Artigo: Pacto antenupcial na comunhão parcial de bens – Por Tarcisio Alves Ponceano Nunes


* Tarcisio Alves Ponceano Nunes

Muito se discute no dia-a-dia notarial e registral sobre a possibilidade da lavratura de escritura pública de pacto antenupcial para o caso de adoção do regime legal/supletivo, isto é, o regime da comunhão parcial de bens previsto nos artigos 1.658 à 1.666 do Código Civil Brasileiro de 2002.

Dias atrás, lavrei uma escritura pública nestes moldes e afirmo, com absoluta certeza, que nada há de ilegal neste ato! Muito pelo contrário: é até altamente recomendável tal prática no caso do futuro casal ter amealhado patrimônio, em conjunto, durante o namoro/noivado, mas que, por questões de conveniência, o seu registro ter sido feito apenas em nome de um deles.

Analisemos a legalidade e absoluta conveniência de tal prática: o artigo 1.639 do Diploma Civilista estabelece que: “É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver”. Pois bem: “… estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver” inclui, por óbvio, a possibilidade de se definir, no pacto, que um determinado imóvel, adquirido antes do casamento pelo futuro casal, passe a pertencer, com o matrimônio, à ambos, ainda que registrado em nome de apenas um deles. Neste caso, é cristalino que não se deve exigir dos nubentes que se casem no regime da comunhão universal de bens, nem que um deles transfira 50% (cinquenta por cento) do bem para o outro (com incidência do ITBI sobre a fração transmitida). Basta que na escritura pública de pacto antenupcial conste uma cláusula com o seguinte teor: “… Pela presente escritura pública, como prescreve o artigo 1.653, primeira parte, do Código Civil Brasileiro de 2002 e na melhor forma de direito, vêm adotar, como de fato e na verdade adotado têm, para o casamento civil entre ambos ajustado, o “REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS”, para regular as relações patrimoniais que existirão entre ambos, nos termos dos artigos 1.658 à 1.666 do Código Civil Brasileiro de 2002, com a única exceção adiante convencionada, conforme lhes faculta a lei, sendo que referido pacto deverá ser também consignado no respectivo processo de habilitação e termo de casamento à ser lavrado pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais competente. Pelos outorgantes e reciprocamente outorgados me foi dito que: a) o regime de bens que adotarão para o casamento é o da COMUNHÃO PARCIAL DE BENS, porém, com exceção do seguinte bem imóvel: … descrição pormenorizada do bem, inclusive com número da matrícula e título aquisitivo…; e, b) a(o) segunda(o) outorgante e reciprocamente outorgada(o), por força do regime matrimonial e da presente convenção antenupcial, à partir do casamento, terá participação na propriedade do imóvel acima mencionado, à título de meação, juntamente com o(a) primeiro(a) outorgante e reciprocamente outorgado(a).”E, como consequência lógica da lavratura deste pacto, a escritura pública correlata deverá ser registrada no Livro n.º 03 de Registro Auxiliar pertencente ao Cartório de Registro de Imóveis do primeiro domicílio conjugal do casal e averbado na matrícula correspondente ao bem imóvel que integrará a comunhão.

Esta escritura pública evitará, com certeza, qualquer questionamento judicial à respeito do titular do bem e atingirá a finalidade precípua do Tabelião de Notas, que é garantir a paz social e a certeza quanto aos efeitos de um negócio/ato jurídico!

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* O autor é 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Matão-SP.

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Artigo: Direito de família – Por: Jones Figueirêdo Alves


* JONES FIGUEIRÊDO ALVES

Pais fictícios

A inserção de nome materno fictício em registro de nascimento de filho adotivo de pai solteiro, determinada em decisão proferida em Pernambuco (21.05.2014), pela juíza Paula Maria Malta Teixeira do Rego, da 11ª Vara de Família e Registro Civil do Recife, apresenta-se conducente a assegurar a dignidade plena do adotado. Cuida-se de direito personalíssimo à identidade pessoal, como bem jurídico a ser tutelado, onde presentes o prenome e o sobrenome (composição do nome) e a individualização de origem, reclama-se também a nominação de ambos os pais.

No caso, consabido que a adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de qualquer vínculo com os pais e parentes consanguíneos (artigo 1.626 do Código Civil) e que em adoção por uma única pessoa (homem solteiro) não poderá ser mantido o sobrenome materno biológico, a recente decisão judicial assenta-se iniludível a garantir autoestima, reputação e respeitabilidade da pessoa registrada. Mais das vezes, a falta de designação do pai ou da mãe, no registro civil, importa em constrangimento existencial, frustrando o desenvolvimento saudável da personalidade daquele desprovido de uma identidade completa (artigo 3º, ECA). 

A atribuição fictícia da origem genética, não poderá ser entendida como “falsidade”, como é o pseudônimo (do grego “pseudos”: falsidade), quando caracteres substitutivos do nome civil e das referencias de vínculos apresentam-se como bens estimáveis a exprimir a identidade. Isto porque obrigatória a atribuição ficta, pelo vínculo da adoção, por ordem legal do art. 1.626 do CC, com a consequente modificação do nome de família do adotado. 

Nessa linha, tem-se ainda uma prescrição de caráter humanitário, a conferir ao adotado uma paternidade ou maternidade fictícias, quando mães solteiras, por vínculos biológicos ou adotivos, e pais solteiros, por vínculos de adoção, não podem indicar o genitor ou a genitora que faltam ao filho. 

É o que estabelece o artigo 18 do “Pacto de San José”, da Costa Rica, de 22.11.1969, em vigor internacional desde 18.07.1978 e ratificado pelo Brasil em 06.11.1992 (Decreto nº 678): “Toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um destes. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário”.

Nesse universo jurídico de pessoa, a latitude maior é a de não ser possível qualquer dissociação entre pessoa e personalidade, como não mais tolerável qualquer discriminação relativa à filiação. (artigo 227 § 6º, CF).

Em conformidade da teoria de valores, não há negar que a supremacia do valor da pessoa humana sobre qualquer outro valor, está a dizer que “o significado da dignidade humana apoia-se no valor intrínseco e intangível da pessoa” (CHOERI, 2010), pelo que em prol desse alcance, todas as medidas valorativas se farão legitimadas e justas, urgentes e necessárias.

É exatamente o caso. Os valores intrínsecos da pessoa, a partir de sua sacralidade (dignidade absoluta e irredutível), importam inexoravelmente na afirmação da identidade pessoal como uma realização indiscutível da dignidade humana. Ações afirmativas desse nível, melhor constroem a identidade da pessoa, no efeito de atribuir-lhe condições de ampla interação social, efetivando a dignidade em sua adequada dimensão axiológica. 

Em menos palavras, pais fictícios serão, sempre, nominações admissíveis em registro civil, não apenas para atender ao melhor interesse da criança (tutela máxima) como a servirem, em qualquer idade, como fórmulas consectárias de uma melhor dignificação da pessoa.

Estudos apontam que, no Brasil, mais de 700 mil crianças não tem a paternidade declarada na certidão de nascimento, gerando constrangimento psicológico e sensações de abandono e rejeição. A inclusão de um pai fictício no registro civil servirá, enquanto não reconhecido o pai biológico, como alternativa de mitigação desse grave problema social. (STF- TV-Justiça – 24/04/2009).

Com efeito, o direito de individualização da pessoa haverá de compreender, na sua singularidade, a identidade de sua origem (mesmo ficta), como história social que se comunique perante todos. Essa identidade completa faz a diferença e a dignidade. Afinal, a humanidade das pessoas situa-se exatamente no fato de serem singulares e únicas. Titulares do direito de possuírem, como qualquer outro, um pai e uma mãe. Mesmo que fictícios.

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* O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), coordena a Comissão de Magistratura de Família. Autor de obras jurídicas de direito civil e processo civil. Integra a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas (APLJ).

Fonte: Anoreg/BR – Diário de Pernambuco | 16/06/2014.

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