A arrematação: forma originária de aquisição de propriedade

A fim de se demonstrar o verdadeiro renascimento que se opera sobre a saúde registrária do bem quando da sua arrematação em hasta pública, mister rememorar que são pressupostos fundamentais deste procedimento (I) a inexistência de relação entre o adquirente e o precedente titular do direito real e a (II) inocorrência de transmissão voluntária do direito de propriedade.

Diante desse cenário, em prol da segurança e da natureza jurídica da aquisição de um bem por esta modalidade – a arrematação -, a doutrina e a jurisprudência passaram a considerá-la modo originário de aquisição da propriedade, tal e qual a usucapião.

A fim de elucidar tal conceito, preleciona ilustre jurista Caio Mário da Silva Pereira1 que é considerada originária a propriedade daquele que se torna dono de um bem que jamais esteve sob o senhorio de alguém; ou seja, é uma propriedade que se adquire sem que ocorra a sua transmissão por outrem, seja voluntária ou involuntária, direta ou indireta; sem que tenha havido, pois, qualquer relação com o estado jurídico anterior daquele bem.

Tem-se, assim, que a propriedade adquirida por meio da arrematação judicial implica o rompimento de todo e qualquer vínculo daquele bem, tanto com relação ao antigo proprietário, quanto com os ônus e gravames que o embaraçavam (art 849, VII, CC), tais como penhoras, ou até mesmo dívidas tributárias que, contraídas anteriormente à arrematação, são incorporadas aos valores transacionados na hasta pública.

Outro não foi o posicionamento da Ilustre desembargadora Cláudia Telles, da 5ª câmara Cível do TJ/RJ, no julgamento do agravo de instrumento 0060959-15.2012.8.19.0000, ao consignar que "considerando que a arrematação judicial é título aquisitivo originário, entende esta relatoria que à hasta pública não podem sobreviver pendências que anteriormente tisnavam a propriedade plena, devendo o imóvel ser passado ao arrematante livre de qualquer ônus que incida sobre o imóvel."

Cumpre destacar, ainda, que nem mesmo as hipotecas que estiverem devidamente registradas no fólio real resistirão à arrematação judicial do bem, já que serão devidamente extintas, para o que se faz imprescindível a prévia intimação do credor hipotecário sobre a realização da hasta.

Neste sentido, vem sendo firmado o entendimento dos Tribunais Estaduais. A ver:

PENHORA DE IMÓVEL – ARREMATAÇÃO – CANCELAMENTO DE PENHORA. Bem penhorado. Arrematação. Cancelamento da penhora. O bem arrematado se transfere para o arrematante livre deste ônus. Tendo a aquisição judicial de bem caráter originário, o imóvel se transfere ao arrematante livre dos ônus da penhora, tanto quanto extingue a hipoteca, que é direito real, quando intimado da praça o credor hipotecado. Se assim não fora, situação esdruxula ocorreria. Com a arrematação o imóvel passou à propriedade do arrematante. Se continuasse a incidir sobre ele a penhora, nova praça seria realizada e com a venda judicial, o bem seria do patrimônio, não da executada, mas do novo proprietário, primeiro arrematante. Portanto este é que garantiria, com seu patrimônio, execução sofrida pela executada. Agravo denegado.2

E, baluarte que é, o STJ vem dando eco e consolidação à jurisprudência das Cortes Estaduais. Nos termos:

"Civil. Processual civil. Arrematação. Bem hipotecado. A arrematação extingue a hipoteca, tanto que o credor hipotecário tenha sido intimado da realização da praça, posto que tem conteúdo de aquisição originária, livre dos ônus que anteriormente gravavam o bem por esse meio adquirido".

Via de consequência, o imóvel é transferido ao arrematante livre de qualquer ônus, restando a arrematação perfeita e acabada depois de atendidas todas as formalidades previstas nos arts. 686 a 707 do CPC, sendo as últimas etapas da transferência do bem a assinatura, pelo referido arrematante, do auto de arrematação, e a derradeira expedição da respectiva carta, que deverá ser levada a registro como título aquisitivo da propriedade.

Manifesto, portanto, o privilégio do adquirente que recebeu a propriedade de um bem – que retornou à condição de imaculado quando da consumação da sua arrematação, já que desonerado de todo e qualquer gravame anterior – tendo de suportar, apenas e tão-somente, a comissão do leiloeiro e as despesas atinentes à transcrição dos títulos de transmissão de propriedade.

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[1] Instituições do Direito Civil, Caio Mário da Silva Pereira Vol. IV, 12ª edição, Ed. Forense

[2] TJRJ – 0023058-67.1999.8.19.0000 (1999.002.01409) – Agravo de Instrumento – 1ª Ementa – Des. Gustavo Kuhl Leite – Julgamento: 11/05/1999 – Segunda Câmara Cível

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*Renata Ribeiro é diretora da área de litigância cível do escritório Manhães Moreira Advogados Associados.

Fonte: Miagalhas | 16/07/2013.

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Parcelamento do solo urbano. Loteamento. Circunscrições limítrofes.

Parcelamento do solo urbano. Loteamento. Circunscrições limítrofes.

Questão trata acerca do registro de loteamento urbano quando o imóvel a ser loteado pertence a duas circunscrições.

Para esta edição do Boletim Eletrônico a Consultoria do IRIB selecionou questão acerca do registro de loteamento urbano quando o imóvel a ser loteado pertence a duas circunscrições. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de João Baptista Galhardo:

Pergunta
Em qual circunscrição imobiliária deve ser registrado um loteamento urbano, quando o imóvel a ser loteado pertence a duas circunscrições?

Resposta:
O tema já foi devidamente abordado por João Baptista Galhardo, em obra intitulada “O Registro do Parcelamento do Solo Para Fins Urbanos”, publicada pelo IRIB/safE, Porto Alegre, 2004, p. 48. Vejamos:

“31. Imóvel em mais de uma circunscrição

Quando a área loteada estiver em mais de uma circunscrição imobiliária, o registro será requerido primeiramente perante aquela em que estiver localizada a sua maior parte. Procedido o registro nessa circunscrição, o interessado requererá, sucessivamente (nunca concomitantemente), o registro do loteamento em cada uma das demais, comprovando perante cada qual o registro efetuado na anterior, até que o loteamento seja registrado em todas. E só depois de registrado em todas é que terá existência jurídica. Denegado o registro em qualquer das circunscrições, essa decisão será comunicada, pelo oficial do registro de imóveis, às demais para efeito de cancelamento dos registros feitos. O indeferimento do registro do loteamento em uma circunscrição não determinará o cancelamento do registro procedido em outra, se o motivo do indeferimento naquela não se estender à área situada sob a competência desta, e desde que o interessado requeira a manutenção do registro obtido, submetido o remanescente do loteamento a uma aprovação prévia perante a Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso. Nenhum lote poderá situar-se em mais de uma circunscrição.

Cada Registro de Imóveis abrirá as matrículas de seus respectivos lotes.”

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br)| 16/07/2013.

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1ª VRP/SP: Registro de Imóveis – dúvida – registro de instrumento particular de cessão da posição de devedor fiduciante – imposto de transmissão inter vivos, por ato oneroso (ITBI) – não-incidência por falta de previsão na lei municipal – dúvida improcedente.

MM. JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA DE REGISTROS PÚBLICOS DE SÃO PAULO/SP

MM. JUIZ DE DIREITO JOSUÉ MODESTO PASSOS

Processo 0059498-04.2012.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – 3º Oficial de Registro de Imóveis da Capital – Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU – CONCLUSÃO Em 3 de maio de 2013, faço estes autos conclusos a(o) MM(A). Juiz(a) de Direito Josué Modesto Passos, da 1ª Vara de Registros Públicos. Eu, ________, [Antônio Marcos Ribeiro da Silva], Escrevente, digitei. Registro de Imóveis – dúvida – registro de instrumento particular de cessão da posição de devedor fiduciante – imposto de transmissão inter vivos, por ato oneroso (ITBI) – não-incidência por falta de previsão na lei municipal – dúvida improcedente. CP 400 Vistos etc. Recebi estes autos em 3 de maio de 2013. 1. O 3º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (3º RISP) suscitou dúvida (fls. 02-04; matrícula 116.849, prenotação 356.921) a requerimento de Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo CDHU, que apresentara um instrumento particular (fls. 19-40) de cessão de direitos em que figuram a própria apresentante, na qualidade de credora fiduciária, Joice Ariane Nogueira Brito, cedente, e Suely Barbosa Nogueira, cessionária. 1.1. Segundo o ofício do registro de imóveis, nos termos da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973 LRP73, art. 289, o instrumento particular não pode ser dado a registro, porque não foi adimplido o imposto de transmissão por ato inter vivos (ITBI), devido por força do Decreto Municipal n. 51.627, de 13 de julho de 2010, art. 1º, II, e art. 2º, XIII. 1.2. A apresentante CDHU, contudo, entende que o caso é de não-incidência do tributo, nos termos da Lei Municipal n. 11.154, de 30 de dezembro de 1991, art. 3º, VI. 1.3. A dúvida veio acompanhada de documentos (fls. 06-45 e 47-48). 2. A suscitada impugnou (fls. 50-55), apresentou procuração ad iudicia (fls. 60-62) e fez juntar documentos (fls. 56-59). 3. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 64). 4. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. 5. Em que pesem as razões do ofício de registro de imóveis e do Ministério Público, in casu não incide o imposto de transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição ITBI. 5.1. A cessão da posição de devedor fiduciante, de que aqui se trata, não é: (a) obviamente, transmissão inter vivos, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física (Decreto Municipal n. 52.703 Consolidação da Legislação Tributária Municipal, de 5 de outubro de 2011, art. 129, I, a e b); nem (b) cessão, por ato oneroso, de direitos relativos à aquisição de bens imóveis (Dec. n. 52.703/11, art. 129, II): afinal, para o direito civil (Cód. Tributário Nacional CTN, art. 110), a alienação fiduciária imobiliária (Lei n. 9.514, de 20 de novembro de 1997, art. 22 e segs.) é direito real de garantia (Lei n. 9.514/97, art. 17, IV), e não direito relativo à aquisição, propriamente. 5.2. Ademais, a cessão não está prevista expressamente no Dec. n. 52.703/11, art. 130, I-XII. 5.3. Quanto ao Dec. n. 52.703/11, art. 130, XIII, trata-se de uma cláusula aberta, que não se pode interpretar como compreensiva da cessão dos direitos de devedor fiduciante, não só porque é do sistema da legislação municipal (Dec. n. 52.703/11, art. 1º, II, 129, I, b, e 131, VI) deixar fora da incidência do ITBI os atos relativos à alienação fiduciária sobre imóveis. 5.4. Como já ficou decidido por esta Vara (autos 000.03.045910-9, Juiz Venício Antonio de Paula Salles, j. 03.10.2003): “[…] o art. 3° desta lei local, prevê a seguinte hipótese de ‘não incidência’: Art. 3°. – O imposto não incide: VI. – sobre a constituição e a resolução da propriedade fiduciária de coisa imóvel, prevista na Lei Federal n° 9.514, de 20 de novembro de 1997. Destaque-se que não se trata de ISENÇÃO, mas de reconhecimento de ‘não incidência’, pois são institutos distintos, na medida em que a isenção retira uma operação do campo de incidência, ao passo que a previsão de ‘não incidência’ corresponde à declaração, ao reconhecimento de que a ‘operação’ sequer ingressou no campo de atuação fiscal. Portanto, fica marcante a postura e o entendimento do legislador ordinário, que reconheceu e declarou que criação da garantia fiduciária não representa TRANSMISSÃO IMOBILIÁRIA para fins tributários. Fosse isenção e a dicção legal teria sentido diverso. Assim, se Lei Municipal, a despeito da provável natureza REAL dos direitos do devedor fiduciante, não vislumbrando transmissão imobiliária para efeitos fiscais, igualmente não poderá considerar TRANSMISSÃO, no ato de cessão destes direitos. A Lei 11.154/91 fornece, portanto, várias sinalizações no sentido de confirmar a NÃO INCIDÊNCIA. Em primeiro lugar, por não contemplar expressamente a hipótese de CESSÃO dos direitos do fiduciário, em seu art. 2°, na medida em que este elenca todas as operações submetidas ao foco tributário. Em segundo lugar, por deixar patente que toda a operação que envolve a ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA não é alcançada pela incidência (‘não incidência’), não sendo considerada TRANSMISSÃO para efeitos fiscais. Em terceiro lugar por expressamente excluir no campo e tributação os ‘direitos reais em garantia’ (art. 1°, inciso I, letra ‘b’). Anote-se que a cessão decorrente de compromisso de compra e venda, que tem características semelhantes, foi contemplada pela lei municipal de forma expressa e objetiva, que criou a incidência, circunstância, que mais uma vez sinaliza no sentido de que, à mingua de PREVISÃO EXPRESSA, prevendo a incidência sobre a CESSÃO DE DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE, não há como se reconhecer a incidência tributária.” 6. Do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo 3º Ofício do Registro de Imóveis de São Paulo, para que proceda ao registro do título da prenotação 356.921. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Desta sentença cabe apelação para o E. Conselho Superior da Magistratura no prazo de quinze dias, no efeito devolutivo e suspensivo. Esta sentença vale como mandado (Portaria Conjunta n. 01/08). Oportunamente ao arquivo. P. R. I. C. São Paulo, . Josué Modesto Passos JUIZ DE DIREITO – CP 400 – ADV: ANA LUCIA FERNANDES ABREU ZAOROB (OAB 81487/SP).

Fonte: DJE/SP | 11.07.2013.

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