CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias– Óbice mantido – Recurso desprovido.


  
 

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1007328-09.2020.8.26.0019
Comarca: AMERICANA

PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Registro: 2021.0000161477

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019, da Comarca de Americana, em que é apelante FDS ADMINISTRADORA DE BENS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE AMERICANA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 25 de fevereiro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1007328-09.2020.8.26.0019

Apelante: FDS Administradora de Bens Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imoveis e Anexos da Comarca de Americana

VOTO Nº 31.468

Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias– Óbice mantido – Recurso desprovido.

1. Trata-se de apelação interposta por FDS ADMINISTRADORA DE BENS LTDA em face da r. sentença de fl. 98/102, que manteve a recusa levantada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Americana, negando registro de escritura pública de permuta de bens em razão da não apresentação de prova de quitação do ITCMD relativo à diferença de valores entre os imóveis permutados.

Em suas razões, o recorrente afirma que a negativa não se aplica, já que a escritura pública envolveu permuta de imóveis sem torna, com valor atribuído aos imóveis pelos proprietários, prerrogativa que lhes é exclusiva, visto que os valores são subjetivos e de livre escolha das partes, sendo descabida a presunção de doação do valor da diferença entre os imóveis, bem como a incidência do ITCMD. Ao final, pugnou pelo provimento da apelação.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 141/146).

É o relatório.

2. O recurso não merece provimento.

Versa a questão sobre a possibilidade de se efetuar o registro de escritura pública de permuta de bens imóveis com valores diversos e sem torna, sem que haja prova de recolhimento do ITCMD.

A apelante permutou um terreno urbano no valor de R$ 159.570,00, sob nº 20A2, da quadra 44, no loteamento denominado Parque Nova Carioba, Americana/SP, matrícula nº 92.164 junto ao CRI local, por dois terrenos urbanos, de R$ 79.785,00 cada um, com a empresa JGR Administração de Bens Ltda, descritos como lotes nº 2 e 3, ambos da quadra C, do loteamento denominado Jardim Dona Judith, matrículas nº 86.004 e 86.005, junto ao CRI local.

A permuta foi realizada por meio de escritura pública lavrada em 03/06/2020, no 1º Tabelião de Notas e Protesto de Americana, no livro nº 1.058, às págs. 027/034.

A nota de devolução nº 47.393, de 30/07/2020, constatou que há uma diferença de R$ 133.735,81, em relação ao valor de mercado dos imóveis de matrículas nº 86.004 e 86.005, os quais possuem avaliação de mercado no patamar de R$142.241,79 e 151.064,02, respectivamente, conforme indicado pelos próprios interessados na escritura. Dessa forma, considera-se o valor excedente na permuta, como doação, por isso exigiu o recolhimento do ITCMD (fls. 56/57).

Não se ignora que, se tratando de ITCMD, este Conselho Superior da Magistratura tem seguido a linha de que, em regra, não cabe ao Oficial Registrador aferir a regularidade do valor apurado a título do referido imposto:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA FORMAL DE PARTILHA – Registro negado, ao argumento de recolhimento a menor de ITCMD impossibilidade não pode o Sr. Oficial obstar registro por entender que o valor recolhido a título de tributo é inferior ao devido – Dúvida improcedente – Recurso provido.” (Apelação n.º 1066691-48.2015.8.26.0100, Rel. Des. PEREIRA CALÇAS).

Contudo, a hipótese não envolve a regular apuração de valor recolhido, mas sim de efetivo não recolhimento.

Com efeito, o Art. 289 da Lei n° 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do Art. 134, VI, do Código Tributário Nacional-CTN, não se olvidando, também, de seu dever de analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando-se simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízos ao Fisco.

No caso, o negócio jurídico entabulado, permuta de bens imóveis de valores distintos sem haver torna ou reposição em dinheiro, gera acréscimo patrimonial de forma não onerosa àquele que recebe o bem de maior valor, a caracterizar doação, nos termos da legislação civil vigente.

“Art.538, CC: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Outro não é o entendimento jurisprudencial a respeito:

DECADÊNCIA ITCMD – Não ocorrência Inteligência do art. 173, inc. I do CTN – Créditos tributários constituídos antes de decorrido o prazo decadencial Preliminar prejudicial de mérito afastada. APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO ITCMD Alegação de que se firmou contrato de permuta sem torna a título oneroso, de forma a não incidir o imposto estadual Inadmissibilidade – Autuação baseada nas informações prestadas na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física onde foram informadas as transferências de valores a título de doação Admissibilidade – Doação, todavia, que ocorreu em valor menor ao apurado pela fiscalização – Doação relativa a diferença de valores (venais) entre os imóveis permutados – ITCMD que deve recair sobre esta diferença – Minoração do valor autuado que se impõe – Multa confiscatória Não observada – Conversão do depósito em renda em favor da Fazenda – Possibilidade após o trânsito em julgado R. sentença parcialmente reformada – Recursos da autora e da ré parcialmente providos. (Apelação Cível: 1003390-40.2016.8.26.0053, SILVIA MEIRELLES RELATORA).

Nestes termos, assiste razão ao I. Registrador ao exigir a apresentação de guia recolhida do ITCMD sobre a diferença do valor existente entre os imóveis, à luz do que dispõem os Arts. 1º, II, 6º, II, a, e 13 e 16, todos do Decreto Estadual nº 46.655/2002:

“Artigo 1.º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

II  por doação.

Artigo 6.º – Fica isenta do imposto

II  a transmissão por doação: cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs;

Artigo 13  O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação, devendo ser atualizado monetariamente, a partir do dia seguinte, segundo a variação da Unidade Fiscal do Estado de São Paulo – UFESP, até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto.

Artigo 16  O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei 10.705/00, art.13):

 em se tratando de:

a) urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana  IPTU”.

Neste cenário, não colhe o argumento do recorrente no sentido de ser prerrogativa dos proprietários a atribuição de valores aos imóveis objeto da permuta.

Nesse sentido decidiu o E. Conselho Superior em caso semelhante:

REGISTRO DE IMÓVEIS  Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna  Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação  Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis  ITCMD  Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias  Óbice mantido  Recurso desprovido. (CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 1007778- 97.2020.8.26.0100, RELATOR: Ricardo Mair Anafe, DATA DE JULGAMENTO: 05/06/2020 DATA DJ: 19/06/2020).

3. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 26.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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