma, para a Administração Municipal, o imóvel a ser desmembrado não se encontra em área de preservação permanente, motivo por que foi aprovado o projeto de parcelamento do solo em discussão. [ ..] De todo modo, há que se ressaltar que, por se tratar de parcelamento do solo em área definida no Código Florestal como de preservação permanente, imperativa se mostra a obtenção pelo empreendedor de licença ambiental, a ser expedida pelo órgão ambiental estadual, não bastando, no caso, a aprovação concedida pela Prefeitura Municipal. Segundo estabelece a Resolução n. 237/1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, no seu art. 5º Compete ao órgão ambiental estadual ou do Distrito Federal o licenciamento ambiental dos empreendimentos e atividades: (…) II – localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais formas de vegetação natural de preservação permanente relacionadas no art. 2º da Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, e em todas as que assim forem consideradas por normas federais, estaduais ou municipais; (…). Dessa forma, se o desmembramento ora pretendido se encontra situado em área que o Código Florestal como de preservação permanente, necessária se faz a obtenção da licença ambiental estadual para que aquele se realize legalmente, pouco importando, para tal finalidade, a existência de lei municipal com teor diverso. Aqui, a aprovação do empreendimento pelo Município e a legislação municipal que rege a matéria não eximem e empreendedor da apresentação de licença ambiental prevista em lei federal”.

Idêntico entendimento foi adotado pelo Excelentíssimo Desembargador Reis Kunts, em exame de questão semelhante àquela ora discutida:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida procedente – Escritura pública de venda e compra de lote, em que se promove, também sua divisão em duas partes – Desdobro que deve ser aprovado pelo órgão ambiental estadual – Imóvel situado em área de proteção aos mananciais – Existência de aprovação da Prefeitura Municipal que não elide a necessidade de anuência do referido órgão estadual – Precedentes deste Conselho Superior e da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso não provido” (Apelação Cível nº 001.182.6/9-00).

Nesse cenário, afigura-se correta a exigência feita pelo Oficial registrador no caso concreto.

Diante do exposto, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação interposta seja recebida como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, e que a ele seja negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 10 de janeiro de 2020.

Stefânia Costa Amorim Requena

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MM.ª Juíza Assessora da Corregedoria e por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação interposta como recurso administrativo e a ele nego provimento. Intimem-se. São Paulo, 13 de janeiro de 2020. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: PAULO CELSO DE CARVALHO PUCCIARELLI, OAB/SP 45.554, EDSON DE AZEVEDO FRANK, OAB/SP 141.891 e AMÉRICO FERRAZ DIAS FILHO, OAB/SP 255.931.

Diário da Justiça Eletrônico de 28.01.2020

Decisão reproduzida na página 011 do Classificador II – 2020

Nota:

[1] Registro de imóveis – Especialidade Objetiva. Descrição genérica de imóveis rurais com indicação de área, matrícula e cadastro do INCRA. Necessidade da especificação do perímetro e confrontações. Qualificação negativa pertinente apesar da possibilidade de identificar a denominação utilizada pelas averbações existentes e não ser imprescindível a previsão no título da existência de direito real de servidão – Recurso não provido. (TJSP; Apelação 0002476-47.2015.8.26.0111; Relator (a): Pinheiro Franco (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Cajuru – Vara Única; Data do Julgamento: 24/07/2018; Data de Registro: 30/07/2018).

Fonte: INR Publicações

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