CSM/SP – Registro de imóveis – Dúvida – Loteamento – Impugnação (Lei n. 6.766/1979, art. 19, §§ 1º-2º) – Natureza administrativa – Competência do Conselho Superior da Magistratura, por tratar-se de discussão acerca de registro em sentido estrito – Legitimidade do terceiro para impugnar e apelar – Empreendimento aprovado pela Prefeitura Municipal – Impossibilidade de discussão do mérito da aprovação municipal nesta via administrativa – Precedentes – Manutenção da sentença – Apelação a que se nega provimento.

Apelação Cível nº 1004806-29.2019.8.26.0347

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1004806-29.2019.8.26.0347
Comarca: MATÃO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1004806-29.2019.8.26.0347

Registro: 2021.0000127915

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004806-29.2019.8.26.0347, da Comarca de Matão, em que é apelante LUCIANO JOSÉ NANZER, são apelados OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MATÃO, MUNICÍPIO DE MATÃO e BRNPAR EMPREEENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 11 de fevereiro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1004806-29.2019.8.26.0347

Apelante: Luciano José Nanzer

Apelados: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Matão, Município de Matão e Brnpar Empreeendimentos Imobiliários Ltda

VOTO Nº 31.458

Registro de imóveis – Dúvida – Loteamento – Impugnação (Lei n. 6.766/1979, art. 19, §§ 1º-2º) – Natureza administrativa – Competência do Conselho Superior da Magistratura, por tratar-se de discussão acerca de registro em sentido estrito – Legitimidade do terceiro para impugnar e apelar – Empreendimento aprovado pela Prefeitura Municipal – Impossibilidade de discussão do mérito da aprovação municipal nesta via administrativa – Precedentes – Manutenção da sentença – Apelação a que se nega provimento.

1. Cuida-se de apelação (fl. 2.580-2.595) interposta por Luciano José Nanzer contra a r. sentença em que o MM. Juízo de Direito Corregedor do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Matão (a) rejeitou in totum a impugnação (fl. 2.409/2.429; §§ 1º-2º da Lei n. 6.766, de 19 de dezembro de 1979) que o apelante apresentara ao registro do loteamento “Residencial Vila Rica Matão I”, empreendido por BRNPAR Empreendimentos Imobiliários Ltda. e, desse modo, (b) mandou que se prosseguisse no processo registral.

A sentença apelada (fl. 2.549-2.556) entendeu que o loteamento conta com todas as necessárias aprovações administrativas, e o mérito destas não pode ser discutido perante a Corregedoria Permanente, fora da esfera jurisdicional. Mencionou o r. decisum que, a par isso, a Prefeitura Municipal de Matão enfrentou todos os pontos discutidos pelo impugnante e corroborou a legalidade de tudo o que se fez, de modo que a impugnação, tal como apresentada, extrapolou o âmbito administrativo e não podia ser acolhida para impedir o registro pretendido.

Em seu recurso (fl. 2.580-2.595), o apelante volta a questionar os pontos seguintes, já arguidos em sua impugnação: (a) no loteamento pretendido, o sistema de lazer foi desmembrado em 33 áreas, o que fere a Lei Municipal n. 3.800, de 5 de outubro de 2006, art. 47, § 4º, VII: segundo essa regra, com efeito, as áreas de lazer não poderiam ser inferiores, cada qual, a 10.000 m², e no caso atingem a média de 300 m², em 33 frações (fl. 2.583/2.584); (b) há quadras com comprimento superior a 270 m, e para burlar a vedação legal (Lei Municipal n. 3.800/2006, art. 47, § 4º, X) foram inseridas, no meio delas, áreas de lazer irrisórias, com apenas 14 m de frente (fl. 2.584/2.585); (c) não foram destinadas quadras específicas para fins comerciais, conquanto a Lei n. 3.800/2006, art. 47, § 4º, X, b, proíba as quadras mistas (fl. 2.585/2.586); (d) não foram atendidas as exigências de metragens mínimas para as vias públicas, porque a denominada Rua 42 na realidade, uma avenida teria de possuir 18 metros de largura (Lei Municipal n. 3.800/2006, art. 47, § 1º, a), e não apenas 16 (fl. 2.586/2.587); (e) o sistema de águas pluviais do novo loteamento foi interligado ao de outro, este o qual possui rede 40% menor, ou seja: o sistema do antigo loteamento não tem capacidade para receber as águas que se pretende destinar-lhe (fl. 2.587/2.591). Aduz o recorrente, então, que a administração municipal não pode ratificar ou retificar a aprovação de loteamento em desacordo com as exigências urbanísticas postas no plano diretor, e que a qualificação registral tem de ser rigorosa ao verificar a conformidade entre o projeto de loteamento e a lei, o que não se deu neste caso, razão pela qual a r. sentença há de ser reformada para que se indefira o registro stricto sensu do loteamento

“Residencial Vila Rica Matão I”.

A Prefeitura Municipal de Matão e a empreendedora BRNPAR apresentaram contrarrazões (fl. 2.618/2.621 e 2.627/2.636), sustentando, em síntese, que o terceiro, além de não ter legitimidade para impugnar ou recorrer, se valera de meio inadequado para a sua pretensão, a qual, de resto, não tem lugar, uma vez que o loteamento recebeu todas as aprovações administrativas pertinentes.

O Ministério Público pôde manifestar-se em primeiro grau de jurisdição, (fl. 2.640/2.646).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso de apelação (fl. 2.664/2.669).

É o relatório.

2. A impugnação prevista na Lei n. 6.766/1979, art. 19, § 1º e da qual se trata aqui tem natureza administrativa e o seu processo e julgamento, no segundo grau de jurisdição, tocam, segundo o entendimento vigente, a este Conselho Superior da Magistratura.

Como esclarecem Vicente Celeste Amadei e Vicente de Abreu Amadei:

“… quer pela celeridade procedimental, que a impugnação exige (evitando, pois, os longos trâmites dos processos judiciais na esfera jurisdicional, que, não raramente, superam a casa de anos), quer pela especialidade do Juiz Corregedor no trato da matéria, o trâmite e a decisão da impugnação no universo administrativo judicial (não jurisdicional) é, de longe, de maior proficuidade. Outrossim, essa é a tendência que se tem solidificado nos atuais julgados da matéria no Estado de São Paulo e, ainda, na expectativa legislativa (v. g. o Projeto de Lei de Responsabilidade Territorial PL nº 3057/00, explicita, como competente para conhecer e julgar a impugnação de registro de loteamento, o ‘juiz corregedor’).” (Como lotear uma gleba: o parcelamento do solo em todos os seus aspectos (loteamento e desmembramento). 3ª ed. Campinas: Millennium, p. 324).

Assentado assim o cariz administrativo dessa impugnação, vale recordar que, na tradição da jurisprudência administrativa paulista, a este Conselho vêm dar os recursos (rectius, as apelações cf. Lei n. 6.015/1973, art. 202) tirados contra as sentenças dadas pelos Corregedores Permanentes nos processos administrativos concernentes a registros em sentido estrito (Lei n. 6.015/1973, arts. 167, I, e 203, II) e é justamente esta a hipótese dos autos, em que a impugnação serve para controverter-se acerca da legalidade de um registro stricto sensu de loteamento (Lei n. 6.015/1973, art. 167, I, 19).

É o que já se teve a oportunidade de afirmar, mais recentemente:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Loteamento – Impugnação ao registro – Competência do Colendo Conselho Superior da Magistratura – Redistribuição determinada, ressalvado o oportuno exercício, em sede própria, do juízo de admissibilidade do recurso” (CGJSP, Processo 0007988-83.2017.8.26.0032, j. 26.7.2018, DJe 1.8.2018; acrescentemse CSMSP, Apel. Cív. 1000515-22.00.2017.8.26.0099, j. 6.12.2018, DJe 24.1.2019; CSMSP, Apel. Cív. 9000001-12.2015.8.26.0063, j. 15.3.2016, DJe 5.5.2016; e CGJSP, Processo 163.462/2015, j. 11.3.2016, DJe 21.3.2016).

O terceiro Luciano José Nanzer tinha legitimidade para impugnar o processo de registro do loteamento e, por via de consequência, tem interesse para apelar da decisão dada à sua impugnação. A dicção do § 1º do art. 19 da Lei n. 6.766/1979 (verbis “se houver impugnação de terceiros”) é suficientemente ampla para permitir que qualquer um do povo discuta a legalidade de pretendido registro de loteamento o qual, por isso mesmo, se desenrola na forma de um processo, e não de mero procedimento em que não houvesse ciência dos atos e possibilidade de contraditá-los. Pois bem: se a um terceiro se dá a possibilidade de intervir e impugnar, então, pela mesma força de razão, se lhe concede direito de recorrer (no caso, de apelar) da decisão que em seu desfavor vier a resolver essa impugnação. Nesse contexto, está correto considerar-se, para fins de legitimidade recursal, que o impugnante é, nos termos do art. 202 da Lei n. 6.015/1973, um “interessado” que pode apelar.

Esse é o entendimento adotado no julgamento do Processo CGJ 1.258/2000, em 11.10.2000 (DJ 27.10.2000):

“Visto. Acompanho o entendimento esposado pelo MM. Juiz Auxiliar, que permite a impugnação a pedido de registro de loteamento por terceiro, calcada em desrespeito a exigência urbanística prevista em lei local e, nos termos do parecer retro, que aprovo, levando em conta não ter o projeto observado a destinação de reflorestamento da faixa que separa a zona industrial de outra, ao prever nesse local duas vias públicas destinadas à circulação de veículos automotores, – dou provimento ao recurso para negar registro ao projeto de loteamento, impondo à loteadora e à Municipalidade o pagamento em partes iguais do salário do perito. Publique-se, inclusive o parecer.”

Consta do relativo parecer:

“[…] não posso deixar de mencionar que, na doutrina, há, também, quem sustente que, a partir da vigência da Lei n. 6.766/79, a impugnação de terceiro ao pedido de registro de loteamento do solo para fins urbanos não mais precisa vir calcada em direito próprio do impugnante. Hugo Nigro Mazzili, em estudo intitulado Observações Sobre Loteamentos, inserto na Revista de Direito Imobiliário, volume 9, leciona a propósito que: ‘A lei fala em impugnação de terceiros (art. 19, § 1º, da Lei 6.766/79). Não faz ela qualquer exigência de que essa impugnação parta de terceiro interessado, portador de direito real, como o fazia o § 3º do art. 2º do Dec. 3.079/38, ou o § 1º do art. 345 do CPC de 1939, c/c o art. 1.218, I, do CPC de 1973. Quando a nova Lei 6.766 disciplinou inteiramente a matéria do pedido de registro, seu processo, suas impugnações, os recursos, houve uma ab-rogação da legislação anterior a esse respeito, que dispunha diversamente sobre a mesma matéria (art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao CC). Hoje, qualquer cidadão é parte legítima para a impugnação do registro de parcelamento do solo urbano, como o seria para uma ação popular. O principal é o aspecto da moralidade administrativa onde o particular atua em auxílio da Administração, ao impugnar o registro de um loteamento possivelmente irregular. A extensão da faculdade de impugnar a qualquer terceiro, mesmo que não detentor de direito real, é uma clara alusão aos possíveis adquirentes dos lotes, a quem a lei precipuamente quis proteger e a quem ela mesma se referiu no artigo anterior do mesmo capítulo (art. 18, § 2º). Some-se a isto que seria um absurdo que a lei só desse direito de impugnar a terceiros detentores de direito real, se estes já teriam por lei ações próprias para proteção de seus direitos (ações possessórias ou reivindicatórias), negando esse mesmo direito de impugnação aos terceiros futuros adquirentes, que, antes de adquirir, não poderiam impugnar o registro e, depois de adquirir seu lote, também não o poderiam fazer, porque o loteamento já estaria registrado! Bastaria, pois, que o loteador fizesse os maiores absurdos e ilegalidades no projeto de loteamento, desde que dele fosse proprietário e nele ninguém exercesse direito real, pra que, conseguida a aprovação da Municipalidade, tornando-se o pedido de registro por ele formulado inimpugnável em juízo! Isso não é e nem poderia ser o escopo da lei.’ (págs. 28 e 29). Não discrepa de tal entendimento a lição de Gilberto Passos de Freitas, exposta em trabalho denominado O Ministério Público e a Nova Lei de Loteamentos, publicado na Revista de Direito Imobiliário, volume 7: ‘E quem poderá oferecer a impugnação? Sob a égide do Dec.-lei 58/37 e do Dec. 3.079/38, que o regulamentou, a impugnação somente podia ser oferecida por quem tivesse legítimo interesse, fundado em direito real. Dispunha o § 3º do art. 2º do último decreto que: Será rejeitada in limine, remetendo-se o impugnante para o juízo contencioso, a impugnação que não vier fundada num direito real, devidamente comprovado de acordo com a legislação em vigor. Hoje, todavia, falando a lei, em seu art. 19, § 1º, somente em impugnação de terceiros, qualquer um, desde que demonstrado o legítimo interesse, poderá impugnar o pedido de registro. Não mais se faz necessário venha ele fundado em direito real. Assim, qualquer omissão ou descumprimento das exigências previstas no art. 18 ou em leis especiais autorizará o oferecimento da impugnação.’ (págs. 50 e 51). Arnaldo Rizzardo, conquanto ainda sustente a necessidade do registro de loteamento maltratar direito próprio de terceiro para legitimá-lo à impugnação, vendo-o como carente de legitimidade para discutir o preenchimento dos requisitos legais por parte do proprietário loteador, desde que não origine um prejuízo a um seu direito, entende que se houver ofensa a um bem social, ou ao patrimônio público, ou ao meio ambiente, possível se afigura a impugnação ao registro de loteamento pelo terceiro porque, nesse caso, público será o prejuízo (in Promessa de Compra e Venda e Parcelamento do Solo Urbano, RT, 5ª ed., 1998, pág. 74). No meu entender, em que pesem as doutas ponderações daqueles que pensam em contrário, não vislumbro mais, a partir da vigência da Lei nº 6.766/79, razão para admitir a impugnação ao registro de loteamento para fins urbanos por terceiro apenas quando esteja em liça direito próprio deste. Se o terceiro, como cidadão, pode, em ação popular, impugnar a validade da aprovação pelo Poder Executivo Municipal do loteamento que desatende as normas urbanísticas, poderá, também, preventivamente, no incidente de impugnação, se opor ao registro de tal loteamento, evitando, assim, que o parcelamento do solo se efetive com desrespeito às imposições urbanísticas, previstas, ressalte-se, pelo legislador, a bem de toda a coletividade. A inadmissão, nesse caso, da impugnação ao registro do loteamento permitirá a implantação de parcelamento irregular, com inúmeros prejuízos que atingirão não apenas os adquirentes dos lotes, mas todos os membros da comunidade. Sua admissão, ao contrário, a par de evitar tal lesão, torna a tutela das imposições urbanísticas que, segundo o saudoso Hely Lopes Meirelles, se caracterizam como medidas de interesse público que atingem indistintamente todos os indivíduos, como membros da coletividade administrada, imprescritíveis, irrenunciáveis e intransacionáveis (in Direito Municipal Brasileiro, 7ª ed., Malheiros Editores, 1990, pág. 385), mais eficaz. Lembre-se com José Carlos de Freitas que: ‘Sendo, de ordinário, matriz de um novo bairro residencial, o loteamento é um patrimônio da coletividade, pois essa nova realidade urbanística afeta a cidade, sobrecarregando seus equipamentos urbanos, sua malha viária, toda a infraestrutura e os serviços públicos da urbe.’ (in Dos Interesses Metaindividuais Urbanísticos, trabalho inserto na obra Temas de Direito Urbanístico, vol. I, publicado pelo CAOHURB – Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça e Habitação e Urbanismo, pág. 299). E, entre as duas mencionadas posições divergentes, aquela restritiva da matéria a ser apreciada na impugnação a possível maltrato a interesse jurídico próprio do impugnante, e esta ampliativa, possibilitando a oposição de terceiro ao registro de loteamento que não observa as imposições urbanísticas, há que se escolher esta, que possibilita proteção preventiva ao meio ambiente urbano, cujo equilíbrio a todos interessa.”

Portanto, a querela concernente à legitimidade recursal (fl. 2.596/2.598, 2.609/2.610, 2.619/2.620, 2.630/2.633 e 2.640/2.641) resolve-se reconhecendo que o terceiro Luciano José Nanzer realmente podia apelar, e que seu apelo, dessa maneira, tem de ser examinado no mérito.

De meritis o recurso não merece provimento e a r. sentença tem de ser mantida como lançada.

A Prefeitura Municipal de Matão, sempre que ouvida (fl. 2.513/2.521 e 2.618/2.621), sustentou e defendeu a regularidade do projeto de loteamento, esclarecendo que as supostas desconformidades com a lei em verdade não existem, porque as exceções às regras gerais de planejamento urbano puderam ser admitidas segundo as salvaguardas postas na própria normativa vigente, como está posto no Memorando n. 51/2020 (fl. 2.621 e 2.624/2.626).

Sendo assim, a r. sentença apelada realmente andou bem, porque – como nela se contém (cf. especialmente fl. 2.555) – não competia nem à qualificação registral nem, depois dela, ao juízo dos registros apreciar o mérito desses atos de aprovação emanados da Municipalidade. Com efeito, tratando-se de título administrativo, a qualificação registral apenas podia controlar “(i) sua integralidade, (ii) a determinação imobiliária – quando não mesmo a especialidade objetiva – (iii) a determinação subjetiva, (iv) a congruência do título em si próprio, (v) sua correlação com o registro ou averbamento rogado, (vi) sua subscrição, (vii) sua validade temporal e (viii) sua harmonia, quando o caso, com o trato consecutivo e a especialidade objetiva” (Dip, Ricardo. Princípios sobre Princípios, n. 438; cf. também n. 427). Para além disso – ou seja, para dentro do conteúdo mesmo da deliberação administrativa –, aos interessados resta somente, se for o caso, a discussão pela via contenciosa, ou seja, jurisdicional.

É a lição corrente da jurisprudência administrativa paulista:

“De início, cumpre mencionar que o procedimento de impugnação de registro de loteamento tem natureza administrativa, sendo o “juiz competente”, para os fins do art. 19, § 1º, da Lei n. 6.766/1979, no entendimento atual desta Corregedoria Geral da Justiça, o Juiz Corregedor Permanente dos oficiais de registro de imóveis, que exerce, no caso, atividade puramente administrativa e não jurisdicional. Nesse sentido, o Corregedor Permanente e a Corregedoria Geral da Justiça atuam, em casos como este, como órgãos meramente administrativos, despidos, consequentemente, de função jurisdicional.

“Daí por que o controle passível de ser realizado, na impugnação ao registro de loteamento, é o controle de legalidade formal, próprio da atividade administrativa de corregedoria, sem que se admita amplo controle quanto à legitimidade das normas aplicáveis, seja pelo confronto entre atos regulamentares e infraregulamentares e as leis que pretendem disciplinar, seja pelo contraste de leis e atos normativos com a Constituição da República, restritos, referidos confronto e contraste, à atividade jurisdicional.

[…]

“Quanto à alegada ofensa às normas do próprio Município, com a implantação do empreendimento, há que se considerar que o loteamento “Residencial Terras Di Siena” contou com a aprovação do Poder Executivo local e do Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais – Graprohab, grupo esse que congrega todos os órgãos estaduais encarregados de examinar a viabilidade do empreendimento, nenhuma irregularidade tendo sido apurada.

“Bem por isso, o argumento expendido pelo Recorrente, de que houve descumprimento dos preceitos da legislação municipal no concernente aos percentuais das áreas públicas reservadas, não pode ser aceito neste passo, já que o controle de legalidade a ser realizado nesta esfera administrativa, como referido, é de natureza meramente formal, com base nas aprovações emitidas pelos órgãos competentes, reservado, diversamente, o controle de legalidade material, ainda aqui, à esfera jurisdicional.” (CGJSP, Processo 933/2006, j. 1.6.2007, DJ 30.9.2007; no mesmo sentido CGJSP, Processo 97.225/2011, j. 19.10.2011).

“Ocorre que o controle de legalidade dos atos da administração, a ser realizado nesta esfera administrativa e baseado na aprovação emitida pelo órgão competente, é de natureza meramente formal, e, como tal, implica na presunção de legalidade e não deve ser questionado pelo Oficial em sede administrativa de qualificação registrária, porque a este não é dado negar efeito ao ato administrativo. Somente na esfera jurisdicional deve ser feito o controle da legalidade material. Neste sentido já decidiu a Corregedoria Geral da Justiça nos Processos CG nºs. 599/2006 e 933/2006.” (CSMSP, Apel. Cív. 803-6/7, j. 14.12.2007, DJ 18.2.2008)

“Não obstante a previsão da lei municipal mencionada, a Prefeitura Municipal de Aguaí aprovou a divisão apresentada (fls. 21 e 22), o que gera presunção de legalidade e inviabiliza o controle do ato administrativo em sede de qualificação registraria, de maneira que ou o ato é revogado pela própria autoridade que o aprovou ou é desfeito na esfera jurisdicional. Com efeito, a qualificação do título é restrita ao aspecto formal, inclusive no que diz respeito à legalidade, portanto, não é da atribuição do Oficial questionar a legalidade material do ato administrativo que aprovou a divisão que resultou em área inferior à prevista na legislação municipal. O mesmo raciocínio se aplica em relação à previsão existente na legislação federal.” (CSMSP, Apel. Cív. 0004302-32.2014.8.26.0083, j. 4.3.2016, DJe 30.5.2016)

Em suma: a impugnação do terceiro ora apelante extrapolou o controle formal a cargo do Ofício do Registro de Imóveis, razão pela qual o r. decisum não podia tê-la acolhido e, por conseguinte, deve ser mantido como lançado.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 05.05.2021 – SP).

Fonte: DJE/SP.

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CSM/SP – Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Registro de instrumento particular de transmissão de bens imóveis para integralização do capital social da pessoa – Qualificação negativa do título – Exigência de comprovação do recolhimento do imposto de transmissão de bens imóveis – ITBI ou, se o caso, apresentação de declaração de isenção emitida pelo fisco municipal – Dever legal e normativo de fiscalização imposto ao registrador – Registro que é eficaz desde o momento em que se apresenta o título ao Ofícial de Registro, e este o prenotar no protocolo (CC, art. 1.246) – No processo de qualificação do título, compete ao registrador promover seu exame exaustivo a fim de afastar do registro aquele que não preencha os requisitos legais para sua inscrição – Óbice mantido – Nega-se provimento à apelação.

Apelação Cível nº 1000599-84.2020.8.26.0659

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1000599-84.2020.8.26.0659
Comarca: VINHEDOPODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1000599-84.2020.8.26.0659

Registro: 2021.0000069030

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000599-84.2020.8.26.0659, da Comarca de Vinhedo, em que é apelante CAMPANÁRIO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE VINHEDO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 29 de janeiro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1000599-84.2020.8.26.0659

Apelante: Campanário Empreendimentos Imobiliários Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Vinhedo

VOTO Nº 31.440

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Registro de instrumento particular de transmissão de bens imóveis para integralização do capital social da pessoa – Qualificação negativa do título  Exigência de comprovação do recolhimento do imposto de transmissão de bens imóveis – ITBI ou, se o caso, apresentação de declaração de isenção emitida pelo fisco municipal – Dever legal e normativo de fiscalização imposto ao registrador  Registro que é eficaz desde o momento em que se apresenta o título ao Ofícial de Registro, e este o prenotar no protocolo (CC, art. 1.246) – No processo de qualificação do título, compete ao registrador promover seu exame exaustivo a fim de afastar do registro aquele que não preencha os requisitos legais para sua inscrição – Óbice mantido – Nega-se provimento à apelação.

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por Campário Empreendimento Imobiliário Ltda. contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, que julgou procedente a dúvida suscitada pela Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Vinhedo/SP e manteve a recusa do registro de instrumento particular de transmissão de bens imóveis pela sócia Simone Rosa Trivellato para integralização do capital social da pessoa jurídica apelante, em virtude da ausência de comprovação do recolhimento do imposto de transmissão de bens imóveis – ITBI ou, se o caso, apresentação de declaração de isenção emitida pelo fisco municipal (fl. 230/232).

Alega a apelante, em síntese, que não se discute nos autos o dever que o Oficial de Registro de Imóveis tem de fiscalizar a regularidade do recolhimento dos tributos, nem os critérios legais para aferição da incidência, ou não, de ITBI sobre a transferência de imóvel para fins de integralização de capital de pessoa jurídica. Afirma que, em verdade, o que se discute é o momento em que o fato gerador ocorre, sustentando que o ITBI somente é devido por ocasião da transferência da propriedade e, portanto, somente poderia ser exigido depois da efetivação do registro. Acrescenta que a Lei Municipal em que fundamentada a procedência da dúvida não prevê o momento em que se dará o fato gerador do ITBI e tampouco determina que seu recolhimento anteceda o registro, certo que o próprio ente público credor reconheceu que a transferência patrimonial pretendida deve ser formalmente registrada para que, somente então, seja possível verificar a exigência, ou não, do pagamento do tributo.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 268/271).

É o relatório.

2. A dúvida foi suscitada pela Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Vinhedo/SP em virtude de recusa do registro de instrumento particular de alteração de contrato social, por meio do qual a sócia Simone Rosa Trivellato buscou transmitir a titularidade dos imóveis matriculados sob nos 35.968, 43.002 e 6.586 junto ao 1º Oficial do Registro de Imóveis da Comarca de Jundiaí/SP, ainda não transportados ao Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Vinhedo/SP, para fins de integralização do capital.

Na nota devolutiva expedida, a registradora exigiu a apresentação das “guias de ITB devidamente recolhidas ou com sua isenção, no original ou em cópia autenticada, em cumprimento ao disposto no art. 289 da Lei de Registros Públicos, referente aos imóveis objeto da transação” (fl. 195/197).

As Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo impõem aos registradores imobiliários o dever de exigir a comprovação do recolhimento do imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI para registro da transferência da titularidade do domínio junto à serventia predial. Sobre o tema, o item 117 e subitem 117.1 do Capítulo XX assim preveem:

117 – Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais.

117.1. – Com exceção do recolhimento do imposto de transmissão e prova de recolhimento do laudêmio, quando devidos, nenhuma exigência relativa à quitação de débitos para com a Fazenda Pública, inclusive quitação de débitos previdenciários, fará o oficial, para o registro de títulos particulares, notariais ou judiciais.

De seu turno, o art. 289 da Lei n° 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289 – No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

E a omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos exatos termos do art. 134, inciso VI, do Código Tributário Nacional-CTN:

” Art. 134 -. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

(…)

VI – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;”

No que pertine ao imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI, o art. 35 do Código Tributário Nacional c.c. o art. 156, inciso II, da Constituição Federal estabelecem que seu fato gerador é a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição, competindo aos Municípios legislar a respeito de sua instituição.

Sustenta a apelante que a exigência formulada pela registradora merece ser afastada, porque o fato gerador do imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI somente se concretizaria com o registro do título de transferência da propriedade junto ao Registro de Imóveis.

Ocorre que o entendimento da apelante está fundado em uma equivocada interpretação de precedentes jurisprudenciais, inclusive dos Tribunais Superiores, pois nos acórdãos transcritos em suas razões de inconformismo a controvérsia estabelecida diz respeito à incidência do imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI no compromisso de compra e venda, ou na cessão dos direitos decorrentes deste compromisso. Considerando, porém, que a mera promessa não transfere o domínio, mas apenas os direitos à aquisição do bem, é possível concluir que a hipótese tratada nestes autos é totalmente diversa.

E diferentemente do que sustenta a apelante, uma vez protocolizado o título, compete ao registrador, em observância ao disposto na Lei de Registros Públicos e nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, fazer seu exame, qualificação e devolução, com exigências ou registro, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data em que ingressou na serventia, ou de 10 (dez) dias, se o título for apresentado em documento eletrônico estruturado em XML (Extensible Markup Language), com especificações definidas por portaria da Corregedoria Geral da Justiça (NSCGJ, Capítulo XX, item 41 e subitem 41.1).

Cumpre ressaltar que o art. 1.246 do Código Civil dispõe que o registro é eficaz desde o momento em que se apresenta o título ao Oficial de Registro, e este o prenotar no protocolo. Destarte, nesse processo de qualificação, deve o registrador promover o exame exaustivo do título de modo a afastar do registro aqueles que não preencham os requisitos legais para sua inscrição.

Acrescente-se que a natureza administrativa do presente procedimento não é adequada para a declaração da inexigibilidade do tributo em razão de parecer emitido pelo ente público credor, sobretudo porque indeferido o pedido de isenção tributária no caso concreto (fl. 143/161).

Por fim, importa anotar que há precedentes deste Colendo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo no sentido de que, havendo Lei Municipal vigente que imponha ao contribuinte o dever de recolhimento do imposto de transmissão “inter vivos” para efetivação do registro de transferência de propriedade, compete ao delegatário verificar o recolhimento, na forma do art. 30, inciso XI, da Lei n° 8.935/94, o que, importa lembrar, não se confunde com a conferência da exatidão do valor. A propósito, já ficou decidido que:

REGISTRO DE IMÓVEIS. Carta de sentença. Divórcio com divisão de bens e dação em pagamento. Ausência de comprovação do recolhimento de ITBI. Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias, o que não ocorreu. Recurso não provido.(TJSP; Apelação Cível 1023458-08.2019.8.26.0602; Relator (a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Sorocaba – 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/04/2020; Data de Registro: 14/05/2020).

REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de adjudicação – A gratuidade deferida em ação judicial quanto aos emolumentos não atinge os tributos devidos – Cabimento da prévia comprovação do recolhimento do ITBI ou o reconhecimento de sua isenção perante a Municipalidade – Inexistência de previsão no título ou decisão judicial que reconheça ser indevido o recolhimento do imposto devido em razão da transmissão imobiliária – Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1044945-85.2019.8.26.0100; Relator (a): Pinheiro Franco (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 26/11/2019; Data de Registro: 06/12/2019).

Por essas razões, correta se mostra a exigência formulada pela registradora, a quem compete fiscalizar e exigir a comprovação de quitação do imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI, ou prova de sua isenção, na via administrativa ou judicial.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 05.05.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

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CGJ/SP – Registro de Imóveis – Alienação fiduciária em garantia – Sem indicação objetiva, não é possível afirmar que o jornal no qual publicado o leilão não é o de maior circulação no local do imóvel – Sobretudo tratando de jornal de circulação estadual, ocorrendo o leilão em meio virtual e incontroverso sua circulação na localidade – Recurso provido.

Número do processo: 1004302-31.2019.8.26.0506

Ano do processo: 2019

Número do parecer: 709

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1004302-31.2019.8.26.0506

(709/2019-E)

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária em garantia – Sem indicação objetiva, não é possível afirmar que o jornal no qual publicado o leilão não é o de maior circulação no local do imóvel – Sobretudo tratando de jornal de circulação estadual, ocorrendo o leilão em meio virtual e incontroverso sua circulação na localidade – Recurso provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto por Júlio César Borges contra a r. decisão do MM Juiz Corregedor Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto que manteve a recusa de averbação de leilões negativos, sustentando, em preliminar, a nulidade da sentença, e no mérito, o cabimento do ato de inscrição em razão da publicação do leilão em jornal de grande circulação na Comarca (a fls. 150/174).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (a fls. 192/196).

É o relatório.

Opino.

Apesar da interposição do recurso com a denominação de apelação, substancialmente cuida-se de recurso administrativo previsto no artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, cujo processamento e apreciação competem a esta Corregedoria Geral da Justiça.

Diante disso, pela aplicação dos princípios da instrumentalidade e fungibilidade ao processo administrativo, passo ao seu conhecimento.

Afasto a alegação de nulidade da r. sentença, porquanto o i. sentenciante apresentou em cognição exauriente todos os fundamentos da decisão.

A questão posta neste recurso administrativo refere-se à interpretação da cláusula 20º, parágrafo primeiro, do contrato firmado entre as partes quanto à necessidade de publicação do edital de leilão “em um dos jornais de maior circulação no local do imóvel”.

É fato incontroverso nos autos e comprovado pelo documento de fls. 104/106 a circulação do jornal no qual foi publicado o edital na Comarca de Ribeirão Preto, bem como no Estado de São Paulo.

De outra parte, não houve indicação objetiva de que o jornal em questão não seria um dos jornais de maior circulação na cidade, para tanto, seria necessário, afora fato notório, o que não é o caso, a indicação de quais jornais o seriam.

Tampouco o interessado na realização dos leilões de forma válida apresentou impugnação nesse sentido.

Além disso, o leilão foi realizado de forma presencial e virtual, sendo possível acesso a seu conteúdo por meio da internet.

O precedente administrativo do E. Conselho Superior da Magistratura referido na r. sentença (Apelação Cível n. 1007423-92.2017.8.26.0100, j. 24/07/2018) não tem aplicação ao caso em julgamento; porquanto aquele D. Órgão Colegiado compreendeu pela legalidade do leilão realizado em meio eletrônico e de forma presencial em localidade diversa da situação do bem, afastando a aplicação do precedente acima referido por tratar de questão diversa.

Nesse sentido, entre outros, o julgamento das apelações cíveis n. 0011312-94.2018.8.26.0566 em 19/09/2019, 1026079-87.2018.8.26.0577 em 25/07/2019, 1001252-75.2019.8.26.0577 em 23/08/2019 e 1029836-89.2018.8.26.0577 em 23/08/2019. E, também, em data mais recente, as apelações cíveis n. 1028829-62.2018.8.26.0577, 1026226-55.2018.8.26.0564 e 0011312-94.2018.8.26.0566.

No voto de Vossa Excelência, na Apelação Cível: 0011312-94.2018.8.26.0566, j. 19/09/2019, constou:

A Caixa Econômica Federal (CEF) promoveu os leilões nas modalidades virtual e presencial, e, além disso, houve publicação do edital em jornal de circulação no município em que localizado o imóvel (fls. 5/12).

Em decorrência, não há qualquer vício na publicação do edital que possa ser reconhecido em procedimento de dúvida.

Igual ocorre com a realização do leilão presencial em comarcas diversas, pois, de forma concomitante, também se realizou o ato de forma virtual, em endereço da Internet divulgado no edital que foi publicado no município da situação do imóvel.

Sendo o leilão presencial e virtual, eventual litígio envolvendo a realização dos leilões e a arrematação do imóvel também deverá ser dirimido em ação jurisdicional, de que participem todos os interessados, com o devido contraditório e ampla defesa.

Diante da informação de que o credor fiduciário realizou prévia comunicação dos leilões aos devedores fiduciantes, não cabe impedir o registro da escritura de compra e venda, pois a eventual declaração da inexistência da comunicação, ou de vício em sua realização, deverão ser obtidas pelos devedores em ação própria, a ser movida contra todos os interessados.

Por fim, a forma de publicação do edital e de realização dos leilões não se confundem com a situação verificada por este Col. Conselho Superior da Magistratura no julgamento da Apelação n.º 1007423-92.2017.8.26.0100; naquele caso, o edital foi publicado em jornal que não tinha circulação no local do imóvel e, além disso, o leilão, apenas se realizou pela modalidade física na Comarca de Vitória, Estado do Espírito Santo, sem autorização no respectivo contrato de alienação fiduciária.

Nessa perspectiva, neste caso concreto, não é possível compreender, pelo que consta dos autos e nesta via administrativa, que o jornal no qual publicado os editais afronte o ato de autonomia privada referente a “um dos jornais de maior circulação no local do imóvel”.

A tudo deve ser acrescentado que o leilão em meio virtual amplia a divulgação do leilão, o que encerra a causa da estipulação contratual em exame.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação interposta pelos recorrentes seja recebida como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo e a ele seja dado provimento, com a realização do ato de averbação.

Sub censura.

São Paulo, 13 de dezembro de 2019.

Marcelo Benacchio

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação como recurso administrativo e a ele dou provimento para realização do ato de averbação. Publique-se. São Paulo, 16 de dezembro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: MIGUEL CAPARELLI NETO, OAB/SP 328.260.

Diário da Justiça Eletrônico de 24.01.2020

Decisão reproduzida na página 009 do Classificador II – 2020.

Fonte: INR Publicações.

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