CSM/SP: Registro de Imóveis – Pedido de tutela antecipada para a averbação da suscitação da dúvida na matrícula, para assegurar o resultado do julgamento e possibilitar o conhecimento por terceiros – Não cabimento.

Apelação Cível nº 1004268-07.2020.8.26.0220

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1004268-07.2020.8.26.0220
Comarca: GUARATINGUETÁ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1004268-07.2020.8.26.0220

Registro: 2022.0000486635

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004268-07.2020.8.26.0220, da Comarca de Guaratinguetá, em que é apelante CONSTRUTORA ARCO LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE GUARATINGUETÁ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Por maioria de votos, deram provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente, nos termos do voto do Desembargador Ricardo Anafe. Declarará voto vencido o Desembargador Fernando Torres Garcia.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), vencedor, FERNANDO TORRES GARCIA(CORREGEDOR GERAL), vencido, RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 21 de junho de 2022

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1004268-07.2020.8.26.0220

APELANTE: Construtora Arco Ltda.

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da comarca de Guaratinguetá

VOTO Nº 31.727

Registro de Imóveis – Pedido de tutela antecipada para a averbação da suscitação da dúvida na matrícula, para assegurar o resultado do julgamento e possibilitar o conhecimento por terceiros – Não cabimento.

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária Desdobro do imóvel dado em garantia nove áreas, uma delas posteriormente desdobrada em duas novas áreas – Registro da garantia em relação a dois imóveis, resultantes do desdobro, que permanecem na propriedade do devedor fiduciante – Perfeita identificação dos imóveis, com suas localizações e medidas perimetrais, e dos elementos da garantia – Especialidades objetiva e subjetiva atendidas – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

1. Ex antecumpre destacar a adoção do relatório elaborado pelo eminente Relator, Desembargador Fernando Antonio Torres Garcia, bem como a excelência do seu voto.

2. Cuida-se de recurso interposto por “Construtora Arco Ltda.” contra r. sentença que manteve a recusa do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Guaratinguetá em promover o registro, nas matrículas nºs 50.095 e 50.096, da alienação fiduciária em garantia contratada com “Publius Raneiri Consultoria Financeira Ltda.” sobre o imóvel que originalmente era objeto da matrícula nº 42.952 e que, antes da apresentação do título, foi desdobrado em nove áreas, com abertura de novas matrículas, sendo uma delas a matrícula 48.909 que foi, a seguir, desdobrada em duas outras áreas que permanecem na propriedade da devedora fiduciante.

O registro foi recusado pelo Oficial de Registro de Imóveis porque: I) fere o princípio da especialidade subjetiva em razão da alteração da denominação social da devedora para “JT Castro Consultoria Ltda.”, sem que tenha ocorrido a retificação do contrato de alienação fiduciária; II) viola o princípio da especialidade objetivo em decorrência do desdobro do imóvel dado em garantia, com a abertura de novas matrículas para as áreas desdobradas, e do encerramento da matrícula nº 42.952 que foi indicada na escritura pública.

O recorrente afirmou que as alterações foram posteriores à escritura pública de mútuo garantido por alienação fiduciária sobre o imóvel objeto da matrícula nº 42.952, existindo perfeita identificação do imóvel e da figura do devedor que não foi alterada pela mudança da denominação social. Disso que isso permite o registro da alienação fiduciária que permanece em relação aos imóveis das matrículas nºs 50.095 e 50.096 porque têm origem na matrícula desdobrada e porque são áreas ainda de propriedade do devedor. Requereu a reforma da r. sentença (fl. 128/135).

Requereu, por fim, a concessão de tutela de urgência para a averbação da suscitação da dúvida nas matrículas nºs 50.095 e 50.096, para assegurar o resultado do processo e para ciência a terceiros (fl. 157/158).

3. A antecipação da tutela pleiteada pelo apelante é incompatível com a natureza deste procedimento e, ademais, é desnecessária porque a suscitação da dúvida prorroga o prazo de validade do protocolo, o que impede o registro de outros títulos representativos de direitos contraditórios posteriormente prenotados.

Outrossim, por força do princípio da publicidade, o protocolo do contrato de alienação fiduciária e a suscitação da dúvida devem ser noticiados em todas as certidões da matrícula do imóvel que forem expedidas durante a prorrogação do prazo da prenotação, o que basta conhecimento de terceiros.

Por essas razões, acompanho o respeitável voto do Excelentíssimo Desembargador Corregedor Geral da Justiça no que tange ao indeferimento do pedido de tutela antecipada.

4. A alteração da denominação social para “JT Castro Consultoria Ltda.” não prejudica a perfeita identificação da devedora fiduciante e não altera os seus direitos e deveres.

Ademais, as matrículas nºs 50.095 e 50.096 relacionam as diferentes denominações sociais adotadas pela devedora fiduciante ao longo do tempo, incluindo “Publius Raneiri Consultoria Financeira Ltda.” que consta no contrato de alienação fiduciária em garantia, existindo plena correspondência entre o título e o registro imobiliário.

Não prevalece, portanto, a recusa do título por suposta violação da especialidade subjetiva do registro. Nesse sentido:

“Registro de Imóveis – Instrumento particular de alienação fiduciária de imóvel – Desqualificação do título – Exigência de certidões negativas de débitos (CND) expedida pelo INSS e pela Receita Federal e de retificação da denominação da empresa titular de domínio – Dispensa apenas da apresentação das certidões negativas de débitos pela Corregedoria Permanente Inconformismo da parte quanto ao óbice remanescente, relativo à denominação social da empresa alienante fiduciária – Elementos que permitem o estabelecimento de identidade perfeita entre a pessoa jurídica que figura como proprietária tabular e aquela posicionada, no instrumento de contrato, como devedora fiduciante – Ausência de ofensa ao princípio da especialidade subjetiva – Afastada a exigência, para ingresso do título no fólio real – Apelação provida” (CSM, Apel. nº 1062367-44.2017.8.26.01000, Rel. Desembargador Pinheiro Franco, j. 15.05.2018).

Diante disso, também nesse ponto acompanho o voto do Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça para afastar a recusa do registro do título por suposta violação da especialidade subjetiva.

5. Contudo, peço vênia para divergir no que se refere à recusa do registro por violação da especialidade objetiva.

As certidões de fl. 26/71 demonstram que a matrícula nº 42.952 foi encerrada pelo desdobro, em nove áreas, do imóvel dado em garantia.

Em razão desse desdobro foram abertas as matrículas de nºs 48.901 a 48.909 (fl. 29/63), sendo a última posteriormente desdobrada em dois imóveis que se tornaram objeto das matrículas nºs 50.095 e 50.096 (fl. 68/71 e 64/67, respectivamente).

Esses desdobros, assim como ocorre com as alterações da denominação social, não acarretam a necessidade de retificação do título para identificar as matrículas nºs 50.095 e 50.096 como correspondentes aos dois imóveis sujeitos à constituição da garantia real (fl. 10/11).

Como esclarece Afranio de Carvalho:

“O princípio da especialidade significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado. Esse princípio, consubstancial ao registro, desdobra o seu significado para abranger a individualização obrigatória de:

a) todo imóvel que seja objeto de direito real, a começar pelo de propriedade, pois a inscrição não pode versar sobre todo o patrimônio ou sobre um número indefinido de imóveis;

b) toda dívida que seja garantida por um direito real, pois a quantia não pode ser indefinida, mas certa, expressa em moeda nacional”.(Registro de Imóveis, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 203).

In casu, o Oficial de Registro de Imóveis informou que as áreas desdobradas integravam a matrícula do imóvel originalmente dado em alienação fiduciária, o que também se verifica pelas certidões das matrículas que apresentou ao suscitar a dúvida.

Observo que eventual questionamento sobre a origem tabular dos imóveis matrículas nºs 50.095 e 50.096 teria impedido os desdobros que, reitero, foram promovidos pelo Oficial de Registro de Imóveis sem que exista notícia, nestes autos, sobre indagação em relação à identificação das localizações e das medidas perimetrais do imóvel original e das áreas desdobradas, o que faz concluir que os desdobros sucessivos respeitaram os requisitos impostos pela especialidade objetiva do registro.

Observada a especialidade objetiva na constituição da garantia e nos desdobros realizados, permanecem os imóveis oriundos desses desdobros, que ainda são de propriedade da devedora fiduciante, sujeitos à alienação fiduciária constituída sobre a área maior que integravam.

Anoto que não é incomum a alteração do registro imobiliário antes da apresentação de título de alienação ou constituição de garantia ou ônus real, o que, como exemplo, pode ocorrer pelo desfalque causado por desapropriação, pela retificação da descrição da área, ou por outro motivo.

Porém, estando a área remanescente do imóvel descrita na matrícula de modo a possibilitar a sua completa identificação e, ainda, a correspondência entre esse imóvel e o que foi objeto do negócio jurídico celebrado pelo titular do domínio, no exemplo citado não há razão para impedir o registro com fundamento no princípio da especialidade objetiva, ou no princípio da continuidade que se apoia no da especialidade.

Igual ocorre com a retificação, pois o art. 213, § 13, inciso I, da Lei nº 6.015/73 prevê que a retificação da descrição da área não impede o registro de título anterior, com manutenção da nova descrição do imóvel:

“§ 13. Não havendo dúvida quanto à identificação do imóvel:

I – o título anterior à retificação poderá ser levado a registro desde que requerido pelo adquirente, promovendo-se o registro em conformidade com a nova descrição; e

II – a prenotação do título anterior à retificação será prorrogada durante a análise da retificação de registro”.

6. Por fim, os desdobros não importam em divisão da garantia que subsiste em relação aos imóveis de que o devedor fiduciante é proprietário, sendo nesse ponto aplicável o raciocínio adotado em parecer da lavra do Desembargador Vicente de Abreu Amadei, quando Juiz Auxiliar da Corregedoria, aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Gilberto Passos de Freitas,:

Aliás, não confundir a indivisibilidade da hipoteca com a indivisibilidade da coisa, sabendo que aquela não impede divisão do bem hipotecado, é da tradição de nosso direito (Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, vol. III, p. 398; Caio Mario da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, IV, p. 307, Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, vol. XX, p.127-130), como bem leciona Ademar Fioranelli (A Hipoteca, in Direito Registral Imobiliário. Ed. Saf, 2001, p. 283-285)” (Processo CG n. 259/2006, j. em 6/10/2006).

Preservada a indivisibilidade da alienação fiduciária, cada um dos imóveis que permanecem na propriedade do devedor responderá pelo valor total da obrigação garantida, salvo se, no futuro, for pactuado de forma diversa pelas partes. Assim porque, a partir dos registros, o credor fiduciário terá a propriedade resolúvel sobre cada imóvel formado pela divisão da área maior, podendo, por esse motivo, autorizar o cancelamento do registro da garantia e a consolidação da propriedade plena com o devedor fiduciante também em relação a um ou a mais desses imóveis.

7. Ante o exposto, pelo meu voto dou provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente.

RICARDO ANAFE

Presidente do Tribunal de Justiça

Relator Designado

Apelação Cível nº 1004268-07.2020.8.26.0220

Comarca: Guaratinguetá

Apelante: Construtora Arco Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da comarca de Guaratinguetá

VOTO Nº 38.648

DECLARAÇÃO DE VOTO

Com o devido respeito aos fundamentos exarados no Voto do Excelentíssimo Relator Designado, DESEMBARGADOR RICARDO MAIR ANAFE, tendo ficado vencido diante dos votos que prevaleceram no julgamento, peço vênia para expor as razões da minha divergência.

Tratou-se de apelação (fls. 128/135) interposta por Construtora Arco Ltda. contra a r. sentença (fls. 115/119) proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá, que julgou procedente a dúvida registral (fls. 01/09) e manteve a recusa de registro stricto sensu da escritura pública de mútuo com alienação fiduciária em garantia do imóvel matriculado sob n.º 42.952 (fls. 26/29) daquela serventia.

Segundo a r. sentença (fls. 115/119), os óbices apresentados pelo Oficial encontram respaldo nos princípios da continuidade registral e da especialidade objetiva e subjetiva, haja vista que o imóvel da matrícula n.º 42.952 foi desmembrado em nove outros imóveis, de matrículas diversas, encontrando-se a matrícula n.º 42.952 encerrada, bem como porque a empresa que ofereceu o bem em garantia sofreu alteração de sua denominação social.

Em seu recurso (fls. 128/135), suscitou o apelante, em resumo, que as exigências do Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá não prosperam porque as alterações havidas são meramente formais e supervenientes à escritura, devendo ser considerado que, no tocante à especialidade objetiva, o objeto da garantia é o imóvel e não números de matrículas, e quanto à especialidade subjetiva, ela está atendida porque não houve alteração da pessoa jurídica, mas apenas de sua razão social, o que demandaria mera averbação na matrícula, sem necessidade de retificação da escritura.

Por tudo isso, requereu, o apelante, a reforma da sentença, para que se lhe defira o registro da escritura de mútuo com alienação fiduciária em garantia, como rogara.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 162/164).

Houve também pedido de antecipação parcial da tutela recursal, a fim de que fosse determinado ao Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Guaratinguetá que averbasse a existência da dúvida nas matrículas n.os 50.095 e 50.096, desmembradas da matrícula n.º 42.952.

É o relatório.

Inicialmente, nenhuma divergência há com relação ao indeferimento da pretendida antecipação parcial da tutela recursal.

O recorrente postulou a antecipação parcial da tutela recursal para que fosse anotada a existência da dúvida na matrícula dos imóveis de n.os 50.095 e 50.096, mas a anotação que se faz é da prenotação, no Livro 01, Protocolo do Registro de Imóveis, o que ocorreu no presente caso, como se vê a fls. 16, de modo que o conhecimento de terceiros a respeito da pretensão do recorrente de registro da escritura está garantido até a solução da lide.

Com efeito, instaurada a dúvida registrária, o prazo da prenotação é prorrogado até solução final do procedimento, sendo inadmissível a concessão de tutela provisória, na forma pretendida pela apelante, em razão do disposto no art. 203 da Lei n.º 6.015/73 que condiciona o registro do título ao trânsito em julgado da decisão:

“Art. 203 – Transitada em julgado a decisão da dúvida, proceder-se-á do seguinte modo:

I – se for julgada procedente, os documentos serão restituídos à parte, independentemente de translado, dando-se ciência da decisão ao oficial, para que a consigne no Protocolo e cancele a prenotação;

II – se for julgada improcedente, o interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do Protocolo”.

Desta forma, há manifesta incompatibilidade da antecipação da tutela recursal e o procedimento (processo em fase recursal) de dúvida, implicando a ausência de interesse processual. E, quanto a isso, não há divergência nos votos exarados.

Superada a questão, no mérito, em que pese às razões da apelante e aos votos divergentes, pelo meu voto, r. sentença deveria ser mantida, como, aliás, opinou o Ministério Público.

A pretensão do apelante de ver registrada a escritura pública de mútuo com alienação fiduciária do imóvel da matrícula de n.º 42.952 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Guaratinguetá era mesmo improcedente.

Pelo que consta dos autos, a escritura de mútuo com alienação fiduciária em garantia (fls. 17/24) referiu-se ao imóvel da matrícula de n.º 42.952 do Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá, em que Publius Ranieri Consultoria Financeira Ltda. figura como devedora/fiduciante, e a Construtora Arco Ltda. firma o contrato como credora/fiduciária.

A escritura foi lavrada em 12 de dezembro de 2017, mas apenas em 06 de outubro de 2020 foi apresentada ao registro de imóveis, quando, então, recebeu a prenotação de n.º 139.834 (fls. 16).

Referido título recebeu qualificação negativa, nos termos da nota devolutiva n.º 25.775, do seguinte teor:

“1) O imóvel objeto da Alienação Fiduciária, ou seja, da Matrícula 42.952 do Livro 02, com a área de 48.567,24 metros quadrados, foi desmembrado em nove (09) áreas distintas, com algumas já alienadas, estando o remanescente atualmente nas Matrículas 50.095 e 50.096 do Livro 02.

2) A devedora fiduciante que consta na escritura, Publius Ranieri Consultoria Financeira Limitada, alterou sua razão social diversas vezes e hoje consta como sendo: JT Castro Consultoria Ltda, com sede na Avenida Juscelino Kubitschek de Oliveira, nº 1.165, Loja B, Campo do Galvão, Guaratinguetá, SP, inscrita no CNPJ. 09.048.662/0001-06.

3) A Escritura Pública de Mútuo com Alienação Fiduciária em Garantia, lavrada aos 12.12.2017, no Livro 670, páginas 055/062, do 2º Tabelião de Notas de Guaratinguetá, SP, ora apresentada, deverá ser retificada, para constar as alterações acima citadas. Apresentou apenas um requerimento solicitando que a mesma seja registrada nas Matrículas 50.095 e 50.096 do Livro 02”.

Como se vê, a escritura em pauta referiu-se ao imóvel da matrícula de n.º 42.952 no Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá, mas, em razão da demora da apresentação do referido título a registro, aproximadamente três anos a contar de sua lavratura, a matrícula já estava encerrada porque o imóvel havia sido desmembrado em nove áreas, conforme as matrículas de n.os 48.901 (fls. 30), 48.902 (fls. 32/35), 48.903 (fls. 36/39), 48.904 (fls. 40/42), 48.905 (fls. 44/47), 48.906 (fls. 48/50), 48.907 (fls.52/54), 48.908 (fls.56/59) e 48.909 (fls. 60/63). Posteriormente, o imóvel da matrícula de n.º 48.909 foi desmembrado em duas áreas, inscritas sob os n.os 50.095 (fls. 68/71) e 50.096 (fls. 64/67).

Nesse sentido, constata-se que a escritura pública apresentada a registro diz respeito a imóvel que não mais existe, haja vista que a matrícula de n.º 42.952 foi encerrada após seu desmembramento em nove outras matrículas.

Nem mesmo o fato de remanescerem dois imóveis, objetos das matrículas de n.os 50.095 e 50.096, originários do imóvel da matrícula n.º 48.909, a qual, por sua vez, foi desmembrada da matrícula de n.º 42.952, é capaz de alterar a solução dada pela sentença à dúvida suscitada.

É imperioso que haja perfeita identidade na descrição do imóvel contida na escritura pública e no fólio real, em decorrência do princípio da especialidade objetiva: Consoante nos ensina Afrânio de Carvalho[1]:

“Ao exigir-se, para o registro, que o imóvel se apresente com as suas características, limites e confrontações, o que se exige é que ele apareça como um corpo certo. A sua descrição no título há de conduzir ao espírito do leitor essa imagem. Se a escritura de alteração falhar nesse sentido, por deficiência de especialização, terá de ser completada por outra de rerratificação, que aperfeiçoe a figura do imóvel deixada inacabada na primeira. Do contrário, não obterá registro.

Assim, o requisito registral da especialização do imóvel, vestido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogêneo em relação a qualquer outro. O corpo certo imobiliário ocupa um lugar determinado no espaço, que é abrangido por seu contorno, dentro do qual se pode encontrar maior ou menor área, contanto que não sejam ultrapassadas as reais definidoras da entidade territorial”.

Na espécie, não existe perfeita identidade entre o imóvel contido no título e os que constam das matrículas de n.os 50.095 e 50.096 do Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá.

Enfim, o óbice registral em pauta, no meu entender, deveria prevalecer, o que já era suficiente para a procedência da dúvida.

Por fim, no que se refere à exigência de retificação da escritura por conta do óbice relativo à identificação da devedora/fiduciante, melhor sorte socorre ao recorrente. Como o Oficial afirma que Publius Ranieri Consultoria Financeira Limitada ostenta atualmente denominação social de JT Castro Consultoria Ltda., não poderia exigir retificação da escritura outrora lavrada.

Ao tempo da lavratura da escritura, a denominação social da devedora/fiduciante estava correta e as alterações na razão social da pessoa jurídica são averbáveis na matrícula do imóvel, não havendo de se exigir retificação do título para fazer constar a atual denominação daquela, à evidência.

Muito embora a Lei n.º 6.015/1973 não mencione, de modo explícito, a necessidade de averbação da alteração da razão social da pessoa jurídica, é de se ver que o art. 167, II, “5”, prevê a averbação de circunstâncias que, de qualquer modo, tenham influência no registro ou nas pessoas nele interessadas.

Todavia, apenas na hipótese de serem levantados todos os óbices ao registro é que a dúvida seria improcedente, mas, no caso, persistiria o óbice ao registro constante do item 1 da exigência do Oficial de Registro de Imóveis de Guaratinguetá (fls. 02), daí porque a dúvida seria procedente, rejeitando-se o recurso.

Por esta razão, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

NOTA:

[1] CARVALHO, Afrânio de. Registro de Imóveis. 3ª Edição. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1982, pág. 247. (DJe de 12.09.2022 – SP)

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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1VRP/SP: Registro de Imóveis. Valor venal de referência. ITBI. O preenchimento da declaração de isenção do ITBI tomando por base o valor da transação não se mostra flagrantemente incorreto, notadamente diante das teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça .

Processo 1078492-14.2022.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Bernie Walbenny Maria de Oliveira Moreno e Silva Teixeira – Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida para afastar o óbice registrário e, em consequência, determinar o registro do título. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: ANDERSON DIAS DE SOUZA (OAB 246850/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo nº: 1078492-14.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: Oficial do 8º Cartório de Registro de Imóveis da Capital/sp

Suscitado: Bernie Walbenny Maria de Oliveira Moreno e Silva Teixeira

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 8º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Bernie Walbenny Maria de Oliveira Moreno e Silva Teixeira após negativa de registro de escritura pública de compra e venda do imóvel descrito na matrícula n.156.263 daquela serventia

O Oficial informa que o óbice registrário diz respeito à incorreção da declaração de isenção do ITBI apresentada, na qual foi informado valor inferior ao valor venal de referência, pelo que exigido o recolhimento do imposto (artigo 26 do Decreto n.55.196/14).

Embora não desconheça o entendimento do Tribunal de Justiça que fixou a tese de que o valor venal de referência não pode ser utilizado como base de cálculo do imposto, não é possível ao Registrador reconhecer a inconstitucionalidade da legislação municipal. Ademais, a lei impõe aos registradores controle rigoroso do recolhimento de tributos, sob pena de responsabilidade pessoal.

Documentos vieram às fls.05/75.

A parte suscitada se manifestou às fls.84/85, reiterando as razões apresentadas ao Oficial (fls.64/72), por meio das quais defendeu a regularidade de sua declaração de isenção, em que utilizado o valor da transação como base de cálculo do imposto de transmissão, já que inaplicável o valor venal de referência conforme entendimento jurisprudencial (TJ/SP, Arguição de Inconstitucionalidade n.0056693-19.2014.8.26.0000 – STJ, REsp n.1.937.821/SP, Tema 1.113).

O Ministério Público opinou pelo afastamento do óbice (fls.93/95).

É o relatório.

Fundamento e Decido.

De início, é importante ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n.8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

No mérito, porém, a dúvida é improcedente. Vejamos os motivos.

Não se desconhece que, para os registradores, vigora ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (art. 289 da Lei n. 6.015/73; art.134, VI, do CTN e art. 30, XI, da Lei n.8.935/1994).

Entretanto, o Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a fiscalização devida não vai além da aferição sobre a existência ou não do recolhimento do tributo (e não se houve correto recolhimento do valor, sendo tal atribuição exclusiva do ente fiscal, a não ser na hipótese de flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo).

Nesse sentido, os seguintes julgados do E. Conselho Superior da Magistratura:

“Ao oficial de registro incumbe a verificação de recolhimento de tributos relativos aos atos praticados, não a sua exatidão” (Apelação Cível 20522-0/9- CSMSP – J.19.04.1995 – Rel. Antônio Carlos Alves Braga).

“Todavia, este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor” (Apelação Cível 996-6/6 CSMSP, j. 09.12.2008 – Rel. Ruy Camilo).

“Este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor” (Apelação Cível 0009480- 97.2013.8.26.0114 – Campinas – j. 02.09.2014 – Rel. des. Elliot Akel).

Nessa mesma linha, este juízo vem decidindo pela insubsistência do óbice quando não caracterizada flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo (processo de autos número 1115167-78.2019.8.26.0100, 1116491-06.2019.8.26.0100, 1059178-53.2020.8.26.0100, 1079550-52.2022.8.26.0100, 1063599-18.2022.8.26.0100, 1039109-29.2022.8.26.0100 e 1039015-81.2022.8.26.0100).

No caso concreto, verifica-se que o valor da transação que constou na escritura de venda e compra foi também utilizado na declaração de isenção apresentada ao ente fiscal (R$150.000,00 – fls.08/12)

O preenchimento da declaração de isenção do ITBI tomando por base o valor da transação não se mostra flagrantemente incorreto, notadamente diante das teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.1.937.821/SP (processoparadigma do Tema n.1.113), sob a sistemática da Repercussão Geral:

“a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;

b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);

c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente”.

Nesse contexto, de título formalmente hígido e declaração de isenção, eventual irregularidade deve ser apurada pelo ente tributante, com discussão na via adequada, que não esta.

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida para afastar o óbice registrário e, em consequência, determinar o registro do título.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 08 de setembro de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juíza de Direito (DJe de 12.09.2022 – SP)

Fonte: Diário do Judiciário eletrônico

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TRT-1: Impenhorabilidade do bem de família não é absoluta

A Nona Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região – TRT-1 concluiu que a impenhorabilidade do imóvel residencial não é absoluta, dependendo da análise do caso concreto. A decisão ocorreu no julgamento de um agravo de petição interposto pelo dono de um imóvel penhorado na Justiça do Trabalho, que alegou tratar-se de um bem de família.

O colegiado entendeu que a penhora do imóvel não seria atentatória ao direito à moradia e à dignidade do devedor, além de ser imprescindível para satisfação de crédito de natureza alimentar do exequente, que está há mais de 10 anos sem receber créditos trabalhistas.

A decisão leva em conta o artigo 1º da Lei 8.009/1990, que determina que o bem de família “é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”.

Ao interpor agravo de petição, o executado argumentou ser proprietário de apenas 50% do imóvel penhorado para o pagamento da dívida trabalhista, além de não possuir outros bens imóveis.

Ele afirmou extrair seu sustento da locação do bem penhorado e o valor recebido de aluguel, de R$ 15 mil, se destinava a pagar despesas com a moradia e os demais gastos voltados à sobrevivência. Sendo assim, no seu entendimento, o bem seria impenhorável por se tratar de bem de família.

No segundo grau, observou-se que a impenhorabilidade do imóvel residencial não é absoluta, podendo ser relativizada de acordo com fatos concretos.

Fonte:  Instituto Brasileiro de Direito de Família

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