CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura pública de divisão amigável – Escritura de rerratificação de extinção de condomínio – Negócio jurídico que configura permuta de partes ideais – Incidência de ITBI – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias – Óbice mantido – Recurso desprovido

Apelação Cível nº 1001074-40.2020.8.26.0077

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1001074-40.2020.8.26.0077

Comarca: BIRIGUI

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1001074-40.2020.8.26.0077

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001074-40.2020.8.26.0077, da Comarca de Birigüi, em que é apelante EDILENE MOIMAZ CESCHIN, é apelado OFICIALA DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOAS JURÍDICAS DA COMARCA DE BIRIGUI – SP.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 11 de fevereiro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001074-40.2020.8.26.0077

Apelante: Edilene Moimaz Ceschin

Apelado: Oficiala de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Birigui – SP

VOTO Nº 31.451

Registro de imóveis  Escritura pública de divisão amigável  Escritura de rerratificação de extinção de condomínio – Negócio jurídico que configura permuta de partes ideais – Incidência de ITBI  Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias  Óbice mantido  Recurso desprovido.

Trata-se de apelação interposta por EDILENE MOIMAZ CESCHIN em face da r. sentença de fl. 71/72, que manteve a recusa levantada pela Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Birigui, negando registro de escritura pública de divisão amigável e extinção de condomínio por falta de recolhimento do ITBI entendendo ter havido transmissão de propriedade por meio de permuta de frações ideais.

Da nota devolutiva de fl. 21 constou o seguinte óbice:

“Em cumprimento a nota devolutiva prenotada sob n.º 267.945, foi apresentada escritura pública de rerratificação alterando a denominação do negócio jurídico entabulado entre as partes, ou seja, que trata-se de extinção de condomínio, mantendo todas as demais cláusulas da escritura primitiva, bem como foi juntado ao título requerimento por instrumento particular, datado de 25 de outubro de 2019, solicitando reconsideração dos motivos elencados na nota devolutiva do protocolo acima exposto. Em que pese a alteração do nomem iuris (denominação) do negócio jurídico (de divisão amigável para extinção de condomínio), mantemos as exigências abaixo descritas pelos seguintes motivos:

Quanto ao recolhimento dos tributos (ITBI): Cumpre informar que é dever do Oficial de Registro fiscalizar o pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício, na forma do art. 289 da Lei n.º 6.015/73, sob pena de responsabilização pessoal do Oficial Delegado.

Dentre estes impostos encontra-se o imposto de transmissão inter vivos (ITBI), cuja prova de recolhimento deve instruir o título, salvo hipótese de isenção devidamente demonstrada.

Como é sabido, o fato gerador do ITBI, no caso da transmissão do domínio, é o efetivo registro, pois somente ele tem o condoão de transferir a propriedade, muito embora seja habitual o pagamento desses tributo já quando se celebra o negócio jurídico obrigacional.

“O art. 156, inciso II, da Constituição Federal estabelece a competência tributária para instituir e cobrar o ITBI Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, nos seguintes termos: “Compete aos Municípios instituir imposto sobre: II transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”. Neste sentido: Kollemata Jurisprudência Registral e Notarial Sérgio Jacomino, editor. Criado em 29/07/2019 às 22:25 h http://www.kollemata.com.br/Página: 2 de 3

Sobre a aquisição da propriedade imóvel, dispõe o art. 1245, caput e §1º do Código Civil: “Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. §1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”.

Na presente hipótese, a intenção das partes presentes no ato negocial foi eliminar a comunhão e, para essa consequência, permutaram as frações ideais de que são titulares. Em que pese terem firmado escritura de divisão amigável rerratificada para extinção de condomínio, não desnatura a substância de sua expressa voluntariedade. A lei, aliás, prevê expressamente que, nas declarações de vontade, se atenda mais à sua intenção que o sentido literal da linguagem.

(…)

Assim, por tratar-se de permuta de frações ideais, passível, portanto, de recolhimento de imposto de transmissão, e em consonância com o princípio da legalidade, não há como afastar a exigência da apresentação das guias com o devido recolhimento do imposto, ressalvada a hipótese de isenção aprovada pelo órgão municipal competente, ou ainda por determinação judicial.”

Em suas razões, a recorrente afirma, em suma, que se trata de negócio de família para divisão de única propriedade rural; que na origem o imóvel era um só pertencente às mesmas partes e gerou a divisão gerando quatro matrículas, eis que as partes eram plenamente divisíveis; que o imóvel rural ainda que composto por várias matrículas é um único todo coeso em extensão rural; que não houve transmissão onerosa; que cada condômino apenas levantou o que lhe cabia; que o Município expediu guia de recolhimento com valor zerado; que o art. 263, inciso VII da Lei Municipal n.º 1225/94 prevê que o imposto não incide no processo de divisão de domínio.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fl. 134/138).

É o relatório.

Presentes pressupostos recursais e administrativos, conheço do recurso.

No mérito, a r. sentença deve ser integralmente confirmada.

Versa a questão sobre a possibilidade de se efetuar o registro de escritura pública de divisão amigável e extinção de condomínio sem que haja prova de recolhimento do ITBI.

Com efeito, o imóvel objeto da matrícula n.º 3.425, após georreferenciamento, deu origem a quatro matrículas diversas.

E, das matrículas n.º 87.166; 87.167; 87.168; e 87.169 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Birigui, oriundas da matrícula n.º 3.425, constam como proprietários MARIA IRAILDES MOIMAZ MARQUES casada com JOSÉ CARLOS MARQUES; IDENILSON MOIMAZ casado com MARILENA SANCHES MOIMAZ; EDILENE MOIMAZ CESCHIM casada com LUIZ FABIO CESQUIM e JOSÉ CARLOS MOIMAZ casado com SUZELY ADAS SALIBA MOIMAZ. A cada uma das partes foi atribuído 25% de cada imóvel.

Consoante escritura pública de divisão amigável de fl. 06/16, firmada por MARIA IRAILDES MOIMAZ MARQUES casada com JOSÉ CARLOS MARQUES; IDENILSON MOIMAZ casado com MARILENA SANCHES MOIMAZ; EDILENE MOIMAZ CESCHIM casada com LUIZ FABIO CESQUIM e JOSÉ CARLOS MOIMAZ casado com SUZELY ADAS SALIBA MOIMAZ, restou avençado que caberá à condômina MARIA IRAILDES MOIMAZ MARQUES o imóvel objeto da matrícula n.º 87.167 (27,0859 hectares de terras); ao condômino IDENILSON MOIMAZ o imóvel objeto da matrícula n.º 87.169 (30,6206 hectares de terras); à condômina EDILENE MOIMAZ CESCHIM o imóvel objeto da matrícula n.º 87.168 (29,5113 hectares de terras) e ao condômino JOSÉ CARLOS MOIMAZ o imóvel objeto da matrícula n.º 87.166.

O valor de cada um dos imóveis, atribuído pelas partes, foi de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Consoante escritura pública de rerratificação de divisão amigável (fl. 17/19) restou consignado que embora tenha constado na escritura pública de fl. 06/16 que se tratava de divisão amigável, o ato ficava retificado para constar se tratar de extinção de condomínio.

Pois bem.

O primeiro ponto que se coloca é a natureza jurídica do negócio jurídico entabulado entre as partes, se se trata de divisão e extinção de condomínio ou permuta de frações ideais.

E, analisando atentamente os autos, verifica-se não se tratar de simples extinção de condomínio.

O art. 1.322 do Código Civil dispõe que:

“Quando a coisa for indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-la a um só, indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado, preferindo-se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao estranho, e entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior.”

A hipótese, não se confunde, à evidência, com a telada nos autos.

Na extinção de condomínio tem-se ato declaratório sem transmissão onerosa, mas apenas atribuição física do bem a cada pessoa, mediante adjudicação e indenização aos demais, diversamente do que ocorre com a permuta quando a propriedade do bem (frações ideais) é transmitida a um determinado condômino.

Outro não é o entendimento a respeito:

“APELAÇÃO CÍVEL. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. RECOLHIMENTO DE ITBI. EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIOS. PERMUTAS DE FRAÇÕES IDEAIS DE IMÓVEIS. DESFAZIMENTO DE CONDOMÍNIO E ADJUDICAÇÃO DE DETERMINADO BEM A UM ÚNICO CONDÔMINO POR MEIO DE INDENIZAÇÃO OU PERMUTA. DIFERENÇAS. EFEITOS TRIBUTÁRIOS DISTINTOS. SITUAÇÃO CONCRETA. CONCESSÕES MÚTUAS DE PARCELAS DE OUTROS BENS IMÓVEIS (PERMUTA). HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ITBI. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1) As hipóteses de desfazimento de condomínio e de adjudicação de determinado bem a um único condômino por meio de indenização ou permuta não se confundem. Enquanto no primeiro caso temos um ato declaratório (não há, portanto, transmissão onerosa, mas apenas atribuição física do bem a cada pessoa), no segundo, a propriedade do bem (frações que pertencem aos demais) é transmitida a um determinado condômino.

2) Tratando-se de coisa divisível, a divisão mostrase como meio adequado para extinguir o condomínio (art. 1.320, Código Civil). Nesse caso, diz ser simplesmente declaratória e não atributiva da propriedade a divisão porque o imóvel está sendo fracionado entre os condôminos de acordo com a porção que cabe a cada um. De outro lado, adjudicação de determinado bem a um único condômino denota o ajuste por meio do qual os condôminos acordam atribuir a um co-proprietário a integralidade do bem, isto é, transferindo frações que não lhe pertenciam. Essa transmissão poderá ser ajustada de forma gratuita ou onerosa. No primeiro caso, estará sujeita ao ITCMD; no segundo, incidirá o ITBI.

3) A situação concreta evidencia a ocorrência de adjudicação onerosa. A escritura pública acostada aos autos denota o intento dos requerentes em dividir entre eles os vários imóveis já adquiridos (e partilhados) por sucessão causa mortis . Buscam, por meio de concessões mútuas de frações de outros imóveis (permuta), que cada bem passe a ser titulado por um único proprietário.

4) O ITBI, imposto de competência municipal, deve incidir sobre as permutas, pois se trata de transmissão onerosa de bem, devendo ser deduzida da base de cálculo da exação apenas a importância correspondente a quota parte de cada proprietário (1/6) (APELAÇÃO CÍVEL nº 0008950-49.2012.8.08.0011 RELATOR : DES. SUBST. FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY, TJES).

No caso, as partes eram condôminas de quatro imóveis rurais, com matrículas distintas. Cada uma delas passou, por meio do ato notarial em questão, a ser proprietária exclusiva de um único imóvel. Houve, portanto, transmissão de propriedade por meio de permuta de frações ideais, fato gerador do ITBI, sendo irrelevante o fato de ser um único imóvel originalmente.

Ora. Cada uma das partes era proprietária apenas de partes ideais de todos os imóveis, não ostentando propriedade exclusiva sobre nenhuma delas. Assim, aquele que recebeu o domínio exclusivo de um bem, transferiu aos outros as parcelas ideais de que era titular sobre os demais imóveis e, em troca, foram transmitidas as frações ideais do imóvel de que eram proprietários os demais condôminos, passando, pois, a ser de proprietário exclusivo.

A matéria já foi objeto de V. Acórdão do Conselho Superior da Magistratura:

“Tratando-se de comunhão sobre diversos imóveis rurais, extingui-la com atribuição de domínio exclusivo de um deles a determinado consorte implica, à evidência, permuta de frações ideais . Se todos tinham apenas partes ideais sobre todas as coisas, e, pois, nenhum ostentava propriedade exclusiva sobre uma delas, quando vem, por força de negócio jurídico rotulado de divisão e extinção do condomínio, a ocorrer esta situação, aquele que recebeu o domínio exclusivo transferiu aos outros as parcelas ideais de que era titular sobre os demais prédios e, em troca, transferiramlhe os outros as frações que possuíam sobre o imóvel que se tornou de propriedade exclusiva. E o correspondente negócio jurídico encobre autêntica permuta, que é fato gerador do imposto de transmissão” (Ap. Cível nº 267.112).

Fixadas, pois, estas premissas, não se ignora que, tratando-se de ITBI, este Conselho Superior da Magistratura tem seguido a linha de que, em regra, não cabe ao Oficial Registrador aferir a regularidade do valor apurado a título do referido imposto:

“REGISTRO DE IMÓVEIS  DÚVIDA  FORMAL DE PARTILHA  Registro negado, ao argumento de recolhimento a menor de ITCMD   impossibilidade  Não pode o Sr. Oficial obstar registro por entender que o valor recolhido a título de tributo é inferior ao devido  Dúvida improcedente  Recurso provido.” (Apelação n.º 1066691-48.2015.8.26.0100, Rel. Des. PEREIRA CALÇAS).

Contudo, a hipótese não envolve a regular apuração de valor recolhido, mas sim de efetivo não recolhimento. Com efeito, o art. 289 da Lei n° 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do Art. 134, VI, do Código Tributário Nacional-CTN, não se olvidando, também, de seu dever de analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando-se simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízos ao Fisco.

A permuta de frações ideais com transmissão de propriedade configura fato gerador do ITBI, cujo recolhimento deve, de fato, acompanhar o título levado a registro, salvo hipótese de isenção devidamente comprovada, o que, contudo, não veio aos autos.

Ademais, a hipótese de incidência do tributo, in casu, vem descrita na Legislação Municipal de Coroados, Lei n.º 1.225/1994:

“Art. 262 – Estão compreendidos na incidência do imposto:

(…) III – a permuta, inclusive nos casos em que a co-propriedade se tenha estabelecido pelo mesmo titulo aquisitivo ou bens contíguos;”.

Finalmente, sobreleva ressaltar que as guias expedidas estão zeradas e não trazem o visto municipal ou parecer favorável do Município de Coroados reconhecendo a tese defendida pela recorrente.

Por essas razões, de fato, incabível o registro buscado, com a manutenção do óbice suscitado pela Sra. Oficial Registradora.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida – Título notarial – Escritura de venda e compra – Vendedor casado no regime de comunhão universal de bens, e que recebeu o domínio a título de doação, com cláusula de incomunicabilidade – Necessidade de autorização de seu cônjuge – Hipótese que não cai em exceção ao disposto no Código Civil, art. 1.647, I – Óbice corretamente apontado – Apelação a que se nega provimento, mantendo-se a r. sentença como lançada.

Apelação Cível nº 1001439-63.2020.8.26.0443

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1001439-63.2020.8.26.0443

Comarca: PIEDADE

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1001439-63.2020.8.26.0443

Registro: 2021.0000195905

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001439-63.2020.8.26.0443, da Comarca de Piedade, em que é apelante WALTER APARECIDO GODINHO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PIEDADE.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 11 de março de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001439-63.2020.8.26.0443

Apelante: Walter Aparecido Godinho

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Piedade

VOTO Nº 31.474

Registro de Imóveis – Dúvida – Título notarial – Escritura de venda e compra – Vendedor casado no regime de comunhão universal de bens, e que recebeu o domínio a título de doação, com cláusula de incomunicabilidade – Necessidade de autorização de seu cônjuge – Hipótese que não cai em exceção ao disposto no Código Civil, art. 1.647, I – Óbice corretamente apontado – Apelação a que se nega provimento, mantendo-se a r. sentença como lançada.

1. Trata-se de apelação (fl. 78/84) interposta por Walter Aparecido Godinho e Patrícia Aparecida Prestes de Oliveira Godinho contra a r. sentença (fl. 71/73) proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Piedade, que julgou procedente a dúvida (fl. 01/03) e manteve a recusa (fl. 17/19) de registro stricto sensu de compra e venda (fl. 20/24) na matrícula n. 23.861 daquele cartório (fl. 35).

Segundo a r. sentença, o domínio em questão está gravado com cláusula de incomunicabilidade; ainda assim, considerando-se que o dono é casado, a venda depende de outorga uxória, que não houve; logo, o registro, tal como pretendido, não pode ser deferido, e é necessário manter a objeção do ofício de registro de imóveis.

Os apelantes afirmam que os arts. 1.667, 1.668 I, e 1.669 do Código Civil, ao excluir da comunhão os bens doados com cláusula de incomunicabilidade, permitem que sejam alienados sem outorga uxória, e por essa razão é necessário reformar-se a r. sentença e afastar-se o óbice, para permitir-se o registro almejado.

A ilustre Procuradoria Geral de Justiça ofertou parecer pelo não provimento do recurso (fl. 102/105).

É o relatório.

2. A r. sentença tem de ser mantida, em que pese aos bons fundamentos da apelação.

A letra do Código Civil é clara: sob pena de anulabilidade (art. 1.649, caput), um cônjuge não pode, sem a autorização do outro (art. 1.647, caput) ou o suprimento do juiz (art. 1.648), alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis, exceto no regime da separação absoluta (art. 1.647, I) ou da participação final dos aquestos, se houver convenção nesse sentido e o bem for particular (art. 1.656).

Logo, se o vendedor é casado no regime da comunhão universal, a outorga uxória é necessária ainda que o bem tenha sido havido, antes, por doação com cláusula de inalienabilidade (como, note-se a fl. 35, é o caso dos autos): o fato de o bem estar excetuado da comunhão universal (Cód. Civil, art. 1.668, I) não significa, de nenhum modo, que a sua alienação posterior escape à regra do art. 1.647, I para a qual, repita-se, a exceção está somente no regime da separação absoluta.

Como explica a doutrina:

“O art. 1.647 do Código Civil dispõe: ‘ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; (…)”. Referido dispositivo trata da vênia conjugal, dispensando-a no regime de separação absoluta de bens.

“Mais adiante, no art. 1.656, o legislador também autorizou a dispensa da vênia conjugal no regime da participação final dos aquestos, desde que tal dispensa esteja convencionada no pacto antenupcial e o bem imóvel seja de natureza particular.

“Resta saber se cabe vênia conjugal para os atos de alienação e oneração de imóveis gravados com cláusula de incomunicabilidade. A resposta a esta indagação pode ser obtida pela própria interpretação literal dos dois dispositivos legais citados, ou seja, o legislador determinou a dispensa de autorização conjugal tão somente em relação aos dois regimes de bens, não a estendendo, portanto, aos bens gravados com cláusula de incomunicabilidade.

“Embora devesse também constar a dispensa de outorga conjugal para os bens gravados por cláusula de incomunicabilidade tendo em vista que o bem clausulado é de propriedade exclusiva de somente um dos cônjuges , conclui-se que a vênia conjugal para tais situações é indispensável, sob pena de anulabilidade do ato transmissivo ou de oneração do imóvel.” (Vitor Frederico Kümpel e Carla Modina Ferrari, Tratado Notarial e Registral Ofício de Registro de Imóveis, São Paulo: YK Editora, 2020, p. 2.816) Recentemente, aliás, decidiu este Conselho Superior da Magistratura:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóvel – Promitente vendedor casado no regime da comunhão parcial de bens – Imóvel decorrente de desmembramento de outro adquirido antes do casamento – Necessidade da anuência conjugal ou de suprimento judicial – Regra do art. 1.647, I, CC que não se vincula ao fato do imóvel alienado ser comum ou particular do cônjuge, mas sim à tutela da entidade familiar – Óbices apresentados pelo registrador mantidos – Recurso não provido.” (CSMSP, Apel. Cív. 1000050-19.2019.8.26.0236, j. 06/02/2020, DJe 01/04/2020)

Em suma: a autorização do outro cônjuge era realmente necessária e, faltando agora, impede a inscrição pretendida, como bem apontaram a r. sentença apelada e, antes dela, a nota devolutiva.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação, mantendo-se a r. sentença, como lançada.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias– Óbice mantido – Recurso desprovido.

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1007328-09.2020.8.26.0019
Comarca: AMERICANA

PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Registro: 2021.0000161477

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019, da Comarca de Americana, em que é apelante FDS ADMINISTRADORA DE BENS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE AMERICANA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 25 de fevereiro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Apelante: FDS Administradora de Bens Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imoveis e Anexos da Comarca de Americana

VOTO Nº 31.468

Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias– Óbice mantido – Recurso desprovido.

1. Trata-se de apelação interposta por FDS ADMINISTRADORA DE BENS LTDA em face da r. sentença de fl. 98/102, que manteve a recusa levantada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Americana, negando registro de escritura pública de permuta de bens em razão da não apresentação de prova de quitação do ITCMD relativo à diferença de valores entre os imóveis permutados.

Em suas razões, o recorrente afirma que a negativa não se aplica, já que a escritura pública envolveu permuta de imóveis sem torna, com valor atribuído aos imóveis pelos proprietários, prerrogativa que lhes é exclusiva, visto que os valores são subjetivos e de livre escolha das partes, sendo descabida a presunção de doação do valor da diferença entre os imóveis, bem como a incidência do ITCMD. Ao final, pugnou pelo provimento da apelação.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 141/146).

É o relatório.

2. O recurso não merece provimento.

Versa a questão sobre a possibilidade de se efetuar o registro de escritura pública de permuta de bens imóveis com valores diversos e sem torna, sem que haja prova de recolhimento do ITCMD.

A apelante permutou um terreno urbano no valor de R$ 159.570,00, sob nº 20A2, da quadra 44, no loteamento denominado Parque Nova Carioba, Americana/SP, matrícula nº 92.164 junto ao CRI local, por dois terrenos urbanos, de R$ 79.785,00 cada um, com a empresa JGR Administração de Bens Ltda, descritos como lotes nº 2 e 3, ambos da quadra C, do loteamento denominado Jardim Dona Judith, matrículas nº 86.004 e 86.005, junto ao CRI local.

A permuta foi realizada por meio de escritura pública lavrada em 03/06/2020, no 1º Tabelião de Notas e Protesto de Americana, no livro nº 1.058, às págs. 027/034.

A nota de devolução nº 47.393, de 30/07/2020, constatou que há uma diferença de R$ 133.735,81, em relação ao valor de mercado dos imóveis de matrículas nº 86.004 e 86.005, os quais possuem avaliação de mercado no patamar de R$142.241,79 e 151.064,02, respectivamente, conforme indicado pelos próprios interessados na escritura. Dessa forma, considera-se o valor excedente na permuta, como doação, por isso exigiu o recolhimento do ITCMD (fls. 56/57).

Não se ignora que, se tratando de ITCMD, este Conselho Superior da Magistratura tem seguido a linha de que, em regra, não cabe ao Oficial Registrador aferir a regularidade do valor apurado a título do referido imposto:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA FORMAL DE PARTILHA – Registro negado, ao argumento de recolhimento a menor de ITCMD impossibilidade não pode o Sr. Oficial obstar registro por entender que o valor recolhido a título de tributo é inferior ao devido – Dúvida improcedente – Recurso provido.” (Apelação n.º 1066691-48.2015.8.26.0100, Rel. Des. PEREIRA CALÇAS).

Contudo, a hipótese não envolve a regular apuração de valor recolhido, mas sim de efetivo não recolhimento.

Com efeito, o Art. 289 da Lei n° 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do Art. 134, VI, do Código Tributário Nacional-CTN, não se olvidando, também, de seu dever de analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando-se simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízos ao Fisco.

No caso, o negócio jurídico entabulado, permuta de bens imóveis de valores distintos sem haver torna ou reposição em dinheiro, gera acréscimo patrimonial de forma não onerosa àquele que recebe o bem de maior valor, a caracterizar doação, nos termos da legislação civil vigente.

“Art.538, CC: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Outro não é o entendimento jurisprudencial a respeito:

DECADÊNCIA ITCMD – Não ocorrência Inteligência do art. 173, inc. I do CTN – Créditos tributários constituídos antes de decorrido o prazo decadencial Preliminar prejudicial de mérito afastada. APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO ITCMD Alegação de que se firmou contrato de permuta sem torna a título oneroso, de forma a não incidir o imposto estadual Inadmissibilidade – Autuação baseada nas informações prestadas na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física onde foram informadas as transferências de valores a título de doação Admissibilidade – Doação, todavia, que ocorreu em valor menor ao apurado pela fiscalização – Doação relativa a diferença de valores (venais) entre os imóveis permutados – ITCMD que deve recair sobre esta diferença – Minoração do valor autuado que se impõe – Multa confiscatória Não observada – Conversão do depósito em renda em favor da Fazenda – Possibilidade após o trânsito em julgado R. sentença parcialmente reformada – Recursos da autora e da ré parcialmente providos. (Apelação Cível: 1003390-40.2016.8.26.0053, SILVIA MEIRELLES RELATORA).

Nestes termos, assiste razão ao I. Registrador ao exigir a apresentação de guia recolhida do ITCMD sobre a diferença do valor existente entre os imóveis, à luz do que dispõem os Arts. 1º, II, 6º, II, a, e 13 e 16, todos do Decreto Estadual nº 46.655/2002:

“Artigo 1.º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

II  por doação.

Artigo 6.º – Fica isenta do imposto

II  a transmissão por doação: cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs;

Artigo 13  O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação, devendo ser atualizado monetariamente, a partir do dia seguinte, segundo a variação da Unidade Fiscal do Estado de São Paulo – UFESP, até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto.

Artigo 16  O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei 10.705/00, art.13):

 em se tratando de:

a) urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana  IPTU”.

Neste cenário, não colhe o argumento do recorrente no sentido de ser prerrogativa dos proprietários a atribuição de valores aos imóveis objeto da permuta.

Nesse sentido decidiu o E. Conselho Superior em caso semelhante:

REGISTRO DE IMÓVEIS  Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna  Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação  Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis  ITCMD  Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias  Óbice mantido  Recurso desprovido. (CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 1007778- 97.2020.8.26.0100, RELATOR: Ricardo Mair Anafe, DATA DE JULGAMENTO: 05/06/2020 DATA DJ: 19/06/2020).

3. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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