TJ/SP: Testamento. Válido. Conteúdo exclusivamente patrimonial. Herdeiros maiores e capazes. Ratio legis da Lei 11.441/07. Disposição já prevista no CC (art. 2.015). Entendimento, em sede de primeiro grau, da possibilidade de realização no extrajudicial.

TJ/SP: Testamento. Válido. Conteúdo exclusivamente patrimonial. Herdeiros maiores e capazes. Ratio legis da Lei 11.441/07. Disposição já prevista no CC (art. 2.015). Entendimento, em sede de primeiro grau, da possibilidade de realização no extrajudicial.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

COMARCA DE SÃO PAULO

FORO CENTRAL CÍVEL

7ª VARA DA FAMÍLIA E SUCESSÕES

SENTENÇA

Processo nº: 0052432-70.2012.8.26.0100

Abertura, Registro e Cumprimento de Testamento

Requerente: F. F. G.

Requerido: A. L. B. N.

Registre-se, inscreva-se e cumpra-se o testamento público, com que faleceu A. L. B. N. Servirá para o cargo de testamenteiro, o(a) Sr(a). F. F. G., independentemente de assinatura do termo.

Desde que todos os herdeiros sejam maiores e capazes, não haja fundações entre os herdeiros testamentários e estejam todos de acordo acerca da partilha, o inventário poderá ser feito de forma extrajudicial por escritura pública no correspondente Cartório de Registro de Notas nos termos do art. 2.015 do Código Civil, não sendo necessário ajuizamento de ação de inventário. O fundamento da decisão decorre de uma interpretação teleológica dos dispositivos legais aplicáveis no caso.

Isto porque, na visão deste juízo, o intuito da determinação da imprescindibilidade de realização do inventário judicial está relacionado à intenção de proteção de legatários com natureza fundacional e incapazes. A existência de tais legatários justificaria a participação do Ministério Público, enquanto fiscal da lei, nos processos de inventário. Assim, em uma interpretação teleológica da lei, concluiu-se que a “ratio legis” estaria ligada à proteção de incapazes ou de fundações. Destaco que localizei as discussões legislativas anteriores à aprovação da Lei 11.441/2007, porém não havia nelas referências aos motivos da ressalva quanto ao inventário extrajudicial na hipótese de haver testamento. É de se observar ainda que os artigos 2.015 e 2.016 do Código Civil, que já previam, anteriormente à mudança da Lei Adjetiva, o inventário extrajudicial, assim dispõem:

Art. 2.015. Se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz.

Art. 2.016. Será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for incapaz. O teor do disposto no Código Civil corrobora a conclusão a que chegamos por meio de interpretação teleológica do dispositivo.

Demais disso, na hipótese de o testamento não conter disposições patrimoniais (exemplo: testamento que unicamente reconhece a paternidade de filho do “de cujus”), tampouco haveria justificativa lógica que amparasse a conclusão de que o testamento deve ser judicial. Em verdade, o testamento que não contém disposições de caráter patrimonial é cumprido fora da esfera do processo de inventário. Assim, no exemplo acima, se no testamento há reconhecimento de um filho, e este, assim como os demais herdeiros, é maior, capaz e concorde, basta que faça o inventário extrajudicial, juntamente com os demais herdeiros, e as demais regularizações de sua situação de filiação são tomadas na esfera própria (do registro civil).

Diante de toda a fundamentação acima, concluímos que é possível realizar o inventário extrajudicial mesmo havendo testamento, desde que (1) o testamento não contenha disposições patrimoniais; ou (2) o testamento disponha dos bens de forma a legá-los para pessoas maiores e capazes, excluídas as fundações. Evidentemente, para a realização do inventário extrajudicial, os herdeiros sempre deverão estar concordes, mesmo que presentes as outras condições que autorizariam o inventário extrajudicial.

É importante ressaltar que tabeliões, notários e registradores exercem uma atividade pública em regime de delegação, e que, dado o caráter público da função registral, o entendimento exposto acima não acarreta nenhum prejuízo a nenhum interesse tutelado pelo Estado.

Ademais, a interpretação das leis deve buscar atender aos fins públicos a que as leis se destinam, que, no caso, seriam preservados. A interpretação teleológica é a forma preferencial de interpretação das leis.

Finalmente, a lei 11.441/2007 veio complementar o que já constava no Código Civil, nos artigos transcritos acima, e foi fundamentada na cobrança da sociedade civil por maior agilidade nos processos de inventário e arrolamento. Os inventários realizados de forma extrajudicial são notoriamente mais ágeis e céleres, e, conjugadas tais premissas, sua realização deve ser incentivada, como forma de se atribuir maior eficiência aos processos de sucessão “causa mortis”. Assim, não se justifica interpretação que venha a restringir as disposições do Código Civil e que confira à Lei 11.441/2007 o sentido de inviabilizar por completo a realização do inventário extrajudicial na hipótese de haver testamento. Parece mais acertado interpretá-la na forma descrita acima para se viabilizar a realização do inventário extrajudicial em algumas hipóteses, quando não houver interesse público que justifique a necessidade de realização do inventário judicial. Atende-se, assim, também o interesse público, ao permitir, desde que haja concordância das partes, que não ingressem no Poder Judiciário processos em que há mero interesse privado e disponível de partes maiores, capazes e concordes, que não necessitam da “tutela” do Estado para defender seus interesses; ao propiciar, para todos os envolvidos, a liberdade de optar pela via judicial ou extrajudicial para realizar o inventário, haja vista que a opção pela realização do inventário judicial seria preservada; e, finalmente, ao se conferir maior agilidade aos processos de inventário por meio da utilização da via extrajudicial, facilitando-se assim o desenvolvimento do país.

Cópia da sentença do processo de abertura e registro do testamento deverá integrar o inventário extrajudicial.

Transitada em julgado esta sentença, providencie o requerente a extração de uma cópia da escritura original do testamento, no Tribunal de Justiça; recolha-se a taxa para expedição da certidão, documento este que servirá para o registro deste testamento em livro próprio, em 30 dias contados do trânsito em julgado desta sentença, nos termos do Provimento CSM 833/2004, arquivando-se independentemente de nova intimação, na falta destas providências.

Após, arquivem-se os autos.

P. R. I.

São Paulo, 05 de fevereiro de 2013

Fabiano da Silva Moreno, Juiz de Direito

Fonte: Blog do 26º.


STJ: DIREITO CIVIL. DESNECESSIDADE DE PARTILHA PRÉVIA DOS BENS NO DIVÓRCIO INDIRETO.

Não é necessária a prévia partilha de bens para a conversão da separação judicial em divórcio. De fato, a partir da interpretação dos arts. 31 e 43 da Lei n. 6.515/1977, tinha-se a regra de que a realização da partilha dos bens do casal era requisito para a convolação da separação judicial em divórcio. Foi justamente em razão desses dispositivos que a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que apenas o divórcio direto independia da prévia partilha de bens, o que foi consolidado na Súmula 197 do STJ. Esse entendimento, embora restrito ao divórcio direto, já refletia a tendência atual de garantir cada vez mais autonomia aos direitos da personalidade, distanciando-os dos direitos eminentemente patrimoniais. As recentes reformas legislativas no âmbito do direito de família seguiram essa orientação. Nesse contexto, o CC/2002 regulou o divórcio de forma essencialmente diversa daquela traduzida pela legislação de 1977. Assim, o art. 1.580 do novo código civil passou a condicionar a concessão do divórcio indireto apenas a requisito temporal, qual seja, o transcurso do prazo de um ano entre o requerimento de conversão e a separação judicial ou medida cautelar equivalente; e o art. 1581 disciplinou expressamente a desnecessidade da prévia partilha de bens como condição para a concessão do divórcio. Isso porque a visão contemporânea do fenômeno familiar reconhece a importância das ações relacionadas ao estado civil das pessoas, como direitos de personalidade, a partir da proteção integral à dignidade da pessoa humana. Portanto, o estado civil de cada pessoa deve refletir sua realidade afetiva, desprendendo-se cada vez mais de formalidades e valores essencialmente patrimoniais. Estes, por sua vez, não ficam desprotegidos ou desprezados, devendo ser tratados em sede própria, por meio de ações autônomas. REsp 1.281.236-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/3/2013.

Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – N° 0518. Publicação em 16/05/2013.


STJ: DIREITO CIVIL. RECONHECIMENTO DE ANTERIORIDADE DE CRÉDITO PARA CARACTERIZAÇÃO DE FRAUDE CONTRA CREDORES.

Não é suficiente para afastar a anterioridade do crédito que se busca garantir — requisito exigido para a caracterização de fraude contra credores — a assinatura de contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel não registrado e desacompanhado de qualquer outro elemento que possa evidenciar, perante terceiros, a realização prévia desse negócio jurídico. O art. 106, parágrafo único, do CC/1916 disciplinou o instituto da fraude contra credores, visando coibir o devedor de praticar atos fraudulentos que acarretem a diminuição de seu patrimônio com o propósito de prejudicar seus credores. Para isso, instituiu a ação pauliana ou revocatória, possibilitando ao credor prejudicado anular o negócio jurídico fraudulento e conservar no patrimônio do devedor determinados bens para a garantia do cumprimento das obrigações assumidas por este. Para a caracterização dessa fraude, exigem-se os seguintes pressupostos: a existência de dano ao direito do credor (eventus damni); o consenso entre o devedor e o adquirente do bem (consilium fraudis); e a anterioridade do crédito que se busca garantir em relação ao negócio jurídico tido por fraudulento, pois somente os credores que já ostentavam essa condição ao tempo do ato fraudulento é que podem demandar a anulação, visto que, apenas em relação a eles, esse ato diminui a garantia oferecida pelo patrimônio do devedor. Nesse contexto, na hipótese em que o devedor tenha firmado contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel, para fins de constatar a anterioridade de crédito em relação ao ato fraudulento, deve ser considerada a data do registro do instrumento particular no Cartório de Registro de Imóveis, e não a data da sua elaboração. Isso porque o registro do contrato de promessa de compra e venda de imóvel, conquanto não interfira na relação de direito obrigacional — existente entre promitente comprador e promitente vendedor —, é necessário para que a eficácia da promessa de compra e venda se dê perante terceiros, de forma a gerar um direito real à aquisição do promitente comprador, em caráter erga omnes. Dessa forma, dispõe o art. 1.417 do CC/2002 que, mediante promessa de compra e venda em que não foi pactuado o arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel. Assim, não estando o contrato registrado, o promitente comprador pode exigir do promitente vendedor a outorga da escritura, mas não poderá opor seu direito a terceiros. Ademais, ao permitir o contrário, estar-se-ia enfraquecendo o instituto da fraude contra credores, tendo em vista a facilidade em dar a um documento uma data falsa e, ao mesmo tempo, a dificuldade em demonstrar essa fraude. REsp 1.217.593-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/3/2013.

Fonte: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – N° 0518. Publicação em 16/05/2013.