EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI): PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E MODELO CONTRATUAL

* Luís Ramon Alvares

Nem todos sabem que, em 2011, foi publicada uma importante lei para o Direito Empresarial. A Lei Federal nº. 12.441/11 alterou o Código Civil e permitiu a constituição da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI).

É um avanço significativo na legislação empresarial, haja vista que, agora, é possível a constituição de empresa limitada por apenas uma pessoa. Deu-se a institucionalização da empresa limitada unipessoal. A referida lei é um facilitador para aqueles que desejam dirigir a empresa sem a figura de um sócio, que, muitas vezes, só integrava a sociedade limitada para cumprir o requisito legal.

Conheça abaixo as principais características da EIRELI, disciplinada no art. 980-A do Código Civil-CC (acrescentado pela Lei nº. 12.441/11):

  • Tem personalidade jurídica própria (art. 44, VI, do CC), distinta do seu titular.
  • É constituída por 1 (uma) única pessoa, titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado (art. 980-A, caput, CC).
  • A EIRELI pode ter natureza simples (registro no Registro Civil das Pessoas Jurídicas- RCPJ) ou natureza empresária (registro na Junta Comercial). A maioria das EIRELI’s terá natureza simples, haja vista que não terá por objeto o exercício de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços (art.982 c/c art.966, ambos do CC).
  • Tecnicamente, é empresa; não é sociedade. Nos termos do Enunciado 469 do Conselho da Justiça Federal, EIRELI “…não é sociedade, mas novo ente jurídico personificado”.
  • Tecnicamente, na EIRELI há a figura do titular da empresa; não do sócio.
  • Nos termos do Enunciado nº 468 do Conselho da Justiça Federal c/c Instrução Normativa nº 117, do DNRC- Departamento Nacional de Registro do Comércio, o titular da EIRELI só pode ser pessoa natural.
  • O capital social deve estar devidamente integralizado (art. 980-A, caput, CC).
  • O capital social não pode ser inferior a 100 vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País (art. 980-A, §1º, CC).
  • A denominação ou a firma deverá ser integrada pela expressão “EIRELI”.
  • No registro da empresa, deve-se exigir declaração do titular da EIRELI, para os devidos fins e efeitos de direito, constando expressamente que o mesmo não participa de qualquer outra pessoa jurídica dessa modalidade (art. 980-A, §2º, CC).
  • Aplicam-se à EIRELI, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas (art. 980-A, §6º, CC).

O registro da EIRELI simples, no Registro Civil de Pessoa Jurídica, é tão simples quanto a sua própria natureza.

Após elaborar o contrato de constituição, as páginas do respectivo instrumento deverão estar rubricadas e assinadas ao final pelo titular da empresa. Todas as firmas devem ser reconhecidas no Tabelionato de Notas (Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, Cap. XVIII, item 11). O contrato deve ser visado por um advogado (art. 1º, §2º, da Lei nº 8.906/94), salvo quando se tratar de Microempresa/Empresa de Pequeno Porte (art. 9º, §2º, da Lei Complementar nº. 123/06).

Após a elaboração do contrato e a aposição de todas as assinaturas, o interessado deverá apresentar o respectivo título, em duas vias, ao RCPJ da cidade em que sediada a empresa. Deve apresentar também requerimento, assinado pelo representante legal (art. 121 da Lei nº. 6.015/73).

Satisfeito o pagamento das custas e emolumentos, conforme Tabela de Custas e Emolumentos vigente, o registro será feito em até 10(dez) dias úteis, prazo este reduzido em muitos RCPJ’s.

Clique aqui e baixe, gratuitamente, um modelo de contrato constitutivo da EIRELI.

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* O autor é Substituto do 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de São José dos Campos/SP, idealizador e organizador do Portal do RI- Registro de Imóveis (www.PORTALdoRI.com.br) e editor e colunista do Boletim Eletrônico, diário e gratuito, do Portal do RI.

Como citar este artigo: ALVARES, Luís Ramon. EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI): PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E MODELO CONTRATUAL. Boletim Eletrônico do Portal do RI nº. 074/2014, de 22/04/2014. Disponível em https://www.portaldori.com.br/2014/04/22/empresa-individual-de-responsabilidade-limitada-eireli-principais-caracteristicas-e-modelo-contratual/. Acesso em XX/XX/XX, às XX:XX.

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O ping pong da Central dos Registros de Títulos e Documentos de São Paulo

* Vitor Frederico Kümpel

Nos últimos anos, muito se discutiu sobre a permanência e funcionalidade do Centro de Atendimento e Distribuição de Títulos e Documentos de São Paulo, pessoa jurídica responsável por orientar e dar suporte à instalação e operação de uma central própria para a recepção e distribuição dos serviços dos Registros de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica na Comarca da Capital.

A central foi criada a partir de 09 de outubro de 2001, quando o então Corregedor Geral Luiz de Macedo, tendo por base o processo C.G. 2.686/01, a pedido dos titulares de Cartórios de Títulos e Documentos instituiu o provimento 29, alterando a redação do subitem 7.2. do capítulo XIX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. A partir daí, todos pedidos de registros foram centralizados e distribuídos de forma equânime entre as dez serventias de Títulos e Documentos da capital, a cada qual se garantia ainda um valor mínimo de 10% do montante capitalizado pela atividade no município.

A sistemática perdurou por aproximadamente dez anos sem qualquer objeção oficial e pôs fim à concorrência entre as unidades. Somente em 2011, que, motivado pelo processo 2011/42965, o corregedor geral pôs fim à distribuição prévia dos registros, sem juízo, entretanto, da distribuição mantida em consenso unânime dos titulares das delegações (provimento 19). Contudo, foi facultada a livre escolha do registrador pelo usuário, que poderia apresentar o título na unidade escolhida, neste caso vedada obviamente a compensação. O próprio provimento ainda destacava que nas dependências da central, bem como no respectivo endereço eletrônico deveriam ser fixadas informações claras sobre a liberdade de escolha e a possibilidade de apresentação do título diretamente ao registrador. Desde então, entre idas e vindas, vários provimentos regulamentaram o assunto, instituindo ou destituindo a centralização obrigatória, em um infindável set de uma partida de tênis.

Não satisfeita a questão, em 28/9/2011, os registradores de São Paulo solicitaram ao Conselho Nacional de Justiça o retorno da compensação dos valores. O CNJ acolheu o pedido e em 14/2/2012 suspendeu parte do Provimento 19/2011 da CGJ-SP. Desse modo, o então corregedor geral Renato Nalini editou os provimentos 03 e 04, conferindo nova redação ao subitem 7.2 do capítulo XIX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. Segundo o provimento 04, o usuário poderia até escolher o registrador, desde que apresentasse o título ao distribuidor, sem prejuízo da obrigatória compensação dos títulos livremente distribuídos.

Em 12/6/2012, a Associação dos Advogados de São Paulo impetrou mandado de segurança questionando a última decisão do CNJ. Em abril de 2013, o ministro Ricardo Lewandowsi suspendeu a decisão, prejudicando os provimentos 03 e 04. Desse modo, o atual corregedor-geral da Justiça de São Paulo Hamilton Elliot Akel foi obrigado a revogar as normas editadas por Nalini.

Na época, o presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Arystóbulo de Oliveira Freitas, defendeu o direito de escolha pelo cidadão do local de registro do documento, vez que existem "cartórios" mais eficientes e céleres. De qualquer modo, para quem defende a descentralização, o argumento é a busca por melhor qualidade no serviço, diferencial básico e elemento de competitividade entre as unidades. À maneira de Smith, diríamos que uma mão invisível regularia de maneira diretamente proporcional a procura em vista da qualidade do serviço oferecido.

Ademais, sendo a procura regulada pela qualidade do atendimento, nada impediria, por exemplo, que os RTDs que se dispusessem a manter elevado quadro de funcionários e notificantes, a utilizar de técnicas hodiernas em benefício de seu mister ou desenvolver trabalho aliado aos escritórios advocatícios usufruíssem da preferência pela clientela contentada. Acrescendo-se ainda em defesa da descentralização o fato de que a manutenção da central como intermediadora entre cidadão e o "cartório" apenas atrasaria os serviços prestado e elevaria os custos do serviço, dada a estrutura bis in idem.

Alguns chegam a responsabilizar a central pela redução no número de prepostos das serventias, com a perda de contratos que passaram a ser registrados inclusive em outras cidades, devido à queda na qualidade do atendimento e interrupção do desenvolvimento tecnológico apresentado pelo setor anteriormente ao surgimento da central. As más línguas chegam a apelidá-la "poupa trabalho" referindo-se aos delegatários ineficientes, que utilizam a central para transferir compulsoriamente parte da atividade prestada.

Se traçarmos um paralelo com a visão de George Arkelof e sua obra "The Market for Lemons: Quality Uncertainty and the Market Mechanism" poderíamos mencionar aqui a problemática de uma assimetria de informações, vez que os prestadores do serviço detêm maior informação que os usuários, cuja preferência acaba subsumida pela uniformização e centralização, premiando unidades menos eficientes ao igualá-las às mais eficientes. Trata-se do famoso mercado de limões de Arkelof, que utiliza o termo em alusão aos carros com defeito no mercado de usados, em uma tradução, equivaleria ao nosso famoso "abacaxi"1. Haveria um nivelamento do serviço de má qualidade que obteria o salvo conduto diante de um sistema que imporia uma igualdade para ofícios qualitativamente distintos.

Por outro lado, para quem defende a posição contrária, como Robson Alvarenga, titular do 4º Ofício de Títulos e Documentos, a descentralização completaria o sucateamento do sistema com piora no atendimento à população, pois a central garante a estabilidade necessária a um serviço com nível de excelência e independência fundamental à segurança jurídica do registro. Segurança esta incompatível com a captação de clientela em uma estrutura descentralizada, dada a possibilidade de oferecimento de vantagens ilegais. Nessa linha de raciocínio, uma das grandes preocupações éticas da atividade é evitar a concorrência formal na medida em que não pode haver captação de "clientela", o que certamente ocorre diante da liberdade de opção do usuário.

Argumenta-se que a comunhão das dez unidades de títulos e documentos facilita a inserção tecnológica a longo prazo de todas as serventias envolvidas. Segundo o próprio CDT até janeiro de 2014, mais de 13 milhões de atos registrais já haviam sido praticados, e somente em 2013 o investimento na área teria superado R$ 1 milhão. Outro argumento favorável à permanência da unidade se põe em função de clientes do setor financeiro, como grandes bancos. Trata-se de clientes em potenciais que seriam priorizados, em detrimento do cidadão comum, pois para satisfazê-los cada serventia teria de arcar ainda com a contratação de profissionais especializados no mercado.

Nesse sentido, a centralização também é elogiável, pois, na prática, ao longo da última década, o CDT moveu esforços para a capacitação dos seus funcionários, visando a melhoria dos serviços, oferecidos ao cidadão com celeridade e eficiência, por meio de estrutura apropriada e consistente, voltada à prontidão do atendimento.

A centralização da recepção e distribuição dos títulos e documentos obra favoravelmente no que toca à logística para que as informações e providências ganhem uma uniformidade e a central passe a ser elemento potencializador do próprio serviço de Títulos e Documentos facilitando inclusive o controle.

Contra o argumento da elevação dos custos da atividade, os defensores da Central pregam que os custos do CDT não são repassados aos usuários, vez que são financiados diretamente pelas serventias agregadas. Nesse contexto, prioriza-se compromisso dos delegatários com a eficiência, segurança, transparência e profissionalismo, em detrimento do valor de arrecadação das serventias.

O art. 12 da lei 8.935/94, na sua interpretação gramatical torna óbvio que os registros de títulos e documentos independem de prévia distribuição. Walter Ceneviva ensina que a escolha é livre, desde que no ambito da rescpectiva comarca, de modo que a legitimidade do funcionamento de cada serviço fique restrita a um local único, vedando-se sucursais2. Todo o problema da análise do artigo 12 reside no fato de que a lei 8.935/94 subentende em funcionamento no estado, como o de São Paulo, o ofício de registro de distribuição, que não se trata de um mero distribuidor, mas sim uma serventia centralizadora dos atos praticados nos ofícios de registro, o que jamais foi implementado na maioria dos estados da federação.

Independentemente do ponto de vista adotado, verdade é que a tecnologia informacional surge flexibilizando e inovando o serviço o que acaba, de certo, modo, por eliminar a problemática. Para ilustrar, temos o sistema adotado pelas CRCs, um gerenciamento de banco de dados alimentado por atos de competência dos oficiais dos Registros Civis das Pessoas Naturais interligados com um regimento administrativo próprio. Sem dúvida, a inclusão digital dos serviços extrajudiciais reflete um avanço considerável, tendo em vista a enorme redução de custos de transação. Por meio da virtualidade dos serviços, as despesas e tempo despendidos com o deslocamento à respectiva Serventia são substituídos pela faculdade do cidadão requerer e receber em seu endereço certidões instantaneamente atualizadas, sem ter de percorrer quilômetros de distância ou levar horas para se deslocar em uma cidade de infraestrutura deficitária. A adesão à tecnologia informacional é marco a favor do princípio da eficiência do serviço público, independente de qualquer distribuição ou equalização dos serviços de títulos e documentos. Aliás, a referida informatização põe em xeque o próprio ofício de distribuição.

É sabido que a própria LNR confere organização técnica e administrativa aos serviços notariais e de registro, com preceitos fundados na economia taylorista, relativos ao ordenamento científico do trabalho com método, técnica e especialização, por meio de uma definição de tarefas. Nesse sentido, a inserção tecnológica e interligação dos serviços atende a problemática em benefício da eficiência.

De fato, o CDT tornou-se ferramenta a favor da celeridade e eficiência dos serviços de Títulos e Documentos da capital, com o cognome de "poupa tempo" dos RTDs. Contudo, a tecnologia se põe à favor do final da partida de "ping pong" em benefício do cidadão usuário. Diante de todo o arrazoado o centro da discussão deve ser deslocado da existência ou não da central para o uso adequado da tecnologia como fator central na prestação do serviço em benefício da cidadania. Existindo ou não a central, a carência dos registros gira em torno da tecnologia como fator de produção.

_______________________________

1. Akerlof, George A. (1970). "The Market for 'Lemons': Quality Uncertainty and the Market Mechanism". Quarterly Journal of Economics (The MIT Press) 84 (3): 488–500. doi:10.2307/1879431.

2. W. Ceneviva. Lei dos Notários e dos Registradores Comentada. 9ª edição. São Paulo: Saraiva. p. 158.

_______________________________

* Vitor Frederico Kümpel é juiz de Direito em São Paulo, doutor em Direito pela USP e coordenador da pós-graduação em Direito Notarial e Registral Imobiliário na EPD – Escola Paulista de Direito.

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CGJ edita o PROVIMENTO CG Nº 06/2014, que exclui, das atribuições dos Registros Civis de Pessoas Jurídicas, o registro de cooperativas.

DICOGE 5.1

Processo 2013/125821 – DICOGE 5.1

Parecer 30/14-E

NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA – MINUTA DE PROVIMENTO EXCLUINDO A ATRIBUIÇÃO DOS REGISTROS CIVIS DE PESSOAS JURÍDICAS DE REGISTRAREM AS COOPERATIVAS.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

O presente expediente reviu o Capítulo XVIII, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, culminando com a edição do Provimento CG nº 23/2013.

Uma das principais alterações foi no sentido de estabelecer expressamente que é atribuição dos Oficiais de Registro Civil das Pessoas Jurídicas registrar os atos constitutivos das cooperativas.

A redação anterior do item 1, alínea “a”, dispunha:

“1. Compete aos oficiais do Registro Civil das Pessoas Jurídicas, independentemente de despacho judicial:

a) registrar os contratos, os atos constitutivos, os estatutos ou compromissos das sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, bem como os das fundações, exceto as de direito público, e das associações de utilidade pública;”

Com o advento do Provimento CG nº 23/2013, assim ficou redigido:

“1. É atribuição dos Oficiais do Registro Civil das Pessoas Jurídicas:

a) registrar os atos constitutivos, contratos sociais e estatutos das sociedades simples; das associações; das organizações religiosas; das fundações de direito privado; das empresas individuais de responsabilidade limitada, de natureza simples; das cooperativas; e, dos sindicatos”.(g.n.)

Em novembro de 2013, a Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo, OCESP, requereu nova revisão das normas, alegando que: (1) o §6º do art. 18 da Lei n. 5.764/74 (Lei das Cooperativas), o qual prevê o registro das cooperativas nas Juntas Comerciais, teria sido recepcionado pela Constituição de 1988 e estaria plenamente em vigor, a despeito da não recepção das demais disposições do artigo; (2) o referido §6º do art. 18 da Lei das Cooperativas se impõe sobre os dispositivos do Código Civil que definem as cooperativas como sociedades simples e determinam o registro delas nos Registros Civis de Pessoas Jurídicas, pois é lei especial que não pode ser sobreposta por lei geral, ainda que posterior, conforme inteligência do §2º do art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e do art. 1.093 do Código Civil, que ressalva a aplicação da lei especial sobre o Código; (3) ainda que se entenda que o §6º do art. 18 da Lei das Cooperativas não foi recepcionado, permanece em vigência o art. 32, II, alínea “a” da Lei n. 8.934/94 (Lei dos Registros de Empresas Mercantis), que determina o registro das cooperativas nas Juntas e também é lei especial; (4) entendimento em sentido contrário viola os princípios da Legalidade e da Separação dos Poderes (fls. 47/54).

O Instituto de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas do Estado de São Paulo, IRTDPJ-SP, foi então ouvido e defendeu a manutenção da redação dada pelo provimento CG nº 23/2013 sustentando que: (1) o art. 226 da Constituição Federal determina que os serviços de registro são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público, de forma que as Juntas Comerciais não poderiam, em tese, praticar nenhum tipo de registro; (2) a Lei dos Registros de Empresas Mercantis não poderia criar sistema paralelo de registros públicos afrontando a sistemática constitucional; (3) o Código Civil enquadra as cooperativas como sociedades simples e estas devem ser registradas nos Registros Civis de Pessoas Jurídicas; (4) o art. 1.150 do Código Civil se insere em capitulo especial que trata de registros e se sobrepõe à Lei dos Registros das Empresas Mercantis (67/73).

É o relatório.

Opino.

A legislação específica sobre as cooperativas, Lei n. 5.764 de 1971, prevê as Juntas Comerciais como local adequado para o registro:

“Art. 18. Verificada, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de entrada em seu protocolo, pelo respectivo órgão executivo federal de controle ou órgão local para isso credenciado, a existência de condições de funcionamento da cooperativa em constituição, bem como a regularidade da documentação apresentada, o órgão controlador devolverá, devidamente autenticadas, 2 (duas) vias à cooperativa, acompanhadas de documento dirigido à Junta Comercial do Estado, onde a entidade estiver sediada, comunicando a aprovação do ato constitutivo da requerente.

§ 1° Dentro desse prazo, o órgão controlador, quando julgar conveniente, no interesse do fortalecimento do sistema, poderá ouvir o Conselho Nacional de Cooperativismo, caso em que não se verificará a aprovação automática prevista no parágrafo seguinte.

§ 2º A falta de manifestação do órgão controlador no prazo a que se refere este artigo implicará a aprovação do ato constitutivo e o seu subsequente arquivamento na Junta Comercial respectiva.

§ 3º Se qualquer das condições citadas neste artigo não for atendida satisfatoriamente, o órgão ao qual compete conceder a autorização dará ciência ao requerente, indicando as exigências a serem cumpridas no prazo de 60 (sessenta) dias, findos os quais, se não atendidas, o pedido será automaticamente arquivado.

§ 4° À parte é facultado interpor da decisão proferida pelo órgão controlador, nos Estados, Distrito Federal ou Territórios, recurso para a respectiva administração central, dentro do prazo de 30 (trinta) dias contado da data do recebimento da comunicação e, em segunda e última instância, ao Conselho Nacional de Cooperativismo, também no prazo de 30 (trinta) dias, exceção feita às cooperativas de crédito, às seções de crédito das cooperativas agrícolas mistas, e às cooperativas habitacionais, hipótese em que o recurso será apreciado pelo Conselho Monetário Nacional, no tocante às duas primeiras, e pelo Banco Nacional de Habitação em relação às últimas.

§ 5º Cumpridas as exigências, deverá o despacho do deferimento ou indeferimento da autorização ser exarado dentro de 60 (sessenta) dias, findos os quais, na ausência de decisão, o requerimento será considerado deferido.

Quando a autorização depender de dois ou mais órgãos do Poder Público, cada um deles terá o prazo de 60 (sessenta) dias para se manifestar.

§ 6º Arquivados os documentos na Junta Comercial e feita a respectiva publicação, a cooperativa adquire personalidade jurídica, tornando-se apta a funcionar”. (g.n.)

Da mesma forma que a Lei das Cooperativas, a Lei dos Registros de Empresas Mercantis e Atividades Afins, n. 8.934 de 1994, também prevê o registro de tais pessoas jurídicas nas Juntas Comerciais:

“Art. 32. O registro compreende:

(…)

II – O arquivamento:

a) dos documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas;”

É certo que o atual Código Civil considera as cooperativas como sociedades simples, as quais por sua vez devem ser registradas nos Registros Civis de Pessoas Jurídicas:

“Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.

Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa”.

“Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária”.(g.n.)

Por outro lado, contudo, no capítulo específico destinado às cooperativas, o Código Civil ressalvou a aplicação de lei especial:

“Art. 1.093. A sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no presente Capítulo, ressalvada a legislação especial”.

Consequentemente, aqueles que defendem a continuidade do registro das cooperativas nas Juntas Comerciais sustentam a supremacia da Lei n. 5.764/71 sobre o art. 1.150 do Código.

Há uma aparente antinomia jurídica.

Fábio Ulhôa Coelhoaduz que “antes da entrada em vigor do Código Civil, a competência era da Junta Comercial, por força da lei de disciplina do registro de empresa (Lei n. 8.934/94, art. 32, II, a). Em 2003, nenhuma outra norma atribuía às Juntas a incumbência – não mais vigia, então, a previsão do art. 18, §6º, da LCoop; como a Constituição Federal havia abolido a autorização de funcionamento para as cooperativas, no art. 5º, XVIII, os arts. 17 a 20 da LCoop não foram recepcionados pela nova ordem e perderam vigência em 1988. Pois bem, aquele dispositivo da lei do registro de empresas foi revogado pelo art. 1.150 do Código Civil; porque não sendo legislação específica das cooperativas, sua vigência não foi alcançada pela ressalva do art. 1.093 desse Código.” (Curso de Direito Civil, vol. 3, Contratos, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 493).

Nessa ordem de ideias, Sílvio de Salvo Venosa propôs na IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, um Enunciado “no sentido de ser competente o Registro Civil da Pessoa Jurídica da sede da sociedade cooperativa para o arquivamento e registro de seus atos constitutivos, apresentando como fundamento as normas dos arts. 1.093, 1096 e 1.150 do Código Civil, além da não recepção dos arts. 17 a 20 da Lei 5.764/71 pela Constituição Federal de 1988. Após acalorados debates no âmbito do Grupo de Direito de Empresa, a proposta foi rejeitada por maioria de votos, mantendo-se a orientação interpretativa adotada na I Jornada” (Ricardo Fiuza e Newton De Lucca, Código Civil Comentado, Coordenadora Regina Beatriz Tavares da Silva, 9ªed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1030).

Para Modesto Carvalhosa “alguns dos dispositivos da ainda vigente Lei n. 5.764/71 claramente não foram recepcionados pela Constituição Federal, tais como os arts. 17 a 20, por exemplo, que dispõem sobre a referida autorização prévia de funcionamento” (Comentários ao Código Civil, Tomo 13, 2ªed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 396).

Em sentido contrário, porém, Maria Helena Diniz, cita o Enunciado 691 da I Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal, de 2002, bem como o Enunciado 2072, aprovado na III Jornada, e se posiciona pelo registro das cooperativas nas Juntas Comerciais. Afirma que os §§ 6º e 8º3 do art. 18 da Lei das Cooperativas foram recepcionados pelo art. 5º, XVIII da Constituição Federal4 e prevalecem em relação ao art. 1.150 do Código Civil (Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 8, Direito de Empresa, 5ªed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 289).

Esse também é o entendimento de Newton De Lucca e Ricardo Fiuza, segundo os quais apesar das cooperativas serem sociedades simples, elas “continuam a ter seus atos arquivados na Junta Comercial em face da ressalva da parte final do art. 1.093 combinada com a regra do art. 1.096. Nesse sentido foi a conclusão da I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, no Superior Tribunal de Justiça” (Código Civil Comentado, Coordenadora Regina Beatriz Tavares da Silva, 9ªed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1030.

As diferentes posições acerca do tema também se espraiam pelas diversas Corregedorias de Justiça dos Estados, que não têm posicionamento unânime.

Em alguns Estados, como por exemplo o Rio de Janeiro5, Rio Grande do Sul6, Bahia7 e Ceará8, as normas de serviço das Corregedorias determinam expressamente os Registros Civis de Pessoas Jurídicas como os competentes para o registro das cooperativas.

Em outros, como Santa Catarina9 e Maranhão10, os Registros Civis são proibidos expressamente pelas normas de registrarem as cooperativas.

Paraná, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais não trazem disposição expressa sobre o tema nas respectivas normas.

Cumpre lembrar também que há no Senado dois projetos de lei (PL 03/2007 e PL 153/2007) visando a substituir a Lei n. 5.764/74 e prevendo o registro das cooperativas nas Juntas Comerciais.

Sopesados os argumentos e respeitadas as controvérsias, nos filiamos à corrente doutrinária que entende que o registro deve ser feito nas Juntas.

O art. 1.093 do Código Civil ressalva a aplicação da legislação especial e o §6º do art. 18 da Lei das Cooperativas não teve sua inconstitucionalidade declarada na via jurisdicional pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, prestigia-se entendimento consolidado nas Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal.

Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência, é no sentido de alterar as Normas de Serviço para excluir as menções ao registro das cooperativas nos Registros Civis de Pessoas Jurídicas, conforme minuta anexa.

Em caso de aprovação, sugere-se a publicação da íntegra do parecer, para conhecimento geral.

Sub censura.

São Paulo, 11 de fevereiro de 2014.

(a) Gabriel Pires de Campos Sormani

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e por seus fundamentos, que adoto, determino a alteração das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça nos termos da anexa minuta de Provimento, que acolho.

Para conhecimento geral, determino a publicação na íntegra do parecer por três vezes.

Publique-se.

São Paulo, 18/02/2014

(a) HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça

1 “As sociedades cooperativas são sociedades simples sujeitas à inscrição nas juntas comerciais.”

2 “A natureza de sociedade simples da cooperativa, por força legal, não a impede de ser sócia de qualquer tipo societário, tampouco de praticar ato de empresa.”

3 § 8º Cancelada a autorização, o órgão de controle expedirá comunicação à respectiva Junta Comercial, que dará baixa nos documentos arquivados.

4 Art. 5º, XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.

5 Art. 851, Título VII, Capítulo I, Consolidação Normativa da Parte Extrajudicial

6 Art 211, Título III, Consolidação Normativa Notarial e Registral

7 Art. 702, Título V, Capítulo I, Código de Normas dos Serviços Notariais e Registrais

8 Art. 162,Título III, Capítulo I, Consolidação Normativa Notarial e Registral

9 Art. 686, Terceira Parte, Capítulo III, Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça de Santa Catarina : Não se fará o registro de sociedades cooperativas, de factoring e de firmas individuais.

10 Art. 526, §1º, Seção III, Capítulo III, Título III, Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça do Maranhão.

_________________________

PROVIMENTO CG Nº 06/2014

Modifica os itens 1, letra “a”, 1.1 e 2 do Capítulo XVIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

O DESEMBARGADOR HAMILTON ELLIOT AKEL, CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais;

CONSIDERANDO a necessidade da permanente atualização das Normas de Serviço e adequação delas à lei;

CONSIDERANDO o disposto no art. 18, §6º, da Lei n. 5.764/71;

CONSIDERANDO o parecer emitido nos autos nº 2013/125821;

RESOLVE:

Artigo 1º: Alterar a redação do item 1, letra “a”, da Seção I, do Capítulo XVIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, nos seguintes termos:

“1. É atribuição dos Oficiais do Registro Civil das Pessoas Jurídicas:

a) registrar os atos constitutivos, contratos sociais e estatutos das sociedades simples; das associações; das organizações religiosas; das fundações de direito privado; das empresas individuais de responsabilidade limitada, de natureza simples; e, dos sindicatos.”

Artigo 2º: Alterar a redação do item 1.1, da Seção I, do Capítulo XVIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, nos seguintes termos:

“1.1. Os atos constitutivos, contratos sociais e estatutos das sociedades simples, associações, organizações religiosas, fundações de direito privado, empresas individuais de responsabilidade limitada e associações só serão admitidos a registro e arquivamento quando visados por advogado, devidamente identificado com nome e número de inscrição na OAB, exceto no caso de sociedade simples enquadrada como Microempresa (ME) ou Empresa de Pequeno Porte (EPP), quando o visto é dispensado.”

Artigo 3º: Alterar a redação do item 2, da Seção I, do Capítulo XVIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, nos seguintes termos:

“2. É vedado o registro de quaisquer atos relativos às sociedades simples; associações; organizações religiosas; fundações de direito privado; empresas individuais de responsabilidade limitada, de natureza simples; e, sindicatos, se os atos constitutivos não estiverem registrados no mesmo Serviço.”

Artigo 4º: Este Provimento entrará em vigor em 30 dias de sua 1ª publicação.

São Paulo, 07 de março de 2014

(a) HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça

Fonte: DJE/SP | 12/03/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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