STJ: Recurso Extraordinário – Direito Civil – Venda de título da dívida agrária decorrente de desapropriação de imóvel rural dos cônjuges – Desnecessidade de outorga uxória para a disposição de direito pessoal – Validade do negócio jurídico – Ofensa reflexa à Constituição Federal – Matéria infraconstitucional – Recurso não admitido.

RE no AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1911277 – PR (2020/0329591-3)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI

RECORRENTE : DEUZELITA GNATA FERNANDES

ADVOGADO : THIAGO MOURÃO DE ARAUJO – PR042152

RECORRIDO : SERAFIM RODRIGUES DE MORAES NETO

ADVOGADO : RICARDO LOPES TEIXEIRA – GO015192

RECORRIDO : WALTEMIR FERNANDES

ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS – SE000000M

EMENTA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CIVIL. VENDA DE TÍTULO DA DÍVIDA AGRÁRIA DECORRENTE DE DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL RURAL DOS CÔNJUGES. DESNECESSIDADE DE OUTORGA UXÓRIA PARA A DISPOSIÇÃO DE DIREITO PESSOAL. VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. RECURSO NÃO ADMITIDO.

DECISÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR  –

Trata-se de recurso extraordinário interposto por DEUZELITA GNATA FERNANDES, com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão deste Superior Tribunal de Justiça, assim ementado (e-STJ fl. 478):

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ARTIGO 1.022, II, DO CPC/2015. TRANSFERÊNCIA COMPULSÓRIA DE IMÓVEL REALIZADA MEDIANTE PAGAMENTO COM TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA – TDAs. DIREITO PESSOAL/OBRIGACIONAL. INEXIGÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA PARA A DISPOSIÇÃO DE DIREITO PESSOAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. SUPOSTA AMEAÇA AO DIREITO DE MEAÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Não há violação aos arts. 489 e 1.022 do Código de Processo Civil/2015 se o Tribunal de origem julga a controvérsia de forma suficientemente fundamentada, embora contrariamente aos interesses da parte recorrente.

2. O recurso especial é inviável quando o tribunal de origem decide em consonância com a jurisprudência do STJ (Súmula 83/STJ).

3. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ).

4. Agravo interno a que se nega provimento.

Sustenta a recorrente a existência de repercussão geral da matéria impugnada e aponta a violação dos arts. 5º, I, XXII e 226, § 5º, da Constituição Federal.

Afirma que, sem a devida outorga uxória, seria nulo o negócio jurídico de venda de títulos da dívida agrágria decorrentes de desapropriação de imóvel rural pertencente ao ex-casal, tendo em vista que “se trata de hipótese de alienação de bens que se sub-rogam na qualidade de bens imóveis” (e-STJ fl. 495), fazendo-se imprescindível a autorização legal do outro cônjuge, nos termos do art. 1.647, I, do Código Civil.

Reforça que “se a alienação do bem imóvel demandaria a autorização da recorrente para se operar, não há dúvidas que a alienação do bem sub-rogado (TDAs) deve obedecer ao mesmo comando” (e-STJ fl. 497).

Defende que os óbices descritos nos enunciados sumulares n. 7/STJ e n. 83/STJ não poderiam incidir na hipótese dos autos.

Ressalta que os julgados citados no acórdão recorrido como representativos do entendimento deste Sodalício sobre o tema, não coincidem com o caso em comento.

Requer, ao final, a admissão do recurso e sua remessa ao Supremo Tribunal Federal.

As contrarrazões foram apresentadas às e-STJ fls. 509/522.

É o relatório.

Compulsando-se os autos, verifica-se que a controvérsia cinge-se à questão da necessidade, ou não, da outorga uxória da recorrente para conferir validade ao negócio jurídico de venda de títulos da dívida agrária decorrentes de desapropriação de imóvel rural que pertencia aos cônjuges, estando o acórdão recorrido assim fundamentado (e-STJ fls. 481/487):

O agravo interno não merece prosperar.

Em que pesem as razões exaradas no presente recurso, reforço que a modificação do acórdão recorrido demanda o reexame do conjunto fáticoprobatório dos autos.

Cumpre reproduzir a decisão agravada, que segue mantida por seus próprios fundamentos:

[…]

Ao solucionar a controvérsia, o Tribunal de origem assim dispôs:

A sentença recorrida deve ser mantida.

Observa-se que a tese defendida pela apelante é de que os Títulos de Dívida Agrária expedidos em decorrência do processo de desapropriação sub-rogam o imóvel desapropriado e, assim, devem obedecer ao mesmo comando legal para a hipótese de alienação de imóvel pertencente ao casal, exigindo-se a outorga uxória disciplinada no art. 1.647, inciso I, do Código Civil.

A referida disposição legal mencionada determina a obrigatoriedade da autorização do cônjuge para atos civis que detenham implicações significativas no patrimônio do casal, justamente visando proteger o patrimônio do cônjuge não anuente.

[…]

Outrossim, a exigência da outorga conjugal está adstrita às hipóteses elencadas no próprio art. 1.647, CC.

Vejamos:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III – prestar fiança ou aval;

IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Assim, a lei não exige a outorga conjugal para prática de todo e qualquer negócio jurídico realizado por um dos consortes, mas apenas naqueles casos que se amoldam às hipóteses inseridas no art. 1.647 do Código Civil.

E no caso concreto, a compra e venda levada a efeito pelos réus não se enquadra a nenhuma das hipóteses do dispositivo legal supracitado, sendo descabida a sua aplicação até mesmo por analogia. Veja-se que com o processo de desapropriação do imóvel pertencente ao casal ocorreu a perda da propriedade em razão do interesse do Estado, ocorrendo a transferência compulsória da propriedade particular para o domínio público, mediante prévia e justa indenização.

A indenização justa, no caso vertente, foi definida através da sentença proferida na ação de desapropriação para fins de reforma agrária nº 2008.36.00.008238-6 proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Sinop/MT (mov. 1.10). […].

Embora não conste nos autos cópia da matrícula do imóvel, é certo que com a desapropriação e a fixação de justa indenização, é incontroversa a perda da propriedade pela autora e seu ex-cônjuge, bem como a transferência do domínio ao Estado.

Tal como ocorre nos negócios jurídicos de simples compra e venda de imóveis, uma vez pago o preço ajustado e averbada a transferência da propriedade junto à matrícula do imóvel, o extinto proprietário nada mais poderá reivindicar sobre o bem. No caso concreto, a transferência compulsória do bem de propriedade do casal ao Estado ocorreu mediante o pagamento de indenização ajustada parte em dinheiro e parte em títulos de dívida agrária (TDAs) (mov. 1.7).

O que pretende a autora apelante é conferir aos títulos emitidos para fins de indenização a mesma proteção conferida pelo art. 1.647, do CC ao imóvel que antes pertencia ao casal.

Ocorre que referidos títulos da dívida pública nada mais são do que parte do preço ajustado pela transferência compulsória do imóvel, não podendo subentendê-los como bem imóvel, sendo evidente que eventual renegociação de tais títulos não esbarra em qualquer das hipóteses previstas no art. 1.647, do CC.

Somente se poderia falar em inalienabilidade dos TDAs caso o imóvel objeto da desapropriação estivesse gravado com cláusula de inalienabilidade, hipótese em que a mesma restrição poderia incidir sobre referidos títulos, tal como estabelece o art. 1.911, parágrafo primeiro, do CC.

[…].

De mais a mais, como bem observado pelo magistrado na sentença recorrida, a compra dos títulos a quo pelo réu apelado não representa nenhuma ameaça ao patrimônio partilhável que seria atribuído à autora, visto que a quantidade de TDAs adquiridas por aquele representa parcela evidentemente inferior à quantidade que a autora apelante faz jus na partilha dos bens que integram o patrimônio do casal.

[…] E assim, não se verificando qualquer abuso de direito no negócio jurídico entabulado entre os réus ou até mesmo violação indireta aos direitos da autora apelante, ante o princípio da boa-fé objetiva esculpido no art. 422 do Código Civil, o “Contrato de Compra e Venda de Direitos Creditórios de Processo de Desapropriação Pelo Incra” é válido e independe de outorga uxória.

O acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do STJ, para a qual a natureza jurídica das TDAs é de bem móvel, sendo que a sua alienação não encontra óbice nas hipóteses do art. 1.647, do Código Civil. Nesse sentido:

[…]

Ademais, a Segunda Seção do STJ possui entendimento no sentido de que, em se tratando de direito pessoal/obrigacional como a compra e venda realizada na espécie, não se revela necessária a outorga marital ou uxória para o negócio ter validade. Confira-se:

[…]

Cumpre ressaltar, quanto à outorga uxória, que “Se, de um lado, mostra-se louvável a intenção do legislador de proteger o patrimônio da família; de outro, há de ser ela balizada pela proteção ao terceiro de boa-fé, à luz dos princípios que regem as relações cambiárias” (REsp 1644334/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 23/8/2018), e na espécie, o Tribunal de origem foi categórico em afirmar que “a compra dos títulos a quo pelo réu apelado não representa nenhuma ameaça ao patrimônio partilhável que seria atribuído à autora, visto que a quantidade de TDAs adquiridas por aquele representa parcela evidentemente inferior à quantidade que a autora apelante faz jus na partilha dos bens que integram o patrimônio do casal”, premissa que, a par da aplicação do princípio pas de nullité sans grief, não pode ser revista em sede de recurso especial em razão da Súmula 7/STJ.

Em face do exposto, nego provimento ao recurso especial.

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/15, majoro em 10% (dez por cento) a quantia já arbitrada a título de honorários em favor da parte recorrida, observados os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.

Intimem-se.

Desse modo, a análise da matéria ventilada depende do exame dos arts. 422, 1.647, I, do Código Civil, razão pela qual eventual ofensa à Constituição Federal, se houvesse, seria reflexa ou indireta, não legitimando a interposição do apelo extremo.

Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, não se admite o recurso extraordinário.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília, 16 de março de 2022.

MINISTRO JORGE MUSSI

Vice-Presidente – – /

Dados do processo:

STJ – RE no AgInt no REsp nº 1.911.277 – Paraná – Rel. Min. Jorge Mussi – DJ 17.03.2022

Fonte: INR – Publicações

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TJSP: Reexame Necessário – Mandado de Segurança – ITCMD e emolumentos cartorários – Base de cálculo – Pretensão de recolhimento do imposto incidente sobre doação de bem imóvel e dos emolumentos cartorários, adotando como base de cálculo o valor venal do IPTU do imóvel objeto da doação – Sentença de concessão em parte da segurança, para determinar que o recolhimento do ITCMD do referido imóvel tenha por base o valor atribuído para o IPTU, julgando extinto o processo em relação ao pedido relativo aos emolumentos cartorários – Cabimento – Emolumentos cartorários – Ilegitimidade passiva do impetrado e da interessada quanto a pretensão do impetrante – Emolumentos cartorários que são cobrados pelos Tabeliães de Notas ou Oficiais de Registro de Imóveis, cujo valor é definido na Lei Est. nº 11.331, de 26/12/2.002, de modo que o impetrado e a interessada não têm qualquer relação com a definição do valor e cobrança destes – ITCMD – Possibilidade do afastamento da utilização do “valor de referência” considerado para a base de cálculo do ITBI – Aplicação dos arts. 9º, §1º e 13, I, ambos da Lei Est. nº 10.705, de 28/12/2.000, e art. 16, I, “a”, do Dec. Est. nº 46.665, de 01/04/2.002 – Inaplicabilidade do Dec. Est. nº 55.002, de 09/11/2.009 – Base de cálculo, que somente pode ser alterada por meio de lei – Sentença mantida – Reexame Necessário não provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Remessa Necessária Cível nº 1000116-92.2021.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é recorrente JUÍZO EX OFFICIO, é recorrido MARCELO LUIZ LOPES.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ENCINAS MANFRÉ (Presidente sem voto), MARREY UINT E CAMARGO PEREIRA.

São Paulo, 2 de março de 2022

KLEBER LEYSER DE AQUINO

DESEMBARGADOR – RELATOR

(Assinatura Eletrônica)

Voto nº 13.405

Reexame Necessário nº 1000116-92.2021.8.26.0053

Impetrantes: MARCELO LUIZ LOPES

Impetrado: SECRETÁRIO DE FINANÇAS DA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO-SP

Interessada: FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO

15ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de São Paulo

Magistrado: Dr. Enio José Hauffe

REEXAME NECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD E EMOLUMENTOS CARTORÁRIOS – BASE DE CÁLCULO – Pretensão de recolhimento do imposto incidente sobre doação de bem imóvel e dos emolumentos cartorários, adotando como base de cálculo o valor venal do IPTU do imóvel objeto da doação – Sentença de concessão em parte da segurança, para determinar que o recolhimento do ITCMD do referido imóvel tenha por base o valor atribuído para o IPTU, julgando extinto o processo em relação ao pedido relativo aos emolumentos cartorários – Cabimento – EMOLUMENTOS CARTORÁRIOS – Ilegitimidade passiva do impetrado e da interessada quanto a pretensão do impetrante – Emolumentos cartorários que são cobrados pelos Tabeliães de Notas ou Oficiais de Registro de Imóveis, cujo valor é definido na Lei Est. nº 11.331, de 26/12/2.002, de modo que o impetrado e a interessada não têm qualquer relação com a definição do valor e cobrança destes – ITCMD – Possibilidade do afastamento da utilização do “valor de referência” considerado para a base de cálculo do ITBI – Aplicação dos arts. 9º, §1º e 13, I, ambos da Lei Est. nº 10.705, de 28/12/2.000, e art. 16, I, “a”, do Dec. Est. nº 46.665, de 01/04/2.002 – Inaplicabilidade do Dec. Est. nº 55.002, de 09/11/2.009 – Base de cálculo, que somente pode ser alterada por meio de lei – Sentença mantida – REEXAME NECESSÁRIO não provido.

Trata-se de reexame necessário contra a r. sentença (fls. 148/153), proferida nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA, impetrado por Marcelo Luiz Lopes em face de ato praticado pelo Secretário de Finanças da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo-SP, que, confirmando a liminar (fl. 27), concedeu em parte a segurança para determinar que o recolhimento do ITCMD do imóvel doado tenha por base o valor atribuído para o IPTU e julgou extinto o processo, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, quanto ao pedido de recolhimento dos emolumentos cartorários, com base no valor venal do IPTU do referido imóvel. Houve a determinação de reexame necessário.

Ausente recurso voluntário, os autos vieram a este E. Tribunal de Justiça de São Paulo por força de reexame necessário, nos termos do artigo 14, parágrafo 1o, da Lei Federal no 12.016, de 07/08/2.009 [1].

Relatado de forma sintética, passo a fundamentar e decidir.

Trata-se de mandado de segurança ajuizado pelo impetrante por meio do qual almeja a utilização do valor venal para fins de IPTU como base de cálculo dos emolumentos cartorários e do ITCMD para o imóvel que lhe foi doado por seus genitores.

De início, o pedido do impetrante de que os emolumentos cartorários sejam calculados sobre o valor venal do imóvel para fins de pagamento de IPTU, não merece conhecimento.

Isto porque, o impetrado e a interessada são partes ilegítimas quanto a esta pretensão, vez que os emolumentos cartorários são cobrados pelos Tabeliães de Notas ou Oficiais de Registro de Imóveis e seu valor é definido na Lei Estadual nº 11.331, de 26/12/2.002, de modo que estes não têm qualquer relação com a definição do valor dos emolumentos ou com sua cobrança.

Nesse sentido é o entendimento deste E. Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD – BASE DE CÁLCULO – Sentença que reconheceu que a base de cálculo do ITCMD, no tocante aos bens imóveis, deve corresponder ao valor venal utilizado para o lançamento do IPTU – Manutenção – A estipulação do valor venal do ITBI como base de cálculo do ITCMD, pelo artigo 16 do Decreto nº 46.655/2002, ultrapassa as disposições dos artigos 155, inciso I, da Constituição Federal, 38 do Código Tributário Nacional e 9º da Lei Estadual de São Paulo nº 10.705/2000 – Impõe-se, assim, a utilização do valor venal atinente ao IPTU como base de cálculo do ITCMD – Precedentes – EMOLUMENTOS CARTORÁRIOS – Pretensão de que sejam cobrados sobre a base de cálculo do valor venal de IPTU – Ilegitimidade passiva do Secretário Estadual da Fazenda de São Paulo quanto a esta pretensão – Sentença reformada em parte – Reexame necessário parcialmente provido. (Remessa Necessária Cível nº 1066434-28.2019.8.26.0053; Rel. Des. Spoladore Dominguez; Data do Julgamento: 30/07/2.020; Data de Registro: 30/07/2.020)

Logo, quanto ao cálculo dos emolumentos cartorários sobre o valor venal do imóvel para fins de pagamento de IPTU, de rigor, o não conhecimento do pedido, extinguindo-se o feito, nesta parte, sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.

Relativamente ao ITCMD, a questão litigiosa central gira em torno da legalidade da aplicação do Decreto Estadual n° 55.002, de 09/11/2.009, para o cálculo do valor venal do imóvel, para fins de recolhimento do “Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos” – ITCMD.

Acerca do referido imposto dispõe o artigo 155, inciso I e parágrafo 1°, inciso I, da Constituição Federal:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

I. transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;

(…)

§1º. O imposto previsto no inciso I:

(…)

I. relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal;

Na esteira da disciplina constitucional, acerca do ITCMD, prevê o Código Tributário Nacional (Lei Federal nº 5.172, de 25/10/1.966):

Art. 38. A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. (negritei)

No caso do Estado de São Paulo, a matéria é disciplinada pela Lei Estadual nº 10.705, de 28/12/2.000, que dispõe:

Art. 9º. A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).

§1º. Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.

(…)

Art. 13. No caso de imóvel, o valor da base de cálculo não será inferior:

I. em se tratando de imóvel urbano ou direito a ele relativo, ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU; (…) (negritei)

Da leitura dos dispositivos acima referidos infere-se que a base de cálculo do ITCMD, no caso de bem imóvel, guarda estreita correlação com o “valor venal – valor de mercado” adotado pelo Município para a cobrança do IPTU, nos termos dos referidos artigos 9º, parágrafo 1º e 13, inciso I, ambos da já mencionada Lei Estadual nº 10.705, de 28/12/2.000, que determina que a base de cálculo do ITCMD não seja inferior ao “valor venal – valor de mercado” adotado para o cálculo do IPTU.

Na lição do ilustre Professor Kiyoshi Harada [2]:

“O valor venal de imóvel urbano é aquele encontrado segundo a legislação pertinente ao imposto predial e territorial urbano e é revisto ou atualizado anualmente.

(…)

De fato, a legislação do IPTU dispõe de critério objetivo para apuração do valor venal, bem como de mecanismo para manter atualizado esse valor apurado em 1º de janeiro de cada exercício. Nada justifica apuração de outro valor venal para o mesmo imóvel, só para o efeito de ITBI. A própria legislação estadual para cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis determina a utilização da base de cálculo do IPTU ou do ITR, conforme se trate, respectivamente, de imóvel urbano ou rural, ressalvado aos interessados o direito de requererem avaliação judicial (art. 15 da Lei nº 9.591, de 30-12-66)” (negritei)

O Regulamento do ITCMD, qual seja, o Decreto Estadual nº 46.655, de 01/04/2.002, confirma tal entendimento, dispondo:

Art. 16. O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei nº 10.705/00, art. 13):

I. em se tratando de:

a) Urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU;

(…)

Parágrafo único. Em se tratando de imóvel rural, poderão ser adotados os valores médicos da terra-nua e das benfeitorias divulgados pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo ou por outro órgão de reconhecida idoneidade, vigentes à data da ocorrência do fato gerador, quando for constatado que o valor declarado pelo interessado é incompatível com o de mercado. (negritei)

Contudo, posteriormente, o referido parágrafo único foi alterado pelo Decreto Estadual nº 55.002, de 09/11/2.009, passando a ter a seguinte redação:

Parágrafo único. Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel:

(…)

2. urbano, o “valor venal de referência” do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea “a” do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso. (negritei)

A regra introduzida por este último decreto acerca do “valor venal de referência” do imóvel, não deve prevalecer. Em nenhum momento a Lei Estadual nº 10.705, de 28/12/2.000 permitiu que o legislador estabelecesse a opção em favor do Fisco entre o “valor venal valor de mercado” considerado para a base de cálculo do IPTU e o “valor venal de referência” considerado para a base de cálculo do ITBI.

Destarte, a alteração conferida pelo referido Decreto Estadual nº 55.002, de 09/11/2.009, caracteriza afronta direta ao princípio da legalidade, porquanto se trata de modificação da base de cálculo de tributo por meio de decreto, o que não é permitido pelo Código Tributário Nacional (Lei Federal nº 5.172, de 25/10/1.966), que, no seu artigo 97, inciso II, e parágrafo 1º, dispõe:

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

(…)

II. a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;

(…)

§1º. Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. (negritei)

Diante de tal quadro, em que pese o fato gerador do tributo ter ocorrido após a publicação do Decreto Estadual nº 55.002, de 09/11/2.009 (morte do autor da herança em 11/12/2.013), este não tem o condão de alterar a base de cálculo do “Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos”, em se tratando de espécie normativa inadequada para tanto, extrapolando seu limite constitucional.

Nesse sentido, julgados deste C. Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO – Mandado de segurança – ITCMD – Base de cálculo – Lei Estadual nº 10.705/00 – Valor venal apontado no IPTU – Decreto nº 55.002/09 – ITBI – Valor venal de referência – Majoração da base de cálculo – Ilegalidade – Sentença mantida – RECURSO VOLUNTÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDOS – A base de cálculo do ITCMD é aquela apontada na legislação paulista (IPTU), não podendo ser adotado critério diverso daquele utilizado pela própria Administração Pública para propriedade do bem, observada que a criação de base de cálculo pelo Decreto nº 55.002/09 em referência ao ITBI consiste em ofensa ao princípio da legalidade. (Apelação nº 1016858-08.2015.8.26.0053, Rel. Des. Vicente de Abreu Amadei; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 1ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 24/05/2.016; Data de registro: 25/05/2.016) (negritei)

E, especialmente desta C. 3ª Câmara de Direito Público:

APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE QUAISQUER BENS OU DIREITOS (ITCMD) – Base de Cálculo – ITBI – Inadmissibilidade – Adoção de critério diverso daquele estabelecido pela lei que configura maltrato ao postulado da reserva legal – Segurança concedida – Sentença mantida – A base de cálculo do ITCMD, nos termos da lei é o valor venal do bem ou direito transmitido na época da abertura da sucessão – RECURSOS DESPROVIDOS. (Apelação nº 0038644-04.2010.8.26.0053, Rel. Des. Amorim Cantuária; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 3ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 13/12/2.011; Data de registro: 16/12/2.011) (negritei)

APELAÇÃO CÍVEL – MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD – BASE DE CÁLCULO: VALOR VENAL DO IMÓVEL (NÃO VALOR VENAL DE REFERÊNCIA DO ITBI) – Princípio da legalidade e da tipicidade tributária – Sentença mantida – Recurso não provido (Apelação nº1001769-90.2015.8.26.0037, Rel. Des. Marrey Uint; Comarca: Araraquara; Órgão julgador: 3ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 24/05/2.016; Data de registro: 03/06/2.016)

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD – Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – Base de cálculo alterada pelo Decreto 55002/09 – NÃO CABIMENTO – O Decreto Estadual nº 55.002/09, ao permitir o uso do valor venal do bem como sendo o “valor venal de referência do ITBI”, extrapolou o limite regulamentar, estabelecendo base de cálculo diversa da prevista na Lei 10.705/2000, afrontando o disposto no art. 99 do CTN, pelo qual o conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais foram expedidos – Afronta ao princípio da legalidade – Irretroatividade do decreto à data do falecimento do autor da herança – Sentença que concedeu a segurança almejada pelos impetrantes que há de ser mantida – Liquidez e certeza do direito estampado na exordial mandamental – Recursos oficial e voluntário não providos. (Apelação nº 1016794– 95.2015.8.26.0053, Rel. Des. Ronaldo Andrade; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 3ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 02/02/2.016; Data de registro: 05/02/2.016) (negritei)

Portanto, deve ser mantida a r. sentença.

Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ante o rito eleito do mandado de segurança, nos termos do artigo 25 da Lei Federal nº 12.016, de 07/08/2.009 [3].

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao presente reexame necessário, para manter a r. sentença, por seus próprios fundamentos, acrescidos dos aqui expostos.

KLEBER LEYSER DE AQUINO

DESEMBARGADOR – RELATOR

(Assinatura Eletrônica)

Notas:

[1] Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.

§1o. Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.

[2] In Direito Tributário Municipal; 2ª Edição; São Paulo; Editora Atlas; pag. 94 e 96.

[3] Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. – – /

Dados do processo:

TJSP – Remessa Necessária Cível nº 1000116-92.2021.8.26.0053 – São Paulo – 3ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Kleber Leyser de Aquino – DJ 11.03.2022

Fonte: INR – Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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Edital MINISTÉRIO DE ESTADO DA ECONOMIA – ME nº S/N, de 04.05.2022 – D.J.E.: 04.05.2022.

Ementa

Dispõe sobre os 10 benefícios da modernização do sistema de cartórios no Brasil (MP nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021).


Nota informativa

10 benefícios da modernização do sistema de cartórios no Brasil (MP nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021)

RESUMO

● A MP 1.085, de 2021, atualiza a organização dos cartórios, empregando as tecnologias mais recentes para facilitar a vida do brasileiro.

● É menos burocracia para registrar um filho.

● É menos burocracia na obtenção e no registro de dados entre cartórios para se divorciar.

● É menos tempo gasto indo de cartório em cartório: o brasileiro poderá usar o celular para solicitar registros e obter certidões, de qualquer lugar do Brasil.

● Extratos eletrônicos irão padronizar os registros. No lugar de longas certidões de difícil compreensão, teremos certidões com destaque dos elementos essenciais aos negócios jurídicos.

● Acabam os cartórios que só aceitam pagamento em dinheiro. Com o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (Serp), pagamentos eletrônicos devem ser sempre possíveis.

● Em momentos difíceis da vida, como no falecimento do cônjuge, o Serp tornará mais simples o processo de obtenção de documentos indispensáveis.

● A incorporação imobiliária precisará de menos documentos e terá mais segurança e transparência.

● As certidões necessárias para o registro de um imóvel serão obtidas mais rápida e facilmente.

● O extrato eletrônico reduzirá o custo de se financiar um imóvel.

● O problema da distância física será eliminado com as assinaturas eletrônicas, que já estão disponíveis gratuitamente para todos pelo GOV.BR.

● É menos tempo gasto em burocracia administrativa e mais tempo para o brasileiro trabalhar, empreender e passar com a família.

Introdução

No Brasil, os cartórios são a forma encontrada para se garantir a verificabilidade do direito de propriedade e para a redução da assimetria de informações entre os agentes econômicos, além de dar a publicidade jurídica necessária para diversos atos da vida civil. Entretanto, a organização atual dos cartórios foi construída há cerca de cinquenta anos, quando os recursos disponíveis eram outros e a vida socioeconômica eraem grande parte, restrita ao município de residência das famílias.

A MP 1.085, atualmente em discussão no Congresso Nacional, atualiza a organização dos cartórios, prevendo o emprego das tecnologias mais recentes para facilitar a vida do brasileiro. Nesse sentido, reunimos 10 exemplos práticos de como o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (Serp) facilitará a vida do brasileiro [1]. O objetivo principal desta nota informativa é possibilitar a comunicação efetiva com a sociedade em geral, a partir da utilização de termos comuns e menos técnicos, possibilitando que cada cidadão possa se inteirar melhor sobre essa importante medida do Governo Federal.

Dez exemplos

1) Registro de um filho

O registro de nascimento é uma das atribuições mais básicas do registro público. Antes da MP, o registro, salvo iniciativas pontuais, precisava ser feito presencialmente, o que obrigava o deslocamento até um cartório. A MP traz a possibilidade de utilizar-se o celular da família para enviar a documentação necessária para o registro pelo Serp, sem necessidade de deslocamento ou outros gastos: é mais tempo para o brasileiro passar com a sua família.

  • Como é: a pessoa tem de se deslocar do hospital-maternidade até o cartório de registro civil das pessoas naturais de seu município para, de posse da declaração de nascimento vivo – DNV, efetuar o registro do filho.
  • Possibilitado pela MP: estando no próprio hospital-maternidade, a pessoa poderá usar o seu celular para enviar os dados e fazer a solicitação de registro (detalhes específicos serão regulados pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça). Espera-se que, futuramente, o número da DNV [2] gerado pelo Ministério da Saúde possa ser uma informação interligada com o Serp.

2) Divórcio

Considere um casal que queira se divorciar consensualmente. Hoje, o casal pode fazer isso em um cartório. Apenas no segundo semestre de 2020, mais de 40 mil divórcios ocorreram dessa forma. Apesar de comuns, vários passos são necessários apenas na obtenção e registro de documentos, que podem ser simplificados com tecnologia.

  • Como é: o divórcio pode ser realizado por meio de escritura pública nos cartórios de notas [3]. Antes da escrituração, tipicamente os cartórios requerem que se obtenha uma certidão de casamento atualizada e uma certidão negativa de ônus dos imóveis (se houver). O problema é que também é requerido que essas certidões tenham sido emitidas recentemente, em 30 e 90 dias respectivamente. Com a realização da escritura do divórcio, ela ainda deve ser levada a registro no cartório de registro civil de pessoas naturais em que foi realizado o casamento.
  • Possibilitado pela MP: com o Serp, as certidões necessárias à lavratura da escritura pública poderão ser obtidas diretamente pelo sistema e entregues ao cartório de notas. Lá mesmo, após a escrituração, pode ser solicitado seu registro civil por meio do celular, em decorrência da interoperabilidade de dados que ocorrerá entre os cartórios de registro público e os demais cartórios.

3) Peregrinação por cartórios

É comum, a todos aqueles que precisam de serviços cartoriais, a necessidade de ir a diversos cartórios, para reunir diferentes documentos que se encontram na competência de diferentes cartórios, que, por vezes, estão distantes geograficamente. A descentralização de certidões e documentos força o usuário do sistema a migrar entre diferentes cartórios para a efetivação do seu objetivo (um empréstimo por exemplo). O estabelecimento do Serp centralizará a busca por dados que atualmente se encontram em diferentes cartórios, tornando-os acessíveis pela internet.

  • Como é: os cartórios de registros públicos são divididos por competência (registro civil de pessoas naturais, registro civil de pessoas jurídicas, registro de títulos e documentos e registro de imóveis) e área geográfica. A multiplicidade de cartórios de registros públicos leva à descentralização de documentos que, por vezes, precisam ser reunidos para a resolução de uma atividade que precisa de tais documentos (empréstimo com garantias por exemplo), levando a custos de transporte, tempo e/ou com despachantes.
  • Possibilitado pela MP: a centralização de consulta e registro de dados, promovida pelo Serp, leva ao fim da migração por serviços cartoriais, uma vez que estes se tornam acessíveis pela internet, com atendimento remoto e certidões digitais, e por interoperabilidade de seus registros.

4) Extratos Eletrônicos

A necessidade de diferentes documentos para a checagem de informações importantes para um negócio é parte do dia a dia do brasileiro. Procuram-se e encaminham-se diversos documentos, por vezes com informações repetitivas e custosas. Com o Serp, os requisitos para registro de um negócio poderão ser supridos pelo encaminhamento de extratos eletrônicos padronizados, diminuindo o custo e a burocracia em negócios diários, como a efetivação de um financiamento habitacional.

  • Como é: é necessária a apresentação do documento integral para a efetivação de registros.
  • Possibilitado pela MP: possibilidade de encaminhamento de atos e negócios jurídicos para registro ou averbação por meio de extratos eletrônicos padronizados.

5) Pagamentos por cartões e outras formas eletrônicas

Embora o valor pago por meios eletrônicos seja similar ao valor pago em papel [4], há cartórios que só aceitam pagamentos em dinheiro em espécie. Além da tendência da ampla aceitação de pagamentos eletrônicos no Brasil e no mundo [5], o Brasil entrou em 2020 numa fase de pagamentos instantâneos no sistema financeiro, com o lançamento do Pix. Mesmo assim, a prática de não possibilitar o pagamento eletrônico continua em algumas serventias.

  • Como é: muitos cartórios só aceitam dinheiro em espécie para o pagamento dos emolumentos, das custas e das despesas.
  • Possibilitado pela MP: pagamentos por meios eletrônicos, a critério do usuário, inclusive mediante parcelamento, deverão ser aceitos por todos os cartórios de registros públicos. A aceitação de pagamento eletrônico será padronizada pelos cartórios.

6) Facilitação para sucessores abrirem o inventário

Atualmente, para abertura do inventário, os sucessores precisam passar por mais burocracia. Para dar entrada no procedimento no cartório de notas, os sucessores precisam juntar diversos documentos do falecido, entre os quais certidão de óbito, certidão de nascimento, certidão de casamento. No sistema atual, o cidadão tem que se deslocar para o cartório para obter certidões. Em momentos que já são difíceis por sua natureza, essa exigência se torna ainda mais pesada. Com o Serp, o atendimento remoto e certidões digitais tornam a burocracia mais acessível, especialmente em momentos turbulentos da vida.

  • Como é: para obtenção dessas certidões, os sucessores precisam se deslocar entre vários cartórios, de forma presencial, em busca dessas certidões. Por vezes, precisam ir para outros estados, para conseguir todos esses documentos ou contratar uma terceira pessoa para conseguir retirar essas certidões.
  • Com o Serp: as certidões de óbito, de nascimento, de casamento poderão ser retiradas eletronicamente pelos herdeiros ou por seus advogados, sem a necessidade de deslocamento aos cartórios, de forma presencial.

7) Aquisição de um imóvel na planta

Uma pessoa quer comprar um imóvel na planta, isto é, antes do imóvel ser construído. As pessoas fazem isso porque conseguem pagar um preço menor e podem se planejar. Para a incorporadora, isso também é uma vantagem, pois pode financiar o seu negócio com a parte dos imóveis já vendidos. Nesse sentido, diversas ações do Governo incentivam que isso ocorra [6], especialmente com ações direcionadas para as famílias de baixa renda. O Serp traz mais benefícios ao permitir que essas compras na planta sejam mais fáceis e seguras.

  • Como é: o cidadão, no sistema atual de registro público, tem uma grande dificuldade de adquirir um imóvel que ainda não existe fisicamente, dada a burocracia para a efetivação da aquisição. Em uma situação concreta, o cartório poderia dificultar a venda de imóveis que ainda vão ser construídos, dificultando uma venda que pode financiar empreendimentos imobiliários e impedindo uma compra.
  • Possibilitado pela MP: a medida reduz a quantidade de documentos exigidos, como a dispensa de apresentação do atestado de idoneidade financeira da empresa que gerencia o projeto (incorporadora), reduzindo o excesso de burocracia. Além disso, após o registro do memorial de incorporação, o incorporador poderá negociar não somente sobre as unidades autônomas, mas alienar ou onerar as frações ideais de terrenos (partes comuns do condomínio). Essas modificações facilitam a negociação entre vendedor e comprador, além de reduzir os prazos e os custos do processo de incorporação imobiliária.

8) Registro de um imóvel

Trâmites relacionados a imóveis são outros exemplos de situações nas quais pessoas são confrontadas com disfunções burocráticas e a demora usual em diversos cartórios. A MP nº 1.085 vem para facilitar o registro de imóvel contribuindo para a concretização do sonho de muitos brasileiros, que é a compra de seu imóvel próprio.

  • Como é: é necessário o comparecimento presencial ao cartório. Além disso, o prazo médio para o registro de um imóvel no Brasil varia de 23 dias, na região Sudeste, a 52 dias, na região Sul7 [7]
  • Possibilitado pela MP: será possível fazer o pedido de forma eletrônica. O tempo para emissão da certidão de registro será de, no máximo, 5 dias úteis [8].

9) Financiamento de um imóvel

A burocracia do sistema cartorial atual dificulta a realização do sonho da casa própria. A necessidade de comparecimento presencial, bem como a demora das certidões torna custosa e dificulta a realização do financiamento de um imóvel e encarece o valor do imóvel.

  • Antes da MP: é necessário o comparecimento presencial ao cartório. Além disso, Certidões de inteiro teor demoram alguns dias, forçando retornos diários ao cartório, bem como esperas desnecessárias.
  • Possibilitado pela MP: a possibilidade de acessar o cartório de maneira remota, emitir certidões digitais, bem como a possibilidade de registro de extratos eletrônicos, reduzirão os custos cartorários e o tempo gasto para emissão de certidões – o que irá facilitar a realização dos financiamentos de imóveis por toda a sociedade.

10) Estabelecimento de um condomínio em outro estado

Considere que você é proprietário de imóvel situado na divisa entre dois estados e decida transformá-lo em diversas unidades autônomas, estabelecendo um condomínio no imóvel. A distância geográfica é um dos maiores elementos de experiências práticas ruins aos serviços cartoriais. Quando essa distância geográfica ultrapassa limites estaduais, a burocracia se torna basicamente intransponível para o sistema registral, que necessita de comparecimento presencial para resolução de burocracias diárias, como o estabelecimento de um condomínio por alguém que se encontra em outro estado. Com o Serp, esses serviços poderão se tornar bem mais práticos, pois passarão a ser padronizados em todos os estados.

  • Como é: apesar de comum, o estabelecimento de condomínio em outro estado pode se tornar um grande empecilho dada a necessidade de comparecimento presencial ao cartório da região, bem como a necessidade de assinaturas diversas, na forma da legislação atual, com potenciais custos de despachantes e emolumentos.
  • Possibilitado pela MP: os documentos relativos à criação do condomínio são protocolados eletronicamente e a necessidade de deslocamento a outro estado ou a realização de procuração acabam uma vez que o registro pode ser assinado eletronicamente com assinatura digital ou avançada. As assinaturas eletrônicas estão disponíveis gratuitamente pelo portal GOV.BR.

Notas:

[1] A operacionalização do Serp depende de regulamentação do Conselho Nacional de Justiça. A MP permite que essa regulamentação aconteça e a visão apresentada possa ser realizada.

[2] Lei Nº 12.662, de 5 de junho de 2012.

[3] Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007. O Provimento n. 100 do CNJ possibilita a realização de divórcio na modalidade virtual, desde que preenchidos os requisitos legais. A interoperabilidade dos dados existentes em diferentes serventias não era prevista, entretanto.

[4] CNDL e SPC, disponível em https://site.cndl.org.br/pix-e-o-segundo-meio-de-pagamento-mais-utilizado-no-brasil-aponta-cndl-spc-brasil/.

[5] BIS (Bank for International Settlements), “Covid-19 accelerated the digitalisation of payments”.

[6] “Caixa começa a fazer de financiamento na planta para pessoa física com IPCA na próxima semana, diz Guimarães.

[7] ANOREG. Cartório em Números. 2021. 3ª ed.

[8] MP 1.085, modificações à lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 188 § 1º.

Fonte: INR – Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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