Artigo – Usucapião extrajudicial: primeiras linhas – Por Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza

* Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza

O novo CPC incluiu o art. 216-A na Lei 6.015/73, regulando a possibilidade de requerimento de reconhecimento de usucapião diretamente no registro imobiliário, denominando-o “usucapião extrajudicial”.

A alteração legislativa merece aprofundado estudo. Contudo, neste blog, o que pretendo é traçar apenas brevíssimas considerações, especialmente sobre a atuação notarial, e suscitar debates.

Como se verifica, o procedimento tramitará sob a presidência do registrador imobiliário, mas um dos documentos que deve instruir o pedido é uma ata notarial (inciso I do art. 216-A da Lei 6.015/73).

Não há dúvida que a lei, apesar de suas imperfeições, prestigia a atividade notarial e registral, no contexto da desjudicialização.

A primeira questão que se coloca diz respeito à vigência da alteração da Lei 6.015/73.

O novo CPC entrará em vigor um ano após a sua publicação, ocorrida em 17/03/15. A cláusula de vigência se refere a “este código”, o que leva alguns doutrinadores a sustentar que a alteração da Lei 6.015/73 já está em vigor. Para o tabelião, penso ser irrelevante a discussão, pois nada obsta que, desde já, lavre as atas notariais que servirão para instruir os pedidos de reconhecimento extrajudicial de usucapião. As atas, documentando a “existência e o modo de existir de algum fato (art. 384 do novo CPC)”, já podiam ser lavradas antes mesmo da inclusão do art. 216-A à LRP. Ao registrador, que presidirá o procedimento, caberá analisar se presentes os requisitos para reconhecimento do (a) usucapião, e dentre os documentos estará a ata notarial, não a podendo recusá-la por ter sido lavrada antes da vigência do novo CPC, caso entenda que a vigência da alteração da LRP coincide com a do novo diploma processual civil.

Quanto ao tabelião que lavrará a ata, embora a escolha seja livre, qualquer que seja o domicílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio (art. 8º da Lei n. 8.935/94), na hipótese da ata notarial, que visa atestar “a existência e o modo de existir de algum fato (art. 384 do novo CPC)”, o tabelião que não tiver atribuição para praticar atos no local da situação do bem, terá enorme dificuldade de realizar de modo adequado seu trabalho, especialmente por estar impedido de praticar atos de ofício fora do local onde exerce a delegação (art. 9º da Lei n. 8.935/94). A ata deverá conter as informações que forem do conhecimento do tabelião, e que sirvam para atestar o tempo de posse do requerente e de seus antecessores, bem como fatos relativos à existência de acessões que indiquem a utilização do imóvel para moradia ou o uso do mesmo em cultivo pelo requerente. No entanto, vejo que a atribuição do tabelião não se restringe à ata notarial, pois a colheita de declarações de testemunhas sobre a posse, esclarecendo sobre o título da mesma, tempo, condições de exercício, e o que mais for relevante, é de extrema importância, e deve se dar por meio de escritura declaratória.

Arregimentada a documentação, nela incluída a ata notarial e eventual escritura declaratória, o pedido deve ser apresentado ao registro imobiliário, onde tramitará.

Superada a fase notarial, o requerimento encontrará, com enorme possibilidade, sérios entraves no registro imobiliário, já que a lei exige a concordância dos “titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes” (inciso II do art. 216-A). Caso tais interessados não tenham assinado a planta e o memorial descritivo, o registrador deverá notificá-los “para manifestar seu consentimento expresso em 15 (quinze) dias, interpretado o seu silêncio como discordância” (§ 2º do art. 216-A). Ora, obter o consentimento como determinado pela lei pode inviabilizar completamente o instituto, especialmente se, notificados os interessados, seu silêncio for interpretado como discordância.

Fiel ao objetivo desde breve texto, ressalto que: a) as funções notariais e registrais foram amplamente valorizadas, pois aos profissionais de direito que as exercem foram conferidas as atribuições de instruir e apreciar requerimentos de usucapião, que encerram algumas importantes dificuldades, já que deve ser observado não só o procedimento, mas principalmente se foram preenchidos os requisitos para reconhecimento do usucapião, na espécie requerida; b) apesar do avanço, a lei cometeu alguns equívocos, dentre eles o mal delineamento da atuação do tabelião no procedimento, e a previsão de exigências que praticamente inviabilizarão a efetividade do instituto, ou pelo menos reduzirão consideravelmente seu alcance. Seria de bom alvitre que fossem revistas algumas disposições, para que se atinja o fim almejado com o novel instituto.

Fonte: Notariado | 03/11/2015.

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Artigo: As Escrituras Públicas – Por Dr. Arthur Del Guércio Neto

*Dr. Arthur Del Guércio Neto

A escritura pública é o ato notarial mediante o qual as partes manifestam sua vontade ao Tabelião, visando criar atos e negócios jurídicos.

Normalmente é atrelada à transmissão imobiliária, sob a forma de venda e compra, doação, dação em pagamento, dentre outras. Sem sombra de dúvidas, são atos de extrema importância na vida das pessoas, nos quais o Tabelião também está presente, ofertando fé-pública e segurança jurídica.

No entanto, o universo de utilização da escritura pública é extremamente amplo, não se restringindo apenas à transmissão de imóveis. União estável, contratos de namoro, pacto antenupcial, emancipação, separação, divórcio, inventário, contrato social, objetivando a criação e alteração de empresas, são exemplos habituais de como a escritura pública pode ser importante na vida do cidadão.

A união estável, forma de constituição de família tão numerosa quanto o casamento, pode ter seus principais pontos definidos em uma escritura pública. Os namorados que pretendem declarar seu intuito de não constituir família podem se valer da escritura pública para realizar o polêmico contrato de namoro, objeto da próxima coluna mensal. Mantendo o foco nos relacionamentos, aquelas pessoas que optarem pelo casamento podem escolher o regime de bens, caso seja diferente do legal (comunhão parcial de bens), por intermédio da escritura de pacto antenupcial.

Se criar relacionamentos está atrelado à escritura pública, o mesmo pode-se dizer quanto ao seu fim, pois separação, divórcio e dissolução de união estável podem ganhar essa forma. A possibilidade de separação e divórcio no cartório de notas é fruto da Lei 11.441/07, que também previu a possibilidade de inventários serem feitos por escritura pública, num procedimento rápido e eficaz.

Por fim, o documento mais importante para uma pessoa jurídica é o contrato/estatuto social; ao optar pela forma pública, as partes têm a certeza de que tal documento será elaborado com ampla cautela e zelo, assim como ocorre em qualquer ato no qual o Tabelião atue.

Fonte: Diário do Alto do Tietê.

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CGJ/SP: REGISTRO DE IMÓVEIS – ESCRITURA DE COMPRA E VENDA – AQUISIÇÃO DE BEM POR MENOR INCAPAZ – ORIGEM DESCONHECIDA DOS RECURSOS – NECESSIDADE DE ALVARÁ JUDICIAL – VERIFICAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO E PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL, DA EFETIVA PROTEÇÃO DO INTERESSE DO MENOR – IMPOSSIBILIDADE DE REGISTRO – PRECEDENTE DO EGRÉGIO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA – RECURSO DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 9000002-71.2014.8.26.0470, da Comarca de Porangaba, em que é apelante ANDRÉ ARRUDA NAVARRO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PORANGABA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ RENATO NALINI (Presidente), GUERRIERI REZENDE (DECANO), ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO, RICARDO ANAFE E EROS PICELI (VICE PRESIDENTE).

São Paulo, 29 de setembro de 2015.

ELLIOT AKEL

RELATOR

Apelação Cível n.º 9000002-71.2014.8.26.0470

Apelante: André Arruda Navarro

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Porangaba/SP

Voto n.º 34.276

REGISTRO DE IMÓVEIS – ESCRITURA DE COMPRA E VENDA – AQUISIÇÃO DE BEM POR MENOR INCAPAZ – ORIGEM DESCONHECIDA DOS RECURSOS – NECESSIDADE DE ALVARÁ JUDICIAL – VERIFICAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO E PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL, DA EFETIVA PROTEÇÃO DO INTERESSE DO MENOR – IMPOSSIBILIDADE DE REGISTRO – PRECEDENTE DO EGRÉGIO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA – RECURSO DESPROVIDO.

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto em face de sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Oficial do Registro de Imóveis de Porangaba, que negou registro de escritura de venda e compra, relativa à aquisição de bem imóvel por menor relativamente capaz.

No recurso, argumenta-se que o bem foi adquirido com recursos do próprio interessado e que só há de se exigir alvará para a venda de bens de menor, não para a compra. Colaciona precedente da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital.

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Passo a decidir.

O recurso não comporta provimento.

Há precedente recente do Egrégio Conselho Superior da Magistratura (Apelação n.º 0072005-60.2013) citado pelo Oficial, similar ao caso dos autos. Aliás, a sentença mencionada nas razões de recurso foi reformada justamente no julgamento da mencionada apelação.

As razões de desprovimento do recurso, portanto, são as mesmas.

O item 41, ‘e’, do Cap. XIV, das NSCGJ, diz que o Tabelião de Notas, antes da lavratura de qualquer ato, deve:

“exigir os respectivos alvarás, para os atos que envolvam espólio, massa falida, herança jacente ou vacante, empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial, incapazes, sub-rogação de gravames e outros que dependam de autorização judicial para dispor ou adquirir bens imóveis ou direitos a eles relativos, sendo que, para a venda de bens de menores incapazes, o seu prazo deverá estar estabelecido pela autoridade judiciária.”

O item é composto de duas partes distintas. A primeira parte diz que o Tabelião deve “exigir os respectivos alvarás, para os atos que envolvam espólio, massa falida, herança jacente ou vacante, empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial, incapazes, sub-rogação de gravames e outros que dependam de autorização judicial para dispor ou adquirir bens imóveis ou direitos a eles relativos”. A segunda parte afirma que “para a venda de bens de menores incapazes, o seu prazo deverá estar estabelecido pela autoridade judiciária.”

Em nenhum momento o item dispõe que não é necessário alvará para a aquisição de imóvel por menor incapaz. Ao contrário. Ele é claro ao afirmar a exigência de alvará para atos que envolvam incapazes e outros que dependam de autorização judicial para dispor ou adquirir bens imóveis ou direitos a ele relativos.

A ressalva da segunda parte do item em nada infirma o que foi dito. Aliás, o dispositivo apenas repete o art. 220, parágrafo único, das NSCGJ – Cartórios Judiciais. Trata-se, tão somente, de uma precaução a mais, dada a relevância, perante o ordenamento, da alienação de bem de menor incapaz. Exigem as Normas que, no caso específico de alvará para alienação, o prazo deverá estar estabelecido pela autoridade judiciária. De onde se conclui que, nos demais casos, embora necessário o alvará, não se exige a indicação de prazo.

Visto que as Normas não dispensam a apresentação de alvará, resta verificar se o Código Civil o faz. E a resposta também é negativa.

O art. 1.691 dispõe que os pais não podem alienar, ou gravar de ônus real, os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz.

O interessado aduz que não se tratou de alienar nem de gravar de ônus real imóvel de menor. Ao contrário, cuidou-se de adquirir patrimônio em seu favor, o que vai ao encontro de seu melhor interesse. Nada se perdeu, mas se acresceu ao patrimônio do incapaz. Daí porque seria desnecessária autorização judicial.

O argumento não convence. O negócio de compra e venda do imóvel implicou a contração de obrigação – pagamento do preço de R$45.000,00 – que ultrapassa, absolutamente, os limites da mera administração. E não há qualquer comprovação de necessidade ou evidente interesse do incapaz, o que, justamente, deveria ter sido feito mediante pedido de alvará, quando o Juiz verificaria a presença de tais requisitos.

Não se indicou, na escritura, de onde vieram os recursos para a compra do imóvel. Há de se presumir, portanto, que se tratou de recursos próprios do menor. É a única conclusão que permite a leitura do título e, também, das razões do recurso.

Ora, se são recursos do incapaz e se, como visto, o ato implicou a contração de obrigação que ultrapassa os limites da simples administração, é evidente que o alvará era necessário. Há uma série de circunstâncias que o Juiz Togado deve verificar para concluir que negócio de tal monta interessa mesmo ao incapaz ou se é necessário. Isso porque, na verdade, há possibilidade de que ele esteja sendo usado para encobrir fraude contra credores ou ao fisco, dado que o vendedor é seu pai.

Mesmo os aspectos relativos ao negócio em si deveriam ter sido apreciados pelo Ministério Público e pelo Juiz, no melhor interesse do menor. Cite-se, ainda que na esfera jurisdicional, trecho do Acórdão do Agravo de Instrumento n. 152.031.4-0 – Rel. Des. Zélia Maria Antunes Alves, onde se esclarecem as razões pelas quais a intervenção é pertinente:

Agravo de Instrumento – Alvará – Aquisição de imóvel, com numerário de menor absolutamente incapaz – Avaliações elaboradas por imobiliárias – Inadmissibilidade – Necessidade de proteção do patrimônio do menor – Determinação de avaliação judicial, para aferição do real valor do bem – Recurso provido.

“Em se tratando de operação de venda e compra, por menor, absolutamente incapaz, com numerário próprio, representada por sua mãe, de rigor, para prevenir possível prejuízo, seja o bem imóvel, a ser adquirido, avaliado, por perito nomeado pelo Juízo.

Não basta, ao contrário do entendimento pela MM. Juíza ‘a quo’, embora louvável sua preocupação com os gastos com a perícia, a serem suportados pela própria menor, ora agravada, a juntada de avaliações, simples e sucintas, elaboradas por 03 (três) imobiliárias distintas, apresentadas por sua representante.

Tais avaliações, ainda que não se discuta a idoneidade das empresas que as realizaram, em razão de solicitadas por pessoa diretamente interessada na transação, não substituem, para o fim a que se destinam – compra de imóvel com numerário pertencente a menor, cujos interesses devem ser acima de tudo protegidos, a avaliação por perito judicial.

Impõe-se, na espécie, para a proteção e segurança do patrimônio da menor, ora agravada, total controle e pleno conhecimento, pelo Juízo e pelo Ministério Público, órgãos incumbidos pelo Estado de zelar pelos interesses dos incapazes, de todas as circunstâncias e pormenores do negócio, principalmente, o valor de mercado do imóvel.

Em assim sendo, imprescindível a avaliação judicial, por perito especializado, com descrição pormenorizada do imóvel e do local onde se situa, e, com indicação fundamentada de seu real valor de mercado.”

Dessa maneira, por qualquer ângulo que se analise a questão, a conclusão é pela necessidade do alvará, razão pela qual andou bem o Oficial ao negar o registro da escritura pública.

Ante o exposto, pelo meu voto NEGO PROVIMENTO ao recurso.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: TJ/SP | Data de Inclusão: 04/11/2015.

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